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História do canto ocidental

Uma breve explicação sobre a história do canto no Ocidente como forma de expressão
teatral
Encher os pulmões de ar e soltar emitindo sons que saem em alturas diferentes em forma
de palavras: algo muito simples que qualquer um é capaz de fazer sem o mínimo preparo
e sem comprometimento algum. A arte de cantar, recitar ou interpretar de forma teatral,
porém, não é tão simples, exigem uma técnica apurada além de muita dedicação diária,
em especial, do cantor. Tais técnicas se formaram e foram sendo aprimoradas ao longo de
muitos anos.
Na Grécia antiga, a poesia era indissociável da música sendo que esta arte era
manifestada principalmente em rituais e em encenações teatrais. Os gregos tinham uma
grande preocupação em atingir o público e acreditavam que a música, dependendo de
como ela fosse tocada (da região e do instrumento) poderia alterar o comportamento das
pessoas. Esse poder da música era explicado pela Doutrina do Etos a qual “baseava-se na
convicção de que a música afecta o carácter e de que os diferentes tipos de música o
afectam de forma diferente” (PALISCA, 1994, p. 22). Uma música cantada na região aguda
incitaria um afeto diferente daquele causado por uma melodia entoada na região grave.
Sendo assim, pode-se concluir que um homem de voz mais leve e aguda causaria
emoções diferentes das causadas por um homem de voz grave.
A discussão sobre esse caráter mimético do canto em relação às emoções e à música, em
geral, com relação à natureza, ao ser natural, foi sempre muito discutida e estudada. Cada
época possuía a sua característica na forma de pensar e enxergar o mundo e sua relação
com a música, o que levou, entre outros aspectos, o canto, a um grande desenvolvimento
técnico e interpretativo.
A Igreja foi uma das primeiras instituições a ter uma escola de ensino musical, por volta do
século VIII. Mas já no século VI, o papa Gregório (590-604) propunha uma padronização
dos cantos litúrgicos, conhecidos como cantochão, levando ao surgimento do chamado
canto gregoriano que foi amplamente difundido nas igrejas ocidentais. Na música secular,
tem-se como uma das primeiras manifestações registradas as canções de estudantes ou
clérigos errantes, também conhecidos como goliardos. Estes, por sua vez, deram origem a
diversas manifestações seculares, dentre elas os trovadores e os Minnesinger. Aos
poucos, uma nova prática começa a ser realizada, podendo ser encontra num tratado
anônimo do século XI chamado Musica enchiriadis e num outro manual que o completa,
Scolica enchiriadis, como descrito por Palisca (1994, p. 98). Eles apresentam duas formas
distintas de se cantar em conjunto chamadas de organum. Uma delas consistia numa
melodia de cantochão entoada por uma voz principal que era duplicada uma quinta ou
quarta abaixo por uma voz secundária e ambas poderiam ainda ser dobradas em uma
oitava. O desenvolvimento dessa prática polifônica só foi possível graças à criação de uma
escrita musical. Com ela, o compositor pôde expressar melhor suas vontades e
habilidades criando músicas para até mais de dez vozes que eram executadas tanto no
meio secular quanto no religioso. Uma das características dessa prática era o canto
melismático, no qual eram escritas diversas notas para uma mesma sílaba do texto,
geralmente nas vozes mais agudas. Com a difusão dessa prática, apareceram cantores
que procuravam se aprimorar cada vez mais nas técnicas vocais a fim de realizar perfeitos
e complexos melismas. Os nomes dados a cada uma das vozes foi se modificando até
chegar, no século XVI, no que conhecemos como soprano, alto, tenor e baixo. Cada uma
dessas vozes com sua respectiva clave que determinava a região das notas que seriam
cantadas.
O desenvolvimento das técnicas vocais possibilitou aos compositores escrever para
músicos mais habilidosos que geralmente trabalhavam no mesmo lugar que o compositor
e com isso podiam fazer criações mais elaboradas como descreve William James Gibbons
(2006) em sua tese.
De uma série de tentativas de dramatizar a música como, por exemplo, nos jograis,
dramas religiosos, nos madrigais representados e numa mentalidade renascentista de se
espelhar nos conceitos gregos de tragédia e música, surge a ópera. Mais tarde, final do
século XVII, apareceram os teatros de ópera e a necessidade de uma voz que fosse
claramente ouvida por todas as pessoas desse teatro. Era necessário um treino mais
específico por parte do cantor, pois afinal, “a voz do cantor deveria ser ouvida onde quer
que fossem realizadas a apresentações” como disse Abel Rocha em suas aulas
(informação verbal). Nasce então, em meados do século XIX, uma nova técnica vocal e a
noção de cobertura da voz ou raccolto. “Antes os sons eram emitidos com demasiada
clareza e abertos, tornando a voz branca...” (COSTA, 2001, p. 69). Mas isso não quer dizer
que eram vozes destreinadas, muito pelo contrário. Com essas novas técnicas e
exigências surgem também novas denominações vocais como o termo barítono designado
para uma voz de tessitura mediana, entre o baixo e o tenor.

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