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29/04/2022

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DA
TÉCNICA DO CANTO LÍRICO
DR. MARCELO FERREIRA – FASM

INTRODUÇÃO

• Canto antecede todas as formas de performance musical;


• Todas as culturas cantam ou cantaram;
• Para se estudar a “Pré-História” da pedagogia vocal, precisamos estudar a
História do Canto.
• Como sempre, os melhores registro são da música das classes mais
altas;

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MESOPOTÂMIA

Sumérios:
• Canções de Casamento;
• Lamentos Funerais;
• Canções de Guerra;
• Canções Infantis;
• Música sacra cerimonial e para procissões;
• Épicos cantados com acompanhamento
instrumental.

MESOPOTÂMIA

• Hinos de Enheduanna – 2300 AEC (apenas texto);


• Babilônios criaram a mais antiga forma de notação musical (~1800 AEC)
• Escala de sete nota, sete escalas;
• Peça musical (quase completa) mais antiga conhecida:
• ~1350 AEC
• Poema em Hurrian
• Provavelmente um hino para Nikkal, esposa do deus da lua.

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CHINA ANTIGA

Primeira história confiável da China vem do trabalho de


Ssu-ma Ch´ien e seu pai;
• Shih-chi (Os arquivos do grande historiador);
• Narra os eventos da história do mundo do ponto
de vida dos Chineses
• Do período do Imperador Amarelo até o reino de
Wu da dinastia Han (2500 BCE – 90 BCE).
• 130 capítulos, incluindo 8 tratados;
• Rituais e Música, e Tubos Musicais e o Calendário.

“ATRAVÉS DA MÚSICA, A ALEGRIA


É ALCANÇADA, E ASSIM ELA
SOBRESSAI EM HARMONIA E PAZ
[…] ASSIM OS RITUAIS REGULAM A
HUMANIDADE, MÚSICA ESPALHA
HARMONIA, OS DOCUMENTOS
NOS CONTAM DOS ATOS, AS ODES
EXPRESSAM OS DESEJOS DOS
HOMENS … “

Ssu-ma Ch´ien / Shih-Chi

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CANÇÃO

• O Shih-chi inclui diversos poemas e canções atribuídos a grandes figuras do


passado;
• Canções, nesse caso, servem de relato histórico (questionável);
• Ch´ien espalha essas canções por seu texto de uma forma quase artística, como
meio de expressar emoção.

ÍNDIA ANTIGA

• Canto está presente nas antigas escrituras, conhecidas como


Vedas, em particular no Samaveda, que consiste numa coleção
de hinos, porções de hinos e versos soltos;
• Esses hinos eram memorizados pelos sacerdotes, e eram
cantados em até 11 formulas diferentes de recitação;
• Os mais antigos desses hinos datam do período de 1900 – 1000
BCE;
• O tratado sobre artes performáticas Nāṭya Śāstra (200 BCE – 200
CE) fala de 7 diferentes tipos de canção, e 33 ornamentos
melódicos.

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ANTIGUIDADE HEBRAICA
• Os exemplos mais antigos de música de sinagoga que temos
registro são baseados no sistema utilizado no Templo em
Jerusalém.
• De acordo com o Mishnah, a primeira coleção das tradições
orais judaicas, o Templo tinha uma orquestra de 12
instrumentos e 12 cantores.
• O serviço nas sinagogas utilizavam canto sem
acompanhamento instrumental, com um cantor e respostas da
congregação. O ritual judaico, obviamente, foi de grande
influencia nos primeiros séculos da música cristã.
• O Antigo Testamento tem mais de 12 termos diferentes para se
referir à música vocal.

GRÉCIA ANTIGA

• É notório que música tinha um papel central na cultura da


Grécia antiga.
• Em Atenas, tocar lira era parte fundamental da educação
de um cidadão, e era usada para acompanhar dança,
canto, ou recitação de poesias épicas.
• Os gregos escreveram extensamente sobre a teoria
musical e a função social da música, e muito pouco sobre a
prática da música e do teatro;

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GRÉCIA ANTIGA

• Música e Poesia eram quase sinônimos;


• Acreditava-se que a música poderia afetar o Ethos das pessoas e da sociedade;
• Já encontramos relatos da existência de músicos profissionais desde o tempo de
Platão (~400 BCE);
• Muita incerteza existe sobre as questões práticas da execução da música da Grécia
antiga.

• EXEMPLO – Diferentes realizações do coro Stasimon da peça Orestes (400 BCE)

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PRIMEIROS SÉCULOS DO CRISTIANISMO

• Antes do século IV, temos muito pouca informação sobre as práticas da música cristã, mas
é possível presumir que ela apresentasse pouca uniformidade de um centro para outro;
• No início do século IV, o Papa Silvestre instituiu uma escola de canto em Roma. Muito
pouco se sabe sobre o que era ensinado, mas sabemos que o objetivo era o estudo do
canto em si, não de técnica vocal;
• Com o Concílio de Laodiceia (363 – 364 CE), a congregação foi proibida de cantar, e a
música ficou por conta do coro, com cantores treinados;
• Com a necessidade de uniformização da execução do canto, questões de fraseado e,
consequentemente, fundamentos da técnica vocal começaram a ser discutidos;
• Já nesse período inicial, é possível identificar duas formas de canto, declamatório e florido.

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IDADE MÉDIA

• Muitos elementos que associamos ao canto lírico moderno já eram encontrados nesse período:
• O Trinado é possivelmente utilizado desde o século I, e com certeza desde o século III (Vibrissare);
• O Portamento é mencionado por Guido d´Arezzo no século X (Liquescere);
• Diminuições existem desde o começo do milênio, mas ganhou prominência com a arte do
Descanto, no século XI;
• Marcas de Expressividade foram utilizadas desde o século VIII – Letras Romanianas;
• Antes de 1300, a divisão da escala em registros vocais já existia, evidenciando um estudo
sistemático da voz;
• Tipos de vozes, tanto quanto a sua tessitura, quanto a sua qualidade vocal, já eram discutidos.

