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Índice

I.Introdução ................................................................................................................................... 1
1.1.Objectivos............................................................................................................................ 2
1.1.1Geral .............................................................................................................................. 2
1.1.2 Específicos .................................................................................................................... 2
1.2.Justificativa…………………………………..…………………………………………………………………………….2
1.3.Problema……………………………………….……………………………………………………………………………2
1.4.Hipótese de solução……………………………………………………………………………………………………3
1.5.Estrutura temática .............................................................................................................. 3
1.6.Metodologia ........................................................................................................................ 3
CAPÍTULO I .................................................................................................................................... 5
1.Resenha Histórica da Concorrência Parasitaria como Modalidade da Concorrência Desleal ... 5
CAPÍTULO II ................................................................................................................................... 9
2.Concorrência Parasitária no Âmbito das Marcas. ...................................................................... 9
2.1.Concorrência desleal ........................................................................................................... 9
2.1. Actos considerados desleais............................................................................................... 9
2.2. Concorrência parasitária. ................................................................................................. 18
2.2.1. Noção ........................................................................................................................ 18
2.2.2.Características da concorrência parasitária ............................................................... 19
2.2.3. Fundamentos da sua proibição ................................................................................. 20
2.3. Direito da Marca................................................................................................................. 9
2.3.1. Noção da Marca. ....................................................................................................... 10
2.3.2.Funções da Marca. ..................................................................................................... 12
2.3.3.Tipos de Marca. .......................................................................................................... 13
2.3.4.Princípios Informadores das marcas .......................................................................... 14
2.4.Principais Formas de Violação do Direito à Marca ........................................................... 17
2.4.1. Tipos de Violações. .................................................................................................... 17
2.4.2.Concorrência parasitária por meio de Contrafacção e Imitação de Marcas.............. 22
CAPITULO III ................................................................................................................................ 24
Direito Comprado ........................................................................................................................ 24
3.Soluções Adoptadas noutros Ordenamentos Jurídicos. .......................................................... 24

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3.1.Portugal. ............................................................................................................................ 24
3.2.Espanha: ............................................................................................................................ 24
3.3.Brasil: ................................................................................................................................. 25
CAPÍTULO IV ................................................................................................................................ 26
4.Responsabilidade Civil dos Ilícitos Parasitários no Âmbito das Marcas em Moçambique ...... 26
4.1.Noção e modalidades da responsabilidade civil ............................................................... 26
4.2. Responsabilidade Civil Extracontratual por Factos Ilícitos............................................... 27
4.3. Pressupostos da Responsabilidade Civil dos ilícitos parasitários por meio de Marcas ... 28
4.3.1 O Facto. ...................................................................................................................... 28
4.3.2. Ilicitude. ..................................................................................................................... 29
4.3.3. Culpa.......................................................................................................................... 30
4.3.4. Dano. ......................................................................................................................... 33
4.3.5.Nexocausal ................................................................................................................. 35
4.4 Responsabilidade civil dos ilícitos parasitários por meio de marcas a luz do código de
propriedade industria ............................................................................................................. 36
5.CONCLUSÕES E RECOMENDACÕES .......................................................................................... 38
5.1Conclusão ........................................................................................................................... 38
5.2Recomendações ................................................................................................................. 39
6.BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................... 40

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I.Introdução

O tema sobre o qual a presente dissertação vai debruçar-se é atinente a


Responsabilidade Civil dos agentes praticantes da concorrência parasitária no âmbito
das marcas. A escolha deste tema, prende-se com a sua importância e actualidade, na
medida em que a economia Moçambicana vem conhecendo uma dinâmica caracterizada
por profundas mudanças como resultado do ambiente macroeconómico em contínuo
melhoramento, tendo estado a registar um crescimento bastante acentuado do mercado.
De forma a ganhar mais clientela, alguns agentes têm agido de modo parasitário em
relação aos seus concorrentes, ou seja, um determinado empresário pratica actos que
visam tirar ou tentar tirar partido da reputação legitimamente adquirida por terceiro ou
das realizações pessoais de outrem, mesmo que não haja risco de confusão nem intenção
de prejudicar este.

Os exemplos paradigmáticos são os casos mais conhecidos que ocorreram em vários


países, tais como: uso da marca Luck strike para perfumes, que se verificou em Itália, o
da marca kodak para bicicletas, que ocorreu na Inglaterra, o da marca watermann para
maquinas de barbear, ocorrido em França, o da marca Ford para cigarros, passado na
Noruega, o da marca fhilco para gravatas que se deu em canada. Na verdade, este actos
tem se verificado com maior frequência, pois, a prática dum empresário lançar no
mercado seus produtos assinalando-os como uma marca igual ou semelhante à adoptada
por outro empresário para produtos de natureza diferente, sobretudo quando a marca
reproduzida é bastante conhecida, gozando de larga celebridade. Este facto, para além
de constituir uma concorrência parasitária no âmbito das marcas, traduz uma forma de
criar confusão no Público consumidor, devendo ser encarado como uma concorrência
desleal.

A Concorrência Parasitária aparece como um factor prejudicial à concorrência à


semelhança do que acontece no regime por exemplo, Português, Sul-africano, Francês,
visto que cria confusão no consumidor, levando – o associar marcas notórias ou de
prestígio à bens de má qualidade, ou de conotação negativa, pertencentes à outras
marcas menos conhecidas, o que afecta a reputação daquelas marcas notórias ou de
prestígio.

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1.1.Objectivos

1.1.1Geral

 Analisar a responsabilidade civil da prática ilícita da concorrência parasitária a


luz do direito das marcas na ordem jurídica moçambicana.
1.1.2 Específicos

 Compreender casos de concorrência parasitária que geram confusão ao


consumidor;
 Compreender a figura jurídica dos direitos das marcas no concernente a
concorrência parasitária
 Analisar se o acto de concorrência parasitaria a luz do direito das marcas,
prejudica os agentes económicos e quais as formas de repressão.

1.2. Justificativa
A escolha deste tema, prende - se pelo facto de o licenciando ter notado a dificuldade
de, na actualidade, uma ausência base legal que consiste na aplicação da
responsabilidade civil de agentes praticantes de concorrência parasitaria, na medida em
que agentes tem agido de modo contrario às normas e usos honestos da actividade
industrial, comercial ou de serviços, portanto, usam marcas alheias por forma a lograr
no mercado. A economia Moçambicana vem registando um grande crescimento,
acentuado, no mercado. Sendo assim, novas empresas, marcas, produtos e serviços tem
sido registadas, portanto, por forma a ganhar mais clientela em relação aos seus
concorrentes, alguns empresários tiram ou tentam tirar proveito da reputação
legitimamente adquirida por terceiros ou das realizações pessoais de outrem, portanto,
por temer que num futuro muito próximo não haja este tipo de situações, há uma
necessidade de prever, aprimorar, este instituto da responsabilidade civil dos agentes
praticantes de concorrência parasitaria no âmbito das marcas.

1.3. Problema
Tendo em consideração a razão de escolha do tema pretende - se indagar qual será a
responsabilidade civil a ser a aplicada à aquele agente parasitário que faz uso de uma
marca notória ou notoriamente conhecida em seus productos ou serviços?

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1.4. Hipótese de solução
No presente trabalho apresentamos como hipótese de solução que seria razoável para a
ordem jurídica moçambicana legislar, acolher de forma aprofundada, a Concorrência
Parasitária como factor prejudicial à concorrência à semelhança do que acontece no
regime por exemplo, Português, Espanhol, Brasileiro, visto que cria confusão no
consumidor, levando – o a associar marcas notórias e/ou de prestigio, à bens de má
qualidade, ou de conotação negativa, pertencentes à outras marcas menos conhecidas, o
que afecta a reputação daquelas marcas notórias e/ou de prestígio.

1.5. Estrutura temática

O trabalho divide-se basicamente em 4 capítulos segundo a sequência lógica da


abordagem do tema.

O primeiro capítulo dedicar-se-á a resenha histórica da concorrência parasitária como


modalidade da concorrência desleal, onde apreciaremos as suas origens e fundamentos.

O segundo capítulo debruçar-se-á sobre Concorrência Parasitária no âmbito das marcas


no qual destacaremos o conceito da concorrência desleal, tipos ou elemento,
características da Concorrência parasitária, sem descorar da figura jurídica das marcas,
suas funções, princípios, entre outros que ao longo do trabalho iremos dissecar

O terceiro capitulo incidirá sobre o direito comparado atinente a concorrência


Parasitária em: Brasil, Espanha e Portugal onde verificaremos como os agentes
praticantes da concorrência parasitária no âmbito das marcas respondem civilmente.

O quarto capitulo dedicar-se-á a Responsabilidade Civil dos Ilícitos Parasitários no


âmbito das marcas em Moçambique, sendo que, em primeira instância abordaremos
sobre a responsabilidade civil no geral e por fim apresentaremos as respectivas
conclusões e recomendações.

1.6. Metodologia

Para a elaboração do presente trabalho recorreu-se a consulta bibliográfica de diversos


manuais disponíveis sobre a matéria em análise, entrevistas com individualidades
abalizados no assunto em debate, a pesquisa jurisprudencial referente ao tema e

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legislação que serviu de fundamentação legal para o caso em apreço, onde a principal
base de sustento foi o Decreto nr. 4/2006 de 12 de Abril, Código de Propriedade
Industrial e a Lei 10/2013 de 11 de Dezembro, a Lei que regula as matérias respeitante a
concorrência no exercício da actividades económicas.

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CAPÍTULO I

1.Resenha Histórica da Concorrência Parasitaria como Modalidade da


Concorrência Desleal
A história de concorrência parasitária está relacionada com a de concorrência desleal,
até porque, a concorrência parasitária é uma modalidade da concorrência desleal, esta
surge no liberalismo, no século XIX, o qual tinha como lema “Laissez – faire, laissey –
passer que le monde va de lui - même”1, e exaltava a liberdade de trabalho e das trocas,
deixando-se de fora a intervenção do Estado nas relações económicas.

O liberalismo económico, não só desenvolveu a concorrência, como também trouxe


consigo o aproveitamento abusivo da concorrência. Até podemos afirmar que, o que
actualmente designamos de concorrência desleal, em tempos remotos chamou se
simplesmente de abuso de concorrência2.

O abuso da concorrência ou concorrência desleal surgiu no séc. XIX, na França3. “Para


os Franceses, o abuso da concorrência é um “acto ilícito”4 , daí que, no princípio, a
responsabilização da concorrência desleal, era, em muitos Países, em sede de
responsabilidade civil, e ainda hoje em alguns desses prevalece”5. Na França, “até hoje,
a concorrência desleal é um “ilícito civil”, sendo punível por perdas e danos sofridos”6
.

