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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 2 - março/abril de 2011 147

Revisão

Relação entre a coluna torácica e a função


do ombro: relação estática ou dinâmica?
Relationship between the thoracic spine and shoulder function:
static or dynamic relationship?
Alan de Souza Araújo*, Leandro Alberto Calazans Nogueira, M.Sc.**

*Especialista em Biomecânica (EEFD/UFRJ), Especialista em Anatomia e Biomecânica (UCB), Fisioterapeuta da Clínica Fisioi-
guaçu, Universidade Estácio de Sá (UNESA), **Especialista em Biomecânica (UNESA), Fisioterapeuta do Hospital Universitário
Gafrée e Guinle (UNIRIO)

Resumo Abstract
O ombro pode influenciar o movimento da coluna torácica e The shoulder may influence the thoracic spine movement and
vice-versa, mas há pouca evidência sobre essa relação. Movimentos vice versa, but there is little evidence about this relationship. Shoul-
do ombro associados à coluna cervical e lombar estão bem descritos der movements associated with cervical and lumbar are well descri-
na literatura. No entanto, há um menor número de dados dispo- bed in the literature. However, there is a lack of information about
níveis sobre a influência da coluna torácica e de outras estruturas the influence of thoracic spine and other structures on the shoulder
sobre os movimentos do ombro. O objetivo do estudo foi descrever movements. The aim of this study was to describe the relationship
a relação entre a coluna torácica e a função do ombro. Foi realizada between the thoracic spine and shoulder function. It was realized a
uma revisão de literatura nas bases de dados eletrônicos Bireme, literature review in the Bireme, Pubmed, Lilacs and Science Direct
Pubmed, Lilacs e Science Direct. Os descritores utilizados foram: database with the key-words: thoracic spine, shoulder function
coluna torácica, função do ombro e movimentos torácicos, com and thoracic movements, and their proper translations into Por-
suas devidas traduções para língua inglesa. A pesquisa abrangeu tuguese. The search covered a range of 17 years (1994-2011) and
um intervalo de 17 anos (1994-2011) e retornou 566 trabalhos. returned 566 papers.  After  applying the inclusion and exclusion
Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, e da análise criteria, and analysis of duplicated, remained 26 papers. It is believed
de duplicidade de citações, restaram 26 fontes. Acredita-se que as that postural deformities and muscle shortening can contribute to
alterações posturais e encurtamentos musculares contribuem para shoulder dysfunction, but these findings are not evident in experi-
disfunções do ombro, porém esses achados não são evidentes em mental or well instrumented studies. There is a strong correlation
estudos experimentais ou bem instrumentados. Existe uma forte cor- between functional and dynamic movements of the thoracic spi-
relação funcional e dinâmica entre movimentos da coluna torácica ne and movement patterns of the humerus and scapula. The physical
e os padrões de movimento do úmero e da escápula. A abordagem therapy approach may address the thoracic spine in patients with
fisioterapêutica deve contemplar a coluna torácica em indivíduos shoulder pain.
com dores no ombro. Key-words: thoracic wall, shoulder joint, biomechanics, disability.
Palavras-chave: parede torácica, articulação do ombro,
biomecânica, incapacidade.

Recebido 2 de julho de 2010; aceito em 25 de fevereiro de 2011.


Endereço para correspondência: Alan de Souza Araújo, Rua Brício Filho, 47 FDS, Guadalupe 21660-290 Rio de Janeiro RJ, Tel: (21) 8891-9751,
E-mail: alanfisio@ig.com.br
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Introdução requer tanto mobilidade quanto estabilidade [14]. A relação


