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digital

do trabalho
12 os laboratórios
classificaçãoenquanto
mídiassociaise sua
dos usuáriosnas de plataformas de trabalho como a
atividades global
com a para 0 trabalho plataformi7Ad0 os
partirde2016, especificamente
deslocaram ora reunido revela as múltiplas
debatesse O material
que é 0 trabalho em plataformas.
laboratório da luta de classes tempo, consistência académica
do ao mesmo e linguagem
livroapresenta, servindo como introdução
maisamplo, indispensável
a um público plataformasque vêm sendo empreendidos ao
dirccionada
trabalho em INTRODUÇÃO
aosdebatessobre em obrascuja
maior parte ainda não recebeu uma
do mundo
-conduzidos
antes um primeiro
passoque uma discussão fechada, afinal, estamos Trabalho em plataformas é
É
brasileira. sobre o tema não param de proliferar.
cm meioà tempestade, e as investigaçóes
têm em mãos um material valioso
laboratório da luta de classes
e a leitorano Brasil
Dessaforma,o leitor mais diferentes camadas desse fenómeno.As RafaelGrohmann
de descortinaras
em suacapacidade conceitose cenários do trabalho digital que explicam
por o
entrevistaspassam comocolonialismode dados, marcadores sociaisdo
que vivemos —
momentoem inteligência artificial, moderação de conteúdo, discursos A pandemia do novo coronavírusaceleroue intensificouo processodc platafor-
trabalho cm plataformas, mizaçáodo trabalho, que tende a Se generalizarpara todas as áreas.Trabalho re-
e ao mindfidness,algoritmos e dados, descoloniza_
ligadosao empreendedorismo desigualdades —e vão até moto, ensino à distância, livese trabalho por aplicativossáo sintomas da crcsCcntc
automatização de possibilidades de
çáode tecnologiase dessa conjuntura a partir da organização dependência de infraestruturasdigitais —geralmente alimentadas por dados c
transformação sociale enfrentamento automatizadas por algoritmos —para a realizaçáode atividadcs laborativas. Essa é
cooperativismo de plataforma e de plataformas ligadas ao co-
de trabalhadores,do públicas e em prol da desmercantilizaçáo. a definição de plataformizaçáo do trabalho. Entregadores, professores,jornalistas.
trabalhadores,
mum, de propriedadedos profissionaisque alimentam dados para a inteligéncia artificial (IA): sejade casaou
destelivro só foi possívelgraças ao Ministério Público do
A realização das ruas, os trabalhadoresenfrentam um verdadeirolaboratórioda luta de classes
especialmente nas figuras das procuradoras Clarissa
Trabalho(MPT-15aRegião), em seus novos-velhosexperimentos.
Junges Zani e do procurador Mario Antonio Gomes,
RibeiroSchinestscke Fabíola Concebero trabalhoem plataformascomo laboratórioda luta de classesé
publicação, como desdobramento do convénio de
devidoao apoioconcedidoà compreenderque tanto as novasformasde controlee gerenciamentopor parte
Estadual de Campinas (Unicamp),
cooperaçãocelebradocom a Universidade do capital quanto as possibilidadesde construção de alternativas por parte da
Antunes, também coordenador da cole-
sobcoordenaçãodo professorRicardo classe-que-vive-do-trabalhonão estão dadas. Por um lado, mecanismos como
da qual este livro faz parte. Também agradecemos ao gestão algorítmica, gamificaçáo,dataficaçáoe vigilânciasáo experiênciasdo capital
çáoMundodo Trabalho,
CentroNacionalde Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo rumo à intensificaçãodo trabalho e ao controle da Classetrabalhadora. Por outro.
apoioconcedidono processon. 439.025/2018-4, chamada MCTlC/CNPq os trabalhadorestambém fazemexperimentaçõese prefiguraçõesem torno de
n. 28/2018—Universal. novasformas de organização,reapropriaçõesde tecnologiasdigitais em beneficio
próprio, pressãopor condiçõesdecentes de trabalho e construçáode plataformas
Rafael Grohmann alternativas, cooperativase autogestionadas.
setembro de 2020 Esse laboratórionão nasceu agora. A plataformizaçáoé. ao mesmo tempo,
materializaçãoe consequênciade um processohistórico que mistura capitalismo
rentista, ideologiado Valedo Silício,excraçáocontínua de dados e gestão neoliberal.