“A Itália também não fugiu a regra, sendo, que a jurisprudência também manifestou
receptividade em incluir a concorrência desleal no âmbito do ilícito extracontratual.”7

Posteriormente, a Alemanha consagrou uma disciplina específica que se debruçasse


acerca da concorrência desleal, sendo considerada a pioneira nesta área de estudo,
“primeiro com a Lei de 27/5/1896 e depois com a Lei de 7/6/1909 (Gesetz gegen den

1
É uma expressão Francesa que significa “Deixar fazer, deixar passar, que o mundo caminhe por si só ”:
Cfr. GONÇALVES, Luís M.Couto, Manual de Direito industrial, 2ª edição, Almedina, 2008, p.401.
2
idem.
3
ibidem.
4
A ilicitude é uma qualidade dum determinado comportamento e tem de ser aferida tendo em
consideração o conjunto da ordem jurídica e não somente em relação ao direito penal ou civil. Ao
falarmos de acto ilícito, nos referimos a qualquer comportamento que não está em conformidade com a
Ordem Jurídica e que viola um determinado direito, causa um dano e cria o dever de indemnizar.
5
Cfr. GONÇALVES, ob.cit, 403.
6
ASCENSÃO, José de Oliveira, Concorrência Desleal, Almedina, 2002, p.20.
7
Cfr. GONÇALVES, ob.cit, p.403.

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unlauteren wettbewerb - UWG). Esta ultima, revogada em 2004 (Lei de 3 de Julho),
teve particular importância no desenvolvimento doutrinal e legislativo do instituto. ”8

Deste modo, um acto desleal traduzia-se na contrariedade do acto com a cláusula geral
dos bons costumes, sendo, o agente que no tráfico mercantil realizasse actos com fim
último de concorrência e que atentassem contra os bons costumes, podia ser sujeito a
uma acção com vista à cessação e repressão de danos9.

Segundo Luís Gonçalves10, “esta técnica jurídica de combate à concorrência desleal


baseada na formulação de uma cláusula geral acompanhada de uma enumeração
exemplificativa de categorias de actos desleais viria a tornar-se prevalecente em
detrimento do modelo francês. O modelo Alemão acabaria por receber um grande
impulso da Convenção da União de Paris de 188311, na revisão de Haia de 6/11/1925,
sendo que foi introduzido a cláusula geral de concorrência desleal (acto de
concorrência contrário aos usos honestos em matéria industrial ou comercial) e
acrescentados duas espécies de actos desleais: actos de confusão e de descrédito”.

Deste modo a Lei Alemã, veio culminar de modo coerente, num longo processo de
evolução legislativa e jurisprudencial com objectivo de modernização do instituto em
causa. A Lei visa a protecção dos interesses dos concorrentes, dos consumidores12 e de
outros participantes do mercado em relação a actos de concorrência desleal e a
protecção do interesse geral a uma concorrência não falseada, desta forma definido
como acto de concorrência, “o acto que uma pessoa realiza com o objectivo de
promover a venda de produtos ou aquisição de serviços – incluindo bens imóveis,
direitos ou obrigações exigíveis – próprias ou de um terceiro empresário”13 e acto de
concorrência desleal, definido por uma nova clausula geral, consideram – se proibidos
os actos de concorrência desleal susceptíveis de afectar de modo não insignificante a
concorrência em prejuízo dos concorrentes, consumidores ou participantes no mercado
”14

8
ibidem, p. 404.
9
idem, 404.
10
idem.
11
Convenção de Paris para protecção da Propriedade Industrial de 20 de Março de 1883.
12
Esta protecção colectiva tem como escopo proteger a liberdade de decisão dos consumidores.
13
Cfr. GONÇALVES, ob.cit, 405.
14
ibidem, p.407.

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No direito Americano, “pouco pode se adiantar na medida em que historicamente, a
concorrência desleal não revestia autonomia legal (federal ou estadual) e baseava – se
essencialmente, numa protecção complementar da marca através da acção passing off
(acção destinada a combater actos de confusão entre produtos causada pelo respectivo
modo de apresentação ou pela publicidade) ”15.

A consagração legal da concorrência desleal, “a nível federal, ainda no Direito


Americano, teve lugar de forma sútil na Lei de marcas de 1946, em que não estabelece
se alguma clausula geral, contudo, tipificam – se como actos de concorrência desleal
os actos de confusão entre todos elementos que fazem parte do produto ou da
apresentação da imagem e a publicidade enganosa”16 .

Constitui uma baliza muito importante no desenvolvimento progressivo do instituto da


concorrência desleal a convenção de Paris de 20 de Março de 1883, cuja protecção da
propriedade industrial tem por objecto “as patentes de invenção, os modelos de
utilidade, …, bem como a repressão da concorrência desleal”17.

Em termos de evolução do instituto da concorrência desleal no Ordenamento Jurídico


Moçambicano, podemos afirmar que este instituto, não é novo entanto que tal, na
medida em que a legislação inerente à propriedade industrial, data do período colonial,
particularmente no Código de Propriedade Industrial Português.

Este código, foi aprovado pelo “Dec. N0 30679 de 24 de Agosto de 1940 e tornado
extensivo as Províncias Ultramarinas através da Portaria n0 17043 de 20 de Fevereiro de
1959, cfr. BR n0 13, Ia série, 20 Suplemento, de 3 de Abril de 1959 ”18.

Com a evolução legislativa, aprovou – se o Dec. 18/99, de 4 de Maio (o primeiro


Código da Propriedade Industrial de Moçambique Independente) que posteriormente foi
revogado pelo Dec. N0 4/2006, de 12 de Abril, publicado no BR n0 15, Ia série (Código
da Propriedade Industrial que está em vigor).

No entanto, há que notar que nestes dois diplomas (Dec. 18/99, de 4 de Maio e Dec. N0
4/2006, de 12 de Abril), o conceito de concorrência desleal, é o mesmo, não se
verificando nenhuma inovação. Porquanto se não vejamos: o art. 157, n 0 1, do Dec.

15
Cfr. GONÇALVES, ob.cit, p.409 e ss.
16
Idem.
17
Artigo 1 da Convenção de Paris para protecção da Propriedade Industrial de 20 de Março de 1883.
18
COMOANE, Ana, A Importância da Propriedade Industrial para os PVD’S, Maputo, 1998, p.2.

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18/99, de 4 de Maio, definia a concorrência desleal como “todo o cometimento de actos
contrários aos bons usos e costumes da actividade industrial, comercial ou de
serviços19. O art. 174, n0 1 do Dec. N0 4/2006, de 12 de Abril, define a concorrência
desleal, nos mesmos termos.

19
Pensamos, que o conceito adoptado pelo legislador moçambicano tem grande influência do conceito
adoptado pela Convenção de Paris de 1883, no seu art. 10 – bis.

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CAPÍTULO II

2.Concorrência Parasitária no Âmbito das Marcas.


Antes de abordar sobre concorrência parasitária propriamente dita, urge fazer uma
pequena dissecação sobre a concorrência desleal uma vez que a primeira constitui uma
modalidade da segunda.

2.1.Concorrência desleal

Ao abrigo do Código de Propriedade Industrial, concorrência desleal é todo o


cometimento de actos contrários aos bons usos e costumes da actividade industrial,
comercial ou de serviços.20

Numa acepção doutrinária21, define-se como acto de concorrência desleal aquele acto
susceptível de, no desenvolvimento de uma actividade económica, prejudicar outro
agente económico, um prejuízo que se consubstancia num desvio da respectiva
clientela, efectiva ou parcial, e que, quando se verifica em termos contrários às normas e
usos honestos de qualquer ramo de actividade económica, resulta num acto de
concorrência desleal;

2.2. Actos considerados desleais

São considerados actos de concorrência desleal, designadamente: o acto de confusão,


apropriação, descrédito, desorganização e parasitário, este último será abordado com
mais profundidade por ser a modalidade em análise no presente trabalho22.

2.3. Direito da Marca.

Como referimos anteriormente, o uso de marca notória com o intuito de vender outras
marcas pode confundir o consumidor, prejudicando assim aos outros produtores ou
serviços em causa, ficando lesado o proprietário dos sinais distintivos ou da sua
reputação, gerando deste modo a concorrência parasitária, por isso há uma necessidade
de abordar a concorrência parasitária no âmbito das marcas.

20
Art. 174 n◦ 1 CPI
21
Cfr. Ob.Cit. P.252
22
Cfr. PAÚL, Jorge F.C.Patrício, Concorrência Desleal, Coimbra, 1965, Pp.162

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2.3.1. Noção da Marca.

Um dos institutos do direito de propriedade industrial é o Direito de Marcas, que por


sua vez abrange várias categorias de direitos, nos termos da al. a do art.1) do CPI.23
A maior parte da doutrina define a marca como um sinal distintivo de produtos e
serviços ou, em termos mais acabados, marcas são signos (ou sinais) susceptíveis de
representação gráfica destinados sobretudo a distinguir certos produtos de outros
produtos idênticos ou afins24. Trata-se de uma noção doutrinária, mas muito próxima da
adoptada pelo legislador moçambicano (al. f) do art. 1) CPI.
Para uma percepção mais profunda, vamos agora decantar o conceito em vários
elementos. Assim, antes de mais, a marca é um sinal, tal como o são a firma e o nome e
insígnia do estabelecimento. Todos eles são sinais distintivos de comércio mas existem
diferenças, já que a marca é um sinal individualizador de produtos e serviços, enquanto
a firma individualiza o comerciante, e o nome e insígnia do estabelecimento
individualizam o estabelecimento comercial25.
Este sinal (marca) deve ainda ser susceptível de representação gráfica, daí que todas as
marcas que não preencherem este requisito não devam ser registadas. Há certos tipos de
marcas que dificilmente poderão ser representáveis graficamente, considerando-se que
só um sinal material ou, pelo menos, materializável (representável) pode constituir uma
marca26. Assim, não são registáveis as marcas gustativas, olfactivas e tácteis, pois, são
insusceptíveis de representação gráfica5.27

23
Qualquer referência feita sem indicação do diploma legal em causa dirige-se ao Código da Propriedade
Industrial aprovado pelo Decreto no 4/2006 de 12 de Abril (Boletim da República, I Série, No 15).
24
ABREU, Jorge M. Coutinho de, Curso de Direito Comercial, I, 5a Edição, Almedina, Coimbra, 2004, p.
354.
25
Idem.
26
GONÇALVES, Luís Couto, Direito de Marcas, Almedina, Coimbra, 2002, p. 66.
27
Veja-se ainda a al. f) do art.1.

