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AVALIAÇÃO DA FORÇA MUSCULAR E AMPLITUDE

DE MOVIMENTO EM PACIENTE PORTADOR DE


ATAXIA DE FRIEDREICH: UM ESTUDO DE CASO
Bruna Turela da Silveira1, Magali Teresinha Quevedo Grave2, Eduardo Périco3

Resumo: Contextualização: Ataxia de Friedreich é uma doença genética rara, neurodegenerativa, cujos
sintomas manifestam-se durante a puberdade, levando o paciente a perda gradual da função postural.
Objetivo: verificar a força muscular e amplitude de movimento (ADM) de membros superiores (MMSS)
em um sujeito de 30 anos, portador de Ataxia de Friedrich, após tratamento fisioterapêutico. Como
instrumentos de avaliação foram utilizados o sistema de graduação de força muscular e goniometria.
Metodologia: a pesquisa constituiu-se de um estudo de caso experimental e descritivo, de caráter
quantitativo, cuja intervenção ocorreu na residência do paciente, no decorrer do ano de 2009. O
tratamento fisioterapêutico baseou-se no conceito neuroevolutivo Bobath. Resultados comparativos entre
a 1ª e 32ª sessões, indicam aumento na ADM e força muscular de membros superiores, após intervenção.
Conclusão: a partir dos dados coletados neste estudo, conclui-se que a fisioterapia é de suma importância
na manutenção da qualidade de vida de sujeitos com doenças neurodegenerativas, o que reforça a
importância da fisioterapia na qualidade de vida destes sujeitos.

Palavras-chave: Ataxia de Friedreich. Membros superiores. Atividade de vida diária. Fisioterapia.

MUSCLE STRENGTH AND RANGE OF MOVEMENT


ASSESSMENT IN A PATIENT WITH FRIEDREICH'S
ATAXIA: A CASE STUDY

Abstract: Background: Friedreich's ataxia is a rare genetic neurodegenerative disease, whose symptoms
appear during puberty, leading patients to gradual loss of postural function. Objective: to assess muscle
strength and range of motion (ROM) of upper limbs in a 30-year-old individual with Friedrich's ataxia
after physiotherapeutic therapy. The grading system of muscle strength and goniometry were used as
assessment tools. Methodology: The survey consisted of a case study of experimental and descriptive
quantitative character, whose intervention took place at the residence of the patient, during 2009. The
physiotherapeutic treatment was based on the Bobath neuroevolutive concept. Results: Comparative
results between the first and 32nd session indicate an increase in ROM and muscle strength of upper limbs
after the intervention. Conclusion: Based on data collected in this study, we conclude that physiotherapy

1 Fisioterapeuta. E-mail: bruturela@yahhoo.com.br

2 Fisioterapeuta. Mestre em Desenvolvimento Regional (UNISC/RS). Doutoranda em Ciências da


Saúde (PUCRS). Docente do Centro Universitário UNIVATES. E-mail: mgrave@univates.br

3 Biólogo. Doutor em Ecologia (USP-SP), docente do Centro Universitário UNIVATES/Lajeado/


RS-Brasil. Coordenador do Programa de pós-graduação em Ambiente e Desenvolvimento. E-mail:
perico@univates.br
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is of paramount importance in maintaining the quality of life of individuals with neurodegenerative


diseases, what reinforces the importance of physiotherapy in the quality of life of these individuals.

Keywords: Friedreich's ataxia. Upper limbs. Daily activity. Physiotherapy.