Urna das bases está na crescente responsabilizaçãoindividual dos trabalhadores
por tudo o que envolveo trabalho, circunstânciaque Wendy Browni chama de

Wendy Brown. Cidadania sacrificial: neoliberalismo. capital


Juliane BianchiLeio, Sio Paulo.Zazie.2018).
trabalhodigital
14 os Introdução 15
trabalhadoressáo obrigados a fazer a gestão
Assim, os das
sacrificial". vulnerabilidades, tendo de
"cidadania toda a sorte de escutar que
A comunicação também atua como um braço organizador e mobilizador do
próprias metadados transformados em capital
Já os dados e
"privilégio". , soma- trabalho nas plataformas digitais, sendo o centro de disputas nesse universo e en-
isso um a dar forma às distintas possibilidades
de apitai,
das mais variadas
volvendo tanto as lógicas de controle e gestão quanto as de resistência e organização
dos
dasplataformas, dependentes dos trabalhadores. Ela funciona como mecanismo de justificação dos modos de
extraçáodo valor basta olhar somente para as plataformas
vivo.Issosignificaque não em ser e de aparecer do capital; mobiliza e faz circular determinados processos
de trabalho plataformizado, mas é preciso olhar também para
0 trabalho produtivos e usos e sentidos das plataformas em detrimento de outros; e emprega
siparacompreender financeirizaçáo,neoliberalismo e dataficação, por exemplo. estratégias para fazer circular sentidos que ligam as empresas de plataformas a atri-
entre
as inter-relações O capitalismo de plataforma
refeudalizaçãoou protoforma. éa butos como inovação, disrupção e responsabilidade social. Quando essas empresas
Não se trata de partir dessas combinações.
seu desenvolvimento a nomeiam diretores para o cargo de "líder de políticas públicas" temos a síntese
própriaexpressãode
como quaisquer tecnologias, apresentam valores e de como elas pensam o público e o privado a partir das lógicas da racionalidade
As plataformas,assim
desenhos,algoritmos e interfaces, podendo apresentar empreendedora. É a gramática do capital, que circula nos mais diferentes disposi-
normasinscritosem seus tivos midiáticos, desde o Linkedln até os discursos de coaches,passando inclusive
Há materialidades envolvendo as plataformas, pois
mecanismosdiscriminatórios.
e dependem da extraçáo de recursos naturais e por setores da classe trabalhadora. Isso não quer dizer que os trabalhadores neces-
são frutodo trabalhohumano sariamente aceitem e naturalizem as prescrições do capital a partir de seus signos
por meio de cadeias de produção. Essas
fisicosquesetransformamem artefatos circulantes; existe sempre uma disputa de sentidos.
tanto em relação a processos de trabalho e ao
materialidadesservemparapensá-las É preciso também salientar que os mecanismos da plataformizaçáo do tra-
interfaces das plataformas —enquanto
meioambientequantoem relaçãoàspróprias balho não acontecem no vazio. Isto é, esse processo está longe de ser homogéneo,
meios—no que tange às afordances inscritas em suas arquiteturas. Isto é, existem
das plataformas.
pois há distintos tipos de plataformas digitais e, por conseguinte, diversos perfis
políticasem todo o circuito de produção e consumo
de trabalhadores, com marcadores de género, raça, fraçóes de classee território.
A infraestruturadas plataformas,então, fornece as condições básicas e as Há desde a plataforma francesa Creme de Ia Cràme, considerada "a primeira co-
basestécnicaspara a organizaçãodo trabalho realizado nelas. Elas são, portanto, munidade seletiva de freelancers", especialmente dos setores de tecnologia, dados,
desenhadas paradeterminadas formasde interaçáo em detrimento de outras. design e marketing digital, até as conhecidas plataformas de entrega de merca-
Podemfacilitar,por exemplo, a relação consumidor-trabalhador em prejuízo das dorias, passando por aquelas cujos trabalhadores produzem dados para sistemas
relaçõesentre trabalhadores.Ou seja, podem ser projetadas visando precisamente de inteligência artificial. Cada plataforma, ainda que de um mesmo setor, possui
a essa desarticulação. mecanismos e materialidades próprios, o que contribui para a complexificação do
O trabalhoem plataformas se dá em confluência com processos produtivos cenário. Dessa maneira, é impossível dizer que existe apenas um perfil de traba-
e comunicacionais.Em primeiro lugar, são as práticas materiais de comunicação lhador ou de plataforma.
