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BASES ANÁTOMO-FUNCIONAIS DA ARTICULAÇÃO DO COTOVELO: CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DAS ESTRUTURAS ESTABILIZADORAS DOS COMPARTIMENTOS MEDIAL E LATERAL

Bases anátomo-funcionais da articulação do cotovelo:


contribuição ao estudo das estruturas estabilizadoras
dos compartimentos medial e lateral
Revisão de sete peças anatômicas*
EDUARDO ÁLVARO VIEIRA1, EDIE BENEDITO CAETANO2

RESUMO mainly to evidence the ligament structures which support the


elbow joint. Understanding the anatomic details of this joint
Os autores, baseados em revisão crítica da literatura e
is essential for the accurate diagnosis of the different syn-
no estudo das estruturas que compõem a articulação do
dromes and instabilities which occur during sports and in daily
cotovelo, procuram salientar sua importância na estabili-
activities.
dade estrutural e funcional. Foram estudadas sete peças
anatômicas “a fresco”, procurando-se evidenciar princi- Key words – Functional anatomy; elbow; joint stability
palmente as estruturas de suporte ligamentar da articula-
ção do cotovelo. A compreensão dos pormenores anatômi- INTRODUÇÃO
cos da articulação é essencial para o diagnóstico preciso
das diversas síndromes dolorosas e das instabilidades que Inúmeras atividades da vida diária solicitam a articulação
ocorrem na prática do esporte e nas atividades da vida do cotovelo em seus eixos de movimentos. Esforços muito
diária. intensos ocorrem na prática esportiva. Alguns esportes cau-
sam sobrecargas funcionais dessa articulação, como: tênis,
Unitermos – Anatomia funcional; cotovelo; estabilidade articular beisebol, arremessos, ginástica, voleibol e outros. As forças
predominam na direção em valgo, resultando em lesões agu-
ABSTRACT das ou crônicas. Os esforços repetitivos trazem como resulta-
do seqüelas, tanto na criança como no adulto(1-4).
Functional anatomic basis of the elbow joint: contribution
É, portanto, absolutamente essencial o conhecimento da ana-
to the study of medial and lateral compartments stabilizing
tomia funcional do cotovelo para o diagnóstico preciso e con-
structures. Review of seven anatomical specimens
duta correta de tratamento específico das diversas lesões(5-7).
Based on a critical review of the literature and on the study Os livros de Anatomia(8-14) e os trabalhos básicos no assun-
of the structures that make up the elbow joint, the authors to descrevem o cotovelo como sendo formado pelas articula-
emphasize their importance on functional and structural sta- ções úmero-ulnar, úmero-radial e radioulnar proximal.
bility. Seven “fresh” anatomic specimens have been studied As articulações estão envolvidas por cápsula articular e re-
forços ligamentares diferenciados.
* Trabalho realizado na Clínica de Ortopedia e Traumatologia da Facul-
A articulação úmero-ulnar é uniaxial com movimento de
dade de Medicina de Sorocaba-PUC-SP.
Recebido em 26/5/99. Aprovado para publicação em 7/10/99. flexo-extensão.
1. Professor Associado de Ortopedia da Faculdade de Medicina de Soro- Essa articulação em gínglimo apresenta, no entanto, 5º de
caba-PUC, São Paulo. rotação interna e externa nos extremos dos movimentos de
2. Professor Titular da Disciplina de Ortopedia e Traumatologia e da Dis- flexo-extensão.
ciplina de Anatomia do Centro de Ciências Médicas e Biológicas de
Sorocaba-PUC, São Paulo.
O componente umeral tróclea tem a forma de ampulheta.
Endereço para correspondência: Eduardo Álvaro Vieira, Rua João dos San- Sua superfície articular é revestida de cartilagem. Uma de-
tos, 532 – 18090-040 – Sorocaba, SP. pressão central da tróclea (sulco troclear) separa duas superfí-
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cies convexas desiguais. Este sulco tem direção oblíqua da A articulação radioulnar proximal, juntamente com a dis-
frente para trás e possui características individuais que levam tal, permite rotação do antebraço (supinação e pronação) em
a variações no ângulo de transporte ou carrying angle(1,10,15). torno do eixo longitudinal. Esta diartrose uniaxial é composta
A tróclea está rodada anteriormente de 30º em relação à diáfi- de uma borda medial convexa da cabeça radial e do sulco ra-
se. A ulna apresenta também desvio rotacional de 30º, mas no dial da ulna. Durante os movimentos rotacionais a ulna prati-
sentido posterior. Esta adaptação biomecânica permite um camente permanece imóvel, ao contrário do rádio, que cruza
