Você está na página 1de 4

ANARQUISMO

O anarquismo é uma corrente de pensamento, uma teoria e ideologia política que não acredita em
nenhuma forma de dominação – inclusive a do Estado sobre a população – ou de hierarquia e
prega a cultura da autogestão e da coletividade.

Alguns dos valores defendidos pelos anarquistas são:

 liberdade individual e coletiva, para o desenvolvimento de pensamento crítico e todas as


capacidades individuais das pessoas;
 igualdade – em termos econômicos, políticos e sociais, valor que inclui questões de
gênero e raça;
 solidariedade – a teoria anarquista só tem sentido se há entre as pessoas apoio mútuo,
com colaboração e espírito de coletividade.

O anarquismo critica principalmente exploração econômica do sistema capitalista e o que chama


de dominação político-burocrática e da coação física do Estado. Os anarquistas não buscam
uma revolução política, mas uma revolução social, que parta da maioria da população, dos
trabalhadores, da classe que sofre alguma forma de dominação. Sua ideia principal é a
horizontalidade: um território em que não exista Estado, nem hierarquia e em que a população
faça a autogestão da vida coletiva.

Crítica à dominação do Estado


O pilar mais conhecido da teoria anarquista é a crítica ao Estado e a crença em um território
baseado na autogovernança. A crítica se estende a todo e qualquer tipo de sistema em que há
Estado, dos que agem com intervenção mínima à máxima, dos mais autoritários aos mais liberais.

Existem duas formas de dominação, de acordo com a teoria anarquista: a do poder de decisão e
da coerção física. A primeira consiste no que chamam de dominação político-burocrática, que
seria responsável:

1) pela alienação política da maioria da população, que fez com que se estruturasse um sistema
que permitiria só um pequeno grupo privilegiado adentrar o meio político e tomar decisões em
nome da população – o que também critica a democracia representativa;

2) a existência de uma hierarquia entre os governantes e os governados, à qual os anarquistas se


opõem, que é gerada por esse sistema de poder.

A segunda forma de dominação das classes dominadas seria o uso de coação física por parte do
Estado, que além de poder fazer uso da força, tem seu monopólio. O anarquismo afirma que a
força é utilizada pelo Estado quando sua legitimidade não é suficiente.

Crítica ao capitalismo
A ideologia anarquista critica o capitalismo, argumentando que esse sistema implica na
exploração dos trabalhadores por meio dos proprietários dos meios de produção – uma reflexão
similar às correntes socialistas.

O entendimento de exploração dentro do capitalismo para os anarquistas pode ser ilustrado com
o seguinte exemplo exemplo: os donos de uma fábrica montadora de carros não trabalham
montando os carros, mas pagam funcionários para prestar esse serviço. Logo, os proprietários
são a classe dominante e os trabalhadores a classe produtiva – e dominada –, que trabalha a fim
de transferir recursos ($) para a classe dominadora. A classe dominadora, por sua vez, se
apropria de um excedente produzido pelos trabalhadores e lucra em cima de seu trabalho, o que
caracterizaria a exploração, de acordo com Michael Schmidt e Lucien van der Walt.

Esse entendimento não é diferente num contexto de trabalho rural: acreditam que os proprietários
de terra exploram o trabalho dos camponeses e, por isso, também fazem críticas às sociedades
pré-capitalistas, cuja economia dependia do campesinato.

Crítica à dominação de gênero


Como é da identidade do anarquismo criticar qualquer forma de dominação, isso ocorre também
quanto à dominação de gênero. A união de princípios anarquistas e feministas foi chamada de
anarcofeminismo, que acredita na exploração da mulher pelo capitalismo por ele difundir o
sexismo em suas instituições, desvalorizar economicamente o seu trabalho doméstico e
reprodutivo, além de que os direitos adquiridos seriam válidos apenas a quem integrasse as
classes dominantes. A luta do feminismo contra o patriarcado, o sistema social em que o homem
é a figura referencial e de maior poder, só é vista como possível pelo anarcofeminismo com o fim
do sistema capitalista.