queestruturame organizamas relações de trabalho, de modo que não há traba- Além disso, as desigualdades são o padrão do trabalho em plataformas, não
lho semelas.Consideramos,assim, que as plataformas são, ao mesmo tempo, uma exceçáo. Segundo Niels Van Doorn, o trabalho plataformizado é "completa-
meiosde produçãoe meios de comunicação, ou seja, meios de organização mente incorporado a um mundo criado pela forma-valor capitalista, que depende
das atividadeslaborativase comunicacionais, da subordinação de trabalhadores de baixa renda racializados e generificados"2. Em
apresentando-se com contornos
tambémpolíticos.Os mecanismos das São Paulo, 71 % dos entregadores das plataformas são negros. A pesquisa de Safiya
plataformas, como gestão algorítmica
do trabalho, extraçáo de dados
e vigilância automatizada, configuram-se, pois, Noble e Sarah T. Roberts 3, por exemplo, mostra como as elites tecnológicas do
como processoscomunicacionais Vale do Silício trabalham para esconder as inscrições racistas em seus produtos e
e de gerenciamento dos trabalhadores. Dessa
forma,as plataformastambém nas relações de trabalho em suas empresas, a despeito de discursos pós-raciais. Já
contribuem para a aceleração da produção e
circulaçãodo capital,como
Marx já alertava nos Grundrisse* em relação à fun-
çáo dos meiosde comunicação
e transporte, reforçando o papel desses meios
nacirculação do capital. Niels VanDoorn, "PlatformLabor:On CheGenderedand RacializedExploitationofLow-Income
ServiceWork in Che'On-Demand' Economy",Information, Communication& Society,v. 20,
n. 6, 2017, p. 898-914.
Karl SafiyaNoble e Sarah T. Roberts, "Elites tecnológicas, meritocracia e mitos pós-raciais no Vale do
(trad. Mario
Nélio Schneider, São
1857-1858. Esboçosda crítica da Silício",Fronteiras—EstudosMididticos,
v. 22, n. l, 2020.
Paulo, Boitempo, 2011). (N. E)
digital
laborat—d0
16 os
GabrielaLukács4evidenciamcomo o trabalho Introduçao 17
comoasde plataformas no Japão é o que estrutura
pago
cm a economia
de mulheres Contextualizara geopolíticado trabalhocm plataformassignificatambém
ou mal pago
digitalno país. compreenderos diferentessentidosde trabalhonas economiasde cada paíse que
do trabalhoatravessadiferentes sujeitos sociaisde múlti_ a Europa e aAmérica do Norte não sáo o "padrão".No Norte, houve a emergência
A como um processo homogéneo.
sem configurar situações de expressóescomo gig economypara nomear o cenário do trabalho em plataformas.
piasmaneiras, entrecortadaspor esses marcadores sociais de desigualdadesde
trabalhodistintas, se coloque como algo neutro e
e o que condiz com o contexto específicodos paísesdessaregião, que querem tornar
o controlealgorítmico objetivo. universala validadede suasdenominações.Ora, a históriada economiabrasileira
diferenças,embora género,há outros importantes fatores
e relacionados ao
Alémdc raça,classe se traduz em ser uma grandegig economy,com o gig sendo a norma permanente,
comoas temporalidadese espacialidades do trabalho
emplataformas, algo imposto na gestãoda sobrevivênciada classetrabalhadora.Issosignificaque a
trabalho de trabalho. As tem poralidades
as condições estão marcadas precariedade e a informalidade não são novidades.Por essemotivo, a expressáogig
digital,queimpactam com a cristalização da cultura de seus
plataformas, economyéequivocadaparanomearo que sepassaatualmenteno mundo do trabalho
desdeo desenhodas criadores,
dc e
agilidade orimizaçáoda produtividade, auxiliadas por uma gamifi- brasileiro.Porum lado,podemospensarhistoricamenteo trabalhono Brasilcomo
embusca
processos de gestão. uma grande gtg economycm contexto de superexploraçáo do trabalho; por outro,
caçáoinscrita nos
Asespacialidadesenvolvemas múltiplas dimensóes de locais em que os como afirmaLudmila CosthekAbíli05,o que aconteceagora é a generalização
escáoinseridosparaexecutarsuas atividades. Em uma dimensão,
trabalhadores
dos modos de vida periféricos. Deve-se também considerar as próprias trajetórias
entenderquaissão os espaçosconcretos de trabalho e suas condi-
brasileiraspara pensar em mecanismosde enfrentamentoda plataformizaçáodo
é necessário trabalho.Não podemossupor que já vivemosalgum dia o Estadode bem-estar
dimensão do trabalho em plataformas
çóes.por todaa cidade?Em casa?Já a socialno paíse não podemos nos esquecerde como a CLT não é a mesma desdea
a umaconcretude
relaciona-se espacialmais ampla, ligada a uma geopolítica
mostrado como as condições de trabalho reformatrabalhistado governode MichelTemer,em 2017.O que há de novidade
global. Por um lado, pesquisas têm no mundo do trabalho no Brasilé justamente a plataformizaçáo,que joga uma pá
em SãoPaulo,Londrese na Cidade do Cabo são muito seme-
de entregadores de cal no processohistóricode flexibilização
e precarizaçãodo trabalho,agoraem
lhanres—especialmenteno que se chama de composição técnica de classes o parceriacom financeirização,dataficaçáoe racionalidadeneoliberal.Como esse
que nos levaa pensar na circulação das lutas dos trabalhadores em contexto de cenáriose repete em muitosoutrospaíses,é notórioque náo se trata, então, de
plataformas.Poroutro, há especificidades locais que demonstram desigualdades uma especificidade nossa.