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Outro elemento importante tem a ver com o facto de as marcas destinarem-se sobretudo
a distinguir certos produtos ou serviços de outros idênticos ou afins. Elas têm como
finalidade possibilitar a identificação e diferenciação dos produtos e serviços.
Como podemos ver, as marcas gozam de uma importância crucial num mercado
marcado pela livre iniciativa dos agentes económicos, pois estes, actuando livremente e
em concorrência, colocam no mercado uma diversidade de produtos e serviços
estabelecendo-se entre eles uma relação de semelhança ou afinidade. Assim, o produtor
ou comerciante adopta técnicas que facilitem a identificação do produto ou serviço,
evidenciando alguma doutrina que as marcas desempenham um papel de grande
importância para o tráfego comercial uma vez que, para os produtores “ tem a vantagem
incontestável de tornar conhecidos e acreditar os seus produtos, mediante processos
aperfeiçoados do seu fabrico e a qualidade das matérias-primas empregadas; e para o
público tem o mérito enorme de lhe permitir a aquisição dos produtos que melhor
satisfaçam as suas necessidades, assegurando-lhe a sua origem e qualidade”28.
É atendendo a uma perspectiva de competição entre os agentes económicos que a marca
também é definida como sinal distintivo na concorrência de produtos e serviços 29 .
Assim, podemos dizer que a ausência total de concorrência entre os empresários pode
desmotivar a utilização de marcas. Pense-se no caso de domínio total do mercado por
um produtor, em virtude de ser ele o único a actuar nesse ramo de produção. O público
não terá possibilidades de escolha, daí que a marca não ira distinguir nada por ausência
de semelhança ou afinidade entre os produtos e serviços.
Outro aspecto importante reside no facto de estes sinais distintivos abrangerem não
apenas os produtos mas também dirigirem-se aos serviços. Ao lado dos bens com uma
natureza corpórea ou física, os serviços também podem ser marcados, embora ostentem
carácter imaterial. Esta distinção advém do facto de, numa perspectiva económica, os
bens imateriais (p.e. a lição dada por um professor, a pintura de uma casa) terem a
designação específica de serviços30.
Por fim, as marcas distinguem produtos idênticos ou afins, evidenciando-se assim o
chamado princípio da especialidade que será analisado adiante31. Na verdade todo o
regime jurídico do direito de marcas assenta essencialmente na necessidade de se
distinguir produtos e serviços semelhantes, daí que não se possa adoptar marcas
28
CARDOSO, J. Pires, Compêndio de Noções de Direito Comercial, Atlântida Editora, Coimbra, 1973, p. 99.
29
ASCENÇÃO, José de Oliveira, Direito Industria, II, Lisboa, 1988, p.139.
30
MARTINEZ, Soares, Economia Politica, 6a ed., Almedina, Coimbra, 1995, p. 101.
31
idem.

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idênticas para produtos e serviços similares. Isto é assim porque pretende-se que a
marca se torne num elemento facilitador da vida das pessoas, e não seja um factor de
confusão. Não seria possível identificar com precisão certos produtos ou serviços, se
por hipótese para todos eles se adoptasse a mesma marca ou marcas facilmente
confundíveis.

2.3.2.Funções da Marca.

Função distintiva: A marca é um sinal que permite a identificação e diferenciação de


produtos e serviços. Alguma doutrina interpreta esta função num prisma de
identificação da proveniência de um produto ou serviço por referência a uma empresa32.
Esta orientação não colhe unanimidade, na medida em que, se por um lado, não raras
vezes nos deparamos com produtos e serviços assinalados por marcas que não fazem
referência à origem empresarial desse produto ou serviço, por outro lado, alguns
aspectos do regime jurídico-marcário forçam-nos a discordar, pelo menos parcialmente,
com esta tese. A possibilidade de transmissão da marca (arts. 17 e 121), a
admissibilidade da concessão de licenças de uso (art. 122), a existência das chamadas
marcas colectivas (al. g) do art. 1), evidenciam a hipótese de a marca poder ter uma
origem empresarial diferente da originária33.
Função de garantia de qualidade: segundo a qual, a marca seria um elemento garante
das qualidades de um determinado produto ou serviço. Não se trata de uma verdadeira
função uma vez que o produtor pode alterar as qualidades de um certo bem sem que daí
advenham reflexos jurídicos. Ademais, não raras vezes a qualidade de um determinado
produto ou serviço aumenta ou baixa. Em todos os casos os efeitos serão apenas
metodológicos e não jurídicos, ou seja, o produtor apenas corre o risco de desapontar
parte dos seus clientes que poderão procurar outros produtos ou serviços para a
satisfação das suas necessidades34.

32OLAVO, Carlos, Propriedade Industrial, Almedina, Coimbra, 1997, p. 38-39.


Segundo o autor a marca identificaria os produtos e serviços de acordo com a origem empresarial de
cada um deles.
33
A título ilustrativo consideremos a seguinte hipótese: A transmite a sua marca a B. Este é um outro
empresário e passa a adoptar a marca transmitida para os seus produtos e serviços, configurando-se
uma alteração da origem empresarial desse mesmo produto ou serviço.

34
ASCENÇÃO, José de Oliveira, As Funções da Marca e os Descritores (Metatags) na Internet.
Http://ld2.ldsoft.com.br/portal webseek/detalhe assuntos.asp. Acesso em: 28 Fev. 2013.

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Várias vezes os consumidores compram um bem, motivados pela sua qualidade ou
características — funcionando a marca como elemento referenciador das qualidades ou
características do produto — mas devemos perceber as coisas em termos hábeis.
Função sugestiva e publicitária: Através dela o produtor pode fazer chegar aos
consumidores um determinado produto, assim como informar acerca das alterações que
tenham sido introduzidas no mesmo. Quando se faz a publicidade de determinado
produto ou serviço, é através da marca que se identifica esse mesmo produto ou serviço,
funcionando aquela como um veículo de comunicação35.
Em suma, a marca prossegue apenas uma função jurídica, a distintiva, sendo que todas
as outras se afiguram como funções acessórias ou secundárias36.

2.3.3.Tipos de Marca.

Consoante a natureza material ou imaterial dos bens a que se dirigem as marcas podem
ser de produtos e de serviço37.
Tendo em linha de conta a natureza das actividades em causa, podemos ter marcas
industriais, aquelas com que o produtor assinala os seus produtos, e comerciais, aquelas
que o comerciante adopta para assinalar os produtos com os quais exerce o seu
comércio, ou seja, as marcas comerciais são usadas por quem exerce a actividade
comercial38.
Como podemos verificar as marcas industriais são mais importantes do que as
comerciais dado que “ acompanham a mercadoria desde a sua origem até ao consumo,
ao passo que estas últimas, apenas indicam a casa comercial que as expediu ou pôs à
venda e podem ser suprimidas ou substituídas por todos os sucessivos revendedores”39.
Atendendo aos elementos constitutivos, as marcas podem ser nominativas, quando
constituídas por elementos nominativos (nomes, letras, números, palavras e sons),
figurativas, quando integram elementos emblemáticos ou desenhos, mistas, quando
agrupam elementos nominativos e figurativos simultaneamente e formais ou
tridimensionais, quando se evidenciam pela forma do produto40.

35
ASCENÇÃO, ob.cit, 28 de Fevereiro de 2013
36
Idem
37
Idem
38
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 38.
39
CARDOSO, J. Pires, ob. cit. p.98.
40
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 40.

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Quanto à complexidade, as marcas podem ser simples, no caso de integrarem apenas um
elemento, e complexas, quando agrupam uma variedade de elementos quer sejam
nominativos, figurativos ou apareçam todos eles combinados41.
Consoante estejam ligadas à própria mercadoria ou não, fala-se também em marcas
aderentes e aparentes42·.
Nos termos do art.124, atendendo à protecção dada pelo registo as marcas podem ser
registadas e não registadas ou de facto. As primeiras, por força da lei gozam de certa
protecção conferindo-se direitos ao seu titular43. As marcas de facto são aquelas que,
embora existindo, não estão registadas, não gozando, ou melhor, gozando apenas
parcialmente de tutela legal44.

2.3.4.Princípios Informadores das marcas

O regime legal aplicável às marcas é orientado pelos seguintes princípio:

2.3.4.1.Princípio da Facultatividade:

Regra geral as marcas são de uso facultativo, não sendo obrigatória a sua adopção.
Entende-se que assim seja, uma vez que, se por um lado, atendendo a função distintiva
da marca é ao empresário que o seu uso beneficia — é este que tem a preocupação de
facilitar a identificação dos seus produtos, é este que pretende fazer chegar aos clientes
os seus melhores produtos — por outro lado, em nenhum momento encontramos uma
disposição legal que obrigue a adopção de uma marca tal como sucede com a firma (art.
18 do Código Comercial)45.

2.3.4.2. Princípio da Imutabilidade

Segundo o qual, a marca uma vez registada deve manter-se inalterada quanto a
constituição, enquanto durar esse registo, só admitindo-se alterações de vulto nos casos
especialmente previstos na lei. Com este princípio pretende-se acautelar o interesse dos

41
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 40
42
Ibidem, p.41
43
Podemos dar de exemplo o direito de uso exclusivo de marca, de impedir o uso ilícito e desautorizado
da mesma podendo o titular da marca intentar um processo judicial contra o infractor (nos 1 e 5 do art.
124, respectivamente).
44
O legislador atendendo as desvantagens de um sistema em que aqueles direitos se adquirissem
apenas pelo registo, procurou dar guarida aos casos de uso da marca não registada (arts. 124 no
2;125;126).
45
OLAVO, Carlos, ob. cit. p.45.

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consumidores, pois, embora a marca seja de uso facultativo uma vez adoptada ela não
deve ser alterada ao belo prazer da capacidade inventiva do seu proprietário46.

2.3.4.3.Princípio da Territorialidade

Pode ser tomado em dois sentidos. Por um lado, cabe a cada Estado definir o seu
próprio regime de tutela da marca. Quer isto dizer que, o regime aplicável a marca é em
princípio determinado pelo
Estado em que se pretende registá-la 47 . Por outro lado, os direitos conferidos pelo
registo de marcas encontram-se limitados ao território de um determinado Estado,
salvaguardando-se os casos de registo internacional de marcas48.

2.3.4.4.Princípio de Liberdade

Ao abrigo do qual o titular da marca goza de plena liberdade no que tange a sua
composição. Contudo, há que atender algumas limitações previstas na lei. Assim, a
marca a adoptar deve ter capacidade distintiva, ou seja, deve ser capaz de permitir a
distinção de produtos ou serviços semelhantes (al. a) do art. 110). Isto é compreensível,
pois, não se pode permitir o registo de uma marca que não possibilite a diferenciação
dos produtos ou serviços, sendo um elemento de confusão.
Não poderão ser registadas como marcas os sinais meramente descritivos de produtos.
Estes não têm eficácia distintiva na medida em que apenas descrevem a natureza ou a
identidade dos produtos e serviços para os quais são utilizados49.

46
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 46
47
Ciente das dificuldades que daí adviriam, actualmente a protecção internacional de marcas é feita
através de um sistema criado ao abrigo da Convenção de Paris de 1883, do Acordo de Madrid de 1891 e
do Protocolo referente a este acordo de 1989. Trata-se de um sistema de registo mais simplificado, que
tem a vantagem de aplicar ao registo internacional um conjunto unitário de normas e facilitar o registo
em todos os Estados membros.
48
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 47
49
in Curso Geral de Propriedade Industrial, ob. cit. p. 7. P.e. a adopção da marca ”caneta” para uma
caneta.