movimento de flexo-extensão de 145º-150º com estabilidade sobre a ulna na supinação, ocorrendo o inverso na pronação.
estrutural, mesmo em extensão completa. No plano frontal a A cabeça radial gira dentro do anel formado pelo ligamento
tróclea apresenta inclinação de 6º de valgismo em relação ao anular e o sulco radial da ulna.
longo do eixo da diáfise umeral. Esta angulação leva a uma O ângulo de transporte (carrying angle) do cotovelo é for-
projeção distal da tróclea medialmente. mado pelo eixo da diáfise do úmero e da ulna, o que resulta na
Acima da superfície cartilaginosa da tróclea encontra-se uma posição de abdução do antebraço. A mensuração desse ângu-
depressão: a fossa coronóide, onde se articula o processo co- lo é feita no plano frontal com o cotovelo em extensão. Seu
ronóide da ulna durante a flexão. Posteriormente, a fossa ole- valor é de 10º-15º no homem e de 5º maior na mulher(1,9). Ka-
craniana relaciona-se com o processo olecraniano da ulna pandji(10) afirma que esse ângulo é devido à obliqüidade do
durante a extensão. sulco troclear. London(16) refere que o ângulo de transporte
A ulna proximal tem uma proeminência central. De cada permanece constante, mesmo em flexão.
lado encontra-se uma região côncava, conhecida como sulco Os autores relatam que a articulação do cotovelo é envolta
troclear, que se articula com a superfície da tróclea. A con- por um manguito capsular. Sua inserção anterior recobre a
gruência estrutural dessas superfícies articulares torna a arti- fossa coronóide e supracondilar. Posteriormente, contorna a
culação úmero-ulnar uma das mais estáveis do sistema mús- borda do processo olecraniano. A porção anterior apresenta
culo-esquelético. fibras oblíquas mediais e laterais. A porção posterior apresen-
Outra estrutura relacionada com a articulação úmero-ulnar ta fascículos fibrosos em direção oblíqua e transversal.
é o epicôndilo medial, que é ponto de inserção do grupo dos O cotovelo possui definidos complexos ligamentares: me-
músculos flexores e pronadores do antebraço e do ligamento dial e lateral(17).
colateral ulnar. O epicôndilo medial continua-se com a crista O complexo ligamentar medial(1,4,18-22) é constituído pelo
supracondilar. Posteriormente ao epicôndilo medial está o tú- ligamento colateral ulnar, que apresenta três porções:
nel do nervo ulnar, que é uma depressão óssea que protege o
– porção ou fascículo anterior.
nervo ulnar.
– porção ou fascículo posterior oblíquo.
A articulação úmero-radial é também uma diartrose unia-
– porção transversa.
xial. Entretanto, a articulação tem uma dupla função, reali-
zando a flexo-extensão no eixo frontal e os movimentos rota- A porção anterior origina-se da superfície inferior do epi-
cionais em torno do eixo longitudinal associados à articula- côndilo medial num ponto levemente posterior ao eixo de ro-
ção radioulnar proximal(10). tação e tem a inserção na face medial do processo coronóide.
A saliência distal e lateral do úmero é metade de uma esfe- A origem excêntrica em relação ao ponto isométrico de rota-
ra, denominada côndilo ou capítulo. Um sulco separa o côn- ção permite tensionamento do ligamento no arco de movi-
dilo da tróclea. A borda da cabeça do rádio é direcionada em mento(23,24).
movimento pelo sulco côndilo-toclear na flexo-extensão. Aci- Funcionalmente, a porção anterior divide-se em duas ban-
ma do côndilo está uma depressão, a fossa radial, onde se ar- das:
ticula a cabeça radial na flexão máxima. Lateralmente, en- Ântero-medial: tensa em extensão
contramos o epicôndilo lateral. Póstero-medial: tensa em flexão
A cabeça radial apresenta uma depressão central de forma A porção anterior do ligamento colateral ulnar representa o
oval e continua-se com o colo de dimensões mais estreitas. maior suporte ligamentar às forças valgizantes do cotovelo.
Distalmente ao colo da cabeça radial encontra-se uma proe- Esta porção é essencial na estabilidade funcional em todos os
minência óssea, a tuberosidade bicipital, onde está inserido o graus de movimento. Lesões desta estrutura resultam em ins-
tendão do músculo bíceps. A cabeça do rádio e o colo formam tabilidade importante em valgo, em todas as posições, exceto
um ângulo de 15º em relação a sua diáfise. na extensão completa(25).
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BASES ANÁTOMO-FUNCIONAIS DA ARTICULAÇÃO DO COTOVELO: CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DAS ESTRUTURAS ESTABILIZADORAS DOS COMPARTIMENTOS MEDIAL E LATERAL