introdução
A Ataxia de Friedreich é uma doença genética de caráter autossômico
recessivo. Manifesta-se lenta e progressivamente e pode levar à incapacidade total
(CLARKSON, 2002). Os primeiros sintomas de perda das capacidades funcionais
aparecem na adolescência ou início da vida adulta com incoordenação motora,
desequilíbrio, nistagmo, fala escandida e arreflexia tendínea profunda (SOUZA, 2003;
SUBRAMONY et al., 2009).
Segundo Sendereck et al. (2005), a Ataxia de Friedreich tem início normalmente
entre 5 e 15 anos de idade e a prevalência na América do Norte e na Europa é de cerca
de dois casos por 100.000 habitantes, com uma frequência de portadores de cerca de
1:120. Rowland (2002) e Doretto (2005) citam que não existe preferência significativa
por gênero, embora seja mais frequente em homens que em mulheres e “incide em
todas as raças” (ALBIN, 2003; KUMAR; COLLINS, 2000).
A evolução da doença é progressiva e a maioria dos pacientes não consegue andar
15 anos após o início dos sintomas, embora haja variabilidade na razão de progressão.
O óbito, em média, ocorre entre 40 e 60 anos e decorre de infecção respiratória ou
cardiopatia (ROWLAND, 2002).
Pode ser encontrada em combinações com outros distúrbios neurológicos, como
síndromes extrapiramidais, atrofia muscular neurogênica, polineuropatia e miopatia,
embora existam dúvidas se seriam distúrbios distintos ou devidos a efeitos politrópicos
do gene (DIAMENT; CYPEL, 2005).
O gene para Ataxia de Friedrich se situa na porção proximal do braço longo do
cromossomo 9, na região 9q 13 e, na maioria dos casos, há uma expansão da repetição
de trinucleotídeos GAA (guanina, adenina) no primeiro íntron de um gene que
codifica uma proteína denominada Frataxina. Os indivíduos afetados herdam formas
anormais do gene da Frataxina de ambos os pais e possuem níveis baixíssimos da
proteína (HARDING, 1989). O tamanho de GAA, todavia não explica inteiramente
a variabilidade na idade de início ou na razão de progressão; outros fatores contribuem
para isso, incluindo o mosaicismo somático e outros modificadores genéticos ou
ambientais (ROWLAND, 2002; JESEL, 2007).
As alterações decorrentes da ausência/diminuição de Frataxina acometem
principalmente a medula; as lesões são marcantes nos tratos espinocerebelares, tratos
do funículo posterior, e tratos corticoespinhais, bilateralmente e também acometem
difusamente o cerebelo, sendo frequente o acometimento do núcleo denteado
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(DORETTO, 2005). A degeneração é observada em grandes fibras sensoriais


mielínicas dos nervos periféricos. O cerebelo é envolvido em algum grau (as células de
Purkinje e núcleos denteados). Ocorre em grau menor de patologia na ponte, medula,
coluna de Clarke e raízes dorsais, e nos gânglios das raízes dorsais (KOTTKE, 1994;
ROSSI et al., 2007).
Para Diament e Cypel (2005); Mayo et al. (1999), o processo degenerativo é
máximo na região lombossacra e diminui à medida que se sobe na medula, às vezes,
são afetados os cornos anteriores e posteriores. Microscopicamente, observam-se
degeneração axonal, desmielinização e gliose reacional. Essas alterações são mais
intensas na coluna de Clarke, na qual são observadas despopulação e desintegração
neuronal. No cerebelo observam-se desaparecimento das células de Purkinje e rarefação
da camada granular. Em decorrência, os pacientes perdem a função postural antes dos
30 anos de idade (JESEL, 2007; SOUZA, 2003). A fala torna-se escandida, pastosa,
explosiva, a articulação fica alterada e os movimentos respiratórios tornam-se atáxicos
e irregulares. A fraqueza muscular varia desde simples fatigabilidade até severas
paralisias, as quais são geralmente mais tardias e predominando nas porções distais.
Os déficits sensitivos também são tardios, envolvendo duas modalidades, superficial
e profunda; nessa, atinge as sensibilidades postural, vibratória e articular (SOUZA,
2003; JOHNSTON et al., 2004).
Os reflexos profundos desaparecem mais cedo nos membros inferiores e, depois,
nos superiores. Os reflexos superficiais abdominais e os cremasterinos podem estar
presentes ou ausentes. As seguintes anormalidades podem estar presentes, mas não
em todos os casos: nistagmo horizontal bilateral, usualmente, só ao olhar lateral em
70% (geralmente atribuída à fraqueza muscular desigual nos dois hemicorpos), mão em
garra em menor proporção, anormalidades cardíacas em 60 a 80% (incluindo miocardite
intersticial, crônica com pronunciada hipertrofia cardíaca, fibrose miocárdica, estenose
mitral e oclusão coronariana), diabetes mellitus em 25% ou mais e atrofia óptica
acentuada, frequente em certas famílias (cerca de 10% delas). Ocasionalmente, as
seguintes anormalidades podem apresentar-se: degeneração retiniana, paralisias
oculares externas e perdas auditivas (DIAMENT; CYPEL, 2005).
O diagnóstico é obtido por critérios clínicos e exames complementares. A
eletroneuromiografia demonstra, em muitos casos, uma leve ou moderada redução
das velocidades de condução dos nervos periféricos. Os exames de tomografia
computadorizada ou ressonância magnética de crânio revelam, em alguns casos, atrofia
do cerebelo. O diagnóstico definitivo é obtido pelo exame de DNA (ROWLAND,
2002; SOUZA, 2003; RODRIGUEZ et al., 2006).
Os achados laboratoriais incluem alterações eletrocardiográficas características e
evidências ecocardiográficas de hipertrofia ventricular concêntrica ou, mais raramente,
hipertrofia septal assimétrica. A tomografia cerebral e a ressonância magnética do
cérebro costumam ser normais, mas pode haver uma leve atrofia cerebelar. A atrofia