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SCHOLA CANTORUM
• Com a queda do Império Romano (476 CE), as escolas de
Roma, que já vinham em declínio, desapareceram;
• Em 535, Marcus Aurelius Cassiodorus, pai de Boethius,
organizou fundos e possibilitou a reorganização dessas
escolas;
• Posteriormente, fundou o monastério onde Gregório,
futuro papa, estudou e trabalhou;
• Pouco após se tornar Papa, Gregório fundou a Schola
Cantorum, a escola de cantores que definiria a execução
da liturgia em toda a Europa.

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SCHOLA CANTORUM

• Os melhores alunos de todas as escolas da Europa eram enviados para a Schola Cantorum;
• O curso durava 9 anos, nos quais os alunos recebiam instruções teóricas e práticas, e decoravam
todo o repertório, pois apenas o diretor e o solista eram permitidos cantar com o livro;
• Todos os cantores eram homens e meninos, tinham a cabeça raspada, e usavam casula, uma veste
litúrgica arredondada que cobre o corpo inteiro;
• A música desse período recebeu fortes influencias de diversos tradições de canto, e com certeza
apresentava momentos de escrita florida, apesar de que num caráter bastante diferente do que
veríamos no século XIX;
• O legato era a forma de articulação favorita e é extremamente defendido em quase todos os
textos.

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CANTO GREGORIANO

• Eventualmente, o estilo Gregoriano ofuscou outras tradições de cantochão, em


grande parte por ação de Carlos Magno para consolidar seu poder religioso e
secular;
• Em 1323, o Papa João XXII, em sua Bula Docta Sanctorum Patrum, proibiu o uso de
polifonia com valores mensurados na música sacra, eliminando também os
“excessos” da escrita florida;
• Com o passar dos séculos, as discussões sobre o que se desejava dos cantores
começou a aparecer em relatos escritos, como nos escritos de São Bernardo de
Claraval (1090 – 1153 CE);

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MÚSICA SECULAR MEDIEVAL

• Patrocinados pela aristocracia, Troubadours e Trouveres


começaram a aparecer nas cortes e castelos da França;
• Músicos treinados, alguns atingiram grande fama e tiveram suas
vidas registradas em biografias;
• As canções foram preservadas em antologias chamadas
chansonniers, com impressionantes 2.600 poemas sobrevivendo
até a nossa época;
• São canções estróficas, com melodias simples e de pouca
extensão;
• O estilo florido e elegante é diretamente inspirado pela música
sacra dos primeiros séculos, uma vez que esses músicos eram
treinados em abadias.

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ADAM DE LA HALLE (~1240 - ~1288)

• Primeiro poeta-compositor vernacular cujo


trabalho foi preservado integralmente em um
manuscrito;
• Construiu peças musicais ao redor de canções
pastorais narrativas;
• Exemplo – Jeu de Robin et de Marion

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POLIFONIA

• Mesmo com a Docta Sanctorum Patrum, a polifonia voltou a evoluir e retomar um lugar de
destaque;
• Com a disseminação da polifonia na música sacra, dois tipos de prática foram descritos:
contrapunctus a penna e contrapunctus a mente;
• Temos o aparecimento da técnica do descanto, a prática de se improvisar uma melodia acima da
linha do cantus firmus;
• Quanto o canto em partes se tornou prevalente, formas populares como a Frottola e o Strambotti
permitiram a inclusão de vozes femininas, e aos poucos a melodia começou a ser escrita para a voz
mais aguda;
• Em torno do século XIV, o descanto já tinha regras bem definidas, como a necessidade das vozes se
encontrarem nas consonâncias;

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POLIFONIA

• O ultimo autor a mencionar contrapunctus a mente, Cerone em seu livro Il Melopeo (1613), distingue
duas situações dentro desta prática:
• Cantores improvisando suas partes ao redor de uma melodia;
• Cantores ornamentando suas próprias linhas vocais;
• Cerone já reclamava dos excessos produzidos pelos cantores, que ornamentavam suas linhas ao mesmo
tempo, ao invés de em sucessão;

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CONSIDERAÇÕES SOBRE O PERÍODO MEDIEVAL

• Não há como separar canto de música na música sacra da idade media;


• Canto não era estudado como uma disciplina separada, mas como parte da formação de um
músico;
• Quase todos os grandes mestres do contraponto eram cantores e ensinavam canto;
• A história da música tende a negligenciar esse aspecto, focando apenas na evolução dos métodos
de composição;
• Os cantores e compositores dos primeiros dramas musicais foram treinados pelos e como os
músicos de igreja da geração anterior, com uma tradição que os conecta diretamente à idade
média.

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RENASCENÇA

• A tradição do canto secular se manteve com os Cantori a Liuti, extremamente populares na Itália;
• Canto em partes tornou-se comum na vida das pessoas, como podemos encontrar em vários textos
da época como no Decameron (1348 – 1358) de Boccacio;
• Com o desenvolvimento da imprensa, várias coleções de música polifônica foram impressas, e sua
popularidade como entretenimento chegou ao seu auge;
• Música passou a fazer parte da educação de todos os aristocratas, como por exemplo na educação
das mulheres da corte Elizabetana, que sabiam ler música e se acompanhar no alaúde ou outros
instrumentos,
• É difícil precisar quando as mulheres começaram a como cantoras profissionais, mas é mais que
bem documentado que a prática existe desde bem antes de 1600.

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RENASCENÇA

• Lentamente, vemos a elevação do melodia cantada por uma voz solista, dando
ainda mais importâncias às vozes agudas;
• É difícil precisar quando a monodia começou a predominar pois temos acesso as
partituras mas pouca informação direta sobre a prática de performance;
• Muitos autores acreditam que diversas peças polifônicas do período foram escritas
para ter apenas a voz mais aguda cantada, e as outras linhas executadas por um
instrumento; Seus argumentos são baseados, também, na diferença de caráter
entre a melodia e as outras partes;

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" Messiere Frederick responde que o canto a libro (descant),


bem executado, lhe parece bela música; mas a canção
acompanhada pela viol parece mais bonita, uma vez que
nesse tipo de musica, toda a doçura da canção consiste
inteiramente na voz de apenas um . . .
Il Libro del Cortigiano (1528) Baldassare Castiglione
"
Evidências da popularidade do canto solista acompanhado já são encontradas
na literatura do começo do século XVI.