A porção posterior ou fascículo posterior oblíquo tem ori- alteram sua posição ou comprimento de suas fibras. Estabili-
gem no epicôndilo medial posteriormente e abaixo do centro za o ligamento anular durante o estresse em varo.
do eixo de rotação. Esta característica explica a grande varia- O ligamento anular é uma estrutura forte em forma de anel
ção de comprimento de suas fibras. osteofibroso que envolve e estabiliza a cabeça do rádio na in-
Morrey e An(13) relatam que esse fascículo está em tensão cisura radial da ulna. Tem a extensão de 4/5 de um círculo.
no movimento de flexão, especialmente após 60º. Tem a for- Martin(29) divide o ligamento anular em três camadas:
ma alargada em leque e prende-se na face póstero-medial do – estrutura capsular profunda;
olécrano. Schwab et al.(26) verificaram que a secção desse fas- – camada intermediária (mais importante);
cículo não afeta significativamente a estabilidade medial do – camada superficial.
cotovelo. A porção anterior do ligamento anular torna-se tensa na
A porção transversa ou fascículo transverso origina-se na supinação e a porção posterior no movimento de pronação.
face medial do olécrano e insere-se ao nível do processo coro- Outra estrutura também contribui na estabilização da arti-
nóide da ulna. Tem origem e inserção na ulna e está intima- culação radioulnar proximal: o ligamento quadrado. Este ori-
mente relacionado com a cápsula articular. Contribui em pe- gina-se na porção inferior da incisura radial da ulna e insere-
quena proporção na estabilidade da articulação. Relaciona-se se no colo da cabeça radial.
através de suas fibras arciformes com o fascículo posterior Spinner e Kaplan(30) relatam que esse ligamento estabiliza a
oblíquo. cabeça do rádio, limitando a rotação durante os movimentos
O complexo ligamentar lateral é muito variável na sua cons- de pronossupinação. Reforça também a superfície inferior da
tituição. cápsula articular.
Morrey e An(13) referem que o compartimento lateral é cons- Os músculos diretamente relacionados com a função do
tituído pelas seguintes estruturas: cotovelo estão divididos em quatro grupos:
– Flexores: bíceps, braquial e braquiorradial.
– Ligamento colateral radial;
– Extensores: tríceps e anconeu.
– Ligamento colateral lateral ulnar;
O músculo anconeu origina-se na superfície posterior do
– Ligamento colateral acessório;
epicôndilo lateral e insere-se no olécrano. A disposição de suas
– Ligamento anular.
fibras cobre a porção lateral do ligamento anular, a cabeça do
O ligamento colateral radial é pouco distinguido da cápsula rádio e a superfície lateral proximal da ulna. O músculo é iner-
articular. Origina-se no epicôndilo lateral e em forma de le- vado pelo radial (C7 e C8). Pauly et al.(22) constataram ativida-
que prende-se ao ligamento anular. de desse músculo nas primeiras fases da extensão do cotove-
Desde sua origem está relacionado com o ponto isométrico lo. Participa na estabilização do cotovelo durante a pronossu-
do eixo de rotação, de forma que pouca variação ocorre em pinação pelas características e localização.
suas fibras no movimento de flexo-extensão(27). Sua principal – Os músculos supinato-extensores incluem o braquiorra-
função é estabilizadora aos esforços em varo da articulação dial, extensor curto e longo radial, extensor dos dedos, exten-
úmero-radial. sor ulnar do carpo e extensor do quinto dedo.
O ligamento colateral lateral ulnar origina-se na porção Todos os músculos originam-se próximo ou diretamente no
média do epicôndilo lateral e insere-se no tubérculo da crista epicôndilo lateral do úmero, suas funções primárias relacio-
dos músculos supinadores da ulna. nam-se com o punho e mão, mas contribuem para suporte di-
O’Driscoll et al.(28) relatam que a liberação dessa porção nâmico da face lateral do cotovelo. Este grupo muscular é
permite subluxação inferior da articulação úmero-ulnar. Esse muito suscetível às lesões traumáticas do tipo overuse(31,32).
tipo de subluxação é referido como o sinal do pivot shift do – Músculos flexopronadores incluem o pronador redondo,
cotovelo. Considera-se essa porção como guia de suporte la- flexor radial do carpo, palmar longo, flexor ulnar do carpo e
teral que complementa a função estabilizadora medial do li- flexor superficial dos dedos. A origem conjunta é no epicôn-
gamento colateral ulnar (porção anterior). dilo medial.
O ligamento colateral lateral acessório origina-se na mar- Secundariamente são flexores do cotovelo. Apresentam fun-
gem inferior do ligamento anular e insere-se na crista do tu- ção estabilizadora do compartimento medial do cotovelo e
bérculo supinador. Entra em tensão quando uma força em varo constituem a primeira linha de defesa dinâmica contra o es-
é aplicada ao cotovelo. Os movimentos de flexo-extensão não tresse em valgo(4). Por sua posição e função, constituem local
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Fig. 1
Reprodução
esquemática
das estruturas
osteocartilaginosas
da articulação
do cotovelo:
a) Côndilo ou Fig. 2 – Reprodução esquemática do ligamento colateral ulnar (em exten-
capítulo; são): a1) Fascículo anterior (banda ântero-medial); a2) Fascículo ante-
b) Tróclea; rior (banda póstero-medial); b) Fascículo posterior oblíquo; c) Fascículo
c) Cabeça radial; transverso.
d) Colo do rádio;
e) Tuberosidade;
f) Epicôndilo
lateral;
g) Epicôndilo
medial;
h) Processo
coronóide;
i) Fossa coronóide;
j) Fossa radial.