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da medula espinhal cervical pode ser detectada por meio de ressonância magnética. O
líquido cefalorraquidiano está normal (ROWLAND, 2002).
O teste genético para Ataxia de Friedreich utiliza uma pequena amostra de
sangue para determinar se os cromossomos da pessoa testada contêm a expansão da
tripla repetição no gene correspondente (análise direta do gene no cromossomo 9).
As mutações de ponto são mais difíceis de detectar (a expansão da repetição GAA,
indicando uma mutação gênica, explica cerca de 96% dos casos), mas este tipo de
teste também pode ser realizado por alguns laboratórios. Em quase todos os casos, o
resultado do teste pode determinar definitivamente se a Ataxia de Friedreich é ou não o
diagnóstico correto (SCHULZ; NICHOLAS, 2009).
O tratamento é baseado na fisioterapia motora, na prevenção das deformidades
e no treino de marcha (ROTTA et al., 2004). Atenção especial deve ser dada para
a possibilidade de comprometimento cardíaco. O uso de muletas e de andadores é
especialmente útil para o auxílio da marcha. A cirurgia para correção da escoliose está
indicada dependendo do grau da deformidade e da função respiratória. Cadeiras de
rodas podem ser úteis quando houver grande instabilidade na deambulação (SOUZA,
2003; DORETTO, 2005).
Estudos referentes à evolução do quadro neuromotor desta doença são escassos e
por isto, o trabalho propôs-se a aprofundar os conhecimentos sobre Ataxia de Friedreich
e verificar se a fisioterapia contribui na manutenção da força muscular e amplitude de
movimento (ADM) de membros superiores (MMSS) em um paciente de 30 anos de
idade, portador de Ataxia de Friedrich, dependente de cadeira de rodas há 15 anos.

MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo de caso experimental e descritivo de caráter quantitativo,
que utilizou como métodos de avaliação o Sistema de Graduação de Força Muscular e a
Goniometria em MMSS, incluindo flexores, extensores, abdutores, adutores, rotadores
mediais e laterais de ombro; flexores e extensores de cotovelo; flexores e extensores de
punho. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COEP) do Centro
Universitário UNIVATES, sob protocolo nº 005/09 e prévia autorização do paciente e
de seu cuidador.
O tratamento fisioterapêutico foi realizado na residência do paciente, duas vezes por
semana, durante 16 semanas, num total de 32 sessões, distribuídas em 45 minutos cada,
no ano de 2009. Na 1ª e na 32ª sessões foram realizadas as avaliações da força muscular
e da ADM dos MMSS e nas demais houve intervenção fisioterapêutica. No primeiro
encontro foi realizada uma entrevista de anamnese com os pais, que informaram dados
sobre o histórico e evolução da doença.

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O sistema de graduação de força muscular tem sido amplamente utilizado por


