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A Justiça no Império do Brasil, sua relação com a constituição da Justiça no passado colonial,
a ascensão do Império brasileiro e o processo de consolidação de hierarquias sociais e justiça
nacional.
PROPÓSITO
Compreender um período da história do Brasil a partir do Direito, discutindo a construção das
leis, de acordo com conjunturas políticas e históricas específicas.
PREPARAÇÃO
Seria interessante ter em mãos o Dicionário do Brasil Joanino: 1808-1821 e um Dicionário do
Brasil Imperial. É possível encontrá-los online.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
MÓDULO 3
MÓDULO 4
INTRODUÇÃO
O Império do Brasil foi formado a partir de uma herança portuguesa de instituições. Grande
parte dela chegou ao Brasil junto com a família real, em 1808. Compreender a forma como se
construíram as instituições do Império, principalmente a Justiça, é fundamental para entender a
dinâmica da administração do Império e da sociedade existente, principalmente em seu
controle.
Um ponto importante é a principal característica do sistema político implantado no Brasil a
partir de 1822: a escravidão. Com a escravização de homens e mulheres, a economia imperial
fundamentou-se, cresceu e entrou em crise. Ao mesmo tempo, a Justiça tratou de organizar
leis a fim de controlar uma população escravizada, que constantemente se rebelava. Além
disso, foi pela Justiça que a escravidão começou a ser discutida, reduzindo-se sua influência
sobre a economia e a sociedade.
Discutiremos nos próximos quatro módulos diferentes aspectos da Justiça do Império, desde a
chegada da família real, que trouxe uma bagagem institucional até então inédita nas Américas,
a formação do Império a partir da Constituição de 1824, os códigos criminais e a identificação
de crimes e punições. Por fim, conheceremos as leis que mediaram o fim da escravidão no
Brasil.
Com esse conteúdo será possível compreender a história do Império brasileiro por meio das
instituições e como elas também fundamentaram a economia, a sociedade, a moralidade e a
política.
MÓDULO 1
COMENTÁRIO
Em 1808, sob a ameaça de Napoleão Bonaparte e com o apoio dos ingleses, a Corte
portuguesa foi transferida de Lisboa para o Rio de Janeiro, ocasionando importantes
mudanças. As mais importantes foram a abertura dos portos, que terminou com o “pacto
colonial” permitindo ao Brasil negociar livremente, não mais como uma colônia exclusivamente
com Portugal; e a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido. Ambas as medidas são
representativas para entender por que iniciamos em 1808 e não em 1822 a data oficial da
formação do Império.
Assim, as mudanças operadas desde 1808, a fim de formar um novo projeto administrativo
colonial nas américas, não pode ser descartado para a compreensão da Justiça, que teve início
junto com o Império, em 1822. Além disso, a chegada da Corte à colônia provocou a
“interiorização da metrópole”, de acordo com Maria Odila Leite da Silva Dias, transformando a
cidade do Rio de Janeiro no principal ambiente de difusão de novos modos europeus,
abrigando também instituições e cargos públicos até então inexistentes. (LEITE apud
VAINFAS; NEVES, 2008, p. 429).
A mudança, a priori, fez da cidade do Rio de Janeiro o novo centro de poder, onde se instalaria
uma estrutura administrativa que subordinaria as demais províncias, ao mesmo tempo que
ligaria, ou formaria, o Império luso-brasileiro.
ATENÇÃO
Importante mencionar que o Rio de Janeiro era a sede da colônia desde 1763, quando o
Marquês de Pombal a transferiu de Salvador.
O desenrolar dos acontecimentos, com tratados, conflitos e tensões entre os diferentes grupos
sociais presentes na América portuguesa e a Corte, culminou na ruptura definitiva entre
Portugal e Brasil e a formação do Império do Brasil.
No entanto, ainda que tenham ocorrido alterações significativas a partir de 1824, no que se
refere à Justiça no Império (ano da promulgação da Constituição), é preciso entender a
estrutura inserida pela vinda da Corte para pensar nas permanências e mudanças operadas a
partir da Independência.
Importante mencionar que as Ordenações Filipinas eram as leis que regiam a colônia e a
metrópole, vigentes em Portugal desde os tempos da União Ibérica. Após a Independência e
quando inexistia um código criminal, era a partir delas que se julgavam os crimes cometidos no
Império.
CONSTITUIÇÃO
LEIS ESPECIAIS
LEIS GERAIS
Aplicadas na metrópole.
VOCÊ SABIA
Uma das características fundamentais da Coroa portuguesa era regrar e difundir o regramento
de suas colônias. Durante o período em que Portugal administrou o Brasil, herdamos o código
e, por sua funcionalidade e difusão, foi mantido por todo o período colonial.
Ações empreendidas pelo Marquês de Pombal, secretário de Estado do rei D. José, fizeram
parte do processo de racionalização dos mecanismos de controle das colônias.
Ainda de acordo com essa autora, a instalação da Corte portuguesa no Brasil provocou uma
singular e profunda alteração na estrutura administrativa luso-brasileira (MARTINS, 2014, p.
694).
A Relação da Bahia foi criada em 1609 para ser o local onde seria interposto recurso, tendo
para isso um promotor de justiça e mais 10 desembargadores.
ALARGAMENTO DO APARELHO DE
JUSTIÇA
Essa mudança foi resultado do processo de alargamento do aparelho da Justiça na colônia
após a chegada da família real, causando um impacto futuro na forma como a justiça seria
organizada no período imperial. No entanto, esse alargamento passa também por um processo
de reaproveitamento das instituições existentes e de adaptações, que estavam mais voltadas
para criar uma jurisdição na colônia, agora sede da Corte, do que a formação de aparelhos
independentes.
EXEMPLO
A Casa da Suplicação instalada no Rio de Janeiro é um exemplo desse tipo de instituição que,
ao ser criada, deixara a colônia independente no que se referia às ações da Justiça.