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SITUAÇÃO DA PEDAGOGIA VOCAL NO FIM DA RENASCENÇA

• Com a maior interesse do povo em executar música polifônica para seu próprio
entretenimento, a busca por instrução vocal mais acessível se intensificou;
• Com isso, vários tratados sobre a arte do canto apareceram no século XVII, uma
prática que foi continuada até o final do século XIX;
• Esses tratados são focados essencialmente em questões de ornamentação, mas
aos poucos começamos a encontrar discussões sobre o funcionamento da voz e de
como cantar;
• Foco na voz masculina.

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TRATADOS DE CANTO

• Lantica musica ridotta alla moderna prattica


(1555);
• Nicola Vicentino (1511 – 1575 ou 1576);
• Teorista e compositor, considerado um progressista,
inventou um teclado microtonal;
• Discussão de diferentes aspectos da performance,
ocasionalmente discutindo técnica vocal.

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TRATADOS DE CANTO

• Lettera sul canto (1562)


• Giovanni Camillo Maffei (?) – Médico, filósofo e músico
italiano;
• Carta respondendo ao seu patrono, o Conde d´Alta Villa,
suas duas perguntas:
• Como a voz funciona?
• Como alguém pode aprender a cantar diminuições sem um
professor?

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TRATADOS DE CANTO

• Istitutioni harmoniche (1558);


• Gioseffo Zarlino (1517 – 1590);
• Teorista e compositor, foi cantor na Catedral di Chioggia,
Veneza.
• Dividido em duas partes, a segunda se trata da prática da
música, e apresenta discussões sobre a voz.
• Distinção entre canto de câmara e a capella;

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TRATADOS DE CANTO

• Prattica di musica (1592)


• Lodovico Zacconi (1555 – 1627)
• Compositor e teórico, audicionou e foi aceito na
Catedral de San Marco, Veneza, mas recusou.
Posteriormente, fez parte da Capela do Duque
da Bavária, dirigida por Olando de Lassus;
• Em dois volumes, quatro capítulos;
• Discute exaustivamente teoria musical, com
importantes instruções de como executar
música polifônica;

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TRATADOS DE CANTO

• Regole, passaggi di musica, madrigali et motetti


passeggiati (1594)
• Giovanni Battista Bovicelli (~1550 – ?)
• Sopranista e Tenor, foi membro dos coros da Catedral de
São Pedro em Roma, e da Catedral de Milão;
• Manual de canto e ornamentação;
• Questões práticas relacionadas ao canto e da técnica do
canto virtuoso.

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CONSIDERAÇÕES

• A História da Música tende a encarar os grandes nomes da música do fim do período medieval e da
renascença como grandes compositores e teoristas, o que eles com certeza foram;
• Mas a história negligencia muitas vezes o trabalho desses mestres como cantores, o que a grande
maioria também foi;
• Como vimos anteriormente, a maioria dos tratados que estudamos, falando sobre os mais diversos
assuntos da música, foram escritos por cantores;
• Esses autores foram também professores de outros cantores, assim como a maioria dos
compositores do período;
• Johannes Okeghem, Josquin des Pres, Arian Willaert, Jacopo Peri, Giulio Caccini – Todos cantores
famosos.

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CONSIDERAÇÕES

• Pela primeira vez, começamos a ter uma consistência mínima na literatura para
desenhar um panorama da técnica vocal, o que não significa que não existia uma
sistemática pedagógica anteriormente;

• Para tentar explicar a voz, os autores desses primeiros tratados utilizaram as


informações que existiam na época.

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PRIMEIROS PASSOS EM DIREÇÃO DA CIÊNCIA DA VOZ

• Claudio Galeno (c129 – c217)


• Médico Investigativo;
• Suas teorias influenciaram a medicina ocidental por
mais de um milênio;
• Descreveu a laringe e a importância do cérebro no
processo de fonação.

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PRIMEIROS PASSOS EM DIREÇÃO DA CIÊNCIA DA VOZ

• Avicena da Persia, ou Ibn Sina (c980 – 1037)


• Um dos mais importantes medicos, astrônomo, filósofo
e escritor da Idade de Ouro Islâmica;
• Escreveu o Al-Qanun fi al-Tibb em 1020. Enciclopédia
em 5 volumes do conhecimento médico do mundo
islâmico;
• Se manteve como um dos principais textos de medicina
até o século XVIII;
• Instruções de saúde vocal e o uso do canto como
terapia.

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PRIMEIROS PASSOS EM DIREÇÃO DA CIÊNCIA DA VOZ

• Leonardo da Vinci (1452 – 1519) e os Cadernos


Anatômicos.

• Andreas Vesalius (1514 – 1564) e De Humani


Corporis Fabrica Libri Septem (Dos tecidos do
corpo humano);
• Considerado o pai da anatomia moderna.

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TRATADOS DO FIM DA RENASCENÇA – CONTROLE DO AR

• Instruções pragmáticas e simples;


• Maffei, em suas regras pro canto, coloca na oitava posição “gradualmente pressionar a respiração
com a voz, e prestar grande atenção para que ela não vá através do nariz ou do palato, pois um ou o
outro seria um grande erro.”
• Maffei também afirmou que o registro do falsetto utilizava mais ar do que a voz de peito;
• Zacconi e Bovicelli ambos instruíam para que não se respirasse no meio de uma diminuição ou de
uma palavra;
• Bovicelli foi um dos primeiros autores a defender uma inspiração silenciosa.

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TRATADOS DO FIM DA RENASCENÇA – TIMBRE E RESSONÂNCIA

• Temos muito poucas descrições de timbre nos textos desse período. Quando mencionado, é quase
sempre em termos abstratos como firme, suave, limpo, doce ou sonoro.
• Zacconi foi a exceção, sendo bem mais específico que seus contemporâneos;
• Zacconi descreveu a qualidade do som de diferentes vozes e diferentes registros, deixando claro
sua preferência pelo som brilhante da voz de peito.
• “Dentre todas as vozes, devemos sempre escolher […] as vozes de peito, e particularmente aqueles
com a deliciosa qualidade ‘mordente’ que perfura um pouco mas não ofende, e devemos deixar de
lado as vozes ‘obtusas’ que não são ouvidas entre as outras, e as de cabeça que são excessivamente
dominantes.”
Prattica di musica, Libro Primo, Cap. LVIII, Fol. 77

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TRATADOS DO FIM DA RENASCENÇA – VIBRAÇÃO

• Não há uniformidade suficiente na literatura pra se chegar a uma conclusão definitiva ou para
acreditar que existia uma única opinião quanto a vibração da voz, em suas mais diversas formas.