fisioterapeutas e os graus variam de zero a cinco, onde zero significa ausência de
contração; grau 1 quando há contração muscular, porém, insuficiente para realização de
movimentos; grau 2 é atribuído quando há movimento em toda sua amplitude com força
nula da gravidade; grau 3 quando o movimento é reduzido com força gravitacional,
sem nenhuma outra resistência; grau 4 no qual o músculo realiza movimento contra a
gravidade e uma resistência moderada pode ser aplicada, e por fim, o grau 5 é conferido
quando o músculo realiza o movimento completo contra força da gravidade e uma
resistência adequada para cada grupo muscular.
As medidas goniométricas são usadas pelo fisioterapeuta para quantificar a
limitação dos ângulos articulares, decidir a intervenção terapêutica mais apropriada
e, ainda, documentar a eficácia desta intervenção. É provavelmente o procedimento
mais utilizado para se fazer avaliação e pode ser considerado como parte essencial da
ciência da Fisioterapia (MARQUES, 2003). Para avaliar o grau de amplitude articular
os movimentos foram realizados ativamente, até o limite do paciente. Após, foram
realizados passivamente pela pesquisadora.
Priorizou-se o tratamento em músculos-chaves na execução de atividades
funcionais, como vestimenta, alimentação e higiene pessoal, visto que o paciente possui
controle cefálico e de tronco, permanece a maior parte do dia na cadeira de rodas, não
realiza transferências ativamente e não deambula.
Foram utilizados exercícios e técnicas embasadas no Conceito Neuroevolutivo
Bobath, uma abordagem de resolução de problemas para a avaliação e tratamento de
pessoas com distúrbios do movimento, função e controle postural, que busca a inibição
de padrões anormais de postura e movimento, com vistas à facilitação de atividades
funcionais (FLEHMIG, 2005).
Para finalização dos resultados obtidos neste estudo, no 32º encontro houve
a reavaliação da força muscular e da amplitude de movimento dos MMSS, após 30
sessões de intervenção fisioterapêutica que incluiu estimulação sensorial, manutenções
e mudanças de postura, contrações musculares, treino de atividades de vida diária,
orientações aos familiares e avaliação ergonômica do ambiente.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Histórico do paciente:
O paciente, segundo seus pais, teve o desenvolvimento psicomotor compatível ao
que se espera de uma criança. Falou as primeiras palavras aos 9 meses e aos 14 meses
deu os primeiros passos sem apoio. Aos 12 anos sua mãe foi chamada na escola, pois
o filho não conseguia acompanhar as aulas de educação física, “tropeçava nos próprios
pés” e caia com facilidade. Consultou com neurologista, que atestou “ausência de
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alteração”. Aos 13 anos já não conseguia manter-se em pé sem apoio e “pendia sempre
para um lado do corpo”. Em 1995, aos 19 anos, a doença foi diagnosticada.
Atualmente, aos 32 anos, o paciente se expressa pelo olhar, apresenta sialorreia,
é dependente em atividades de vida diária (AVDs). Não apresenta deformidades
estruturais e possui controle de cabeça e de tronco. Do ponto de vista cognitivo,
mantém inteligência íntegra, é disposto e colaborativo.
Tabela 1 – Sistema de graduação da força muscular na primeira e última sessões, nos
músculos dos ombros, cotovelos e punhos (D/E).
Grupos musculares 1ª sessão (03.03.2009) 32ª sessão (20.12.2009)
Ombro D/E Grau de força muscular Grau de força muscular
Flexores ombro 1/1 3/3
Extensores de ombro 1/1 2/2
Abdutores de ombro 1/1 3/3
Adutores de ombro 2/2 3/3
Rotadores mediais 2/2 3/3
Rotadores laterais 2/2 3/3
Cotovelo D/E    
Flexores 1/1 3/3
Extensores 1/1 2/2
Punho D/E    
Flexores 1/1 3/3
Extensores 0/0 2/2

A Tabela 1 apresenta o resultado quando aplicado o Sistema de Graduação de Força


Muscular na primeira e na última sessões nos músculos dos ombros, cotovelos e punhos
direito e esquerdo, respectivamente. Observa-se que o paciente apresentou ganho
de força muscular em todos os músculos testados, após intervenção fisioterapêutica.
Ressalta-se que a maior evolução em termos de ganho de força muscular ocorreu nos
abdutores e flexores de ombro, flexores de cotovelo e punho, passando de grau 1 para
grau 3 e nos extensores de punho bilateral, que passaram de grau zero a grau 2. Este é
um dado relevante, considerando que um grupo muscular avaliado em 1 tem contração
muscular, porém esta é insuficiente para a realização de movimentos; o grau 3, por sua
vez, possibilita a realização de movimentos contra a ação da gravidade. O ganho de força
muscular para extensores de punho D/E permitiram ao paciente um posicionamento
mais funcional de ambas as mãos, facilitando a preensão manual de objetos. Para Souza
(2003), a fraqueza muscular varia desde simples fatigabilidade até severas paralisias, as
quais são geralmente mais tardias. Isto pode ser explicado pela falta total de atividade
física, pois há mais de quatro anos o rapaz não realizava nenhum tipo de atividade física
(LIANZA, 2004; MARQUES, 2003).