Essa mudança fez com que, na colônia, houvesse a última instância da Justiça, o que antes
acontecia em Portugal, acelerando o fim dos processos deste lado do Atlântico, já que não
precisariam ser mandados para Lisboa.
1812
1821
Houve também a instalação de novas juntas de justiça nas capitanias do Rio Grande de São
Pedro e Mato Grosso, reorganização da junta de São Paulo e a recriação do cargo de juiz de
sesmaria, responsável pela delimitação e mediação das sesmarias (terrenos abandonados
pertencentes a Portugal e entregues para ocupação, primeiro no território português e, depois,
na colônia, o Brasil, que perdurou de 1530 até 1822).
Além da mudança estratégica no que se refere à Justiça e suas instâncias, a chegada da Corte
promoveu também a criação de instituições até então inexistentes. Uma delas foi a
Intendência Geral da Polícia da Corte e do Estado do Brasil. Tal órgão, criado em abril de
1808, tinha como objetivo organizar as tropas na Corte, controlar a ordem e administrar obras
públicas.
A Intendência tinha funções que variavam entre uma ideia de governo municipal, política ou
força militar, além de funções administrativas. Seguido à criação desse órgão, veio o cargo de
Intendente Geral da Polícia, importante para a construção de uma ideia de ordem.
A partir dos relatos daqueles que ocupavam o cargo, é possível entender o funcionamento da
polícia e o que se entendia por ordem e justiça no Império.
CARACTERIZAÇÃO DA JUSTIÇA NO
IMPÉRIO
A Justiça militar também sofreu impacto com a chegada da família real. Já em 1808, foi criado
o Conselho Supremo Militar e de Justiça, que representava a segunda instância da Justiça
militar, tendo duas seções:
No que se refere às finanças da nova Corte, em 1808, ocorreu a criação da Real Junta do
Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, com muitas competências. Entre elas, podemos
enumerar:
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Ainda com sede na Corte e em 1808, ocorreu a criação do Real Erário, que substituiria a Junta
de Fazenda do Rio de Janeiro. O Erário tinha a função de administração, arrecadação e
distribuição.
O Conselho da Fazenda Real também foi criado na mesma ocasião e seria responsável pelos
negócios envolvendo os armazéns reais, a exploração de minas e minérios e demais impostos
e tributos.
Por fim, a fundação do Branco do Brasil, também em 1808, é de extrema importância, uma
vez que, por meio dele, seria possível financiar os gastos do Estado, obter crédito para a
instalação e manutenção da Corte e assim continuou funcionando até 1829.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. AS PRINCIPAIS INSTITUIÇÕES JURÍDICAS IMPLEMENTADAS NO
BRASIL NO PERÍODO JOANINO SÃO:
I – A CASA DE SUPLICAÇÃO.
A) Apenas a I.
B) Apenas a II.
C) Apenas a III.
D) Apenas I e II.
E) Apenas II e III.
A) A chegada da Corte modifica a economia, uma vez que as mercadorias aqui produzidas não
são mais exportadas para Portugal, gerando aumento do lucro e a necessidade da criação de
uma Justiça voltada a regular as finanças.
C) A Corte pouco muda o processo jurídico brasileiro mantendo as Ordenações Filipinas como
principal base jurídica da colônia, com manutenção e tribunais de relação e um tribunal de
suplicação na capital.
D) A mudança jurídica mais significativa ocorre no campo militar, com a criação do Conselho
Supremo Militar e de Justiça, que passaria a regular todo o Exército e decisões militares
nacionais.
E) A Corte no Brasil significou a possibilidade de um fortalecimento da Igreja e a multiplicação
de tribunais do Santo Ofício, não separando a religião da Casa Real Portuguesa.
GABARITO
I – A Casa de Suplicação.
2. A chegada da família real ao Brasil pode ser descrita como um momento crítico para a
história do país e, por consequência, da nossa Justiça. A afirmativa que melhor
descreve essa mudança é:
São diversos os processos que marcam a mudança da Justiça no Brasil com a chegada da
família real. No entanto, a ideia de que são ímpares é o problema da maior parte das
afirmativas. A letra B chama atenção ao fenômeno central: a ideia de a colônia ter se tornado
uma metrópole abre um conjunto de exigência de mudanças jurídicas.
MÓDULO 2
Reconhecer a construção das leis e da Constituição no Império e o ideal de Justiça
CASAMENTO DE TRADIÇÕES
A construção do Império passava pela determinação das leis que o regeriam. No entanto, a
Constituição não foi feita imediatamente e dois anos se passaram entre a Independência e a
promulgação desse conjunto de leis, que confirmou que a antiga colônia, agora Império, seria
uma monarquia constitucional.
A duração do Império do Brasil, 67 anos, dois imperadores e alguns regentes, tem como marca
uma Constituição feita a reboque dos interesses do povo e que não satisfez as necessidades
institucionais desse novo sistema de governo.
Neste módulo, trataremos de como a Justiça no Império foi construída, consolidando-se como
um ambiente hierarquizado e distinto, dependendo das categorias jurídicas existentes no
Império: livres e escravizados.
De outro, a aristocracia local
No Brasil Imperial, esses debates se intensificaram com a chegada da família real e a posterior
consolidação da Independência do Brasil. Passamos, agora, à construção da Justiça imperial.
D. PEDRO I
D. PEDRO II
Em setembro do mesmo ano, o projeto da Constituição foi apresentado e entre suas principais
características estavam o estabelecimento de um limite ao poder do imperador e sua
submissão ao Poder legislativo. Outro ponto importante desse projeto eram os 32 artigos que
defendiam a extinção gradual da escravidão, artigos esses defendidos por José Bonifácio.