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2.3.4.5.Princípio da Novidade e da Especialidade50

O princípio da novidade traduz-se na ideia segundo a qual, a marca deve ser nova, no
sentido de, não ser idêntica a outra já registada (al. i) do art. 110) 51. A ausência de
novidade desencadeia a usurpação de marca (conceito analisado adiante). Este requisito
da novidade restringe-se a um círculo de produtos e serviços que estabelecem entre si
uma relação de semelhança ou afinidade (princípio da especialidade). Ou seja, esta
limitação apenas se dirige a produtos semelhantes, pois, há que evitar incorrer o
consumidor em erro por confusão de marcas.
Quer isto dizer que uma marca aplicada num certo produto ou serviço, pode ser
adoptada para outro produto ou serviço desde que não exista semelhança ou afinidade
entre os mesmos.
Devemos notar que no princípio da especialidade a semelhança diz respeito aos
produtos e serviços, ao passo que no princípio da novidade essa semelhança abrange as
marcas individualmente consideradas.
Podemos nos perguntar como é que se afere a semelhança ou afinidade entre produtos e
serviços? E a semelhança entre marcas?
A afinidade ou semelhança entre produtos e serviços deve ser aferida tendo em conta,
por um lado, a natureza ou características, e por outro, as finalidades dos produtos e
serviços. Deverão os bens em causa ter natureza próxima e finalidades idênticas ou
similares 52 . Podemos avançar o exemplo de calças e calções. A semelhança existirá
igualmente quando os produtos apresentem apenas finalidades idênticas embora tenham
natureza diversa ( p.e. sapatos de cabedal e sandálias).
Quanto a semelhança entre marcas a al. c) do art. 111 é bastante ilustrativa. O legislador
exige a verificação de três requisitos, devendo a marca apresentar semelhança gráfica,
fonética ou figurativa, e ainda, ser susceptível de criar confusão ao consumidor. O art.
111 do CPI deve ser entendido em termos abrangentes para se abarcar igualmente os
casos de contrafacção de marcas.
Justifica-se a orientação doutrinária segundo qual a novidade existirá quando a marca
para além de ser idêntica ou semelhante a outra, se afigure capaz de induzir em
confusão o consumidor.

50
Trata-se de dois princípios, e por estarem intrinsecamente relacionados serão abordados em conjunto.
51
Ficam igualmente abrangidas as marcas de prestígio e as notoriamente conhecidas art. (al. f) do
art.110) assim como outros sinais distintivos do comércio (al. g) do art. 110).
52
ABREU, Jorge M. Coutinho de, ob. cit. p. 378.

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Ainda em relação a semelhança entre as marcas, deve-se ter em conta o tipo de marcas e
o seu aspecto constitutivo. Se por hipótese, estivermos perante marcas emblemáticas, a
comparação deverá ser feita tendo em conta desenhos ou emblemas. Se a marca for
nominativa deverão ser tomados em consideração elementos nominativos.
Já a susceptibilidade de criar confusão ao consumidor — de incorrer as pessoas em erro,
tomando uma marca por outra, e por essa via um produto por outro — é evidenciada
com recurso a um consumidor abstracto o “consumidor médio” dos produtos ou
serviços marcados por sinais confundíveis53.

2.3.4.6.Princípio da Verdade

Ao abrigo do qual a marca não deve ser enganosa. A marca é enganosa quando incorre
o público em erro sobre “ a natureza, qualidade, proveniência geográfica ou outro
aspecto (v.g. composição, destino ou finalidade) do produto ou serviço, signifique um
sinal falso, isto é, um sinal objectivamente contrário a verdade, signifique isso
simplesmente, um sinal capaz de gerar risco de engano no público” (al. c) do art. 110)54.

2.4.Principais Formas de Violação do Direito à Marca

2.4.1. Tipos de Violações.

Depois de registada a marca, a lei confere ao seu titular uma série de direitos parte dos
quais constam do art. 12455. Ao lado do direito de uso exclusivo (no 1 art. 124), podem
ocorrer situações de uso ilícito da marca, quer motivadas por um terceiro, quer
perpetradas pelo próprio proprietário da marca.
As violações podem ser directas e indirectas. No primeiro caso, fica afectada a função
distintiva da marca, e no segundo, estaremos em face de situações que embora não
afectem a função distintiva da marca podem lesá-la em termos económicos56.
No que diz respeito às violações indirectas, importa frisar que a capacidade
identificadora e distintiva da marca não fica afectada — não se configurando o chamado
risco de confusão mas a sua reputação no mercado sofre uma depreciação. Trata-se

53
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 53 e ainda ABREU, Jorge M. Coutinho de, ob. cit. p. 382.
54
GONÇALVES, Luís Couto, ob. cit. p. 106. Não poderá p.e. se registar a marca “sedol” para tecidos de
seda, pois, tratando-se de tecidos a maioria de pessoas tenderá a associá-la a seda.
55
Cfr. p. 12 (nota 16).
56
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 73.

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assim de casos em que se põe em jogo a “ força atractiva da marca, o prestígio
comercial e, consequentemente, o seu valor económico”57. Procura-se aqui evitar que a
marca sofra uma queda no mercado atendendo o status económico e mercadológico que
ela ostenta58.

2.5. Concorrência parasitária.

2.5.1. Noção

Após a menção de algumas modalidades de concorrência desleal, vamos ocupar-nos


duma modalidade específica de concorrência desleal e que constitui objecto de estudo
deste trabalho, a concorrência parasitária.

A doutrina diverge quanto ao seu conceito, como também o tipo de acto de concorrência
desleal.

Define Carlos Olavo59, “actuações parasitárias como os actos de um empresário que


tiram ou tentam tirar partido da reputação legitimamente adquirida por terceiro ou das
realizações pessoais de outrem”.

No mesmo diapasão, Paúl Patrício60 entende que concorrência parasitária consiste em


um empresário seguir sistematicamente as pisadas dum concorrente, copiando lhe, com
simples variantes de forma, as diferentes realizações que este vai efectuando nos vários
sectores da sua actividade; é assim, uma modalidade de concorrência desleal
absolutamente nova, no sentido de que não é reconduzível a qualquer das formas de
concorrência desleal expressamente reguladas.

Portanto, na verdade, o uso de marca notória com o intuito de vender, através de outras
marcas, serviços ou productos de marcas semelhantes pode confundir ao consumidor,
prejudicando assim aos outros produtores ou serviços em causa, ficando lesado o
proprietário dos sinais distintivos ou das reputações.

O nosso legislador não faz menção da concorrência parasitária, contudo, o art.174 do


CPI, faz apenas uma enunciação exemplificativa, pertencendo esta situação, a categoria

57
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 78.
58
P.e. A empresa que se dedica ao fabrico de roupas de linho de alta-costura pode ver a sua marca
desprestigiada em virtude de esta ser adoptada para vestuário de baixa qualidade.
59
OLAVO, Carlos, Propriedade Industrial – Vol.I, 2ª edição, Almedina, 2005, p.283.
60
PAÚL, Jorge F.C.Patrício, concorrência desleal, Coimbra, 1965. p.193

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não prevista, daí que há que perfilhar a posição segundo a qual a concorrência desleal,
tem em conta o carácter não taxativo do art.174 do CPI contudo, a categoria de
concorrência parasitária no âmbito deste trabalho é vislumbrável nas alíneas c e d do
artigo acima citado.

Aliás como assegura o Prof. José de Oliveira Ascensão, “concluímos assim que sempre
se deve incluir na concorrência desleal a concorrência parasitária. Deverá porém ter
carácter global, só assim ultrapassando os limites das actividades livres”61.

Constitui exemplo de concorrência parasitária, a utilização de uma determinada marca


muito conhecida como chamariz ou um meio de promoção para venda de produtos de
marca diferente.

2.5.2.Características da concorrência parasitária

Convém identificar os elementos caracterizadores do aproveitamento parasitário:


1.1 A actuação do imitador do símbolo em segmento comercial diverso daquele
ocupado pelo seu criador. Se houver relação de concorrência entre os dois
agentes económicos, não há que se falar em aproveitamento parasitário. Nesse
caso, aplicar-se-iam as regras de repressão à concorrência desleal, ou as
próprias normas de protecção à Propriedade Intelectual, sem maiores
dificuldades62.
1.2 Fama do símbolo alheio, referida algures como sendo a “herança genética” que
ele conduz consigo. Não é possível reconhecer a existência de parasitismo de
um elemento de identificação se este não possuir ao menos relativa
popularidade. É importante esclarecer que tal fama não precisa ser geral, tal
como acontece com as marcas de alto renome ou notoriamente conhecidas, mas
relativa, podendo ser adstrita a um círculo fechado de consumidores. Este ponto
merece uma ligeira atenção: quanto mais criativo e original for o símbolo
copiado – uma expressão inusitada, criada pelo próprio titular (“Bubballo”, por
exemplo) –, mais facilmente será reconhecida a existência de aproveitamento

61
ASCENSÃO, José de Oliveira, Concorrência Desleal, Associação Académica, 1994, p.125
62
Obtido em
http://www.mcampos.br/posgraduacao/Mestrado/dissertacoes/2011/rafaelneumayraproveitamentopa
rasit%C3%A1riodoselementosdeidentificacaodaempresa.pdf, (consultado em 20 de Julho de 2012)

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parasitário. Por outro, quanto menos criativa a expressão, mais dificilmente será
acatada a tese a que aqui se reporta63.
1.3 Ocorrência de associação entre o símbolo copiado e a cópia, e, por
conseguinte, associação entre os empresários, empresas, produtos ou serviços
que os dois identificam. É importante esclarecer que a ocorrência de confusão
não é indispensável, bastando a ocorrência de mera associação no mercado64.
1.4 Por fim, o últimoelemento que faz nascer o parasitismo entre não concorrentes
é o beneficiamento – ou o seu potencial – que a associação entre os símbolos
ocasionará ao imitador. Esse, pretende pois obter algum tipo de vantagem
decorrente da vinculação da sua marca, nome empresarial ou qualquer outro
elemento de identificação ao de terceiro, dotado de fama e prestígio,
procurando agregar valor à sua própria actividade injustamente65.