entre a coluna torácica com a função do ombro e a cintura
O complexo do ombro é uma das regiões mais frequentes escapular tem sido atribuída à existência de inúmeras conexões
de busca de auxílio médico e fisioterapêutico. A articulação musculares. Entretanto, a posição destes vários segmentos ós-
glenoumeral sofre diretamente com a necessidade de estabi- seos podem influenciar diretamente a função do ombro, além
lização e de realização de movimentos de grande amplitude de influenciar no comprimento muscular, comprometendo
simultaneamente, sendo muitas vezes, a sua alteração biome- sua capacidade de gerar tensão [6].O objetivo do estudo foi
cânica a causa do impacto subacromial [1,2]. descrever a relação entre a coluna torácica e a função do om-
A relação entre os movimentos da articulação glenoumeral bro, além de analisar os mecanismos envolvidos nesta relação.
e da articulação escapulotorácica durante a abdução do ombro
variam, mas geralmente podem ser consideradas como 2:1. Se Material e métodos
a posição escapular for modificada, parece razoável esperar que
este padrão normal de movimento integrado seja afetado [3]. O presente estudo trata-se de uma revisão de literatura, nas
O ombro pode influenciar o movimento da coluna torácica, bases de dados eletrônicos Bireme, Pubmed, Lilacs, Science
mas há pouca evidência sobre este fenômeno [2]. Desvios Direct. Os descritores utilizados foram: coluna torácica,
posturais, como cabeça anteriorizada, ombros anteriorizados função do ombro e movimentos torácicos, com suas devidas
(protração escapular), rotação interna do úmero, e aumento traduções para língua inglesa thoracic spine, shoulder function e
da cifose torácica, podem implicar em problemas no ombro thoracic movement. Os descritores foram utilizados com diver-
[2]. Outro fator importante é que, durante a abdução do sas combinações e de forma aleatória. A pesquisa abrangeu um
ombro há um conhecido padrão de movimento integrando intervalo de tempo de dezessete anos (1994-2011). Somando-
a articulação glenoumeral e a articulação escapulotorácica, se todas as bases de dados, foram encontrados 566 artigos.
esse mecanismo é chamado de ritmo escapuloumeral [3-5]. Após a leitura dos títulos dos artigos, notou-se que alguns deles
Durante a abdução do ombro, a escápula deve fornecer se repetiram nas diferentes bases e outros não preenchiam os
uma base estável para o movimento glenoumeral e ainda ser critérios do presente estudo. Foram adotados como critérios
móvel o suficiente, a fim de posicionar a cabeça do úmero de inclusão, tanto artigos experimentais, como revisões de
em toda sua amplitude de movimento [6]. Alguns autores literatura que pudessem obter informações sobre as correlações
sugerem ainda que uma alteração postural pode levar a uma existentes entre o complexo do ombro e a coluna torácica, e
fraqueza muscular no complexo do ombro e ainda limitar a foram excluídos os artigos que não continham informações
articulação glenoumeral em sua amplitude de movimento, correlacionando a coluna torácica com a função do ombro,
podendo assim resultar em uma patologia muito comum no ou que fossem anteriores ao ano de 1994. Foram selecionados
ombro chamada Síndrome do Impacto Subacromial (SIS) 46 artigos para a leitura e foram excluídos os que não diziam
[3,6-9]. Outros autores relatam que os movimentos vertebrais respeito ao propósito deste estudo. Sendo assim restaram um
da coluna toracica podem interferir na cinematica do com- total de 26 fontes que contextualizavam o assunto de interesse
plexo glenoumeral compromentendo sua função [2,10-13]. (Figura 1). As Tabelas I e II resumem os principais achados
O conceito de SIS foi introduzido por Charles Neer, em dos estudos que analisaram as relações estáticas e dinâmicas,
1972, e representa a compressão mecânica do manguito rota- respectivamente, com a função do ombro.
dor, bursa subacromial e tendão do bíceps contra o acrômio e
ligamento coracoacromial, especialmente durante a elevação Figura 1 - Organograma descritivo de todo o processo de pesquisa