comdinâmicasdesiguaisNorte-Sul, envoltas em contextos políticos,
geográficas, Porém, o futuro da plataformizaçáo não é dado ou definido a priori. É curioso
sociais,jurídicos, legislativos e económicos. que, enquanto nos anos 1990 haviaquem bradasseo "fimdo trabalho",atualmente
Segundo económicoOnline Labour Index (OLI), da Universi-
o indicador a coligaçãoLinkedln-coachnão parade circularnarrativassobreo "futuro do traba-
dadede Oxford,o maior empregador de tarefas freelance on-line são os Estados lho" —evidentemente marcadas por sentidos ligados à ideologia do Vale do Silício.
Unidos,e a maioriados trabalhadoresfreelance on-line é proveniente da Índia —a As perguntas,como "seremossubstituídospor robôs?",são as mesmasde trinta
maiorparre(59,8%)no setor de tecnologia e software. De acordo com o mesmo anos atrás. Porém,comoressaltaJanine Berg6, economistada OIT, poucaatençáo
índice, os países em que essas tarefas mais são desenvolvidas concen tram-se na Ásia, tem sido dada à crescenteperda de "qualidadeno trabalho"ao redor do mundo.
com destaquepara Índia, Paquistão e Bangladesh. Podemos também ressaltar a Em direçáosemelhante,Aaron Benanav7argumentaque, em vez de desemprego
proeminênciade venezuelanostrabalhando como treinadores de dados para carros em massa,haverá uma crescenteintensificaçãode subempregos.Para ele, não é a
autónomos—que,aliás; tendem a atropelar mais pessoas negras do que brancas — automação, mas são as consequênciasda progressivadesaceleraçãoeconómica em
e de filipinoscomomoderadoresde conteúdo terceirizados de plataformas de curso desde os anos 1970 as responsáveis pelo declínio da demanda por trabalho,
mídiassociais,comomostrao documentário 7he Cleaners*. Isso significa que há num processo em que as transformações tecnológicas atuariam como uma causa
dinâmicas
diferentesde trabalhoem plataformas no Norte e no Sul, que, por sua secundária. O cenário desenhado pela radicalização da plataformizaçáo, portanto,
vez, sáoafeadas por relaçõesde
raça, classe e género.
Ludmila Costhck Abílio, "Plataformas digitais c uberizaçáo: a globalizaçào", Contracampo, v. 39,
n. 1, 2020.
GabricllaLuucs, Janine Berg, "Protecting Workers in CheDigital Age: Technology, Outsourcing and thc Growing
Duke UniRrsiry Press,
byDaign: IVomen Digital Economy (Durham, Precariousness ofWork", Comparative Labor Law PolicyJournal, v. 41, n. 2, 2020.
2020).
Aaron Benanav, Automation and t/" Future ofiVork (Londres, Verso, 2020).
deHansBlocke MoritzRiesewieck,
Alemanha/Brasil,2018, 90 min. (N. E.)