Esses e outros pontos provocaram calorosas discussões, além de tensão na Imprensa e nas
ruas, principalmente no que se refere ao espaço que os portugueses ocupariam no Império.
Essas tensões e a insatisfação do imperador levou-o a dissolver essa Assembleia Constituinte
sete meses depois da sua formação.
Nessa ocasião, foi criado o Conselho do Estado, composto por conselheiros vitalícios e
nomeados pelo imperador, que, somado a seis ministros e quatro membros, foram os
responsáveis pela elaboração de uma Carta constitucional que duraria todo o Império.
A Constituição foi jurada pelo imperador no dia 25 de março de 1824. Esse é um marco
importante, considerado como uma ruptura dos chamados modelos de “absolutismo
monárquico”, ainda que tenha mantido formas de exercício. Nesse texto, foram estabelecidas
as bases da estrutura política: forma de governo monárquica, hereditária e constitucional.
PODER EXECUTIVO
Exercido pelo imperador e pelos ministros
PODER LEGISLATIVO
Exercido por senadores, deputados gerais e provinciais
PODER JUDICIÁRIO
Comandado por juízes e tribunais
PODER MODERADOR
Exercido também pelo imperador
Essa Carta constitucional também estabeleceu o catolicismo como religião oficial e não proibiu
o exercício privado de outras religiões. A Constituição considerou como brasileiros todos os
portugueses que permaneceram no país após a Independência e que tivessem aderido à
causa.
A Constituição não foi direta no que se refere à escravidão, não há artigo que estabelecesse
esse regime, apenas menções indiretas a ela quando tratou da cidadania.
Ficou estabelecido no sexto artigo da Constituição que eram cidadãos os que haviam nascido
no Brasil e fossem ingênuos ou libertos. Desse modo, foi indicada a existência de não livres, ou
seja, aqueles que não seriam considerados cidadãos.
Outra questão referente aos escravos estava presente no artigo que determinou quem poderia
ser eleitor. Nesse caso, nem se fossem libertos com renda, os ex-escravos poderiam votar,
uma vez que a Constituição estabeleceu limites para o exercício da cidadania baseada em
renda.
No título IV, artigo 151 da Carta constitucional, foi estabelecida a independência do Poder
Judiciário e a função de seus membros.
É importante destacar que a formação desse poder se adequou aos traços de uma antiga
tradição, apesar de ter estabelecido mudanças em relação ao passado colonial.
Uma dessas mudanças foi a necessidade de novos códigos, presente nesse artigo da
Constituição, sendo tal procedimento essencial para a organização da Justiça imperial, estando
prevista a criação do Supremo Tribunal de Justiça, que seria composto por juízes das
Relações em função de sua antiguidade.
Somado aos novos códigos ocorreu também a criação de novas instituições. Uma delas foram
as Juntas de Justiça Militar, em 1827, nas províncias do Norte. A Justiça militar pode ser
vista como um foro híbrido que juntou dois universos: o militar e o jurídico.
Sua organização era feita em torno dos conselhos de disciplina, os de guerra e o supremo
militar e da justiça, sendo a comissão militar uma instituição de exceção. Em 1841, ocorreu a
criação dos conselhos de inquirição, mais uma instituição vinculada à Justiça militar a fim de
criar mecanismos de controle sobre a oficialidade, organizando os quadros dos oficiais do
Exército e da Marinha.
ATENÇÃO
É preciso ressaltar que, apesar do período Joanino ter deixado algum tipo de experiência
administrativa para o que se tornaria o Império, de fato a estrutura do Brasil Imperial foi
construída como forma de se modernizar, tendo um campo jurídico baseado em lógica. Além
disso, foi pela Assembleia Geral, composta pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, que as
leis do Império se formaram. Desse modo, pensar a estrutura jurídica do Império é também
pensar essa Assembleia que o modernizou por meio de leis e outras estratégias.
Ainda segundo esse autor, até 1833 não havia numeração nas leis. Entre os anos de 1833 e
1839, as leis eram numeradas a cada ano e zeradas para o ano seguinte. Apenas em 1840
que a numeração se tornou contínua. (SARAIVA, 2011)
Uma primeira grande reforma judiciária ocorreu em outubro de 1827 ao ser criado o juiz de paz
na área paroquial, que seria eleito junto com os vereadores e pelo mesmo período.
Esse juiz era um magistrado leigo, sem formação específica, sem remuneração e exercia
funções administrativas, de polícia e de justiça.
A população elegia esse juiz que atuava nas paróquias com a função de julgar casos variados,
desde a destruição de quilombos até prender homens bêbados que circulavam pelas ruas.
Servir de centro do poder judiciário, segundo as palavras de seu presidente, José Albano
Fragoso.
Ao abdicar em abril de 1831, o imperador deixou seu filho de apenas cinco anos como herdeiro
do trono, fazendo jus ao que estava estabelecido na Constituição, de que o Império seria uma
monarquia hereditária. No entanto, por causa da pouca idade, a abdicação deu início ao
período regencial, que terminou apenas em 1840, quando D. Pedro II, então com 15 anos,
assumiu o trono.
VERIFICAR
A Guarda Nacional era formada por um corpo de “cidadãos”, e expressava, no plano simbólico,
“a ordenação elitista da nação que se pretendia forjar” (VAINFAS, 2002, p. 319), podendo
exercer funções policiais caso fosse preciso. Mantinha os critérios de fortuna e cor que
hierarquizavam os cidadãos, já previstos na Constituição.
Foi no período regencial que ocorreram duas modificações no texto constitucional, as únicas de
todo o Império:
O ato adicional ocorreu pela Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834; as alterações foram
aprovadas pela Câmara dos Deputados e visavam a promover descentralização.
Por meio desse ato, o poder central foi esvaziado e os conselhos gerais das províncias foram
transformados em assembleias provinciais, tendo autonomia para legislar sobre a divisão civil,
judiciária e eclesiástica.
