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Teen Titans, assim como Duna, Holy Avenger e Star Wars, não me pertencem, em

qualquer forma ou qualidade.

CAP 10

Ravena tinha acordado tarde esta manhã. A maratona de filmes tinha começado às
06h20min e terminado por volta de três e meia da madrugada. E ela tinha assistido a
todos os cinco, por mais difícil que isso seja de se acreditar.

Ela levantou-se por volta de 10h30min, e foi tomar um banho com a cabeça imersa em
pensamentos. A principal razão pela qual descera para se juntar aos demais, na noite
anterior, era a esperança de tirar sua mente do evento que ocorrera imediatamente antes.
A empata estava se sentindo tão confusa naquela hora, que estava até mesmo disposta a
se expor a qualquer que fosse o besteirol escolhido por seu colega verde. Naquele
momento, ela estava realmente disposta a sacrificar alguns milhares de neurônios, desde
que conseguisse se esquecer daquela tarde no processo.

Se algum de seus amigos Titãs lhe perguntasse o que tinha ocorrido na tarde do dia
anterior, ou porque ela queria tanto tirá-la da cabeça, provavelmente não obteria
resposta nenhuma. Primeiro porque correria o risco de parar em uma dimensão nada
agradável. E segundo porque a própria Ravena não tinha palavras para descrever o
ocorrido. Seria apenas capaz de dizer que Mutano invadira seu quarto e a tratara de uma
forma que ela jamais esqueceria. Uma forma que a fizera ficar feliz e furiosa ao mesmo
tempo. Que de uma só vez relativizara todos os seus conceitos mais rígidos. O que tinha
ocorrido naquele quarto tinha deixado a empata sem a mínima idéia do que fazer e até
do que pensar.

O problema é que assistir a todos aqueles filmes tinha lhe dado ainda mais coisas para
pensar. Em primeiro lugar, e menos importante, é que nenhum dos cinco era a coleção
de imbecilidades que ela esperava. Na verdade, tinha até gostado do primeiro e do
terceiro. Quanto aos outros três, apesar de não agradarem, tinham uma história bastante
sólida: ela tinha ficado absorta neles.

Em segundo lugar, ela tinha se distraído tanto que nem percebera o frio da noite sumir
de repente. Apenas quando o quinto e último filme chegou ao final é que ela percebeu
que estava acariciando um gato (verde!) adormecido em seu colo, e nem tinha idéia de
como ou quando ele tinha ido parar ali.

- Bem-feito. – Falou Ravena, com o cabelo cheio de xampu. Estava lembrando que
carregara aquele “gato” nos braços até a cozinha, e, no momento em que ele abrira os
olhos, largara-o dentro da lata de lixo. Ela estava sorrindo quando disse essas palavras.

Mas o que mais ocupava a mente da empata eram coisas no interior dos filmes. Em três
dos cinco, ela tinha visto algumas cenas, as quais a perturbaram profundamente. Eram
diálogos, declarações ou discursos, cujas palavras de alguma forma tocavam alguma
coisa dentro dela. No começo, Ravena não tinha dado maior importância, mas pouco
depois descobriu que aquelas cenas continuavam retornando à sua mente, sem parar.
Como a letra de uma música ruim, mas com uma diferença. Cada vez que uma dessas
memórias vinha à superfície de sua consciência, Ravena não conseguia deixar de ficar
pensando sobre o que aquilo poderia significar, se era verdade, e, acima de tudo, porque
ela se importava.

A água quente do chuveiro estava fazendo os músculos da empata relaxar, e, junto com
a sensação agradável de limpeza, a faziam se sentir menos preocupada. Parada embaixo
da água quente que chovia sobre seu corpo, ela acabou deixando a mente divagar, e com
isso, permitindo a chegada da memória de algumas cenas do terceiro filme.