2.5.3. Fundamentos da sua proibição

Embora nós não tenhamos discutido a natureza jurídica do aproveitamento parasitário,


contudo, pode se afirmar que trata – se de um tipo de conduta contrário aos princípios
da concorrência leal. Sendo assim, há necessidade de meios através dos quais esse tipo
de acto possa ser impedido.
A reputação do trabalho alheio, fruto de muito esforço; o facto de essa reputação
representar um valor económico da actividade empresarial do parasitado, constituem um
dos fundamentos da proibição do aproveitamento parasitário. A ser assim, é de se barrar
este tipo de acto na medida em que atentam directamente contra marcas notórias, sendo,
esta, por ser conhecida de uma gama variada do público e por estar associada a produtos
de alta qualidade e renome, tende a ser copiada por terceiros que pretendem se
aproveitar de/o seu bom nome, razão pela qual se justifica a sua protecção em todas as
classes indistintamente.
Segundo Paulo patrício66, “o princípio que informa a protecção às marcas de renome é a
repressão ao enriquecimento sem causa. As marcas notórias são verdadeiros magnetos,
aptos a atrair clientela pelo simples facto se sua presença, independentemente dos
produtos ou serviços a que se destinavam na origem; na mesma linhagem, o autor refere

63
ASCENSÃO, José de Oliveira, Concorrência Desleal, ob. cit, p.198
64
idem
65
Ibidem p. 199
66
PAÚL, Jorge F.C.Patrício, ob.cit. 198

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que a dificuldade está em se querer insistir na conceituação da marca que deve merecer
a protecção ampliada como sendo uma marca notoriamente conhecida, quando o que se
pretende evitar não é, principalmente, o facto da reprodução ou imitação, mas a malícia
de quem assim age e o risco para o consumidor”67.
A concorrência parasitária é manifestamente uma conduta violador do direito à leal
concorrência na medida em que acabamos de ver que é susceptível de prejudicar a
obtenção do legítimo resultado económico a que o empresário que a sofre tinha inegável
direito e poderia certamente obter se não fosse destruído com sua prática, o equilíbrio
económico assegurado com o perfeito e integral funcionamento do mecanismo da
liberdade de concorrência.
A concorrência parasitária é uma modalidade de concorrência desleal que além de
pressupor a verificação dos elementos essenciais comuns às várias figuras desta, se
define ainda pelas características próprias que indicamos. Este tipo de acto, afirma o
autor Paúl Patrício 68 que tem se verificado com maior frequência, a pratica dum
empresário lançar no mercado os seus produtos, assinalando – os com uma marca
semelhante a adoptada por outro empresário para produtos de natureza diferente,
sobretudo quando a marca reproduzida é bastante conhecida, gozando de larga
celebridade; sendo que tem como fim último aproveitar a fama e notoriedade que a
marca já possui, “como se vê pelos casos mais conhecidos que ocorreram em vários
Países: o uso da marca Lucky Strike para perfumes, que se verificou em Itália; o da
marca Kodac para bicicletas, que aconteceu em Inglaterra; o caso da marca
Watermann, para máquinas de barbear, ocorrido em França; o da marca Ford para
cigarros, passado na Noruega”69.
A ser assim, este tipo de actos ou situação confunde o consumidor na medida em que
este, num mundo contemporâneo, de comercio dominado pelos conglomerados,
portanto, por entidades cujas actividades muitas vezes não tem qualquer relação uma
com as outras, vê produtos, ainda que totalmente distintos, com a mesma marca, é
natural que as associe ao titular da marca notoriamente conhecida. Sendo assim, quando
um empresário utiliza uma marca notória em determinado bem, está manifestamente a
prejudicar os demais fornecedores desse bem, na medida em que está a usufruir
abusivamente do poder sugestivo da marca notória e da publicidade feita pelo respectivo

67
PAÚL, Jorge F.C.Patrício, ob. cit. 199
68
Idem.
69
Ibidem, p. 190

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titular; além disso, pode o titular da marca notória ser lesado, uma vez que a utilização
em causa é susceptível de significar o esvaziamento do poder sugestivo da sua marca,
isto é o esforço empreendido pelo empresário na criação e produção da marca, torna-se
desvanecido.

2.5.4.Concorrência parasitária por meio de Contrafacção e Imitação de Marcas.

A contrafacção traduz-se na cópia integral de uma marca anteriormente registada, isto é,


no uso desta sem qualquer modificação 70 . Verifica-se quando alguém adopta marca
doutrem para os seus produtos e serviços sem que para tal esteja autorizado. A
autorização poderá advir da transmissão da marca (art. 121) ou da sua cessão em licença
de uso (art. 122). Como podemos ver, a contrafacção é uma modalidade de violação do
direito à marca muito grave que gera confusão ao público, se assim podemos dizer71. Já
a imitação, traduz-se na adopção de uma marca não completamente igual, mas
confundível com outra anteriormente registada. Neste caso, o usurpador da marca faz
uma cópia acrescida de ligeiras modificações que se mostram insusceptíveis de facilitar
a distinção das marcas em causa (a original e a imitada)72.
Por força da al. b) do art. 111, os conceitos de contrafacção e imitação encontram-se
limitados ao princípio da especialidade. Quer isto dizer que, a marca só se considerará
contrafeita ou imitada se ambas (a contrafeita e a imitada) se referirem aos mesmos
produtos e serviços ou melhor a produtos e serviços que estabelecem entre si uma
relação de semelhança ou afinidade manifesta.
Para além do regime acima mencionado a que ter em conta o regime das marcas
notórias e de prestígio, sendo certo que estas comportam uma regra excepcional, na
medida em que estende o exclusivo uso de marcas e bens que não sejam nem idênticos
nem afins aos bens a que a marca é aplicada, podendo constituir, assim, um limite a
livre concorrência. Com esta previsão e aplicação pretende-se salvaguardar que certas
marcas, que tenham adquirido um determinado nível de reputação e tenham, criado, no
público, a capacidade de gerarem uma relação mental entre si e uma auréola de
excelência, não percam, por amiudades diferentes utilizações ou por utilizações

70
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 73.
71
Por esta via um terceiro usurpa a clientela e os lucros do titular da marca, e isto sem contar com
aspectos ligados a depreciação da mesma dado que o terceiro usurpador possui muitas vezes produtos
e serviços de qualidade manifestamente inferior àquela a que os consumidores estão habituados.
72
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 73

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depreciativas. A capacidade de criar aquela associação mental, ou seja, que não veja
diluída a sua capacidade identificativa e distintivas especial.
A reprodução servil ou de total identidade, assim como a reprodução aproximativa,
abrangem a contrafacção enquanto que a reprodução com adições dirige-se à imitação73.
Assim, por exemplo, a marca NIKE adoptada por um terceiro não autorizado a usá-la
constitui contrafacção. Haverá imitação quando nos depararmos com as marcas NIKE e
MIKE ambas adoptadas para artigos desportivos partilhando igualmente semelhança
figurativa ou emblemática.
A contrafacção e a imitação estão previstas no art. 111; al. d) do art. 173 e no n◦ 1 do
art. 177. Na al. e) do no 1 do art. 177, cabe por um lado, o caso de adopção de marca
doutrem para identificar produtos e serviços e, por outro lado, as situações em que o
titular da marca a utiliza para assinalar produtos e serviços que não são seus (uso
fraudulento de marca), tudo associado ao intuito de iludir o público sobre a origem dos
produtos e serviços.

A questão de fundo que se coloca é de saber qual seria a responsabilidade civil que
impende sobre os agentes praticantes dos actos da concorrência parasitária uma vez que
o Código de Propriedade Industrial nada estatui sobre a responsabilidade civil. Por isso,
torna-se oportuno analisar outras ordens jurídicas.

73
OLAVO, Carlos, ob. cit. p. 74.

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CAPITULO III

Direito Comprado

3.Soluções Adoptadas noutros Ordenamentos Jurídicos.


3.1.Portugal.

Após a entrada em vigor do Código de Propriedade Industrial de 1940, aprovado pelo


Decreto no 30.679, de 24 de Agosto de 1940, a protecção dos direitos da propriedade
industrial passou a ser mais intensa. Quanto a responsabilidade civil por ilícito
parasitário, importa destacar o art. 227 daquele diploma legal no qual se estabelece: “a
aplicação das penas cominadas não isenta os delinquentes da obrigação de reparar as
perdas e danos causados, fixando-se a respectiva indemnização nos termos gerais do
direito” 74 . Depreende-se daqui, a admissibilidade expressa da responsabilidade por
actos violadores do direito de uso exclusivo de marca registada.
Esta disposição foi retirada com a vigência do Código de Propriedade Industrial de
1995, aprovado pelo Decreto-Lei no 16/95 de 24 de Janeiro de 1995. A obrigação de
indemnização passou assim a ser sustentada pelo art. 257 do referido diploma legal,
onde se preceitua: “ A propriedade industrial tem as garantias estabelecidas por lei para
a propriedade em geral e é especialmente protegida nos termos do presente diploma e
demais leis e convenções em vigor”. Importa frisar que, o actual C.P.I. português,
aprovado pelo Decreto-Lei no 36/2003 de 5 de Março herdou esta disposição (cfr. art.
316).

3.2.Espanha:

Maiores avanços se verificam neste ordenamento jurídico. A Ley 17/2001 de 17 de


Deciembre, de Marcas, prescreve no art. 40 “El titular de una marca registrada podrá
ejercitar ante los órganos jurisdiccionales las acciones civiles o penales que
correspondan contra quienes lesionen su derecho y exigir las medidas necesarias para su
salvaguardia, todo ello sin perjuicio de la sumisión a arbitraje, si fuere posible” (grifo
nosso). O legislador espanhol foi muito mais claro e expresso, pois, no art. 41 vem fixar
em especial quais as acções cíveis que o lesado pode intentar admitindo-se, por via da
al. b) do no 1 do art. 41 “La indemnización de los daños y perjuicios sufridos”. O art. 42

74
Decreto no 30.679, de 24 de Agosto de 1940

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dirige-se aos pressupostos da indemnização e no art. 43 o legislador procurou fixar as
vias ou critérios para o cálculo da mesma75.
Verificamos, assim, que o legislador espanhol foi mais feliz ao consagrar um corpo de
normas que, de forma clara, nos dão a entender que a indemnização por ilícito de
marcas é admissível, fixando-se ainda os critérios para o apuramento líquido do
quantum a indemnizar.

3.3.Brasil:

O ordenamento jurídico brasileiro é igualmente caracterizado por avanços


significativos.
A nível legal na Lei da Propriedade Industrial (Lei no 9279 de 14 de Maio de 1996,
conhecida pela abreviatura L.P.I.) se estabelece: “Independentemente da ação criminal,
o prejudicado poderá intentar as acções cíveis que considerar cabíveis na forma do
Código de Processo Civil” (cfr. art. 207, sublinhado nosso). O art. 208 dirige-se ao
critério para a determinação da indemnização devendo-se atender os “ (...) benefícios
que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido”76. Especial destaque
merece o art. 210 (quanto aos lucros cessantes) no qual se pauta por um critério mais
favorável ao prejudicado, deixando-se a sua eleição ao arbítrio do julgador77.
No domínio doutrinário as inovações são ainda mais significativas com a
admissibilidade (embora parcial) da chamada Teoria da Presunção do Dano. Em termos
gerais, no cômputo desta tese, a obrigação de indemnização nasce ainda que não se faça
prova efectiva dos prejuízos sofridos pelo lesado. Procura-se fazer, face às dificuldades
que o lesado pode encontrar em provar os efectivos prejuízos que o facto violador do
seu direito terá originado. Na verdade, actos como a contrafacção e a imitação de
marcas sempre implicarão algum prejuízo para o lesado, exigindo-se, assim, a simples
prova do uso indevido e desautorizado da marca para que a pretensão de indemnização
seja tida como procedente78.