do ombro. Neer afirmou que 95% de todos os casos de injú- da revisão de literatura do presente artigo.
rias no manguito rotador poderiam ser atribuídos à mecânica Resultado da busca nas bases
do impacto, mas recentemente o conceito de SIS tem sido de dados (1994-2011)
bastante discutido [7]. Acredita-se que a SIS é a causa mais 566 Artigos
comum de dor no ombro, sendo responsável por 44% a 65% Aplicação
de todas as queixas em um consultório médico [6]. dos critérios de
inclusão e exclusão
A relação entre o alinhamento da coluna torácica, posição 46 Artigos
e cinemática escapular e função do ombro são baseadas em Artigos não correspon-
dentes ao assunto (15)
grande parte por observações pessoais e não por dados inves-
31 Artigos
tigativos, apenas poucos estudos procuraram explorar esta
relação. Movimentos associados à região cervical e lombar Artigos duplicados
possuem maior interesse e estão bem descritos na literatura, 26 Artigos
no entanto, há um menor número de dados disponíveis sobre Finalização do artigo contendo
a coluna torácica ou sobre a influência que outras articulações informações sobre relações
ou estruturas podem ter sobre seus movimentos [2]. estáticas e dinâmicas
A coluna torácica é a principal área de transferência de 13 Artigos 13 Artigos
carga entre a parte superior e inferior do corpo, e sua função Relações dinâmicas Relações estáticas
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Tabela I - Resumo dos achados encontrados em estudos que analisaram as relações estáticas entre a coluna torácica e o complexo do ombro.
Autor /Ano / Jornal de Tipo de estudo Características da amostra e testes Resultados
Publicação realizados
Bostard [3] Observacional 50 indivíduos assintomáticos. Indivíduos com cifose aumentada e me-
Descritivo Foram medidos a orientação escapular, nor comprimento do peitoral menor têm
cifose torácica e comprimento do peitoral maior tendência a problemas no ombro
menor por meio de eletromagnéticos e fita devido à alterações do posicionamento
métrica. escapular em repouso.
Kebaetse et al. [6] Observacional 34 indivíduos assintomáticos. Na postura de hipercifose há diminuição
Descritivo Postura ereta e curvada (hipercifose). da força muscular, diminuição do ADM
Cinemática escapular e ADM ativo do om- ativo, elevação da escápula e diminui-
bro durante a abdução no plano escapular ção de seus movimentos.
mensurada por um sistema eletromecânico
em 3D.
Força muscular medida por dinamometria.
McClure, Michener e Caso-controle 90 indivíduos (45 com SIS e 45 sem SIS). Não foram encontradas diferenças signi-
Karduna [7] ADM do ombro e cifose torácica por meio ficativas relacionando postura torácica e
da goniometria e força muscular pela dor em indivíduos com e sem SIS.
dinamometria. Alterações escapulotorácicas, de força
e ADM poderiam estar relacionadas a
mecanismos compensatórios relaciona-
dos à dor.
Herbert et al. [15] Caso-controle 51 sujeitos (41 com SIS e 10 sem SIS). Alterações do movimento escapular du-
Movimentos escapulares por dispositivos rante a abdução do braço em indivíduos
eletromagnéticos com SIS.
Greenfield et al. [16] Caso-controle 60 indivíduos (30 com SIS e 30 SIS). Apesar de encontrarem movimentos alte-
Movimentos escapulares, ADM do ombro rados da escápula e diminuição do ADM
e postura. do ombro, não observaram diferenças
na postura em indivíduos com e sem SIS.
Lewis, Green & Wright Caso-controle 60 individuos com SIS e 60 sem SIS. A postura da parte superior do corpo
[23] Anteriorização da cabeça, cifose torácica, não seguiu os padrões definidos na
posição escapular e diminuição do ADM literatura, e seus achados foram insu-
do ombro por um programa de análise ficientes para correlacionar postura e
posural. indivíduos com e sem SIS.
Lewis & Valentine [24] Caso-controle Mediram a curvatura da coluna torácica Apesar da avaliação interavaliadores ter
em 45 indivíduos com SIS e 45 sem SIS por sido boa, seus dados foram inconclusi-
meio de um inclinômetro. vos para indivíduos com e sem SIS.