• Na maioria das fontes, tremolo parece ser um fenômeno occasional, um ornamento que pode ser
utilizado seletivamente;

• Outras fontes descrevem ondulações vocais que não são ocasionais, mas um elemento intrínseco
da voz cantada;

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TRATADOS DO FIM DA RENASCENÇA – VIBRAÇÃO

• Zacconi escreveu: “O tremolo deve ser leve e agradável, pois se for exagerado e forçado, ele cansa e
irrita; sua natureza é tal que, uma vez utilizado, deve ser sempre para que assim seu uso se torne
um hábito.”

• Zacconi também defendia que o tremolo auxiliaria na execução de passagens rápidas de


diminuições.

• Luigi Zenobi, em sua Carta sobre o Músico Perfeito (~1600), utiliza o termo Ondeggiamento, e
defende que as sopranos devem, mais que todas as vozes, havere l´ondeggiar della voce; assim
como muitas outras fontes elogiam sopranos pelo doce tremor de suas vozes;

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TRATADOS DO FIM DA RENASCENÇA – VIBRAÇÃO


• De Canendi elegantia (Georg Quitschreiber, 1598) – “Tremula voce optime canitur;”
• De forma geral, os autores alemães tendem a concordar que uma oscilação é natural à voz cantada;
• Podemos encontrar nos tratados de instrumentos mais evidências de um vibrato natural sendo
utilizado no canto:
• Os tratados de diversos instrumentos instruem os músicos a tocarem com uma ondulação imitando a voz
humana;
• Os tratados de órgão instruem o uso do registro Vox Humana com a ativação do tremolo;

• A única certeza que podemos ter é de que os autores desse período eram muito menos obcecados
com vibrato do que nós somos hoje em dia.

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FIM DO SÉCULO XVI

• Exemplos:
• Trecho de um dos Salmi Passegiati do
livro Francesco Severi, 1615.
• Nella Maniera Che Si Cantano in Roma

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GIULIO CACCINI (1551-1618)

• Provavelmente nascido em Roma, estudou alaúde, viol e


harpa, e ganhou fama como cantor, sendo levado para
Florença por Francesco de´ Medici;
• Sua influencia sobre os cantores e diretores do século é
subestimada, e ele foi um dos nomes mais influentes para
a pedagogia vocal do século XVII;
• Suas ideias foram traduzidas para o Alemão por Praetorius
em 1619, no seu Syntagma Musicum.

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NOVA MÚSICA

• Ópera e Oratório – Monodia e Stile Recitativo;


• A prática da monodia ganhou tanta força que temos o madrigal e o moteto solo;
• O termo se refere geralmente a música do começo do século XVII, mas o termo pode ser estendido
para se entender uma música na qual temos uma melodia com um acompanhamento
independente;
• O stile recitativo surgiu da interpretação de Jacopo Peri da teoria antiga grega. Nesses momento da
música, o baixo se mantinha constante e a voz ficava livre da harmonia para se mover entre
consonâncias e dissonâncias, emulando as inflexões da voz.
• Com a evolução do gênero, o recitativo ganha um caráter dramático, como encontramos nas
últimas óperas de Monteverdi.

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EDIÇÕES

• Pelos padrões modernos, a escrita barroca pode parecer bastante imprecisa;


• Os compositores não sentiam a necessidade de anotar todas as informações na
partitura:
• Cantores tinham liberdade e outras formas de chegar nessas informações;
• Os compositores trabalhavam em proximidade com os intérpretes;
• A prática de se compor para a posteridade só se estabeleceu no meio do século XIX.
• Muitas das partituras utilizadas por estudantes são reinterpretações das partituras
originais feitas no fim do século XVIII em diante, muitas vezes dentro do estilo
destes períodos.

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EDIÇÕES – ESTUDO DE CASO

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EDIÇÕES – ESTUDO DE CASO

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EDIÇÕES –
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QUESTÕES PRÁTICAS

• Instrumentação não é claramente definida, principalmente no caso do instrumento que ira tocar o
baixo-contínuo;
• A frequência das notas variavam imensamente de lugar pra lugar, principalmente devido a afinação
dos órgãos. Transposições eram frequentes;
• A = 440hz só foi estabelecido em 1939, mas a prática de usar A = 415 é bem mais recente e existe
por conveniência, não por representar a afinação da época;
• Por ser, em parte, uma reação ao estilo florido da renascença, esse novo repertório exige uma
grande atenção a pronúncia e inteligibilidade do texto;
• Muitas vezes deixado de lado nas performances “HIP”, a pronúncia mudou durante os séculos e
uma interpretação que busque ser o mais informada o possível, não deve negligenciar esse fator.

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A ÓPERA CHEGA EM ROMA


• Ópera em Roma é uma tradição que data
desde a década de 1620. Roma foi o centro
de desenvolvimento da ópera entre Florença
e Veneza.
• Por causa da proibição de mulheres
cantando nos palcos, os papéis femininos
eram cantados por castratti, começando
assim uma longa tradição.
• É também em Roma onde aparecem os
primeiros exemplos de ópera cômica,
baseada na commedia dell’arte. Os libretos e
composições de Giulio Rospigliosi, que mais
tarde se tornaria o Papa Clemente IX, são
considerados os primeiros do estilo.

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OPERA SERIA

• Ao final do século XVII, ópera havia se espalhado por toda a Itália e se tornou uma das
formas mais populares de entretenimento.

• Os cantores mais famosos atraiam grandes audiências e dominavam o mundo operístico.


Esse é o começo da era das “divas” e da exibição vocal. Por facilitar tais demonstrações de
técnica e musicalidade, a aria da capo se tornou a forma dominante das partes solo.

• Nesse período é possível perceber um tipo de ópera sendo favorecido por compositores e
audiências por quase toda a Europa. Esse estilo de ópera, muitas vezes chamado de
“Ópera de Árias”, consiste de uma sequencia de momentos dedicados a representar um
tipo de emoção, com pouca conexão entre estes e, consequentemente, demonstrando
indiferença quanto a uma apresentação realista da trama.