75
Ley 17/2001 de 17 de Deciembre
76
Cfr. art. 562 do nosso C.C.
77
Lei no 9279 de 14 de Maio de 1996
78
Veja-se em todo o caso, http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3151. Acesso, 29 Fev. 2008.
Embora de forma tímida a Ley 17/2001 de 17 de Deciembre, de Marcas, caminha neste sentido ao
prescrever no no 5 do art. 43 o seguinte: “El titular de la marca cuya violación hubiera sido declarada
judicialmente tendrá, en todo caso y sin necesidad de prueba alguna, derecho a percibir en concepto de
indemnización de daños y perjuicios (...)”. (Grifo nosso)

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CAPÍTULO IV

4.Responsabilidade Civil dos Ilícitos Parasitários no Âmbito das


Marcas em Moçambique
4.1.Noção e modalidades da responsabilidade civil

Dentre as fontes das obrigações encontramos o vasto instituto da responsabilidade civil


o qual se encontra regulado no Código Civil. Esta traduz-se na obrigação de reparar
danos sofridos por alguém, na qual o lesante é o devedor e o lesado credor79. Trata-se de
situações em que uma vez verificadas certas circunstâncias a lei faz surgir para uma das
partes uma obrigação, qual seja, a de reparar danos.
A doutrina maioritária divide a responsabilidade civil em dois grandes grupos, quais
sejam, o da responsabilidade contratual (obrigacional), e o da responsabilidade
extracontratual ou extra obrigacional 80 . Na primeira categoria a obrigação de
indemnização surge por via da violação ou da falta de cumprimento de uma obrigação,
dada a preexistência de uma relação obrigacional entre o devedor e o credor. No
segundo caso, a obrigação de reparação não assenta na violação de um direito de crédito
mas advém de outros factos, isto é, “ da violação de direitos absolutos ou da prática de
certos actos que, embora lícitos, causam prejuízo a outrem”81.
Por sua vez a responsabilidade extracontratual agrupa três ramificações, a
responsabilidade por factos ilícitos, por factos lícitos e pelo risco. O Código Civil
regula a responsabilidade contratual nos arts. 798 e seguintes.
A responsabilidade extracontratual por factos ilícitos (também conhecida por
responsabilidade delitual) está prevista nos arts. 483 e seguintes, e os arts. 499 e
seguintes reconduzem-se a responsabilidade pelo risco82.

79
COSTA, Mário J. de Almeida, Direito das Obrigações, 4a Ed., Coimbra Editora, 1984, p. 343. No mesmo
caminho, TELLES, Inocêncio Galvão, Direito das Obrigações, 6a Ed., Coimbra Editora, 1989, p. 194.
80
Existe uma discussão doutrinária, preferindo alguns autores a designação responsabilidade
obrigacional e extra obrigacional, e outros, responsabilidade contratual e extracontratual. Seja como for,
trata-se de uma discussão de ordem terminológica. Adoptaremos a designação responsabilidade
contratual e extracontratual uma vez que embora o contrato não seja a única fonte das obrigações é
inquestionavelmente que é a principal fonte dos direitos de crédito. De qualquer modo, esta orientação
não é imune a críticas. Com maiores desenvolvimentos, COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 352 e
353; VARELA, João de M. Antunes, Das Obrigações em Geral, I, 6a Ed., Almedina, Coimbra, 1989, p. 490
e 491, TELLES, Inocêncio Galvão, ob. cit. p. 198-200.
81
VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 490. Veja-se ainda, COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit., p. 352.
82
A responsabilidade extracontratual por intervenções lícitas não mereceu regulamentação específica.

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4.2. Responsabilidade Civil Extracontratual por Factos Ilícitos.

O objecto do nosso trabalho pressupõe a conjugação de duas áreas, por um lado, a


responsabilidade por factos ilícitos, e por outro, o direito de marcas.
Dada a complexidade do instituto da responsabilidade civil urge justificar o carácter
inadequado das outras vias de responsabilização quando estamos em face de
contrafacção e imitação de marcas, ou seja, a única via que o lesado por estes actos pode
usar para ressarcir-se dos danos ocorridos é a da responsabilidade por factos ilícitos (art.
483 C.C.). Chegamos a esta conclusão por exclusão de partes, se não vejamos.
A responsabilidade por factos ilícitos traduz-se no nascimento da obrigação de
indemnizar por via de uma conduta ilícita do agente. Ora, da análise da al. e) do art. 173
e do art. 177, facilmente se pode concluir que a contrafacção e a imitação não são actos
lícitos, mas sim ilícitos. Sem querer adiantar muitas considerações que serão feitas em
lugar adequado, a ilicitude traduz-se na prática de actos que se afigurem em manifesta
oposição à ordem jurídica83.
A responsabilidade pelo risco assenta na “Teoria do Risco” ao abrigo da qual todos os
que utilizam em seu proveito coisas perigosas, “quem cria ou mantém um risco em
proveito próprio, deve suportar as consequências prejudiciais do seu emprego, já que
deles colhe o principal benefício (ubi emolumentum, ibi onus; ubi commodum ibi
incommodum)”84.
Nestes casos, aquele que aufere vantagens com o desenvolvimento de actividades
perigosas paga o preço de suportar o regime da responsabilidade pelo risco85. Assim,
podemos verificar que dada a natureza dos actos subjacentes à contrafacção e imitação
de marcas, a responsabilidade pelo risco mostra-se inútil. Na verdade alguma doutrina
embora de forma tímida aponta para este caminho86.

83ALARCÃO, Rui de, et al., Direito das Obrigações (Policopiado), s. ed., Coimbra, 1983, p. 241. Sem
grades contrariedades, NORONHA, Edgard Magalhães, Direito Penal, I, 34a Ed., Saraiva Editora, São
Paulo, 1999, p. 100 e 101.
84
VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 603. Veja-se ainda, com maior profundidade LEITÃO, Luís M. T.
de Menezes, Direito das Obrigações, I, 2a Ed., Almedina — Coimbra, 2003, p. 49 e 50.
85
A contrário do que se passa com a responsabilidade por factos ilícitos, na qual a ilicitude e a culpa são
requisitos do seu funcionamento (no 1 do art.483 C.C.), na responsabilidade pelo risco o dever de
indemnizar resulta de uma conduta lícita mas perigosa do responsável funcionando assim,
independente da ilicitude e da culpa. Em todo o caso veja-se, COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 403.
86
CORREIA, A. Ferrer, Lições de Direito Comercial, LEX, Lisboa, 1994, p. 201; VARELA, João de M.
Antunes, ob. cit. p. 503; ALARCÃO, Rui de, et al., ob. cit., p. 242. Estes dois últimos em considerações
sobre a ilicitude como pressuposto da responsabilidade por factos ilícitos.

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4.3. Pressupostos da Responsabilidade Civil dos ilícitos parasitários por meio de
Marcas.

Para que se possa responsabilizar alguém, a lei exige que se verifiquem algumas
condições. É necessário que haja a prática de um facto, qualificável como ilícito, e que
seja imputado ao lesante, facto esse que origina um dano o qual encontra-se ligado a
aquele por um nexo causal. Discriminando, são pressupostos da responsabilidade civil o
facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo causal87.
Importa ter em linha de atenção que nem todos os autores adoptam a mesma
sistematização quanto à abordagem desta matéria. Assim, quanto aos requisitos, uns
falam em dano e imputação e outros falam de acto ilícito e prejuízo reparável88. De
qualquer modo, tudo depende da perspectiva de análise de um mesmo fenómeno, razão
pela qual no fundo, quer num caso, quer noutro, acaba-se percorrendo os aspectos
essenciais da responsabilidade por factos ilícitos89.

4.3.1 O Facto.

Como primeiro pressuposto encontramos o facto que se traduz num acto humano.
Quando falamos em acto humano, pretende-se fazer referência a todos os
comportamentos domináveis ou controláveis pela vontade90. Só estes importam, ficando
de fora os danos causados por força maior ou pela actuação irresistível de circunstâncias
fortuitas91. Há assim, uma limitação dos danos ressarcíveis sendo apenas indemnizáveis
os danos causados por uma conduta livre do agente.
O facto voluntário do agente pode revestir a forma de acção ou de omissão. A acção
traduzir-se-á na existência de um facto positivo (p.e. danificação de um bem alheio,
ofensa ao nome de alguém). Já a omissão, existirá nos casos em que a obrigação de
indemnização se justifica pelo facto de o agente não emitir um comportamento que de
contrário seguramente teria obstado a verificação do dano (arts. 486 e 563 C.C.)92.

87
COSTA, Mário J, direito das obrigações de Almeida, 9ᵃ ed, 2001 509-510.
88
Veja-se para o primeiro caso, CORDEIRO, António Menezes, Direito das Obrigações, II, 1a Ed., AAFDL,
Lisboa, 1988, p. 281. Para o segundo, JORGE, Fernando Pessoa, Direito das Obrigações, I, AAFDL, Lisboa,
1975/76, p. 494 e 495.
89
A maioria dos autores adopta a primeira forma de abordagem, que no fundo possui até apoio legal
(no 1do art. 483 C.C.). A título demonstrativo veja-se, COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 364;
ALARCÃO, Rui de, et al., ob. cit. p. 238; VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 495.
90
VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 499.
91
Idem. O autor avança o caso de alguém que é irresistivelmente empurrado pelo vento, partindo o
vidro da vetrine de um local.
92
COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 511.

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A lei tratou especificamente das omissões no art. 486 C.C., condicionando-a à
existência de um dever de agir oriundo da lei ou do negócio jurídico. Assim, se não
havia para o lesante um dever de agir, de emitir a conduta que obstaria o dano, não
haverá obrigação de indemnizar por mais danosa que seja a atitude omissiva e mesmo
que a conduta seja imposta pela moral ou pelos usos ou convenções sociais93.
A contrafacção e a imitação de marcas constituirão condutas positivas abrangendo-se
aqui todas as operações tendentes a contrafazer ou imitar marca registada.