Tal reforma foi vista por alguns autores como fazendo parte de um processo de
descentralização iniciado partir da década de 1830. Apesar da pretensa autonomia, o
representante do executivo no âmbito provincial permaneceu sendo indicação do poder central.
ATENÇÃO
Outro ponto importante de mudança vindo por meio dessa lei, foi a transformação do Rio de
Janeiro, sede da Corte, em município neutro. A Regência Una, eletiva e temporária (renovável
a cada quatro anos) também foi estabelecida por essa lei, que também suspendeu o Conselho
de Estado.
Em 1840, ocorreu a lei de interpretação do ato adicional, quando alguns poderes foram
retirados das assembleias provinciais.
O Conselho de Estado foi restituído em 23 de dezembro de 1841, por meio da Lei nº 234,
tendo as mesmas competências previstas na Constituição. Após essa restauração, o Conselho
passou a ser ocupado por 24 membros, sendo 12 conselhos ordinários e 12 extraordinários,
mais os advogados do Conselho e o Imperador.
Esse órgão se reunia sempre em caso de grandes decisões, não sendo, porém, o imperador
obrigado a seguir suas recomendações. Ainda assim, muitas leis foram redigidas no Conselho,
como a Lei de Terras e a do Ventre livre. O Conselho foi extinto junto com o Império.
INSTITUCIONALIZAÇÃO DA ADVOCACIA
NO BRASIL
Assista ao vídeo A institucionalização da advocacia no Brasil.
Uma das funções do instituto era manter o monopólio da perícia profissional com exigência de
diplomas universitários para que houvesse reconhecimento do profissional e validasse seu
exercício. Essa era uma maneira de acabar com uma tradição do período colonial de rábulas
ou daqueles que recebiam autorização do governo para advogar. No entanto, temos um grande
exemplo de como essa exigência não funcionava a todo momento.
RÁBULAS
Aqueles que atuavam como advogados por autorização, sem nenhuma formação – que já
existia fora do Brasil –, por valor de articulação nacional. O termo torna-se pejorativo para
advogados que falam sem o devido conhecimento ou “falastrões”.
Luís Gama (um dos maiores nomes do direito brasileiro) foi um dos que exerceu a profissão
sem ter o diploma, sendo reconhecido advogado anos depois, como homenagem póstuma. De
todo modo, logo no Segundo Reinado percebia-se a necessidade da regulamentação da
profissão, que teria marcas aristocráticas, uma vez que o acesso a curso superior ainda era
restrito às elites.
De qualquer forma, havia a legitimidade baseada nessas leis para inúmeras ações, entre elas a
repressão a revoltas e outras insurreições que pudessem colocar em risco a soberania do
imperador ou a estabilidade do sistema político e econômico, este último baseado na
escravidão.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
A OBSERVAÇÃO ALUDE:
B) Ao grau de autonomia que as câmaras municipais das vilas da Província de São Paulo
passaram a ter, a partir de 1834, para formular e aprovar suas leis e posturas.
C) Ao fato de se ter ampliado a área de atuação do Conselho Geral da Província, criado pela
Constituição de 1824 e substituído, em 1834, pela Assembleia Provincial.
ESTÃO CORRETAS:
A) Apenas a I e II.
B) Apenas II e III.
C) Apenas I e III.
GABARITO
“Com quanto estes Corpos deliberantes tenhão preenchido a expectação da Nação, pelo
que respeita a providencias, e remedios locaes, que nem a Assembléa geral, nem o
Governo central poderião acautelar, com tudo algumas tem exorbitado das raias que
lhes marcou o Acto Addicional das reformas à Constituição, legislando sobre materias,
que aquelle Acto não lhes confiou.”
A observação alude:
Estão corretas:
Foi reconduzido à pasta do Império em 1840, onde permaneceu por algumas horas, na
tentativa de impedir a maioridade de D. Pedro. Com o golpe da maioridade afastou-se do
governo, mas manteve sua atuação política no Senado e no Conselho de Estado. Líder
dos regressistas, foram de sua autoria a Lei de Interpretação do Ato Adicional (1840) e o
restabelecimento do Conselho de Estado (1841). Criou, à frente da pasta do Império, o
Colégio de Pedro II (1838), trabalhou na reforma do Código de Processo Criminal (1842)
e contribuiu na elaboração do Código Comercial (1850).
É importante destacar que, a partir desses códigos, foram estabelecidos os tipos de crimes e
punições, ressaltando também a hierarquia existente na sociedade do Império, em que a
escravidão predominava. De todo modo, por meio desses códigos acreditava-se que o Império
poderia escapar de revoltas, insurreições e, caso ocorressem, os envolvidos seriam punidos
exemplarmente.
Entre as modificações que foram promovidas pelo Código Criminal estavam as penalidades em
caso de crimes. Desde o período colonial, existia a pena do degredo, sendo até mesmo o
Brasil o destino para quem era penalizado em Portugal. Com o Código Criminal, essa pena foi
substituída por outras, mais modernas e civilizadas. Em vez de receber essa penalidade, o
culpado teria que cumprir a pena de prisão com trabalho; isso fazia com que esses
“indesejáveis” tivessem utilidade, servindo como mão de obra gratuita para serviços públicos.
No entanto, nem todos teriam a mesma penalidade, uma vez que a graduação das penas era
de acordo com o caso, sendo o julgamento do juiz feito de forma individualizada. Portanto,
possivelmente as hierarquias presentes na sociedade determinariam a forma como alguns
crimes seriam punidos.
PENA DO DEGREDO
EXEMPLO
COMENTÁRIO
No entanto, em caso de líder da insurreição a pena seria a maior, a de morte. Por outro lado,
em caso de rebelião feita por não escravos, a pena seria mais leve; a mais dura era a prisão
perpétua com trabalhos forçados. Dessa forma, rebelar-se ou insurgir-se dependia da condição
jurídica:
ESCRAVO
Para o escravo, qualquer movimentação poderia ser vista como insurreição, recebendo penas
específicas diante de sua condição de escravizado.