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OPERA SERIA

• Um novo tipo de ópera aparece na virada do século como resultado de uma revolução de membros
da Accademia degli Arcadi, de Roma. O membro mais importante dessa revolução foi o libretista
Pietro Metastasio, que se tornaria posteriormente o poeta oficial da corte de Viena.

• A revolução que gerou o que seria posteriormente chamado de Opera Seria inicia com uma
modificação no formato dos novos libretos s, com a intenção de diminuir o número de árias e
eliminar a mistura de elementos trágico-heroicos dos elementos cômicos.

• As árias dessas óperas passam a seguir arquétipos pré-definidos, possibilitando assim ao libretista
prever o tipo de música que seria composto para cada cena. Alguns desses “tipos” de ária são: aria
di bravura, aria parlante, aria di mezzo carattere e aria cantabile.

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TRATADOS DE CANTO

• Prefácio do Le Nuove Musiche (1602);


• Coleção de monodias com baixo- contínuo de Giulio Caccini
(1551 – 1618);
• Discussão da técnica vocal adequada para a “nova” música vocal
solista;
• Discute o stile recitativo e ornamentação;
• Ideias traduzidas para o Alemão – Syntagme Musicum
(Praetorius, 1619).

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TRATADOS DE CANTO

• Musica Moderna Prattica (1642) ;


• Johann Andreas Herbst (1588 – 1666);
• Compositor e teorista, importou o estilo Veneziano e
outras características do barroco para a Alemanha
protestante;
• Partes do seu tratado são inspiradas no Syntagma
Musicum.

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TRATADOS DE CANTO

• Remarques curieuses sur l'art de bien chanter


(1688);
• Bénigne de Bacilly (1625 – 1690);
• Compositor e teorista, considerado o reformador da air de
cour;
• Apesar de um sério esforço de sistematizar o tratamento
das vogais francesas, segue o estilo italiano a risca.

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TRATADOS DO SÉCULO XVII – CONTROLE DO AR

• Caccini escreveu muito nas linhas de seus antecessores quanto ao controle de ar, mais uma vez
alertando contra o falseto;
• Dedicou sua atenção ao controle do ar nas variações de dinâmica, assunto também abordado por
Domenico Mazzocchi (1592 – 1665) em seu livro de madrigais.
• Bacilly também escreveu sobre o controle do ar, alertou que o controle do ar no canto tem que ser
desenvolvido junto e através de outros particulares do canto.
• A maioria da literatura não difere muito das gerações anteriores, se limitando a afirmações de bom
senso comum.

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TRATADOS DO SÉCULO XVII – TIMBRE E REGISTROS

• O antigo modelo da divisão em duas vozes continuou sendo utilizado;


• Caccini continuou com as ideias de Zacconi, defendendo a voz piena e naturale e
sugerindo que se evite a voce finta (falseto)... “sem ser forçada a se acomodar a
outras vozes.”
• Essa é uma clara referência a individualidade do canto solista;
• Essas opiniões sobre timbre e registro foram repetidas na Alemanha por Praetorius
e Herbst, e podem ser encontradas em textos até a metade do século XIX;
• Essa visão pode ser uma reação a tradição antiga e aos falsetistas da música sacra.

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TRATADOS DO SÉCULO XVII – VIBRAÇÃO

• No começo do século, ainda encontramos referencias a vibrações constantes e


sendo usadas como ornamento;
• Encontramos também instruções em manuais de instrumento para imitarem a
vibração da voz, e também o curioso caso de um autor que sugeriu que o vibrato
vocal era imitação do som de instrumentos;
• Vários textos citam vibrato como sendo característica intrínseca de algumas vozes,
e tipos exagerados continuaram a ser criticados;
• Bacilly usou o termo cadence para se referir a vibração constante da voz.

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TRATADOS DO SÉCULO XVII – OUTROS CONCEITOS

• Meraviglia - Termo associado a estética da performance virtuosa, termo


encontrado em diversos textos da época;
• Sprezzatura – Flexibilidade rítmica que permitia a acentuação natural das palavras
imitando a fala; o termo a vezes tem seu significado ampliado para envolver
articulações discretas e pequenas modificações de dinâmica;
• Grazia – Seria a qualidade ideal de um cantor, que reuniria facilità, dolcezza e
morbidezza.
• Meraviglia e Grazia são embriões dos ideais de cantabile e coloratura do belcanto
italiano.

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SÉCULO XVIII

 Na metade do século XVIII, a música começa a passar por um processo de


transformação alimentado pelos novos ideais do Iluminismo. Essa transformação
se inicia na música vocal.

 Christopher Willibald Gluck (1714-1787), junto com o libretista Raniero de


Calzabigi (1714-1796), com o intuito de submeter a música a função de auxiliar o
poema (libreto) e avançar a trama. Ocorre uma diminuição do foco nos cantores
solistas, e estes passam a ser apresentados de uma forma mais realista.

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INTERMEZZO E OPERA BUFFA

 Com a separação do “sério” e do cômico por parte da revolução árcade, diversos


estilos de ópera cômica se desenvolvem por toda a Europa: Opera Buffa na Itália,
Opéra Comique na França, Ballad Opera na Inglaterra e Tonadilla na Espanha.

 Por estar mais livre do peso da tradição, a ópera cômica começou a absorver
características do nascente classicismo, e permitiu o surgimento de um novo tipo
de ária, menos focada na exibição vocal.

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A PRÁTICA DO CANTO NO BARROCO


TARDIO
• Particularmente nesse período, contrastes entre forte e piano, pesado e leve, e
dissonante e consonante eram destacados, o que costuma ser muito mais fácil de
se executar quando acompanhado por instrumentos de época;
• Legato e cantabile são utilizados localmente, mas um estilo mais separado e
destacado era favorecido;
• Se deve considerar as diferenças rítmicas entre Italiano, Francês e Alemão, o que
gera o estilo particular de articulação de cada repertório;
• Ainda mais que no século anterior, a ornamentação passou a ter um idioma local
que precisa ser estudado, tanto para se improvisar ornamentações quanto para
executar as que estão escritas na partitura;

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A PRÁTICA DO CANTO NO PERÍODO


CLÁSSICO

• Principalmente no caso dos trabalhos maduros dos compositores de maior fama, a


adição de ornamentos por parte do cantor se tornou menos necessária, sendo
limitada para algumas notas selecionadas;
• Esse é um período que é muitas vezes tratado da mesma forma como a música do
próximo século mas, principalmente quando se trata de música vocal, tem mais
em comum com a música do século anterior;

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A PRÁTICA DO CANTO NO PERÍODO


CLÁSSICO

• A disseminação do fortepiano e desenvolvimentos na construção de instrumentos,


como o desenvolvimento de um novo arco de violino, mais pesado, começaram
aos poucos a aumentar o número de decibéis que um cantor precisava produzir,
iniciando o processo que resultaria na técnica vocal moderna;
• Teatros maiores, orquestras com mais instrumentos e afinação mais alta
(questionável) também foram fatores importantes.
• Esse foi o período de ouro dos “tutores de canto”, e vemos o ensino do canto se
tornam uma atividade separada, com uma literatura específica cada vez maior.