4.3.2. Ilicitude.

Traduz-se na oposição a ordem jurídica, ou por outras palavras, a ilicitude “exprime


uma relação de oposição entre o facto e o direito 94 . Neste contexto, para efeitos de
responsabilidade civil torna-se necessário que a conduta do lesante se encontre em
manifesta contrariedade ao direito.
De acordo com o art.483 C.C. a ilicitude reveste duas formas. Por um lado, traduz-se na
violação de um direito que a lei atribui a um conjunto de pessoas, e por outro, na
violação de normas que protegem interesses alheios. No primeiro caso, contemplam-se
situações em que a lei protege directamente determinados interesses mediante a
concessão de verdadeiros direitos subjectivos, integrando-se nesta categoria os casos de
violação de direitos de personalidade (direito ao nome), direitos reais e os direitos de
propriedade industrial95.
Maiores dificuldades existem em relação a segunda forma de ilicitude. São casos em
que nos deparamos com “a ofensa de deveres impostos por lei que vise a defesa de
interesses particulares, mas sem que confira correspectivamente quaisquer direitos
subjectivos” 96 . Tudo se passará como se a lei procedesse a uma tutela indirecta de
determinados interesses, sem contudo conferir aos respectivos titulares verdadeiros
direitos subjectivos.
Para a verificação desta segunda forma de ilicitude é imprescindível: i) que a lesão dos
interesses do particular corresponda de uma norma legal; ii) que a tutela dos interesses

93
LIMA, Fernando Pires e VARELA, João de M. Antunes, Código Civil Anotado, I, Coimbra Editora,
Coimbra, 1967, p. 332 e 333.
94
NORONHA, Edgard Magalhães, ob. cit. p. 100.
95
COSTA, Mário J. de Almeida, 9ᵃ ed, ob. cit. p. 514

96
COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 369.

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particulares figure entre os fins da norma violada; iii) que o dano se verifique no círculo
de interesses privados que a lei visa tutelar97.
Para além das inúmeras situações que cabem na previsão geral do n◦ 1 do art. 483 C.C.
importa destacar a existência de casos de ilicitude especialmente regulados. São eles o
abuso de direito (art. 334 C.C.), a não cedência recíproca (art. 335 C.C.), a ofensa ao
crédito e bom nome (art. 484C.C.) e o caso de conselhos, recomendações ou
informações (art. 485 C.C.).
Especial cuidado merecem as chamadas causas de exclusão da ilicitude ou se
preferirmos, causas justificativas do facto. São situações em que, por via da verificação
de determinadas circunstâncias que rodeiam a prática do facto danoso deixa este de ser
ilícito98.
A contrafacção e a imitação de marcas implicarão sempre a violação do direito de
outrem, o direito de uso exclusivo (no 1 do art. 124), preenchendo-se assim a primeira
forma de ilicitude atrás referida.

4.3.3. Culpa.

Procura-se aqui estabelecer uma relação entre o facto e o agente, em termos de aquele
puder ser atribuído a este. Ou seja, culpa em sentido geral traduz-se na possibilidade de
imputação do facto ao lesante 99 . Tal imputação implica a verificação de algumas
condições, é necessário que o lesante seja capaz de ser objecto de censura por ter agido
como agiu (imputabilidade).
Num plano mais preciso, culpa é a imputação de um acto ilícito ao seu autor, traduzida
no juízo segundo o qual este devia ter-se abstido desse acto100. A imputabilidade dirá
respeito ao conjunto de condições que devem existir para que haja a imputação, a tal
atribuição do facto ao agente. Torna-se assim necessário “que o agente tenha a
capacidade natural para discernir e apreciar o carácter ilícito do seu acto (elemento
intelectual) e a faculdade de dirigir o seu comportamento de um modo conforme à
apreciação feita (elemento volitivo)”101. 27

97
VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 509-510.
98
Dado o objecto do nosso trabalho é desnecessário abordar em especial estas questões daí que nos
limitamos a remeter o leitor para as obras que com algum rigor tratam desta matéria. Veja-se em
especial COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 372 e ss; VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 520 e
ss; CORDEIRO, António Menezes, ob. cit. pp. 355 e ss.
99
COSTA, Mário J. de, ob. cit. p. 381.
100
TELLES, Inocêncio Galvão, ob. cit. p. 341.
101
ALARCÃO, Rui de, et. al, ob. cit. p. 249.

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É a isto que se refere a lei no n◦ 1 do art. 488 C.C. presumindo-se a falta de
imputabilidade nos menores de sete anos e nos interditos por anomalia psíquica (no 2 do
preceito em análise)102.
A culpa em sentido amplo comporta duas modalidades: o dolo e a negligência também
conhecida por mera culpa ou culpa em sentido restrito. No primeiro caso, o lesante
representa um determinado resultado ilícito, e dirige a sua conduta nesse sentido. Na
segunda situação a responsabilidade advém da imprudência, imperícia ou falta de
cuidado do agente103.
Estas duas modalidades de culpa apresentam ramificações. Assim, o dolo pode ser
directo, necessário e eventual e a negligência pode ser consciente e inconsciente. No
dolo directo, o lesante prefigurando um certo resultado age no sentido de alcançá-lo a
todo o custo. No dolo necessário o agente não quer directamente o resultado mas prevê
a sua verificação necessária dado que pretende um outro objectivo, ou seja, de outro
modo dizendo, por via do objectivo que pretende alcançar o lesante tem consciência da
verificação necessária de determinado resultado104.
Maiores dificuldades de abordagem se apresentam em relação ao dolo eventual dado
que a doutrina105 considera ser uma modalidade de culpa muito próxima da negligência
consciente. Numa tentativa de esclarecimento diremos que, enquanto que no dolo
eventual o agente representando um determinado resultado como provável e não
estando certo da que este não se verificará — e nem por isso se deixa abalar, aceitando-
o — na negligência consciente o agente confia, não devendo confiar, na não verificação
desse resultado. A sua actuação é motivada por uma falsa confiabilidade na não
verificação do resultado ilícito106.
A negligência inconsciente assenta no facto de o agente sequer chegar a prever a
possibilidade de verificação de um determinado resultado (devendo em todo o caso
prevê-lo).107

102
Estamos perante uma presunção tantum iuris admitindo-se prova em sentido contrário (no 2 do art.
350 C.C.)
103
ALARCÃO, Rui de, et. al, ob. cit. p. 251.
104
idem
105
COSTA, Mário J. de, ob. cit. p. 382
106
Será o caso de um mestre-de-obras encarregado de edificar um murro, que ao proceder a sua
construção faz recurso a um material barato e inapropriado para tal tarefa. Nesta situação se o mestre
na edificação do murro prevê a possibilidade da sua queda haverá dolo eventual. Já se confia na não
queda do murro haverá negligência consciente: COSTA, Mário J. de, ob. cit. p. 382
107
idem

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A distinção entre o dolo e a negligência tem algum interesse prático dado que nos casos
em que o agente tenha procedido com mera culpa, a obrigação de indemnização pode
ser fixada em montante inferior ao correspondente aos danos causados. Assim, tal como
prevê o art. 494 C.C., o julgador pode de forma equitativa atenuar a responsabilidade
quando o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e
demais circunstâncias do caso o justifique. Seja como for, este preceito não deverá ser
aplicado aos casos de dolo já que nestes, “ sendo mais forte o laço que prende o facto à
vontade do agente, o montante da indemnização terá de corresponder sempre ao valor
dos danos não podendo o juiz arbitrar indemnização inferior”108.
À culpa refere-se o art. 487 C.C.,sendo que no no 1 o legislador quis respeitar alguns
princípios relativos à prova e às presunções. Nestes termos, se aquele que invoca um
direito deve fazer prova dos factos constitutivos do mesmo (no 1 do art. 342 C.C.), em
princípio o lesado alegando direito à indemnização deverá provar a culpa do lesante.
Todavia, a lei afasta esta regra nos casos de presunção legal de culpa art. (no 1 do
art.487 C.C. in fine), isto é, já não será ao lesado que caberá fazer prova de culpa, pois,
tem a seu favor uma presunção legal, que pode ser ilidida (art. 349; n◦ 1 e 2 do art. 350;
art. 491; no 1 do art. 492 e nos 1e 2 do art. 493, todos do C.C.)109.
No no 2 do art. 487 C.C. o legislador procurou estabelecer o critério que o julgador deve
usar para aferir o grau de diligência do agente, isto é, para concluir se no caso em
concreto o agente agiu com culpa ou não. Consagra-se o critério de apreciação da culpa
em abstracto, segundo o qual, para determinar a culpa do agente devemos ter em
atenção a conduta que um homem médio colocado nas mesmas circunstâncias teria
adoptado. A expressão bom pai de família (empregada pelo legislador naquele preceito)
remete para o homem padrão dotado de uma diligência normal ou razoável110.
Em relação ao objecto do nosso trabalho a culpa irá traduzir-se no dolo, pois,
dificilmente se poderá falar em contrafacção ou imitação negligente de uma marca.

108
VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. p. 537.
109
Em todo caso veja-se COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 584-587; VARELA, João de M. Antunes,
ob. cit. p. 560-567.
110
Ao lado da apreciação da culpa em abstracto, existe a apreciação em concreto, nos termos da qual se
deve tomar em consideração a diligência habitual, normal do lesante. Com maior detalhe veja-se
ALARCÃO, Rui de, et. al, ob. cit., p. 254.

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4.3.4. Dano
A responsabilidade por factos ilícitos só opera quando o facto ilícito e culposo do
agente tenha originado um dano ou prejuízo111. Só assim se justifica que o lesante esteja
obrigado a reconstituir a situação que existiria se não fosse o evento danoso (art. 562
C.C.). Daqui devemos extrair o postulado segundo o qual, sem dano não há
responsabilidade, ainda que a conduta do lesante seja extremamente ilícita e culposa.
Isto justifica-se também na própria natureza do instituto da responsabilidade delitual
que possui uma finalidade essencialmente reparatória, já que visa no fundo tornar o
lesado indemne, livre dos prejuízos que a conduta do lesante terá ocasionado112.
Em termos conceptuais podemos dizer que, dano será toda a ofensa de bens ou de
interesses alheios protegidos pela ordem jurídica113.
Sob ponto de vista de classificação, fala-se em:
i) Danos emergentes e lucros cessantes — sendo que os primeiros traduzem-se numa
diminuição que se opera no património do lesado, e os segundos, abrangem os aumentos
patrimoniais que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (no 1 do art. 564
C.C).114
ii) Dano real e dano de cálculo — o dano real traduz-se no prejuízo efectivamente
sofrido pelo lesado, isto é, encara-se o dano na sua real configuração (p.e. as dores
sofridas, as amolgaduras provocadas numa viatura). Já o dano de cálculo abrange as
implicações pecuniárias daquele prejuízo. Neste caso, procura-se aferir as
consequências em dinheiro do dano sofrido em sentido naturalístico (p.e. as despesas
suportadas para tratamento das lesões corporais sofridas, as quantias despendidas para a
reparação da viatura)115.
iii) Danos directos e danos indirectos — os primeiros abrangem os prejuízos que são
consequência directa do facto ilícito, e os segundos traduzem-se nos danos reflexamente

111
COSTA, Mário J. de, 9ᵃ ed, ob. cit. p. 542
112
Defende-se igualmente que a responsabilidade civil prossegue uma finalidade sancionatória
evidenciada por alguns aspectos do seu regime (art. 494; no 2 do art. 497 e art. 570, todos do C.C.).
113
COSTA, Mário J. De Almeida, ob. cit. p. 389; ALARCÃO Rui de, et. al, ob. cit. p. 270.
114
COSTA, Mário J. de, 9ᵃ ed, ob. cit. p. 546
115
Uma questão que merece atenção tem que ver com os critérios da avaliação do dano. Assim, se por
um lado, segundo o critério da avaliação concreta do dano, considera-se que na determinação do
montante da indemnização se deve atender o valor que aquele bem tinha para o lesado (p.e. uma peça
de arte de família transmitida de geração em geração), por outro prisma, se consagra o critério da
avaliação abstracta, no qual se deverá considerar apenas o montante objectivo daquele bem
independentemente do valor que tinha para o lesado (p.e. preço de um carro no mercado). A avaliação
em concreto tem sido repudiada por muitos: COSTA, Mário J. de, 9ᵃ ed, ob. cit. p. 545

Universidade São Tomás de Moçambique - Milton Bande Página 33


produzidos pelo evento danoso (p.e. no caso de ofensas corporais, as dores
dosferimentos são danos directos enquanto que a perda do emprego, por hipótese, será
um dano indirecto)116

iv) Danos patrimoniais e não patrimoniais — os primeiros são susceptíveis de avaliação


em dinheiro, são qualificáveis em dinheiro, e os segundos não comportam esta
característica. A ressarcibilidade dos danos não patrimoniais é admitida em termos
expressos (art. 496 C.C.). Sem querermos aprofundar mais, neste caso a obrigação de
indemnizar não terá em vista “ ressarcir, tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma
compensação que contrabalance o mal sofrido (a dor, o desgosto, os vexames 117 .
Qualquer acto que implique a violação do direito de uso exclusivo pode implicar uma
variada ordem de danos. Quem imita marca doutrem e comercializa os seus produtos
(adoptando este sinal distintivo) usurpa a clientela e os lucros do legítimo titular da
marca.