de processos inflamatórios e degenerativos por lesões repeti-


tivas.

MATERIAL E MÉTODO
Para este estudo realizamos dissecções de sete peças anatô-
micas “a fresco” da articulação do cotovelo.
Os dados obtidos foram anotados de forma conjunta e as Fig. 3 – Foto de peça anatômica: a1) Fascículo anterior (banda ântero-
medial); a2) Fascículo anterior (banda póstero-medial); b) Fascículo pos-
particularidades anatômicas registradas nas diferentes prepa- terior oblíquo; c) Fascículo transverso.
rações.
A dissecção foi realizada nas faces medial e lateral da arti-
bilizadoras. A cápsula articular envolve toda a articulação. Em
culação, observando-se a relação dos músculos periarticula-
sua porção anterior encontram-se fibras em direção oblíqua e
res e, principalmente, dos ligamentos. Os detalhes anatômi-
arciforme. A cápsula posterior é relativamente frouxa e muito
cos foram documentados através de fotos em diferentes ângu-
delgada, o que favorece a grande excursão e mobilidade do
los, procurando uma visão compartimental.
olécrano, sendo o espaço articular preenchido por gordura.
O compartimento medial é então avaliado em toda a exten-
RESULTADOS
são através da dissecação pormenorizada dos diversos fascí-
Os pormenores anatômicos de todas as sete peças foram culos ou porções do ligamento colateral ulnar. Este apresenta
avaliados quanto às características da cápsula e ligamentos três fascículos com fibras de distribuição triangular:
colaterais (ulnar e radial) (fig. 1). – Porção ou fascículo anterior – Tem origem no epicôndi-
Procurou-se observar o trajeto das fibras, suas ações dife- lo medial do úmero, com trajeto oblíquo de suas fibras. Está
rentes nos movimentos de flexo-extensão e suas funções esta- constituído por dois conjuntos de fibras ou bandas;
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– Ântero-medial – Tem direção mais vertical, com espes-