NÃO ESCRAVO
Outros sujeitos, por sua vez, ao se rebelarem, poderiam escapar da morte e dos castigos
corporais, simplesmente por não serem escravos, mesmo se promovessem uma grande
revolta.
A hierarquia colonial acaba deixando esses castigos mais marcados pela afirmação étnica.
Um ponto importante sobre o Código diz respeito à religiosidade. Ao mesmo tempo em que a
Constituição não condenava o exercício de outras religiões, desde que fosse no âmbito
privado, o Código também não previa crimes de ordem religiosa, diferentemente da legislação
portuguesa, baseada nas Ordenações Filipinas. Nesse caso, caberia à Igreja legislar sobre
seus dogmas. No entanto, o Código possui uma moralidade que passa pela ideia religiosa
cristã de bons costumes e manutenção da ordem.
No entanto, a pena de prisão com trabalho era aplicada em um país onde a escravidão ainda
era vigente e forte como uma política econômica e social.
No entanto, diante das turbulências desse ano geradas pela crise política, que levou à
abdicação do Primeiro Imperador, apenas em novembro de 1832 foi aprovado o Código de
Processo Criminal, trazendo uma profunda reforma na administração judicial, que regulou a
parte da administração da Justiça Civil, tornando os promotores públicos responsáveis por ela.
Em linhas gerais, esse novo instrumento extinguiu os cargos de ouvidores, juízes de fora e
ordinários.
PRIMEIRA PARTE
A primeira, com o título Da organização judiciária, em seus capítulos, tem a criação do
escrivão, dos inspetores de quarteirões e de oficiais de justiça; o Capítulo 2 trata da
administração da Justiça Criminal, em que se estabeleceram as competências dos poderes
policiais, que teriam o monopólio da vigilância do cotidiano.
Também foi determinado que cada distrito teria um juiz de paz eleito, um escrivão, inspetores e
oficiais de justiça nomeados pelas câmaras municipais.
Esse código também ampliou os poderes do juiz de paz, que poderia interrogar, solicitar corpo
de delito, emitir denúncias, sentenciar e inocentar. Um ponto importante desse capítulo foi a
criação do “termo de bem viver”, documento que serviu para coagir a liberdade e criminalizar a
vadiagem.
No código, estabeleceu-se que os juízes de paz tinham competência para obrigar vadios,
mendigos, bêbados e prostitutas, entre outros tipos, a assinarem o termo de bem viver. Nessa
parte do Código, há também esclarecimento sobre os “inspetores de quarteirões”, que seriam
nomeados pela Câmara Municipal, estando cada rua submetida à autoridade de um inspetor,
vigilante na prevenção a crimes, que pareciam ser atribuições dos pobres.
O inspetor deveria fazer relatórios mensais sobre os suspeitos ou presos e seus dados, indo
essas informações para o juiz de paz, para o Ministério do Estado dos Negócios da Justiça,
que poderia ser acessado pelo imperador.
SEGUNDA PARTE
A segunda parte do código é chamada de Da forma do processo, com a regulamentação
burocrática do sistema judicial a respeito de audiências, provas, formas de pagar um crime.
Com o código de processo criminal foram extintas as Ouvidorias de Comarca, os juízes de fora
e ordinários e a jurisdição criminal de outras autoridades.
O aparelho judiciário ficou dividido nas províncias entre os Distritos de Paz, Termos e
Comarcas, e cada comarca teria juízes de órfãos, juízes municipais, promotores públicos e um
juiz de direito, nomeados pelo imperador.
Para a administração das cidades mais populosas foi criado o cargo de chefe de polícia, em
substituição ao de intendente de polícia, e a ampliação da atuação dos juízes de paz. No ano
seguinte, foram criados os guardas policiais nos distritos dos juízes de paz (VAINFAS, 2002, p.
584).
Essa reforma fez com que a Justiça se reorganizasse em torno da magistratura profissional
remunerada. Ela também confirmou o princípio da autoridade policial perante os outros
poderes, especialmente o de juiz de paz. Nessa reforma, foram extintas as juntas de paz e o
júri de acusação, tendo os juízes de direito poderes ampliados.
Os juízes de paz eleitos tiveram suas atribuições transferidas para os juízes municipais e
chefes de polícia, tendo estes últimos ampliado suas funções judiciais.
As mudanças também ocorreram entre os jurados, sendo exigido, então, que todos fossem
alfabetizados.
A partir dessa reforma, deixou-se o que era considerado Ministério Público sob o controle do
Executivo e subordinado ao Judiciário. Ou seja, os promotores poderiam ser nomeados e
demitidos por juízes, pelo imperador, pelos presidentes das províncias, não tendo, portanto,
independência no exercício de suas funções.
Apenas em 1874, houve o reconhecimento oficial do Ministério Público. Essa reforma foi a
base do sistema judiciário, que assim permaneceu até quase o final do Império, deixando os
liberais insatisfeitos.
Em setembro de 1871, na lei que data do dia 20, houve significativas mudanças na
organização da Justiça. Entre elas, ocorreu a separação das funções judiciais e policiais,
fazendo com que delegados e subdelegados exercessem apenas as atribuições policiais.
A lei regulou a prisão em flagrante delito. Também estabeleceu a fiança provisória e ampliou a
aplicação do habeas corpus.
Formação da culpa
Julgamentos
Apelações
A reforma concedeu mais direitos de defesa para os réus em processos criminais. Deu
preferência à polícia e ao controle social almejado pelos conservadores. Essa reforma foi feita
sob a gestão do Ministro da Justiça Francisco de Paula de Negreiros Sayão Lobato, o
Visconde de Niterói.