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Doretto (2005) admite que não existe tratamento específico, no entanto,


considerando-se a evolução lenta da doença, a fisioterapia exerce papel primordial
em suavizar a sintomatologia neurológica, além de retardar sua progressão. O grau 3
de força muscular alcançado após a fisioterapia pelos grupos musculares dos flexores,
abdutores, adutores, rotadores mediais e rotadores laterais dos MMSS contribuíram
para melhorar a qualidade de vida do paciente, permitindo-lhe a realização de várias
atividades funcionais.
Tabela 2 – Medição inicial (03.03.09) e final (20.12.09) da ADM passiva através da
Goniometria nos MMSS (D/E).
LADO
ARTICULAÇÃO LADO ESQUERDO
DIREITO
OMBRO
Flexão 150°/170° 150°/170°
Extensão 30°/40° 35°/40°
Abdução 100º/140° 100°/140°
Adução 40°/40° 30°/50°
Rotação medial 80°/80° 80°/80°
Rotação lateral 60°/60° 60°/60°
COTOVELO
Flexão 110/140° 110°/140°
RADIOULNAR
Supinação 70°/70° 70°/70°
Pronação 60°/80° 80°/80°
PUNHO
Flexão 50º/60° 50°/60°
Extensão 10°/40° 10°/40°
Desvio ulnar 20°/20° 20°/20°
Desvio radial 30°/40° 30°/30°

A Tabela 2 apresenta a medição inicial e final da goniometria nos MMSS D/E


e serão considerados os movimentos nos quais houve alteração do ângulo articular,
mediante movimentação passiva, na 1ª e 32ª sessões. Na flexão do ombro D/E o
paciente apresentou aumento de ADM passiva de 150° para 170°; no movimento de
abdução do ombro D/E houve aumento de 40º na ADM. O movimento de flexão do
cotovelo D/E passou de 110º para 140º. Os movimentos de flexão e extensão do punho
ganharam, respectivamente 10 e 30º de amplitude articular, o que, de uma maneira
geral pode ser um bom indicativo de que o tratamento fisioterapêutico foi eficiente para
esta modalidade.
Os demais ângulos articulares se mantiveram inalterados. Marques (2003) relata
que a goniometria deve ser feita no início e no final do tratamento, permitindo, desta

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forma, fazer comparações dos resultados obtidos, e até avaliar se o tratamento proposto
foi eficaz. Nesse sentido, o tratamento realizado foi de grande importância, pois o
paciente não apresentou nenhuma perda, mas sim manutenção e evolução dos ângulos
articulares.
As medidas goniométricas são usadas pelo fisioterapeuta para quantificar
a amplitude dos ângulos articulares, decidir a intervenção terapêutica e, ainda,
documentar a eficácia desta intervenção. Os valores obtidos com a goniometria podem
fornecer informações para avaliar o procedimento de melhora ou recuperação funcional
e estabelecer os objetivos do tratamento (MARTÍNEZ et al., 2000).

Considerações finais
Mediante a comparação dos dados de avaliação e resultados obtidos a partir dos
protocolos de avaliação da Força Muscular Manual e da Goniometria, após intervenção
fisioterapêutica baseada no Conceito Neuroevolutivo Bobath, em 30 sessões de 45
minutos de fisioterapia domiciliar, pode-se inferir que a fisioterapia no ambiente
doméstico contribuiu positivamente para a manutenção da amplitude de movimento e
ganho de força muscular em músculos-chaves dos membros superiores, fundamentais
na realização de atividades funcionais como alimentar-se, pentear-se, movimentar a
cadeira de rodas, dentre outras.
Estes resultados podem ser considerados relevantes, visto que a Ataxia de
Friedrich, mesmo sendo uma doença neurodegenerativa progressiva, pode ter o seu
curso evolutivo retardado por meio da realização de atividades físicas e tratamento
fisioterapêutico especializado.
À medida que os atendimentos fisioterapêuticos eram realizados, além de
proporcionarem momentos de prazer para o paciente e sua família, conforme seu relato,
serviam igualmente para despertar-lhe o desejo de “melhorar”. A cada nova experiência
observou-se a comprovação de que atividades funcionais são de extrema importância
para a melhoria da qualidade de vida, tanto do paciente, quanto de seus familiares, que
aprenderam maneiras mais adequadas para fazer as transferências de seu filho, evitando
a sobrecarga de peso, bem como, a utilizar de forma ergonômica o ambiente doméstico.
Além do atendimento fisioterapêutico convencional, a partir deste estudo, fica
evidente a importância da família como facilitadora do processo de reabilitação de
seu “doente”, como também, a necessidade da avaliação e adaptação do ambiente
doméstico. Nesse sentido, abrem-se portas para profissionais da área da saúde
sentirem-se estimulados a continuar os estudos sobre esta doença, sempre com a
intenção de melhorar a qualidade de vida dos sujeitos acometidos e de seus cuidadores,
principalmente, no ambiente em que estão inseridos, pois a residência é o local onde
passam a maior parte do dia.

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