A pensadora e militante anarquista Emma Goldman foi uma das fundadoras do anarcofeminismo
e defendia, além desses seus princípios básicos, a liberdade da mulher de um jeito mais abstrato:
“Busco a independência da mulher, seu direito de se apoiar; de viver por sua conta; de amar quem
quer que deseje, ou quantas pessoas deseje. Eu busco a liberdade de ambos os sexos, liberdade
de ação, liberdade de amor e liberdade na maternidade”, disse em 1857.

Já Lucy Parsons, anarquista estadunidense, considerada uma opositora das ideias de Emma
Goldman dentro do anarcofeminismo, enfatizava que as mulheres seriam “escravas dos
escravos” ao serem exploradas pelo capitalismo e sendo vítimas da dominação de gênero. Por
isso, defendia também o protagonismo da mulher nessa luta.

Quais as características do anarquismo?


As características fundamentais do anarquismo são ligadas às ideias e princípios defendidos pela
ideologia. Conheça as principais:

 fim da autoridade do Estado sobre o funcionamento da sociedade,


 ideal de que as propriedades devem ser coletivas e não individuais,
 incentivo à coletividade e à solidariedade entre os cidadãos,
 aumento das condições de igualdade social em todos aspectos (como econômicos e
políticos),
 mais autonomia e liberdade de decisão para os cidadãos,
 presença de um Estado autogerido, ou seja, um Estado organizado pelos próprios
cidadãos,
 sistema de educação com mais liberdade para estimular o pensamento crítico.