Além do Código Criminal estabelecido em 1830, ainda nessa década foi preciso construir
outras posturas a fim de que se regulassem os crimes cometidos pelos escravos. Isso ocorreu
diante das tensões criadas por revoltas escravas em um cenário de fim do tráfico de cativos.
A lei assinada em 10 de junho de 1835 (ainda no período regencial) visava reprimir os crimes
cometidos pelos escravos, sendo o principal instrumento de condenação à morte da população
cativa no Brasil, ampliando as tipologias de crimes que levariam à morte.
Por meio dessa lei, foi impossibilitado ao escravo recorrer da sentença, não podendo acionar o
Supremo ou Tribunal da Relação. O projeto de lei teve três discussões na Câmara dos
Deputados e três no Senado entre os anos de 1833 e 1834. Essa lei alterou o Código Criminal
e o Código de Processo Criminal.
Foi eleito deputado geral por diversos mandatos (1850, 1853, 1861 e 1867) e nomeado
senador do Império (1869) e conselheiro de Estado (1870). Ocupou a pasta da Justiça
duas vezes, durante os gabinetes do Marquês de Caxias (1861) e do Visconde do Rio
Branco (1871), tendo participado da promulgação da Lei do Ventre Livre.
PENA DE MORTE
No primeiro artigo da lei de 1835 foi estabelecida a pena de morte para escravos, homens ou
mulheres que matassem ou ferissem de forma grave o seu senhor, administrador, feitor, suas
mulheres e seus filhos. Anteriormente, o escravo que matasse poderia ter outros tipos de
morte; uma vez que poderia evocar atenuantes, podendo ser punido de outras formas, sem ser
a pena capital, de acordo com o Código Criminal.
De acordo com Ricardo Pirola, ao determinar penas mais severas aos praticantes de um crime
contra um grupo de pessoas (os donos dos escravos ou os envolvidos na administração), o
Estado mostrava também quem deveria ser protegido por essa nova lei. Caso o escravo ou
escrava cometesse o mesmo crime, assassinato ou ferisse gravemente alguém livre ou ainda
escravo, o julgamento continuaria baseado no Código criminal (PIROLA, 2012).
VERIFICAR
Colocar o julgamento e a condenação do escravo criminoso no local do crime ou na localidade
de residência do réu, fazia com que sua condenação servisse de exemplo para aqueles que o
conheciam, consequentemente, outros escravos.
Essa foi uma decisão de 1872, após discussões no Ministério da Justiça e no Conselho de
Estado. Para alguns autores, como Joaquim Nabuco, tal decisão é um exemplo da
progressão do processo emancipacionista no Brasil.
JOAQUIM NABUCO
Historiadores que se dedicaram a pensar a Justiça e o acesso a ela por parte dos escravos,
mostra que, com a decisão do monarca, os escravos recorreriam à polícia depois de
cometerem um crime, sendo, portanto:
Esse caso é um exemplo de como podemos combinar Justiça com escravidão e liberdade,
porque a primeira pode ser usada para a manutenção de uma ou de outra. Esses pedidos e a
concessão do perdão não eram generalizados e, segundo o autor, estão concentrados, no
século XIX, entre os anos 1870 e 1880.
De acordo com Pirola, o perfil de quem recebia o perdão ou a comutação das penas estava
associado àqueles que cometiam pequenos delitos, como agressões a pessoas que não eram
das famílias dos seus senhores, ou roubos.
Na década de 1870, houve uma mudança no perfil daqueles que receberam o benefício, sendo
antes os condenados à prisão perpétua e à pena de morte, mostrando que os crimes
cometidos eram mais graves do que os anteriores, cujos réus eram condenados a pequenas
penas.
RESUMINDO
A Justiça do Império não pode ser pensada deslocada da principal característica desse regime,
a escravidão. Portanto, o Código Criminal e a lei de 1835 são exemplos da construção de uma
Justiça para uma sociedade hierarquizada, a partir de uma distinção jurídica: ser ou não livre.
Desse modo, é fundamental pensar como a Justiça para a liberdade desses escravos começou
a ser construída, a despeito das críticas feitas a ela por abolicionistas e escravistas.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. OS CÓDIGOS PENAIS TÊM FUNÇÕES DIVERSAS, DEPENDENDO DE
SEUS CONTEXTOS. PENSANDO EM UMA SOCIEDADE ESCRAVOCRATA
COMO A BRASILEIRA, PODEMOS NOTAR QUE UMA DE SUAS FUNÇÕES
É:
A) Criar um clima punitivista e de hierarquia social, com elementos que reforçam a segregação
entre trabalhadores braçais e os membros da sociedade.
B) Criar o estatuto de escravidão, até então tácito, definindo regulamentos jurídicos e punições
para fugitivos.
E) Estabelecer modelos de Justiça para membros sociais diferentes, fazendo existir várias
justiças concomitantes no Brasil.
D) A Constituição atingiu seu objetivo, pois uma de suas principais ordens era a criação de
códigos de processo que não existiam no Brasil.
O Código Penal brasileiro faz parte do conjunto de reformas judiciais do Império que, tanto no
Primeiro Reinado como na Regência acabam por ofertar a singularização das relações, a
institucionalização de sistemas prisionais. Acontece que leis acabam por refletir aspectos
sociais e garantir o ordenamento e a manutenção da sociedade, no caso de uma sociedade
escravocrata.
MÓDULO 4
ESCRAVIDÃO E IMPÉRIO
Assista ao vídeo Os abolicionistas brasileiros.
Compreender que leis são essas e como foram usadas pelo Estado e por escravizados ou
cidadãos a fim de justificar a escravização ou demandar liberdade serve para ampliar não
apenas o conhecimento a respeito do campo jurídico, mas também como ele pôde ser usado e
manipulado de acordo com interesses de um momento político.