Era, assim como os dois primeiros, baseado em uma série literária muito apreciada,
Duna. Isso por si só era uma surpresa: Mutano escolhendo filmes baseados em livros?
Ravena jamais imaginara que um dia fosse ver algo assim. E nunca conseguiria
descobrir o porquê, se o metamorfo não já tivesse dado a resposta. “Escolhi os filmes
pensando em você, Rae...”. Foram essas as palavras que ele usara. Não deveria
significar nada, mas ela não conseguia evitar sentir um calor agradável subindo pelo
peito, toda vez que lembrava disso.

A história dessa série desenvolvia-se em um império galáctico, no qual uma substância


rara, que existia em um único planeta, prolongava a vida e dava poderes a seus usuários.
Todas as lutas de poder se resumiam ao controle de tal substância, a especiaria. Apenas
um homem, que veio a ser conhecido como o Imperador, conseguira finalmente
eliminar seus oponentes, através do uso de seus poderes de presciência, e assumir total
controle da galáxia. No entanto, ele desapareceu sem deixar vestígios, deixando sua
irmã como regente e seus dois filhos recém-nascidos. Esses três, embora não fossem
capazes de ver o futuro, tinham as memórias de TODOS os seus antepassados,
remontando até o início dos tempos. Mais do que isso: essas “memórias” mais pareciam
manifestações psíquicas autônomas de cada ancestral. Em outras palavras, cada
memória era, na verdade, como uma pessoa dentro da cabeça desses três. Cada memória
tinha voz, vontade própria e personalidade distinta, e era capaz de mais do que
simplesmente esperar ser consultada.

E, de fato, a regente, que tentava controlar ou suprimir as vozes do passado, foi


lentamente enlouquecendo. Os ancestrais faziam mais e mais força para serem ouvidos,
até que um deles, mais forte, acabou por corromper a mente dela, praticamente
assumindo o controle. As duas crianças, por outro lado, fizeram uma abordagem oposta
a seu poder. Elas aceitavam as Outras Memórias. Brincavam de ser elas. Conversavam
com elas. E, no início da adolescência, já tinham controle total. Não tinham o poder,
elas ERAM o poder. A moral da história tinha sido bastante clara: suprimir as vozes só
piorava as coisas. O segredo era aceitá-las, comungar com elas, torná-las parte de si
mesmo, e assim finalmente controlá-las. No filme, é claro.

Ravena não entendia por que isso, dos três primeiros filmes, não parava de voltar à sua
mente. Não era relevante. Era só uma ficção literária que virara filme. Não era, em
suma, verdade. Mas, mesmo assim, por que ela tinha a impressão de que isso era
direcionado a ela? Por que tinha a impressão de que estavam fazendo-lhe uma crítica a
cada vez que pensava nisso? E por que isso a incomodava tanto?

A empata não conseguia entender. Sentia que a resposta estava em algum lugar de sua
consciência, mas, mesmo assim, não conseguia encontrá-la. Tentando focar sua mente
em outra coisa, ela terminou de se secar e foi direto para o espelho pentear o cabelo.
Enquanto corria a escova por suas mechas lilás, os pensamentos que a acompanhavam
foram lentamente substituídos por outros, que infelizmente não eram os que ela
esperava ter. Mais especificamente, um diálogo que estava no quarto filme assistido na
véspera, um anime brasileiro, Holy Avenger.

Em uma enorme câmara de cristais multicor, um idoso, com longos cabelos cinza e
barba da mesma cor, trajado em um robe de cores meio apagadas, conversava com
uma menina muito mais jovem, de pele clara e cabelos curtos, da cor do ébano.

- Conforme fui tão solícito em demonstrar, Petra, um encanto fraco não pode ser usado
para exigir uma coisa muito difícil ou penosa. Apenas encantos muito fortes podem
fazê-lo. – Disse o mago.

- Encantos podem ser simples ou poderosos, mas há uma lei absoluta que todos eles
seguem. Nunca, jamais, nenhum encanto poderá vencer um amor verdadeiro! – Ele
continuou, falando para a menina que escutava.

- Se você ama uma pessoa, do fundo do coração, nem mesmo o mais forte encanto de
Arton pode obrigar você a causar algum mal a essa pessoa. – e, após uma pequena
pausa, enfatiza. - Isso é IMPOSSÏVEL! Até mesmo para os DEUSES!