Introduçao 19
18 trabalho —e com um papel
das atividades de central do
e "taskificaçáo" envolvendointeligência artificial, 0 que H trabalhadorestêm de se provar
humanonos
processos
amid comoa Lionbridge,há até tarefasem alemão,e os
de heteromaçáo. cliques,eles têm dc criar contas
BonnieNardi8chamam
não acontece sem o trabalho fantasma proficientes.Em outras,como as de fazendasde Nesses casos,
Ekbiac quea automaçáo —mais de cinquenta, muitas vezes —para poder
sobreviver.
de falsas e
Issosignifica em plataformasglobais de inteligência e vídeos no YouTube
de trabalhadores artificial. elespassam0 dia curtindo c comentando fotos no Instagram
urnamultidão maisespremidosem microtarefas freelance dependentes a partir das tarefassolicitadaspelasplataformas, em geral
brasileiras.
ada vez sustento.É isso que se aponta quando se em pla-
digitais 0 próprio fala Essesexemplosrevelamuma dimensãomais profunda do trabalho
lataformas e motoristas. Se a
entregando encomendasda Amazon ou do iFood. Não se trata da taformas—para além de um foco específicoem entregadores
cmdrone.s web do trabalho
mas de entregadores
sendo substituídos por deepwebé aquele lugar oculto da internet, há também a deep
automaçãocompleta, um experimento do capital. em plataformas,com atividadesem fazendasde clique, moderaçáo
de conteÚd0
drones.Mais mostra a
quemonitoram expoentesdessecenário são as plataformas de e as possibilidadesde generalizaçáoda plataformizaçáodo trabalho. Isso
Os principais inteligência O próximo passo
chamadasde plataformas de "microtrabalho" —discordamos, capacidadelaboratorialdo capitalem relaçãoaos trabalhadores.
artificial,também considerarque ela não leva em já ensaiadoé o crescenteuso de drones para entregas; nesse sentido, a Agência
por contaa mo.
dousodessaexpressão Esses
porém, em
trabalhadores torno dessastasks nem o papel do trabalh Nacionalde AviaçãoCivil (Anac)já autorizou algumas operaçõesno Brasil.
biliaçáototaldos equipamentos,no entanto, não substituirãoos trabalhadores,pois é necessário
da anatomiade um sistema de IA. Há brasileiros
humanona complexidade plataformas como essas, que que sejamsupervisionados,em mais um processode heteromaçáodo trabalho.
em algumasdezenasde apresentam as
envolvidos
Emprimeirolugar,há plataformas em que trabalhadores É imprescindível que os trabalhadores capturem e se reapropriem da própria
especificidades.
próprias
sistemas de inteligência artificial, como a Amazon noção de futuro a partir de projetos que confrontem 0 cenário atual da plataformi-
produzemc treinamdadospara zaçáo.O futurodo trabalhoé um tema importantedemaispara ficarnas mãos de
Turk (AMT) —cujo slogan é "inteligência artificial artificial"—
Mechanical
humano". As tarefas executadas váo desde "gurus".Quando tudo pareciaconvergirpara um quadro de extremacompetiçáo
e a Appen—"dadoscom um toque entre os trabalhadores—algoque muitosviam como um caminho sem volta os
a avaliaçãode publicidadee o treinamento de algoritmos de reconhecimento acontecimentos nos deram uma lição.Não existe trabalhador inorganizável: se há
facialaté a transcriçãode áudio de assistentes virtuais. Em segundo lugar, há novos métodos de controle e organização do trabalho, sáOnecessárias também novas
plataformas de moderaçãode conteúdo, como Cognizant e Pactera, cujos traba- formas de organização por parte dos trabalhadores. Sem esquecer as lutas histÓricas,
lhadores, via de regra, são terceirizados do Facebook e do Google —nessa linha, o
a classetrabalhadorasemprese reinventa—semprese recompõea partir da nova
foiobrigadoem 2020 a pagar uma indenizaçâo de 52 milhóes
próprioFacebook realidadetécnica do trabalho.Neste laboratóriodo trabalho em plataformas,os
de dólaresa moderadoresde conteúdo terceirizados que desenvolveram estresse trabalhadoresnão são amorfos ou entes passivos,mas se organizam, por exemplo,
9. Porúltimo, há plataformas de "fazendas de cliques" —a maioria
pós-traumátic0 a partir de táticas e estratégiasem relaçãoaos algoritmos.