ALFORRIAS
Carta jurídica colonial usada pelo senhor para reconhecer que seu escravo ganhou a
condição de liberdade por concessão ou compra. A decisão era dos senhores e os
agentes das compras poderiam ser os próprios escravos, a partir de ações que lhe
permitiam ganhos como atuação nas minas e de serviços nas cidades. A Igreja, por meio
de irmandades de homens negros, com alforriados e beneméritos também compravam
alforrias.
VOCÊ SABIA
Um dos funcionários públicos notórios nessa função foi Machado de Assis, tendo elaborado
importantes pareceres pró-homens negros pleiteantes.
Esse ponto é importante para notarmos que as batalhas jurídicas que se seguem não foram
articuladas como benesse ou caridade, mas fruto de uma luta histórica. Já havia nomes
importantes sobre a questão da escravidão no Brasil, parte em defesa da modernização do
país, mas parte oriunda de descendência, adoção, estudos e que passam a militar pelos
direitos.
Esses aspectos podem ser reforçados quando percebemos que, quando terminou o estatuto de
escravo em grandes cidades no Brasil, a maior parte da população negra já havia conseguido
sua liberdade.
LEI FEIJÓ
A primeira lei que interferiu nas relações escravistas no Brasil foi a de 1831, promulgada em 7
de novembro, e que ficou conhecida como Lei Feijó. Essa lei foi a primeira que proibiu a
entrada de escravos africanos no Império, sendo uma ação realizada nos meses seguintes à
abdicação do imperador. Foi construída a partir de arranjos com a Inglaterra, a fim de que a
Independência do Brasil pudesse ser reconhecida.
A repressão ao tráfico já vinha ocorrendo desde o início do século nas colônias inglesas e isso
afetava o Brasil, à medida que proibir o tráfico seria acabar com um lucrativo comércio. Apesar
disso, a lei de 1831 causou um impacto significativo no trânsito de pessoas africanas para
escravização.
Se por um lado, após essa data qualquer africano que entrasse no Brasil para ser escravizado
estaria aqui de forma ilegal, por outro, os que permaneceram nesse negócio, o tráfico de
escravos, tiveram que aprimorar esse trânsito para ter um aumento significativo em seus
lucros.
É interessante pensar em como uma lei, que muitos dizem que era para “inglês ver”, mobilizou
o parlamento nos anos seguintes, a fim de se discutir sua possível revogação, exatamente por
ferir interesses daqueles que eram dependentes do tráfico e que lucravam com esse comércio.
No entanto, a aplicação da lei não foi eficiente para acabar com a entrada de africanos,
piorando sensivelmente a forma como eles chegavam, já que não havia mais fiscalização,
inspeção de saúde e outros trâmites dos tempos da legalidade desse comércio.
Fonte: Shutterstock.com
Escravidão na África, Journal des Voyage, Travel Journal, (1880-81).
Em 1850, a Lei nº 581 proibiu novamente o tráfico e logo confirmou a validade da lei de 1831.
A fim de ser cumprida, a nova lei modificou também alguns pontos da anterior, entre eles, os
que seriam responsabilizados criminalmente pelo contrabando, não sendo mais os fazendeiros
que comprassem os escravizados ilegais. Outro ponto importante da lei de 1850 é que ela não
revogou a de 1831, mas garantiu os direitos de propriedade daqueles que adquiriram escravos
entre as duas leis.
Após 14 dias da aprovação da Lei Eusébio de Queirós, outra foi aprovada, a de número 601,
de 18 de setembro, conhecida como Lei de Terras. Nela, havia a determinação de que as terras
devolutas não poderiam ser ocupadas por qualquer outro título que não o de compra ao Estado
em hasta pública, garantindo, porém, os direitos dos ocupantes de terra por posse mansa e
pacífica e dos possuidores de sesmarias com empreendimentos agrícolas instalados até
aquela data (VAINFAS, 2002. p. 466).
Essa lei fazia parte de um movimento de mudança na política de terras, projeto visado desde a
Independência, uma vez que houve a revogação do instituto de doação de sesmarias. Tal
medida impedia a posse da terra que não fosse a da compra, fazendo com que seu acesso
fosse limitado para libertos e imigrantes. Apesar do fim do tráfico, a escravidão saía dessa
década fortalecida, principalmente no campo, que passava a ser propriedade de poucos.
Os filhos nascidos dessas mulheres, chamados de “ingênuos”, deveriam ficar com a mãe até
os oito anos de idade, sob os cuidados dos senhores das mães; após esse período, o senhor
poderia optar por entregar a criança ao Estado e receber uma indenização, ou ficar com a
criança até ela completar 21 anos de idade, usando seus serviços ao longo do tempo como
forma de indenização.
Apesar de a lei ser conservadora quanto a estabelecer a liberdade dos escravos, causou
profundo debate na sociedade e no parlamento, que a via como uma grande interferência nas
relações entre senhor e escravo. Por meio dessa lei, de fato, o Estado passava a interferir no
cotidiano da escravidão ao determinar o destino daqueles nascidos das mulheres
escravizadas.
Essa lei ficou conhecida também como Lei Rio Branco, por ter sido o Visconde do Rio Branco,
chefe do gabinete conservador, o responsável pelo encaminhamento do projeto para debate e
luta no parlamento. Os efeitos dessa lei para o destino da escravidão são difíceis de analisar
no calor dos acontecimentos naquela época.
No entanto, foi um importante passo para a conquista da liberdade, uma vez que, para além do
ventre, a lei regulava a possibilidade de alforria, prática que não era regulamentada até então.
Para historiadores especialistas na temática, a lei, criticada por senhores e abolicionistas, deu
um parâmetro de como deveria ocorrer o processo da abolição, principalmente na defesa de
um processo dentro da ordem legal.