Ravena achava isso uma piada sem graça. Então aquele desenho animado estava
tentando dizer que maior é a força mais poderosa do universo? “Sem chance”, ela
pensou enquanto escolhia um uniforme. Sua própria existência era a prova de que amor
não tem qualquer tipo de influência sobre coisa alguma. Ou melhor, serve para te deixar
vulnerável. Fraco. Serve para te causar dor. Só isso.

Amor nunca tivera lugar na vida da empata. Ela tinha sido criada como ferramenta: um
portal para trazer Trigon para a Terra. Desde seu nascimento, durante toda a sua vida
em Azarath, a ninguém era permitido lhe mostrar afeto ou amizade em qualquer forma.
Não que quisessem, é claro. Na verdade, as pessoas de lá sempre estavam dispostas a
demonstrar desprezo, raiva, medo, desconforto e demais emoções desse tipo. Até
mesmo sua mãe, nas raras ocasiões em que podiam se ver, não demonstrava... nada.

Ela admitia, no entanto, que gostaria que o diálogo do filme fosse verdade. Afinal, se
fosse, talvez ela não precisasse se preocupar tanto com o risco de seus poderes
arrasarem tudo à sua volta. Talvez pudesse sentir alguma coisa. Mas isso era apenas
pensamento desejoso, ela concluiu enquanto ajustava a capa e o capuz nos seus devidos
lugares. Nada mais que isso.

Enquanto seguia os corredores em direção à sala comum, reparou que eles, mesmo com
as lâmpadas acesas, pareciam estar numa espécie de penumbra. Lembravam o interior
daquela espaçonave que o protagonista do 5º filme usava (Qual foi o nome que
Ciborgue disse? SW: Kotor?). Essa lembrança a fez pensar na última cena que se
recusava a ser esquecida.

Era um filme (ou será que era desenho animado? Cinema feito com videogames era uma
coisa que só poderia ter saído da cabeça do Mutano, mesmo. Até Ciborgue tinha um
mínimo de bom-senso.) com a velha história clássica. Um “império do mal” quase
conquistou a galáxia, e agora tudo está nas mãos de um herói bonzinho, etc. Mais ou
menos na metade da animação (não muito antes da mocinha ser raptada) é que ocorreu o
diálogo que incomodava Ravena.

Numa sala no interior da espaçonave, dois homens conversam. Um deles é negro,


careca e com um bigode branco no rosto. O outro é bem mais jovem, de pele morena e
cabelos lisos e pretos. O mais velho é quem está falando:

- ... História antiga entedia as crianças. Fato comprovado. – Ao que o homem mais
jovem respondeu:

- E gente velha adora falar sobre história antiga. Fato comprovado.

- Já está respondendo? Ah, está bem, você pediu. Só não reclame depois.

E então o velho começou a falar de uma guerra da qual ele teria participado 40 anos
antes, e o que ele fazia antes e depois da guerra, etc. de todo aquele discurso, foi esta a
parte interessante:

- ... O Conselho é paranóico demais para com o Lado Negro, e suas decisões refletem
isso. Um Jedi não pode sentir ódio. Não pode sentir medo. Não pode sentir amor. Não
pode sentir nada. Quer dizer, pelo menos isso é o que eles gostam de dizer.

- Então você acha que o Conselho está errado?

- Não está prestando atenção, garoto? Desde quando generalizar é inteligente? Ainda
mais com o Lado Negro?

- O que você diz não faz sentido. Medo e ódio são um caminho para o Lado Negro. Na
verdade, todas as emoções fortes podem te levar ao Lado Negro, se não for mantido o
controle sobre elas.

- Ah, é, espertinho? Já que você sabe tanto assim, me diga: Quantas vezes um
sentimento de amizade levou alguém a um frenesi homicida? – Desafiou o velho.

Evidentemente, não houve resposta, e por isso ele continuou.