—emque os trabalhadoressão como bots humanos e passam o dia
brasileiras As jornadas extenuantes —que ocorrem de domingo a domingo, para não com-
curtindo,comentandoe compartilhando posts em redes sociais como Instagram, prometer a pontuaçáo do trabalhador,de modo que ele consiga atingir as metas —
emtrocadepouquíssimos centavospor tarefa. Os solicitantes dessas tarefas vão não são um limitepara a organizaçãocoletivados trabalhadoresdas plataformas
desdeinfluenciadores
e duplas sertanejas até candidatos a prefeito. Há também digitais.E náo é de hoje: ao longo dos últimos anos, vimos crescer associações,
um processointenso de vendas e trocas de perfisfakes e bots para que os traba- sindicatos e novas formas de organização nas mais diferentes categorias —do Setor
lhadoresconsigamaumentar os ganhos. de tecnologia ao de games, passando por youruberse influenciadores e incluindo
Cadaum dessestipos de plataforma também apresenta especificidades de também entregadorese motoristas. A Asociaciónde Personal de Plataformas
formação
e trajecóriade trabalhadores,no sentido de (APP),na Argentina, a Independent Workers'Union of Great Britain (IWGB),
fraçóes de classes. Em algumas,
na Inglaterra,e a #NiUnRepartidorMenos,no México,são alguns exemplos de
HamidElbia c Bonnie Nardi,
Heteromation.
como os trabalhadorestêm se Organizado.No Brasil,só entre os motoristas
and Other Stories Computing and Capitalism
(úmbridge, MA, MIT press,
2017). de aplicativos, já há pelo menos dezoito sindicatos e associações,algo que também
CaseyNewron,"Facebook
Will Pay S52 Million in Settlement with Moderators Who vem acontecendoentre os entregadores.Há distintas formasde auto-organização
Deveioped theJob•, 12maio2020;disponívelem: <https://www.theverge por parte dos trabalhadores de plataforma —inclusive experiências de escrita como
com./2020/5/12121255870/hcetmk-content-moderator-settlement-scola-pcd-mental-health>:
acessoem:26 fa. 2021. forma de perceberem-se
e enunciarem-secomo tal, como mostra a edição de
digital
do trabalho
20 os laboratórios
Belou,10,que traz apenas textos Introduçúo 21
da revistaNotesfrom escritos por
Outubrode 2020 diferentessetores—,assim como há
dosmais
trabalhadoras
complexidades
da própria construção da plataforma. Porém, como afirma Marisol Sandoval" é
composiçãopolítica dessa classe. Ao se organizarem
em torno da do capital, e assim preciso enfrentar dialeticamente as contradições históricas em torno das coope-
e podem
elesmostramque rativas —entre constrangimentos e cooptaçóes,por um lado, e possibilidadesde
activamente, e de pressão contra as empresas, em nome
capacidadede barganha reconfiguraçáo em relação à emancipação dos trabalhadores, por outro.
contramsua
melhor. As plataformas cooperativas podem ser de trabalhadores, consumidores ou
de uma vida dos trabalhadores das plataformas, que conduzem
Essessão laboratórios multilaterais,o que mostraas múltiplaspossibilidades
de desenhosinstitucio-
de auto-organização.A comunicação tem um
experimentos com novasformas protagonismo do WhatsApp. se
nais para elas. Essas experiênciaspassam por cooperativasde serviço de nuvem,
questão,a começarpelo as compartilhamento de fotógrafos,mÚsicos,jornalistase gamers, e plataformas de
papelcentral comunicação e produção que servem para o controle streamingde mÚSiCa,
plataformas sio meios de conteúdoaudiovisual,entre outros.Há também plataformas
reapropriadas para a organização dos próprios
também têm sido cooperativasno setor de entregas, sendo alguns exemplos a Mensakas, da Espanha,
do capital,elas circulação de sentidos sobre
trabalhadores.Funcionamainda como veículosde a Resto.Paris,da França, e a Urbe, da Bélgica,todas realizadaspor ciclistas,além
processoque ocorre por meio de vídeos, correntes de de uma federação de cooperativasde entregadores, a CoopCycle, com base na
as lutasdos entregadores, querem mostrar que fazem França e presente em Outros seispaíses.A CoopCycle possui um software próprio
lado; as empresas tudo pelos
texto e fotos,Se, por um e "transformação digital" , é preciso denominado "comum digital", com licença Copyleft, destinado a cooperativas.
em um cenáriode "disrupção"
"parceiros",
que vêm dos trabalhadores. A comunicação A plataforma, criada para gerir a atividade de entregas por bicicletas, tem como
fazercircular,também,conteúdos objetivoservir às reais necessidadesdos trabalhadores.