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TRATADOS DE CANTO

• Opinioni de Cantori antichi, e moderni o sieno osservazioni sopra il


canto figurato (1723) ;
• Pierfrancesco Tosi (~1653 – 1732)
• Um dos primeiros tratados completamente sobre canto;
• Cantor Castrato, teve sua educação musical em uma igreja de
Roma;
• Viajou por toda a europa e compôs diversas árias e cantatas;
• Defendia uma formação completa do cantor, incluindo gramática
e etiqueta.

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TRATADOS DE CANTO
• Anleitung zur Singekunst (1757)
• Johann Friedrich Agricola (1720 – 1774)
• Compositor, organista, cantor e pedagogo alemão;
• Foi compositor da corte de Friederich II, e casou-se com a
soprano Benedetta Emilia Molteni, uma soprano da corte, o que
lhe causou problemas com o Imperador.
• Seu Anleitung é uma tradução do Opinioni de Tosi, com extensos
comentários;

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TRATADOS DE CANTO

• Pensieri e Riflessioni Pratiche Sopra Il Canto Figurato (1774)


• Giambattista Mancini (1714 – 1800)
• Cantor, professor, e autor;
• Foi Cammer-Musicus da corte da emperadora Maria
Theresia da Austria, e foi responsável pelo ensino de canto
de suas filhas;
• Teve sucesso como cantor, mas seu grande sucesso foi
como professor de canto, o que lhe rendeu uma pequena
fortuna.

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GRANDES TUTORES - REGISTROS


• Os tratados desse período tratam, principalmente, da voz do soprano masculino;
• Tosi e Mancini utilizavam os termos voce di petto e voce di testa, mas não sabemos onde essas
mudanças de registros aconteciam na voz dos castratti;
• O rival de Mancini, Vicenzo Manfredini (1737-1799), concordava com o modelo da divisão binária da
voz, e escreveu com clareza que a voz de cabeça era muitas vezes chamadas de falsetto;
• Agricola escreveu um dos trechos mais confusos da história da pedagogia vocal ao tentar explicar o
comportamento da traqueia e da glote durante a voz de cabeça e de peito;
• Agricola usou o termo Sthrobass para descrever o que alguns cantores faziam nas notas mais
graves, mas também argumentava que era possível cantar em falseto até as regiões mais graves da
tessitura;
• Na França do fim do século, alguns autores propuseram a divisão tripla da voz, sobretudo da voz
feminina.

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GRANDES TUTORES – CONTROLE DO AR

• Apesar de não muito revolucionários em comparação com a geração anterior,


começamos a encontrar mais e mais referencias a necessidade de “conservar” o ar
que as poucos começam a parecer com a noção moderna de apoio;
• Mancini recomendava que, antes de tentar executar um messa di voce, o cantor
deveria dominar a arte de conservar, reforçar e retomar o ar;
• Em 1792, Jean Paul Martini (1741-1816) escreveu que “quando, durante a
respiração, os pulmões se enchem de ar, é necessário sustentar o ar com o máximo
de cuidado e não deixar nada ser expelido além da porção necessária para fazer as
cordas vocais [sic] vibrarem.”

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“ Meisner, como você sabe, tem o mau hábito de fazer a voz tremer em alguns
momentos, transformando uma nota que deveria ser sustentada em semínimas ou
até em colcheias, e isso eu nunca pude suportar. E é realmente um hábito detestável
e um que é deveras antinatural. A voz humana ondula naturalmente, mas de sua
própria forma, e apenas até onde o resultado seja belo. Essa é a natureza da voz; e as
pessoas a imitam não apenas nos instrumentos de sopro, mas em instrumentos de
corda também e até no clavicórdio. ”
W. A. Mozart, em carta para seu pai em 1774.

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SÉCULO XIX

 Na virada do século, Paris pós-revolução viu uma explosão de espetáculos públicos, se


tornando virtualmente a capital europeia da ópera.

 O compositor mais importante do período revolucionário foi o italiano Luigi Cherubini


(1760-1842), e sua ópera mais famosa, Médée (1797), que apresenta fortes traços de
influência gluckiana. Mesmo assim, Médée apresenta uma intensidade dramática que
antecipa o novo estilo de ópera romântica que estava por vir e refletia o senso de urgência
do período.

 Curiosamente, a ópera de resgate de maior fama no nosso repertório atual, é de um


compositor muito pouco associado com a ópera. Fidélio (1805), a única ópera de Ludwig
von Beethoven (1770-1827), é um perfeito exemplo do estilo.

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SÉCULO XIX

 Ópera cômica continua a evoluir na França e vemos o surgimento das Operettas, um estilo leve e de
música fácil, que se diferencia da opéra comique por uma certa frivolidade em seus librettos. O
compositor de maior sucesso dessa fase inicial do estilo foi Jacques Offenbach (1819-1880), mais
famoso por seu último e mais sério trabalho Les Contes d’Hoffman (1881). Offenbach compôs
diversas operettas como Orphée aus Enfers (1858), La Belle Hélène (1864), La Vie Parisienne (1866)
e La Périchole (1868).

 O estilo contaminou outras partes da Europa, em particular através do trabalho de Kreutzer, Flotow,
e Lortzing na Alemanha, e as imortais operettas do compositor inglês Arthur Sullivan (1842-1900)
em parceria com o libretista W. S. Gilbert, assim como H.M.S. Pinafore (1878), Pirates of Penzance
(1880) e The Mikado (1885).