- É claro que algumas emoções são mais poderosas e difíceis de controlar do que
outras. Veja o amor, por exemplo. Os mestres do conselho o consideram até pior do
que raiva e ódio, de vez em quando.

- Mas você pensa diferente. – Observou o homem mais novo.

- Amor é uma emoção poderosa... incontrolável. Mas não é ele que te leva para o Lado
Negro. Inevitavelmente, o amor vai ter trazer tanta dor e tristeza quando traz
felicidade. Mas é a forma como você reage a isso é que determina a extensão do
domínio que o Lado Negro tem sobre ti. Amor, por si só, vai salvá-lo, não condená-lo.

A partir desse ponto, o diálogo continuou mais um pouco, mas não tinha mais nada que
atraísse a atenção de Ravena, que considerava que a moral desse diálogo era mais ou
menos a mesma do quarto filme. Amor salva. A única coisa diferente é que sugeria
manter sob controle só as emoções negativas. Se fosse verdade, ia ser até legal. Mas os
poderes da empata exigiam que TODAS as emoções fossem suprimidas, sem levar em
conta se elas eram positivas ou não.

Nesse instante, Ravena abriu a porta da sala onde os seus quatro amigos estavam
preparando o almoço. Pelo visto, todos tinham acordado tarde hoje. Observando ao
redor, ela percebeu que as cenas dos filmes, nas quais estivera pensando até agora,
tinham finalmente abandonado sua mente. Mas não teve tempo de sentir qualquer
alívio, pois se viu com outra coisa para ocupar o espaço mental vago.

- Oh, Azar, ELE está aqui. – Ela pensou, sentindo toda a tarde anterior voltar à sua
memória. De fato, naquele momento, os cinco Titãs estavam reunidos esperando pela
refeição, e isso incluía um certo adolescente de orelhas pontudas.

A empata sentiu-se novamente frustrada, ao mesmo tempo em que se concentrava para


não perder o controle de sua energia. Não sabia ainda o que fazer em relação a seu
colega verde, e isso a incomodava. Ignorá-lo? Tentador, mas Ravena já tinha o costume
de fazer isso há muito tempo e nunca adiantou nada. Bater nele? Ela fazia isso
ocasionalmente, mas essa era outra coisa que nunca fez o metamorfo manter distância.
Além do mais, ela não estava com vontade de fazer isso. Se trancar no quarto até o fim
do ano? Ravena nem tinha idéia de onde esse pensamento ridículo veio. Ficar trancada
não ia facilitar em nada a situação. E ela não queria ficar só, isolada de tudo e todos.
Não sabia por que justo agora isso parecia tão ruim, mas essa era a verdade.

Ela detestava todas essas dúvidas. Detestava não saber o que fazer. Isso a frustrava tanto
que a deixava até com raiva. Mas as piores de todas as dúvidas eram causadas por
algumas perguntinhas muito insistentes.

- O que todo aquele... momento de ontem significa?

Ravena já tinha perdido a conta das vezes em que tinha pensado essa pergunta. Podia
não ser nada, é verdade, Mas definitivamente parecia mais, muito, muito mais. Ela
podia sentir o coração se acelerando ao lembrar. A mão que segurava o garfo tremia,
derrubando seu conteúdo de volta no prato. Não, Ravena não queria que o significado
de tudo aquilo fosse nada.

Só que isso levava a outra pergunta: O que Mutano pretendia? O que todo o momento
de ontem significava para ele? Haviam várias respostas possíveis, e todas a apavoravam.
Incomodava-a não entender o que ele queria, e incomodava-a ainda mais vê-lo ali, de
barriga cheia, conversando despreocupadamente com os outros a respeito dos filmes de
ontem. Ele parecia completamente à vontade, como se os eventos do dia anterior
estivessem completamente esquecidos. O prato que Ravena estava lavando cobriu-se de
rachaduras, à medida que a empata se enchia de inveja e frustração, por ela estar se
sentindo perdida, confusa, e ele não.