sura variável, e suas fibras estão tensas nos movimentos de
flexo-extensão (30º, 60º e 90º). É o estabilizador ligamentar
mais importante nos esforços em valgo do cotovelo (figs. 2 e 3);
– Póstero-medial – Tem fibras com trajeto paralelo às an-
teriores e estão tensas na flexão de 120º.
O fascículo posterior é visibilizado em toda a extensão, apre-
sentando a forma em leque, com origem ampla no epicôndilo
medial e inserção da face medial do olécrano. Suas fibras es-
tão tensionadas em flexão e relaxadas em extensão.
O ligamento transverso oblíquo é também avaliado em toda
a extensão, determinando-se o trajeto de suas fibras e sua re-
lação com as demais porções. Por sua posição, amplia e alar-
ga a cavidade articular (figs. 4, 5 e 6).
No compartimento lateral encontra-se o ligamento colate-
ral radial. Seus pormenores anatômicos foram identificados.

Fig. 5 – Reprodução esquemática do ligamento colateral anular (em fle-


xão): a1) Fascículo anterior (banda ântero-medial); a2) Fascículo ante-
rior (banda póstero-medial); b) Fascículo posterior oblíquo; c) Fascículo
transverso.

Fig. 4 – Reprodução esquemática do fascículo anterior do ligamento cola-


teral ulnar em extensão (30º) e flexão (120º): a1) Banda ântero-medial; Fig. 6 – Foto de peça anatômica do compartimento medial: a1) Fascículo
a2) Banda póstero-medial. (Nota-se o diferente tensionamento das fibras anterior (banda ântero-medial); a2) Fascículo anterior (banda póstero-
na extensão e na flexão (adaptado de Tullos H.S. et al.). medial); b) Fascículo posterior oblíquo; c) Fascículo transverso.

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Fig. 7 – Reprodução esquemática do compartimento lateral: a) Ligamento


colateral radial; b) Ligamento colateral lateral ulnar; c) Ligamento aces- Fig. 8 – Foto do compartimento lateral: a) Ligamento colateral radial; b)
sório; d) Ligamento anular. Ligamento colateral lateral ulnar; c) Ligamento acessório; d) Ligamento
anular.

Origina-se no epicôndilo lateral do úmero e insere-se no liga-


mento anular. Tem direção oblíqua, sendo constituído por fi-
bras em grande quantidade, o que o torna uma estrutura bas-
tante resistente. Relaciona-se com os músculos supinadores e
extensores radiais do carpo e o músculo anconeu. A divulsão
das fibras entre o ligamento colateral radial e o plano muscu-
lar é difícil. Em extensão do cotovelo, o ligamento encontra-
se tenso; na flexão, permite movimentos de lateralidade em
varo. Sua inserção é extensa ao nível do ligamento anular, o
que o integra nos movimentos de pronossupinação do ante-
braço. O ligamento colateral lateral ulnar e o ligamento cola-
teral lateral acessório estão intimamente relacionados com o
ligamento colateral radial, mas se consegue a individualiza-
ção dos trajetos de fibras com direções divergentes e inser-
ções específicas. O ligamento anular é uma estrutura em for-
ma de anel osteofibroso, muito resistente, que mantém o con-
tato da cabeça do rádio com a ulna. Mantém relação direta de
suas fibras com o ligamento colateral radial e ligamento qua-
Fig. 9 – Foto da peça anatômica, demonstrando lesões osteocondrais da
drado, o que permite uma unidade funcional do rádio e ulna cabeça do rádio, tróclea e olécrano
nesse nível (figs. 7 e 8).

DISCUSSÃO tórios ou degenerativos (tendinites, epicondilites, tennis el-


Os grupos musculares da região do cotovelo constituem a bow, LER e outros).
primeira linha de defesa aos diferentes traumas agudos ou crô- As estruturas ligamentares são atingidas com freqüência,
nicos. principalmente nos esforços em valgo do ligamento colateral
As rupturas musculares não são freqüentes. Os esforços ulnar (fascículo anterior, principalmente). Essas lesões são
repetitivos são significativos, o que leva a processos inflama- comuns na prática de esportes.
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