Pierre Proudhon (1809-1865) e Mikhail Bakunin (1814-1876), contemporâneos de Marx, com ele
partilham as críticas ao sistema capitalista, à propriedade privada dos meios de produção e à exploração
da classe proletária pela burguesia. Concordam também que as revoluções Francesa e Americana foram
mais políticas que sociais, pois elas teriam renovado os padrões de autoridade, dando poder às novas
classes, mas não modificaram basicamente a estrutura social e econômica da França e dos Estados
Unidos.
A relação de amizade e admiração de Proudhon e Bakunin com Marx rompeu-se, porém, a partir de
divergências que se tornaram cada vez mais agudas. O nó do desentendimento encontra-se na teoria
marxista da ditadura do proletariado. Como vimos, Marx preconizava um degrau necessário antes do
advento do comunismo, quando a força do proletariado, exercida através do partido, evitaria a contra-
revolução da classe deposta. Só depois o poder se dissolveria rumo à sociedade sem Estado.
Bakunin acusa Marx de otimista, não considerando ser possível evitar a rígida oligarquia de
funcionários públicos e tecnocratas que tenderiam a se perpetuar no poder.
2. Principais idéias do anarquismo
É comum as pessoas identificarem anarquismo com caos, “bagunça”. Na verdade, não se trata disso.
Etimologicamente, a palavra é formada pelo sufixo archon, que em grego significa “governante”, e em,
“sem”, ou seja, “sem governante”. O princípio que rege o anarquismo está na declaração de que o
Estado é nocivo e desnecessário, pois há formas alternativas de organização voluntária.
Se a religião, o Estado e a propriedade contribuíram em determinado momento histórico para o
desenvolvimento do homem, passam a ser restrições a sua emancipação.
No entanto, a tese anarquista da negação do Estado não deve levar as pessoas a pensarem que se trata de
uma proposta individualista, pois a organização não coercitiva se funda na cooperação e na aceitação da
comunidade. O homem é um ser naturalmente capaz de viver em paz com seus semelhantes, mas as
instituições autoritárias deformam e atrofiam suas tendências cooperativas. Surge, então, um aparente
paradoxo, ou seja, a realização da ordem na anarquia; essa ordem na anarquia é uma ordem natural.
A sociedade estatal possui uma estrutura cuja construção é artificial, pois cria uma pirâmide em que a
ordem é imposta de cima para baixo. A sociedade anarquista seria não uma estrutura, mas um
organismo que cresce de acordo com as leis da natureza, e a ordem natural se expressa pela
autodisciplina e cooperação voluntária e não pela decisão hierárquica.
Por isso, os anarquistas repudiam até a formação de partidos, já que estes prejudicam a espontaneidade
de ação, tendem a se burocratizar e a exercer formas de poder. Também temem as estruturas teóricas,
porque podem tornar-se um corpo dogmático. Daí o anarquismo ser mais conhecido como movimento
vivo e não tanto como doutrina. A ausência de controle e de poder torna o movimento anarquista
oscilante, sempre frágil e flexível, podendo ficar inativo por muito tempo para surgir espontaneamente
quando necessário.
A crítica à existência do Estado leva à tentativa de inversão da pirâmide de poder que o Estado
representa; a organização social que deriva dessa inversão rege-se pelo princípio da descentralização,
procurando estabelecer a forma mais direta de relação, ou seja, a do contato “cara a cara”. A
responsabilidade começa a partir dos núcleos vitais da vida social, onde também são tomadas as
decisões: o local de trabalho, os bairros. Quando isso não é possível por envolver outros segmentos,
formam-se federações. O importante, porém, é manter a participação, a colaboração, a consulta direta
entre as pessoas envolvidas.
Os anarquistas criticam a forma tradicional de democracia parlamentar, pois a representação contém o
risco de alçar ao poder um demagogo. Quando a decisão envolve áreas mais amplas, havendo
necessidade de convocação de assembléia, a proposta é de escolha de delegados por tempo limitado e
sujeitos à revogação do seu mandato.
Além da crítica feita ao Estado, os anarquistas prevêem que a supressão da propriedade privada dos
meios de produção deve dar lugar a formas de organização que estimulem as ações dos indivíduos livres
no corpo coletivo, o que poderia se tornar possível na comuna livre e em empresas dirigidas
coletivamente.
Da mesma forma repudiam a estrutura hierárquica da Igreja e defendem o ateísmo como condição de
autonomia moral do homem, liberto dos dogmas e da noção de pecado: “Para afirmar o homem, é
preciso negar Deus”.
3. Representantes e movimentos
O mais brilhante anarquista foi Bakunin, filho de ricos aristocratas russos. Tornou-se revolucionário
graças à influência de Proudhon. Participou das rebeliões que ocorreram em Paris, Praga e Dresden em
1848-1849, tendo sido preso por vários anos e depois exilado na Sibéria. De volta à agitação, em 1870
tomou parte nas revoltas de Lyon e Bolonha. Fez cerradas críticas a Marx, tendo sido expulso da
Primeira Internacional em 1872. Com outros companheiros fundou a Internacional Saint-Imier. Sua
obra é vigorosa e apaixonada, mas mal-organizada, pois dificilmente Bakunin terminava o que
começava. Era, sobretudo um ativista.
Piotr Alexeyevich Kropotkin (1842-1912), ao contrario de Bakunin, defende a ação não-violenta e luta
pelo respeito à vida humana, condenado a pena de morte, a tortura e qualquer forma de castigo imposta
ao homem pelo homem.
O romancista Leon Toistól (1828-1910), embora se intitulasse um “pacifista cristão“, tinha opiniões
sobre o governo e a autoridade que o aproximam dos ideais anarquistas. A pregação da resistência não-
violenta influenciou Gandhi na estratégia da desobediência civil durante a luta pela independência da
Índia. Entre defensores e simpatizantes, o anarquismo conta com artistas, jornalistas e intelectuais em
geral, como Oscar Wilde, George Orwell, Aldous Huxley, Picasso, Alex Comford, Herbert Read, Emma
Goldman, Malatesta e George Woodcock.
No final do século XIX, o movimento sindical deu ampla força ao anarquismo, gerando o movimento
chamado anarco-sindicalismo, pelo qual os sindicatos não deveriam se preocupar apenas em conseguir
melhores salários, mas em se tornar agentes de transformação da sociedade. Segundo o espírito
anarquista, os sindicatos não têm poder centralizado, mas se organizam em pequenos grupos de fábrica,
e a ampliação dos contatos em nível estadual e nacional deve sempre preservar a participação direta do
trabalhador.
Foi na Espanha que o movimento atingiu maior expressividade, até quando não pôde mais resistir à ação
dos exércitos do ditador Franco. Do mesmo modo, o advento do fascismo na Itália e do nazismo na
Alemanha significou o enfraquecimento do movimento naqueles países.
O anarquismo ressurgiu timidamente depois da Segunda Guerra Mundial e recrudesceu na década de 60
com o ativismo de jovens de vários países da Europa e da América, culminando com o movimento
estudantil de 1968 em Paris.

Você também pode gostar