E, por último, havia uma pergunta tão importante quanto as demais. O que ela, Ravena,
queria? Nunca tinha pensado em si mesma dessa forma. Nunca tinha realmente
considerado a possibilidade de um... romance ou coisa assim. E tinha bons motivos para
isso. Primeiro, por causa de seus poderes. Segundo, porque nunca esperara viver além
dos 16 anos. Terceiro, porque não conseguia imaginar como alguém poderia se
interessar por uma meio-de... pessoa como ela. Na única vez em que realmente aceitara
abrir o coração, só conseguiu permitir que um dragão aprisionado o partisse ao meio.
Não, ela não tinha a mínima intenção de se arriscar a sentir esse tipo de dor novamente.
Mas, mesmo assim, não conseguia evitar sentir uma onda de expectativa a respeito de
tudo isso. Sabia que algo ia acontecer em breve. Só não sabia ao certo como.

- Detesto não ter respostas. – Ela disse enquanto retornava a seu quarto.

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Mutano estava bastante satisfeito enquanto se dirigia para a biblioteca. Durante a noite
anterior, tinha arriscado a própria existência para tirar uma dúvida, e tinha chegado à
melhor conclusão que tivera nos últimos tempos:

- Ravena não me odeia. – Pensou ele.

A forma como ele comprovou isso foi bastante ousada. Na noite anterior, quando ela
tinha descido para ver os filmes, tinha se sentado ao seu lado (verdade, era o único lugar
vago, mas ela podia muito bem ter levitado em posição de lótus, como freqüentemente
fazia). Além disso, por um instante, ele tinha visto algo nos olhos dela. O metamorfo
não sabia ao certo o que era, mas se sentiu encorajado. Por isso, lá pelo final do terceiro
filme, fez algo que, em outra ocasião, seria considerado suicídio: virou um gato persa e
deitou no colo da empata.

Ele esperava que ela não o deixasse fazer isso. Esperava ser jogado no chão. Talvez até
levar um chute. Mas nada disso aconteceu. Ravena estava tão absorta com os filmes
escolhidos que nem percebeu a presença dele. Ou talvez tenha, porque lá pela metade do
quinto filme ela estava até acariciando-o. Tudo bem que, quando tudo acabou, o gato-
Mutano foi parar dentro da lata de lixo, mas uma coisa era certa: se a empata estivesse
com raiva dele, nada disso teria acontecido, certo?

Por outro lado, é verdade que ela estava diferente no almoço. Não falou uma palavra
com ninguém. Parecia completamente concentrada em alguma coisa. O que, ele não
tinha a menor idéia. Mas devia ser algo muito importante, já que ela mal estava vendo o
que fazia. Mutano chegou até a colocar um tablete de tofu assado no prato dela, para ver
se a despertava de seu transe, sem sucesso. Na verdade, ela até COMEU o tofu e nem
pareceu ter se dado conta disso.

- Você está morto, Mutano. Morto. – O metamorfo lembrou-se das palavras que
Ciborgue disse ao ver a cena acima descrita.

Mas ele iria se preocupar com isso mais tarde. Porque agora ele ia ter que encarar o
livro mais chato e inútil que já tinha visto na vida. Enquanto abria a porta da sala de
estudos aonde lia, disse a si mesmo para não esquecer de perguntar ao Sr. Smith como
foi que aquele lixo de livro sobreviveu aos séculos.

--\\--\\--
Estelar estava muito preocupada com sua amiga. O que ela viu hoje só confirmou-lhe
que ela não estava normal. Nunca, desde que chegara à Terra, tinha visto Ravena se
comportando dessa forma.

Na verdade, as suspeitas da princesa tamaraneana surgiram quase quatro meses atrás.


Ela lembrava que sua amiga tinha passado quase que um mês e meio basicamente
trancada no quarto, saindo quase que só para comer e ir ao banheiro. Estelar mal a tinha
visto durante esse período, e, quando a via, notava que ela nunca parecia estar bem.