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SÉCULO XIX

O período de estagnação de produção operística na


Itália não durou muito tempo. Mesmo com pouca
produção local, os compositores de maior
importância no resto da Europa eram italianos.
Uma nova tradição surgiria com a obra de
Gioachino Rossini (1792-1868), o estilo hoje em dia
conhecido como belcanto.

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LIEDER

• Na Alemanha, apesar de já existir no século anterior, o Lied explodiu em produção e popularidade


com a produção poética associada ao movimento Sturm und Drang, uma resposta ao racionalismo
do iluminismo;
• Com a disseminação do Lied, o hábito de cantar ornamentos improvisados desapareceu
rapidamente, e ao final do século compositores estavam escrevendo suas próprias ornamentações,
com sinais e notas pequenas inicialmente, mas rapidamente passaram a grafar tudo em notas
normais;
• Rubato e flexibilidade de andamento ficaram cada vez mais presentes, e os compositores foram
ficando mais específicos em sua escrita;
• Com o passar do tempo, vemos a técnica italiana convivendo com uma declamação mais
dramática, que resultaria no estilo das óperas wagnerianas;

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CHANSON

• Na França, principalmente nas canções de câmara, vemos também um movimento se distanciando


da virtuosidade vocal;
• No fim do século, os compositores franceses reagiram aos excessos do romanticismo e buscaram
uma forma mais refinada de expressão vocal, mais “natural.”
• Os manuais de canto franceses do começo do século XIX focam intensamente na expressão
dramática e dicção, com poucas discussões de técnica vocal;
• Cantores do período tinham orgulho de suas dicções limpas e precisas, mas eram criticados por
uma falta de linha e cantabile;

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IMPORTANTES AVANÇOS DA CIÊNCIA NO SÉCULO XVIII

• Giovanni Morgagni relacionou disfonia a problemas na laringe;


• Antoin Ferrein, a partir de seu trabalho com cadáveres, criou o termo “cordas vocais” e
descreveu sua função;
• Albrecht Von Haller, pai da fisiologia moderna, descreveu a anatomia da ressonância vocal;
• Já no século XIX, Johannes Muller foi o pioneiro da teoria mioelástica-aerodinâmica da
produção da voz, descrevendo a contribuição das pregas vocais e do trato vocal na formação
da onda de pressão acústica.

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O NASCIMENTO DA CIÊNCIA VOCAL

• Manuel Garcia (1805 – 1906);


• Manuel Patricio Rodríguez García, filho do tenor
Manuel del Pópulo Vicente Rodriguez García
(Manuel Garcia Pére) e irmão das cantoras Maria
Malibran e Pauline Viardot;
• Primeiro grande nome da ciência vocal,
considerados por muitos como seu criador.

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MANUEL GARCIA

• Teve a voz danificada cedo em sua carreira, após substituir o pai em diversas
apresentações.
• Trabalhou em hospitais militares onde seu interesse por fisiologia pode ter
nascido.
• Após a morte de seu pai, tornou-se responsável pelo treinamento de suas irmãs,
atingindo fama como professor e ingressando ao Conservatório de Paris em 1835.
• Erroneamente considerado o inventor do laringoscópio, foi o primeiro a usá-lo
para investigar a produção da voz.

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MANUEL GARCIA

• Modelo de voz composto por 3 registros (peito, falsete-cabeça, contrabaixo) e 2


timbres (claro e sombrio), e variações de intensidade e volume;
• Defendia que as mudanças de registro eram devidas a mudanças de “princípio
mecânico.”
• Dedicou apenas meia página ao controle do ar, com instruções principalmente
sobre a inspiração, que deveria começar a encher a base do pulmão e só após, a
circunferência;

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FRANCESCO LAMPERTI (1811 – 1892)

• Professor de canto Italiano, considerado o rival de Garcia,


apesar de não divergirem em vários assuntos;
• Estudou no conservatório de Milão, onde ele lecionou
posteriormente por 25 anos;
• Seu filho, Giovanni Battista Lamperti (1839-1910) também
foi um famoso professor de canto;
• Não demonstrou grande interesse por fisiologia vocal;

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FRANCESCO LAMPERTI

• Defendia que o cantor deveria manter um elemento de claridade para manter o brilho da
voz, mas deveria ter um elemento escuro, que seria formado no fundo da garganta;
Lamperti foi fundamental para a divulgação do ideal do chiaroscuro na técnica italiana.
• Lamperti utilizou o termo lotta vocale, criado pelo médico Louis Mandl em seu famoso
livro Hygiène de la Voix (1876), para descrever a ação antagonista entre a musculatura da
inspiração e da expiração, que deveria ser controlada durante o canto;
• Provavelmente, Lamperti foi responsável pelo estabelecimento do termo appoggio na
literatura da pedagogia vocal.
• A partir da disseminação dos trabalhos de Garcia e Lamperti, e sua adaptação as questões
linguísticas e estéticas locais, vemos o surgimento das escolas nacionais de canto.

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ESCOLAS NACIONAIS DE CANTO – ESCOLA ALEMÃ:

• Julius Stockhausen – Gesangsmethode (1887)


• Stimmbildung – divisão do mecanismo da voz
• Kopfstimme – [u] pianíssimo
• Deckung – cobertura
• Stauprinzip – Voz Primitiva
• Laringe baixa;
• Posição do bocejo;
• Lábios para trás e mandíbula baixa.

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ESCOLAS NACIONAIS DE CANTO – ESCOLA INGLESA

• The Art of Singing, Based on Principles of


the Old Italian Singing Masters (1899) -
William Shakespeare, pupilo de Lamperti.

• Respiração dorsal alta e com diafragma


fixo;
• Peito elevado e abdômen contraído
• Mandíbula Baixa – Equalização Através do
[ɔ]
• Cathedral Tone

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ESCOLAS NACIONAIS DE CANTO – ESCOLA FRANCESA

• Respiração “natural” (clavicular);

• Língua Elevada – Equalização através do [i];

• Pouquíssima modificação vocálica e


desinteresse em eventos de registro;

• Posição do “engolidor de espada”.