LEI DOS SEXAGENÁRIOS
Se os filhos das escravas estavam “libertos” por meio de uma lei, outra era necessária para
libertar os mais velhos. A lei de 28 de setembro de 1885, de número 3270, foi chamada de Lei
dos Sexagenários por libertar os escravos com mais de 60 anos, sendo mais uma do conjunto
jurídico que orientava o fim da escravidão, mas não sendo esta sua única finalidade.
Essa lei também regulava a sociedade livre, principalmente nas relações entre libertos e ex-
senhores, de acordo com Mendonça (2008. p. 41).
No que se refere à libertação dos escravos, era preciso que houvesse uma indenização aos
senhores, que receberiam três anos de serviço do escravo a ser libertado. Além disso, quem
fosse libertado deveria permanecer por cinco anos nos municípios onde eram escravizados e
assinar um contrato de trabalho sob pena de prisão.
Esse foi o fim de um projeto anterior, que sofreu críticas no parlamento e uma batalha política
intensa. Tal lei seria a última forma de combater o movimento abolicionista acreditando-se nela
como um importante instrumento para eliminar a escravidão de forma gradual, lenta e sem
traumas econômicos para os senhores, proprietários de escravos.
LEI ÁUREA
A última lei da Justiça do Império que teve a escravidão como tema foi a que acabou com a
escravidão em definitivo e que ficou conhecida como Lei Áurea. As leis anteriores haviam
marcado uma espécie de gradualismo para o fim da escravidão. Desde 1831, com a lei que
determinou a proibição de africanos para a escravização; com a de 1871, quando não
nasceriam mais escravos; até a de 1885, que libertou os mais velhos, acreditava-se que já
estava pronto o terreno jurídico para o fim da escravidão.
Era preciso aguardar o tempo e, simultaneamente, preparar os futuros libertos para a vida em
liberdade. No entanto, seriam precisos muitos anos para que o Brasil deixasse de ter escravos,
caso não houvesse uma ação imediata.
O fim da escravidão ocorreu também por meio de uma lei, a de número 3.353, que tinha
apenas dois artigos e era bastante curta se comparada às outras, sem deixar possibilidade
para contestação ou subterfúgios para a permanência da escravidão no Brasil, a partir de 13 de
maio de 1888, data de sua assinatura.
Um artigo extinguiu a escravidão, sem dar maiores detalhes, e o segundo artigo revogava as
disposições em contrário, ou seja, anulava qualquer possibilidade de uso da mão de obra
escrava que havia sido permitida pelas leis anteriores.
Podemos considerá-la como a lei mais importante do Império por terminar com a principal
característica desse regime: a escravidão.
Apesar de finda a escravidão, restavam aqueles que foram penalizados por crimes cometidos
ainda quando eram escravos. Uma vez que a escravidão não mais existiria, precisaria haver
também a revisão dessas penalidades. Em 13 de maio de 1889, o monarca pediu a revisão
geral dos processos de réus condenados pela lei de 1835. De acordo com Pirola (2016, p.139),
algumas penas foram revistas e publicadas no aniversário do primeiro ano da abolição.
ATENÇÃO
É importante mencionar que recorrer à Justiça em busca de liberdade antes de 1888 foi a
escolha de muitos homens e mulheres escravizados, que utilizaram essas leis como forma de
reivindicar o direito de liberdade. Muitos historiadores já se debruçaram sobre vasta
documentação que menciona as ações de escravizados em busca de direitos, baseando-se em
artigos de leis ou em outros artifícios, tais como promessas de liberdade feitas por senhores no
leito de morte ou testamentos não cumpridos, quando havia clara intenção de liberdade, mas
com os herdeiros não cumprindo a vontade do senhor falecido.
A Justiça do Império ocupou-se de diversas ações de homens e mulheres que não se viam
mais como escravizados por entenderem que alguns artigos de algumas leis davam a eles o
direito de gozar o restante da vida em liberdade. O processo abolicionista no Brasil pode e
deve ser visto tendo a Justiça como parâmetro e como uma solução para a conquista da
liberdade antes de 1888.
Assista ao vídeo A batalha por direitos e o processo jurídico para o fim da escravidão.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
B) As ações progressistas das leis Eusébio de Queirós, Sexagenário e Ventre Livre mostram a
predominância desse grupo político que articula o fim da escravidão.
C) As ações paliativas não tiveram efeito prático de nenhuma monta, sendo a ação necessária
a da Princesa Isabel, valendo-se do Poder Moderador para propor a libertação dos escravos.
GABARITO
A lei de 1888 foi a única que acabou definitivamente com a escravidão. É importante pontuar
como ela é fruto de um processo e que todas as outras dialogam com a sua realidade. O que
temos nesse momento não é a libertação dos escravos, mas sim a impossibilidade legal de
homens e mulheres serem escravizados no Brasil.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A legislação do Império do Brasil é vasta e rica no que se refere à organização administrativa
desse sistema político, até então inédito nas Américas. Estudar essa legislação é entender as
peculiaridades do momento em que ela foi feita, os interesses envolvidos e a dinâmica do
processo histórico.
Ao mesmo tempo, o Império do Brasil foi herdeiro de tradições portuguesas, no que se refere
às instituições aqui implementadas, mas adaptadas ou eliminadas após a Independência.
Podemos ver o Segundo Reinado como um momento também de reformulação dessa herança
e de atendimento de interesses de uma elite já estabelecida no Império e que pretendia
continuar gozando de privilégios, entre eles o uso da mão de obra escrava. Entretanto, a
legislação que impunha limites nas ações dos escravos foi também a forma encontrada pelo
Estado para eliminar a escravidão, e usada pelos próprios escravizados para reivindicar a
liberdade.
Desse modo, a justiça no Império foi feita por diferentes sujeitos e demandada por toda a
sociedade, mesmo aqueles que não fossem considerados cidadãos pelos primeiros
legisladores.
FALA, MESTRE!