Tabela II - Resumo dos achados encontrados em estudos que analisaram as relações dinâmicas entre a coluna torácica e o complexo do ombro.
Autor /Ano / Jornal de Tipo de estudo Características da amostra e testes Resultados
Publicação realizados
Theodoridis & Ruston [2] Observacional 25 mulheres assintomáticas. Foram avalia- Observaram um movimento padrão de
Descritivo das através de dispositivos eletromagnéti- inclinação e rotação ipsilateral acom-
cos para verificar padrões de movimentos panhados de extensão das vértebras
das vértebras torácicas (T2-T7) durante torácicas.
a elevação do braço no plano sagital e
escapular
Meurer et al. [13] Caso-controle Um estudo prospectivo com 50 indivíduos A maior mobilidade foi encontrada em
com SIS e 50 sem SIS. indivíduos sem SIS, não foram encontra-
Foram testar a mobilidade das vertebras das diferenças sobre a postura inicial da
torácicas superiores através de um disposi- coluna torácica.
tivo eletromagnético.
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Crosbie et al. [12] Observacional 32 mulheres assintomáticas. Realizaram Foram observadas consistentes intera-
Descritivo flexão uni e bilateral da glenoumeral em ções e sincronias entre os movimentos
três planos (sagital, coronal e escapular) e do úmero, da escápula e segmentos
foram analisadas diversas variáveis através torácicos.
de dispositivos eletromagnéticos. Movimentos uni e bilaterais do ombro
produzem significativamente diferentes
padrões de movimentos vertebrais e nas
rotações escapulares.
Lee, Hodges & Coppie- Observacional 10 participantes assintomáticos. Durante os movimentos de flexão,
ters [27] Descritivo Foram monitorados através de EMG na multífidos e longuíssimo entraram em
região torácica (longuíssimo e multífidos) atividade antes da ativação do deltóide.
e ombro (deltóide), realizando movimentos
uni e bilaterais do ombro.
Boyles et al. [28] Experimental Manipulação torácica em 56 pacientes Evidenciou alterações significativas nos
com SIS. testes de Neer e Hawkins, melhora da
função e redução da dor nos testes de
resistência para rotação externa e rota-
ção interna e aumento da abdução ativa
do ombro.
Strunce et al. [29] Experimental Manipulação torácica em 21 pacientes Diminuição significativa nos níveis de dor
com dor no ombro em mais de 50% dos indivíduos.
Feil & Morgan [30] Revisão Revisou artigos que incluíam biomecânica Destacou a hipótese da Síndrome do T4.
e manipulação articular. Forneceu subsídios sobre os benefícios
Descreveu as alterações de movimento na da manipulação torácica na mobilidade
coluna torácica e relacionou com os movi- da escápula e do ombro.
mentos do complexo do ombro