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VIBRATO NO FINAL DO SÉCULO XIX

• Garcia era notoriamente oposto a qualquer forma de vibração da voz, criando grande
confusão ao defender um fechamento mais firme da glote;
• Por outro lado, podemos escutar gravações de alunas de sua aluna favorita, Mathilde
Marchesi, e todas cantam com vibrato;
• Lamperti distinguia “tremor” da voz, um defeito, e “ondulação”, que seria um efeito
desejável atingido por uma voz forte, vibrante e sonora;
• Existe uma história anedótica de que o cantor Giovanni-Battista Rubini, um celebrado
cantor de óperas de Donizetti e Bellini, teria introduzido o vibrato aos palcos operísticos.

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VOCE PIENA DI TESTA

• Quando Garcia apresentou suas teorias, o tópico de timbres e suas causas fisiológicas já atraia
bastante atenção;
• Em 1940, dois biólogos franceses fizeram uma apresentação para a Academia de Ciências sobre a
nova e “radical” técnica empregada pelo tenor Gilbert Louis-Duprez;
• Aparentemente, Duprez foi o primeiro tenor a cantar o Famoso “dó de peito”, alcançando essas
notas com o que os franceses chamaram de timbre sombrio ou coberto;
• Em Garcia, percebemos a convivência da nova técnica com a antiga voz de cabeça; e Garcia
defendia que a nova técnica era mais adequada para o novo repertório;
• Estamos observando o nascimento da técnica da voz de cabeça moderna;

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CLASSIFICAÇÕES VOCAIS

• Durante o século XIX, as óperas cada vez mais eram escritas para um tipo
específico de voz e, como se estavam explorando extremos de volume e tessitura,
foi cada vez mais necessário uma especificidade na adequação de tipos vocais,
gerando nosso sistema de classificação vocal;
• Não só os termos para as vozes médias do barítono e da mezzosoprano viraram
lugar comum, como as vozes ganharam “sobrenomes” cada vez mais específicos;
• Diferentes tradições geraram diferentes sistemas, como o sistema de Fach alemão
ou a classificação vocal da ópera italiana;

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SÉCULO XX

• Com a virada do século, veremos os últimos anos de ouro da ópera italiana, que teria em
Puccini o seu último grande compositor;
• Na Alemanha, o romantismo conviveu um bom tempo com as novas experiências
musicais, tendo Richard Strauss como seu principal representante nesse período tardio;
• Com teatros maiores, instrumentos com mais volume, orquestras maiores, afinação mais
alta e com os compositores explorando os limites de tipos específicos de voz, eficiência
vocal foi se tornando a palavra de ordem da pedagogia;
• Ideais como fraseado e pureza do timbre começaram a ceder à questões como
dramaticidade e expressividade realista, e questões práticas como resistência e projeção
vocal.

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SÉCULO XX - PEDAGOGIA

• Com o passar do século, vemos o modelo universitário substituir o sistema de


conservatório, forçando a pedagogia a se adaptar ao paradigma de apenas uma
aula por semana;
• Com isso, vemos uma rápida sistematização do estudo e ensino do canto, com os
tratados sendo substituídos por livros texto, e com a gradual introdução da ciência
da voz como principal fonte de informação da pedagogia;
• Esse foi o século dos pedagogos e cientistas, muito bem resumidos na obra de
autores do anos 80 e 90, como Barbara Doscher e Richard Miller.

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SÉCULO XX - PEDAGOGIA

• Nas primeiras décadas do século, a influencia das escolas nacionais continua bastante
forte. Na técnica italiana, as idéias de Garcia e Lamperti ainda dominavam o cenário;
• Vemos aparecer o fenômeno de livros de cantores famosos ou sobre a técnica de cantores
famosos, como o infame livro da Lili Lehmann ou o livro do Dr. P. Mario Marafioti, sobre o
método de produção vocal de Caruso.
• Com as guerras mundiais, temos um período de pouca produção literária, seguido por uma
renovação, com o começo da pedagogia vocal moderna, desenhada para o modelo
universitário.
• Temos também uma abrupta mudança do centro de produção para os Estados Unidos, e
os primeiros livros que unem o canto com a ciência do século XX.

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SÉCULO XX – NOVAS TÉCNICAS

• No novo século, outras formas de cantar se estabeleceram e, principalmente,


tentaram buscar uma sistematização, aos moldes da literatura do canto lírico.
• Apesar de ter suas origens traçadas até o século XIX, o teatro musical teve seus
anos de ouro entre as décadas de 40 e 60, período no qual se estabeleceu uma
prática específica, muitas vezes chamada de Belting;
• O estudo do canto popular resultou em vários sistemas:
• Speech Level Singing, proposta por Seth Riggs, um cantor treinado na técnica clássica
• Estill Voice Training, criada por Josephine Estill nos anos 80;
• Complete Vocal Technique, criada por Cathrine Sadolin;

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SÉCULO XX – NOVAS TÉCNICAS

• Com as experimentações da música moderna, compositores começaram a


experimentar com técnicas de produção vocais fora da norma do canto lírico,
criando as chamadas Técnicas Vocais Estendidas;
• A primeira a se estabelecer foi o Sprechstimme, utilizado por Schoenberg e seus
contemporâneos;
• Com o passar do século e a virada para o século XXI, diversas novas técnicas
apareceram como canto multifônico, cliques de língua, canto aspirado,
manipulações do vibrato, yodel, faseto, strohbass, entre muitas outras.
• Essas técnicas foram até os limites da escrita musica, sendo necessário muitas
vezes a criação de novas formas de notação.

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SÉCULO XX – NOVAS TÉCNICAS

Aria (John Cage, 1958)

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SÉCULO XXI – LITERATURA DA PEDAGOGIA VOCAL MODERNA

• Donald G. Miller
• EGG Portátil
• Voce Vista
• Resonance in Singing: Voice Building
Through Acoustic Feedback (2008)

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SÉCULO XXI – LITERATURA DA PEDAGOGIA VOCAL MODERNA

• Kenneth Bozeman
• Practical Vocal Acoustics: Pedagogic
Applications for Teachers and Singers
(2014);
• Kinesthetic Voice Pedagogy 2:
Motivating Acoustic Efficiency (2021)

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SÉCULO XXI – LITERATURA DA PEDAGOGIA VOCAL MODERNA

• Sugestão de livro texto atualizado:


• Your Voice An Inside View 3: Voice
Science & Pedagogy (Scott McCoy,
2019)

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