116
COSTA, Mário J. de, 9ᵃ ed, ob. cit. p.547
117
ALARCÃO, Rui de, et. al, ob. cit., p.271. Uma vez que neste domínio levantam-se acesos debates, veja-
se VARELA.

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4.3.5. Nexo causal
Para que a pretensão de responsabilizar alguém prossiga, exige a lei para além da
existência de um facto, ilícito e culposo originador de um dano, uma ligação ou nexo
entre este (dano) e o facto. Assim prescreve o no 1 do art. 483 C.C. Resulta daí que nem
todos os danos ocorridos após o facto, são susceptíveis de viabilizar uma pretensão
indemnizatória, mas tão só aqueles que se consideram originados pela conduta do
agente. Assim, é correcto afirmar-se que o nexo causal desempenha uma dupla função, a
de pressuposto da responsabilidade civil e a de medida da obrigação de indemnizar118.
Com isto quer-se dizer que merecerão acolhimento para efeitos de determinação do
quantum da indemnização apenas determinados danos, quais sejam, aqueles que estejam
ligados ao facto em termos de causalidade. Existem várias construções doutrinárias
sobre este assunto, procurando todas elas estabelecer um critério seguro que nos permita
chegar a conclusão de que um determinado facto ocasionou um dano. Dentre as várias
soluções propostas a mais aplaudida é a chamada teoria da causalidade adequada que
até mereceu consagração legal (art. 563 C.C.). Para os defensores desta, um facto é
causa de um dano quando atendendo as circunstâncias do caso, e ponderadas as regras
gerais da vida, o curso normal das coisas, se mostrava adequado a origina-lo. O
legislador consagrou esta teoria num juízo de probabilidade (art. 563 C.C.)119

118
COSTA, Mário J. de Almeida, ob. cit. p. 397.
119
COSTA, Mário J. de, 9ᵃ ed, ob. cit. p.554

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4.4 Responsabilidade civil dos ilícitos parasitários por meio de marcas
a luz do código de propriedade industrial
Importa agora atender algumas disposições do C.P.I. e do C.C., cuja correcta
interpretação pode ajudar-nos a concluir que a responsabilidade extracontratual é
aplicável ao direito de marcas. São elas o n◦ 5 do art. 124; e os arts. 184 e 1303 C.C.
Por força do n◦ 5 do art. 124 permite-se que o lesado possa deduzir uma petição dirigida
ao tribunal competente quando se esteja em face de actos de contrafacção e imitação de
marcas abarcando-se igualmente os actos preparatórios. De qualquer modo, a pretensão
deduzida deve ter apoio legal, configurando-se assim a importância dos arts. 184 e 1303
C.C.. Quanto ao art. 184 importa destacar a primeira parte, nos temos da qual os
princípios gerais do direito da propriedade serão aplicáveis aos direitos da propriedade
industrial.
O direito da propriedade encontra-se regulado nos arts. 1303 e seguintes C.C.. Por via
do no 1 do art. 1303 C.C. remete-se os direitos de autor e da propriedade industrial para
um regime especifico. Porém no n◦ 2 do preceito em análise, abre-se a possibilidade de
aplicar-se (ainda que subsidiariamente) aos direitos de autor e da propriedade industrial
as disposições do Código Civil exceptuando-se apenas dois grupos de casos: i) a
hipótese de as disposições do Código Civil não se harmonizarem com a natureza dos
referidos direitos; ii) o caso de estas mesmas disposições contrariarem o regime
estabelecido especialmente para aqueles dois institutos (no 2 do art. 1303 in fine).
Sobre este assunto escreve alguma doutrina “a lei considera-o como um direito de
propriedade, mas um direito de propriedade que foge, no tocante ao seu objecto, aos
princípios gerais que dominam este direito (cfr. art. 1302.o), e que, por esta razão, ao
lado de outras, foi afastado do regime da propriedade contido no Código Civil, o qual
lhe é apenas aplicável subsidiariamente”120.
Por outras palavras, o regime do direito da propriedade é extensivo aos direitos da
propriedade industrial sempre se mostre necessário e desde que a natureza destes
direitos o admita.
A responsabilidade civil por factos ilícitos encontra-se regulada no Código Civil, e para
além de ser perfeitamente aplicável ao direito da propriedade não vislumbramos aquelas
duas limitações pelo que entendemos que é de todo aplicável aos casos de contrafacção

120
LIMA, Fernando A. Pires de; VARELA, João de M. Antunes, ob. cit. (III), p. 76.

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e imitação de marcas. De qualquer modo, é preciso ter em linha de consideração alguns
aspectos especiais relativos aos pressupostos já acima referidos.

Universidade São Tomás de Moçambique - Milton Bande Página 37


5.CONCLUSÕES E RECOMENDACÕES
5.1 Conclusão

A concorrência parasitária no âmbito das marcas como instituto da propriedade


industrial goza de uma importância reconhecida, dado que, as marcas são sinais
distintivos que se referem directamente aos produtos e serviços, elementos importantes
do progresso económico das nações.
Através do registo de marcas, a lei confere ao seu titular uma série de direitos, sendo de
destacar o direito de uso exclusivo. Porém, ao lado desta protecção legal, certos actos
podem implicar lesão de direitos ou interesses protegidos. A concorrência parasitária de
marcas são exemplos evidentes, e implicam não só a lesão de direitos do proprietário da
marca registada em termos de este deixar de perceber os ganhos que normalmente
perceberia, mas também fazem incorrer os consumidores em erro, já que estes
adquirirão um bem que ostenta certa marca, por força de uma vontade viciada, dada a
confundibilidade dos sinais distintivos.
O nosso C.P.I. reage a estas situações em termos não inteiramente satisfatórios, já que,
ao lado do regime sancionatório aí previsto, poderão persistir danos na esfera jurídica do
lesado que não podem ficar sem tutela. Tal tutela, só é possível por via do regime geral,
responsabilidade civil, em concreto a responsabilidade delitual, pois, ponderadas outras
vias de responsabilização, afiguram-se inadequadas.
Assim, sendo certo que os danos sempre existirão nos casos de concorrência parasitária
de contrafacção e imitação de marcas, só por aquela via é que o lesado pode obter uma
reparação integral e efectiva do seu direito. Por razões que desconhecemos o C.P.I. não
contêm uma disposição expressa no sentido de responsabilizar os agentes praticantes da
concorrência parasitária no âmbito das marcas e no geral. Defendemos e chegamos a
estas conclusões por via de ponderação e interpretação de algumas disposições do
direito.
Cremos que esta orientação é extensiva aos demais direitos da propriedade industrial,
mas acuidade especial deve ser conferida aos requisitos da responsabilidade civil,
devendo estes ser adequados á natureza e às especialidades de cada um dos direitos da
propriedade industrial.

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5.2Recomendações
Tendo em conta as considerações feitas durante o trabalho cumpre-nos recomendar o
seguinte:
 Que se crie um instituto especifico que trate da concorrência parasitaria no
código de propriedade industrial, dado o crescimento de situações de
concorrência parasitaria.
 Urge adoptar ao nível da legislação sectorial (C.P.I.) uma norma (ainda que de
carácter genérico) que fixe em especial a adopção do instituto da
responsabilidade civil para as situações já analisadas, podendo aquela estender-
se aos demais direitos da propriedade industrial.
 É oportuno consagrar um regime de responsabilidade mais flexível e adaptado a
realidade em debate. Em concreto, o caminho a seguir vai numa perspectiva de
isentar o lesado da prova de alguns aspectos (referimo-nos aos pressupostos da
responsabilidade já atrás analisados) que, por via do regime geral tenham que se
demonstrar bastando a simples prova do facto (contrafacção ou imitação de
marca) para que seja considerada procedente a pretensão do lesado.
Não queremos com isto dizer que o regime geral mostra-se de todo inadequado, o que
não corresponde a verdade uma vez que esse regime resolve em certa medida alguns dos
problemas já levantados.
Por fim, cremos que cabe ao legislador fixar em termos de redacção a norma que tenha
o conteúdo que inclua os aspectos já avançados razão pela qual, nos limitamos a traçar
linhas gerais de orientação.

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6.BIBLIOGRAFIA
 Doutrina
 ABREU, Jorge Manuel Coutinho de, Curso de Direito Comercial, I, 5a Ed.,
Almedina, Coimbra, 2004;
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Lisboa, 1988;
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Lisboa, 1980;
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1984;
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Paulo, 1999;
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 VARELA, João de Matos Antunes, Das Obrigações em Geral, I, 6a Ed.,
Almedina Coimbra, 1989;
 WIPO, Curso Geral de Propriedade Industrial (Secção Especial para
Moçambique), 2007.

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 Legislação
 Código Civil;
 Decreto nr. 4/2006 de 12 de Abril, aprova o Código da Propriedade Industrial,
publicado no B.R., I Série, No 15;
 Ley 17/2001 de 17 de Deciembre, de Marcas (Lei de Marcas da Espanha);
 Lei nr. 9.279 de 14 de Maio de 1996 (Lei da Propriedade Industrial do Brasil);
 Decreto nr. 30.679 de 24 de Agosto de 1940, aprova o Código da Propriedade
Industrial Português de 1940;
 Decreto-Lei nr. 16/95 de 24 de Janeiro de 1995, aprova o Código da Propriedade
Industrial Português de 1995;
 Decreto-Lei nr. 36/2003 de 5 de Marco, aprova o Código da Propriedade
Industrial Português de 2003;
 Lei nr. 10/2013 de 11 de Dezembro, regula a concorrência no exercício das
actividades económicas.

 Internet
 http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3151
 Http://ld2.ldsoft.com.br/portal webseek/detalhe assuntos.asp

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