de sentidos, permitindo que as lutas alcançem toda
atua na organizaçãoe difusão Existe ainda uma cooperativade motoristas, chamada Driver'sSeat, cujo foco
a classe trabalhadora. é a democratização de dados. Os trabalhadoresusam o aplicativodessa cooperativa
As possibilidades de experimentação dos trabalhadores também se con-
sua propriedade, seja em cooperativas para compartilhar os próprios dados; então, a Driver'sSeat coleta e vende infor-
centramna construçãode plataformasde mações sobre mobilidade para órgãos municipais, com a finalidade de possibilitar
de plataforma,sejaem outros arranjos de trabalho e desenhos institucionais. O uma melhortomadade decisõesde planejamentoem relaçãoa transporte.Os
cooperativismo de plataformaé uma possibilidade de unir o potencial tecnoló- dividendos obtidos com a venda dos dados são recebidose compartilhados pelos
gicodasplataformasdigitais,reapropriando-aspara outros usos, às perspectivas motoristas. Isso ajuda a pensar como as lutas contra outras plataformizaçóes também
autogestionáriasdo movimento cooperativista, a partir das possibilidades de envolvem os direitos dos trabalhadoressobre os próprios dados.
construção de plataformasde propriedade de trabalhadores. É uma maneira No Brasil,há cooperativase coletivosmais antigos, como a Pedal Express,
tanto de coletivizaras plataformas digitais quanto de tornar as cooperativas e outros mais recentes,como SeñoritasCourier,TransEntregae Levó Courier,
maispróximasda economiade plataformas. Esse é um laboratório
tradicionais responsáveispor fazer circular,a depender da iniciativa,sentidos de mobilidade,
para prefigurare fazer circular outros mundos— e sentidos —possíveis, para além de responsabilidadeambiental e social e de lutas em torno da igualdade de gé-
de um realismocapitalistade lutas de fronteiras entre circulação do capital e nero. Esses exemplos demonstram as possibilidadesde construção, de baixo para
circulaçáodo comum. cima,de iniciativaslocaisque desenhemoutroscircuitosde produçãoe consumo
Issosignificaentendertanto suas potencialidades como seus limites, tais e o potencialde desenvolvimentosem instruçõesprescritivasou normativas,em
quaisasameaçasdc cooptaçãodas plataformas cooperativas por meio de narrativas verdadeirosexperimentos. Coletivos e cooperativasde entregadores, por exemplo,
empreendedoras,a competiçãoagressivacom as plataformas privadas dominan- podem funcionar em conjunto com cooperativasde programadores e agricultores,
tes—possibilitadas
pelo capitalde risco e pela formação de lobbies —e o perigo além de pequenosrestaurantes,projetandovaloresde trabalho decente, design
da autoexploraçáo.Na realidade, por causa desses limites e contradições, elas náO justice, desenvolvimentosustentávele alimentaçãosaudável.
substituirãoa curto prazoas grandes plataformas de trabalho. Além disso, não será No cooperativismo de plataforma, há uma busca pela criaçáo de plataformas
um aplicativopor si a solução dos
problemas da classe trabalhadora. A problemática
próprias com lógicasque favoreçama democraciano ambiente de trabalho e a náo
estámuitoalémdisso.O cooperativismo vigilânciae autonomia dos trabalhadores.Isto é, desde o desenho, elas já devem
de plataforma depende de um conjunto
de —comoorganizaçãodo trabalho e processos de consumo —para além
Marisol Sandoval, "Enfrentando a precariedade com cooperaçáo: cooperativas de trabalhadores
Disponivel
em:<httpç./lnotcsfrombelow.org/issue/workplace»; mar.2021. no Setorcultural",RevistaParágrafo,v. 5, n. I 2017.
acessoem: 29
digital
do trabalho
laboratórios O empenho na Introduçúo 23
22 os
dostrabalhadores.
de alternativas em em não
sentidos sobre dados e algoritmos
que os trabalhadores,reconhecendocomo centraissuascontradições,que teimam
circular significaidealizar a realidade, mas ajudar
dedados,
coopera deve ser transformada em bens
comuns sc resolver.Falarem potencialidadesnão
capital que mais necessário em um mundo
lítia.s de propriedade de dados, algo que ou a construir outros mundos possíveis,algo ainda
urna alternativosde aproxi
sideram
de regimes descolonização de em que 0 velho está morrendo e 0 novo ainda náo nasceu.