Discussão 16-23]. Sahrmann [8] afirmou que um ótimo alinhamento é


necessário para a adequada realização do movimento. Desvios
A associação entre desvios posturais e dor no ombro é posturais, portanto, podem mudar a capacidade biomecânica
baseada na teoria de que posições prolongadas podem acar- de produzir movimentos precisos, ocasionando ao longo do
retar adaptações dos tecidos moles. Essas adaptações podem tempo dor como resposta a exposição a tarefas repetitivas.
ser explicadas por mecanismos ativos e passivos que agem Kebaetese et al. [6] realizaram um estudo com o objetivo
em conjunto durante o movimento do ombro, levando a de determinar o efeito da postura torácica sobre a cinemática
alterações biomecânicas que geram dor [3]. A relação exata escapular, força muscular e arco de movimento (ADM) ativo
entre os movimentos torácicos e do ombro tem sido objeto do ombro durante a abdução no plano escapular. Os resulta-
de muitas investigações, a razão para tal interesse está na dos obtidos foram que a postura torácica afeta claramente o
crença de que indivíduos com patologias no ombro devem ADM de abdução no plano escapular e a cinemática escapular.
demonstrar muitas vezes uma interrupção da coordenação A força muscular não foi afetada pela postura na posição neu-
entre os movimentos escapulares e torácicos. Dessa forma tra. A diminuição de 16,2 % da força de abdução no plano
torna-se necessária a recuperação de uma sincronia normal escapular com o braço a 90º na postura curvada pode ser
para um bom resultado do tratamento. Um dos maiores explicada por alterações na cinemática escapular. Na postura
problemas com relação a essas investigações é a dificuldade curvada a translação superior da escápula é aumentada entre
de monitoramento dos segmentos em tempo real [12]. 0 e 90 graus, o que reduz o comprimento das fibras superiores
do trapézio e a consequência é a redução da sua capacidade de
Relações estáticas entre a coluna torácica e a gerar tensão. Além disso foi observada uma maior inclinação
função do ombro anterior da escápula nesta posição. Na postura curvada foi
encontrada uma média de 105º em comparação com 90,6º
A investigação de problemas musculoesqueléticos no na postura ereta. Portanto músculos gleno-umerais como
ombro inclui frequentemente uma avaliação postural, pois deltóide e supra-espinhoso estavam mais encurtados.
uma boa função do ombro significa um bom alinhamento Com relação à cinemática escapular foram achados na
vertebral e uma posição adequada da escápula [3,6-9,15]. postura curvada, uma maior translação superior da escápula
Alguns autores propõem que o aumento da flexão torácica (hi- entre 0 e 90º de abdução, menor rotação ascendente e menor
percifose) altera a relação do movimento escapuloumeral [3-7, inclinação posterior entre 90 e 180º de abdução. Segundo o
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autor a diminuição de ADM do ombro na postura curvada Crosbie et al. [12] realizaram um estudo em que o princi-
pode ser atribuído a menor inclinação posterior e menor pal objetivo foi investigar a sincronia e coordenação do úmero,
rotação ascendente da escápula nesta posição. Dessa forma, escápula e movimentos da coluna torácica e lombar durante
o acrômio pode criar uma barreira óssea que pode causar ou movimentos uni e bilaterais do membro superior no plano
contribuir para SIS e lesões repetitivas [6]. sagital, coronal e escapular. A extensão da coluna torácica só
Um dos mecanismos que podem potencializar a SIS seria ocorreu com a flexão bilateral dos ombros, independente dos
o encurtamento do peitoral menor, alterando o movimento planos. A flexão lateral da torácica alta e rotação axial ipsila-
escapular nos planos sagital e transverso. Devido às suas teral só foram predominantes quando houve uma elevação
inserções em processos coracóides e costelas esse encurta- unilateral do úmero e não bilateralmente. Nenhum movimen-
mento do peitoral menor durante o repouso, ocasionaria um to lombar foi significativo para os movimentos do braço. A
aumento da tensão passiva durante a elevação do ombro, o torácica baixa foi particularmente influenciada pela abdução
que restringe a rotação ascendente da escápula. Cabe ressaltar do úmero nos planos coronal e escapularO movimento de
que esses achados foram encontrados por Borstad [3,20] em extensão torácica baixa foi significantemente maior em todos
indivíduos assintomáticos. os três planos de movimentos do braço em relação a torácica
O posicionamento estático da coluna torácica pode não alta. Os autores sugerem que a região torácica superior é mais
ser o fator causal para a SIS. Apenas uma falta de mobilidade limitada devido a sua fixação nas costelas. O movimento de
torácica deve contribuir. McClure et al. [9] não encontraram flexão lateral da coluna torácica alta foi ligeiramente maior
diferenças significativas entre posição do ombro e postura durante a elevação do ombro ipsilateral. Já a região torácica
da coluna torácica superior em indivíduos com e sem SIS. baixa fletiu para o lado contralateral ao movimento do braço
Para os autores as alterações escapulotorácicas poderiam estar em todos os casos e o seu resultado foi significantemente
relacionadas a mecanismos compensatórios relacionados à maior do que o movimento na região torácica alta. A rotação