Bem que tentara chamar Ravena de lado algumas vezes para conversar, tentar descobrir
o que a afligia, mas nunca teve sucesso. Suas tentativas de iniciar uma “conversa de
meninas” foram todas rechaçadas, como de hábito. Só que desta vez, Estelar não pudera
insistir como antes, pois, além de Silkie, tinha que dividir sua atenção com Robin, com
quem finalmente tinha engatado um namoro, após a viagem a Tóquio. A tamaraneana
não conseguia evitar sentir que tinha sido negligente para com sua amiga.

Após aquele fatídico mês e meio, Ravena tinha aparentemente voltado ao normal. Na
verdade, parecia até um pouco melhor. Na época, a intuição feminina de Estelar lhe
disse que sua amiga parecia um pouco mais feliz, e, por isso, acabou deixando de lado a
conversa urgente que pretendia ter.

Mas agora, no entanto, parece que tudo está envolto por um caos. Desde que toda a
equipe fora ao shopping, Estelar vira que tinha algo perturbando sua amiga. E muito.
Até mais do que antes. Porém, a razão disso ainda era um mistério para ela. Já tinha
visto Ravena parecer triste, alegre, esperançosa, assustada, preocupada, à vontade, e
muito mais. Tudo isso nos últimos dois dias. E isso era estranhíssimo, já que sua amiga
escondia seus sentimentos tão profundamente que até mesmo ela tinha dificuldade para
entender.

Sem saber direito o que iria dizer quando encontrasse Ravena, Estelar estava repassando
em sua mente os acontecimentos desde dois dias atrás, começando a partir da parte em
que Mutano tinha terminado de usar aquela máquina de dança. Ele tinha falado alguma
coisa para seu amigo Ciborgue, e nesse momento, a empata quase que arrancou a cabeça
dele fora. Mas o que foi que ele tinha dito mesmo? Estelar não conseguia lembrar. A
única vez que ela tinha visto sua amiga Ravena avançar para cima de seu amigo Mutano
desse jeito fora em Tóquio, quase um ano terrestre antes. Na época, após a luta contra
um lagarto gigante, ele também tinha dito algo momentos antes que provocara a raiva
de sua amiga. Tinha dito “atrair”, “pegar”, “bonitinhas”, ou alguma outra coisa nessas
linhas, o que não fazia sentido. A princesa tamaraneana lamentou não entender o
significado daquelas palavras que seu namorado Robin classificava como “gíria”. Com
certeza esse conhecimento lhe seria útil agora.

E isso não foi tudo. O dia de ontem fora... peculiar, na melhor das hipóteses. Robin e
Ciborgue tinham tentado convencê-la a esquecer o que vira naquela tarde, mas Estelar
não podia: era impossível esquecer que tinha visto dois de seus amigos, Ravena e
Mutano, daquele jeito. Um meio enrolado no outro, ele a prendendo contra si, e ela, em
vez de afastá-lo como sempre fazia, estava rindo. Rindo muito. Era contrário a tudo o
que ela jamais esperava de sua reclusa amiga.
E, no final da tarde, a tamaraneana vira Ravena descer para se juntar aos demais na
frente da televisão. No começo, pensou que ela vinha para agredir seu colega verde, mas
não. Não apenas ela se sentou e assistiu tudo (tudo!), como, mais para o final da noite,
permitira que Mutano virasse um gato e deitasse em seu colo. É bem verdade que ele
estava A-D-O-R-Á-V-E-L naquela forma, mas isso nunca afetara a empata antes. Desta
vez, no entanto, ela estava até acariciando ele! Até carregou o amigo no colo até a
cozinha!

Estelar não conseguia resolver esse enigma. Primeiro, sua amiga, sempre tão reservada,
ter ficado tão irritada por Mutano mencionar alguma coisa sobre a aquisição de filhotes
fêmea de gato. Segundo, por no dia seguinte, ver os dois nem comportamento tão
próximo. Algo que ela pensava ser absolutamente impossível para a empata e o
metamorfo. E ela não conseguia entender o porquê. Ela só entendia que sua amiga ia
precisar de ajuda.

E Estelar não iria negar esse auxílio. Ainda tinha perguntas, mas decidiu que as ouviria
da boca da própria Ravena, enquanto subia para o quarto dela.

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