seja,por
meio dados.
plataformas de propriedade dos É inútil, e até contraproducente, exigir um movimento pronto —àfastfood—
real está
o coopera de trabalha sem contradiçóesou com todas as soluçóes para ontem". O movimento
necessita de uma dança dialética do trabalho. Os
startups possuem muitos
em plena construção.Sáo tentativasem meio à
alter-
as famigeradas movimentos pela regulaçáo do trabalho em plataformas e pela construçáo de
grande nativas só fazem sentido quando ligados à organização coletiva dos trabalhadores.
funcionários12.Da mesma
possuematé cinco
brasileiras forma, Caso contrário, sem saber suas reais necessidades e demandas, existe o perigo de
e coletivos de entregadores ou motoristas cair em um solucionismo tecnológico —mais uma iteraçáo da ideologia californiana
de cooperativas argumentos para deslegitimar
envolvidas.Não há iniciativas dos magnatas do silício—ou de pressionar "de cima para baixo", sem a construçáo
ou cinco trabalhadores apenas por seu tamanho. U de um movimento orgânico. Como argumentam Sai Englert, Jamie Woodcock
com três ma
autogestionárias propriedade de trabalhadores é justamente sua e Callum Cant, "podemos começar a ver o germe de uma alternativa que surge
das plataformasde
dasfortalezas e cooperaçáo
entre iniciativas. da recusa dos trabalhadores das plataformas. No entanto, se propusermos formas
articulaçáo
capacidadede solução simples, resumida ao desenvolvimen_ de socialismodigital de cima para baixo, corremos o risco de perder náo apenas
de seremuma
Portanto,longe de construção de plataformas cooperativas essesgermesradicais, mas também a possibilidadede fazê-loscircular na economia
as experiências
de umaplicativo, envolvem múltiplas dimensões, como design digital e para além dela"14.
de trabalhadores
de propriedade Entre as tentativas de radicalização da plataformizaçáo por parte do capi-
organização do trabalho e processos produtivos,
dasplataformas,
e materialidade intercooperação, estratégias midiáticas tal —com a taskificaçáoe o trabalho que sustenta a inteligência artificial —e as
e algoritmos,
de dados potencialidades de enfrentamento desse cenário e de construção de plataformas
políticase regimes com valores já mencionados, como trabalho
além de suasrelações alternativasresidemos laboratÓriosdo trabalho em plataformas. Se são laboratórios
e de consumo,
decente e design
justice. de lutas de classes,é preciso usá-los a favor da classetrabalhadora. A expropriação e
Huws13,é preciso combater a generalização da
ComodemonstraUrsula o hackeamento das plataformas digitais também devem ser pensados e prefigurados
prol dos trabalhadores
do trabalhocomsua ressignificaçáoem
plataformizaçáo como possibilidades.
circuitos
significa uma reinvenção de económicos locais
e do bempúblico. Isso
meio de plataformas que melhorem as condições de
deproduçáoe consumopor
políticas de mobilidade, melhorias
trabalhoe, ao mesmotempo, promovam
público'serviçosde cuidados e integração ao sistema de saúde.É
de transporte
assimque encaramosas plataformas de propriedade de trabalhadores —algo que
envolvenãosóo desenhoinstitucional de cooperativa: como possibilidades prefi-
gurativas,o que significa que devemos construir hoje experimentos das sociedades
que imaginamosviver amanhã.
Pensarno trabalhoem plataformas como laboratório da luta de classes significa
tantoasdificuldadesimpostas pelos mecanismos atuais da plataformi-
reconhecer
zaçáoquantoas possibilidades,frestas, brechas e fissuras de circulação das lutas dos

u eAccenturc, momentodastarrupbrasileirae o futuro do ecossistemade inovação";


disponível em: <https://drive.google.com/file/d/l WAw_6rExZfuKBSxGdlwgvvjtPgfO-8Z71
vicw»;acaso em:26 fw. 2021.
UrsulaHuws,RànvrnringthtWelfareState:
SaiEnglert,JamieWoodcocke CallumCant, "Operaísmodigital:tecnologia,plataformase
DigitalPlafDrms andPublic Policies (Londres, Pluto, circulaçãodas lutas dos trabalhadores".Fronteiras—EstudosMididticos,v. 22, n. l, 2020. p. 55.
2020).

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