dor. A relação estática entre a coluna torácica e a função do axial da torácica alta foi maior do que na torácica baixa em
ombro não está ainda bem esclarecida [8,9], enquanto vários todos os planos de movimento. Todos os sujeitos da pesquisa
estudos suportam a relação entre movimentos e dor por causa apresentaram fortes correlações entre movimentos da coluna
de alterações da cinemática escapular [3,6-9,15-23]. vertebral e os padrões de movimento do úmero, assim como
rotação lateral escapular e movimento da coluna torácica alta.
Relações dinâmicas entre a coluna torácica e Lewis & Valentine [24] relataram que a extensão das vértebras
os movimentos do ombro torácicas durante a elevação do braço foi necessária para uma
amplitude de movimento completa.
Por muitos anos tem sido entendido, que o ADM com- A coluna torácica funciona como um elo fundamental na
pleto do ombro depende do movimento escapular, e que cinemática da elevação do ombro. As implicações clínicas e
especialmente durante a elevação unilateral do ombro, haverá os achados estão bem coordenados [12]. Assim como já foi
uma tendência de extensão e rotação da coluna para ampliar observado na coluna cervical [25] e na coluna lombar [26],
o movimento [12]. Muitos autores descrevem que uma existe um mecanismo de antecipação de movimento por parte
limitação funcional do movimento do ombro está associada dos músculos profundos da coluna torácica. Lee, Hodges e
também a uma restrição dos movimentos da escápula e da Coppieters [27] selecionaram 10 indivíduos nos quais foram
coluna torácica [2,10-13]. introduzidos eletrodos de agulha nos multífidos e longuíssi-
Segundo Meurer et al. [13], indivíduos saudáveis apresen- mos nos níveis de T5, T8 e T11 e também foram colocados
tam maior mobilidade da coluna torácica nos planos frontal eletrodos nas porções anteriores e posteriores do deltóide
e sagital e na rotação comparados com indivíduos com SIS. direito e esquerdo. Os indivíduos foram orientados a realizar
No mesmo estudo não foram observadas diferenças relati- movimentos uni e bilaterais do braço alternadamente. Foi
vas à postura inicial da coluna torácica [13]. Theodoridis e observado que durante a flexão do ombro, multífidos e lon-
Ruston [2] realizaram uma pesquisa com 25 indivíduos do guíssimos aumentaram suas atividades acima do considerado
gênero feminino, utilizando um dispositivo eletromagnético basal antes mesmo da contração do deltóide, esta atividade
na pele (não invasivo), nos processos espinhosos de T2 a T7. antecipatória ao movimento do braço deve ser planejada pelo
Os sujeitos foram orientados a realizar uma elevação do om- sistema nervoso central (SNC). Os autores acrescentam que
bro no plano escapular e no plano sagital (flexão voluntária o músculo longuíssimo desempenha um papel importante,
máxima). Vinte e três indivíduos apresentaram um padrão de tanto no controle de orientação da coluna vertebral, como
movimento para a inclinação e rotação lateral ipsilateral asso- também no controle do centro de massa (CM) durante alte-
ciada com extensão no plano sagital, enquanto 19 indivíduos rações no plano sagital [27].
encontraram o mesmo padrão durante a elevação do ombro no Um estudo que analisou a melhora da mobilidade torácica
plano escapular. Existem estudos que encontraram o mesmo através da manipulação vertebral em indivíduos com SIS, evi-
padrão de movimento com a coluna torácica superior, porém denciou alterações significativas nos testes de Neer e Hawkins,
com metodologia diferente[10-12]. melhora da função e redução da dor no teste de resistência
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para rotação externa e rotação interna, além da abdução ativa and without shoulder impingement syndrome. Phys Ther
do ombro [28]. Strunce et al. [29] também observaram me- 2006;86(8):1075-90.
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dor em 50% dos indivíduos que sofreram uma intervenção care? J Orthop Sports Phys Ther 2002;32(8):376-9.
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sindrome foi aceita por alguns profissionais de saúde nas Avon) 1996;11(6):311-6.
últimas décadas, mas ainda faltam provas para comprovar 11. Stewart SG, Jull GA, Ng JK-F, Willems JM. An initial analysis
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Como podemos observar a dinâmica da coluna toráci-
mobility in patients with an impingement syndrome compared
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musculares contribuem para disfunções do ombro, porém
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esses achados não são evidentes em estudos experimentais healthy individuals. J Orthop Sports Phys Ther 1995;21(5):287-
ou bem instrumentados. Vários estudos suportam a relação 95.
entre movimentos da coluna torácica e função do ombro em 17. Lewis JS, Green A, Wright C. Subacromial impingement syn-
decorrência das alterações cinemáticas da escápula. Existe uma drome: the role of posture and muscle imbalance. J Shoulder
forte correlação funcional e dinâmica entre movimentos da Elbow Surg 2005;14(4):385-92.
coluna torácica e os padrões de movimento do úmero e da 18. Lukasiewicz AC, McClure P, Michener L, Pratt N, Sennett B.
escápula. Clinicamente estes achados sugerem que a avaliação Comparison of 3-dimensional scapular position and orientation
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