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All content following this page was uploaded by João Carlos Correia on 15 September 2014.
1. INTRODUÇÃO
Os brasileiros acreditam mais na mídia que no Governo. A informação,
resultado de um pesquisa da agência de notícias Reuters, da Rede Britânica BBC e
dos Media Centre Poll da Globescan realizada em dez países, mostra a centralidade e
importância da televisão na sociedade brasileira. Dentro desse contexto, o campo do
telejornalismo ocupa um lugar de destaque como a principal fonte de informação para
56% dos entrevistados é a televisão (BRASIL, 2006, p. 31).
Uma outra pesquisa publicada na revista Imprensa (MORAES,2006)sobre os
telejornais no Brasil também confirma o poder dos noticiários como fonte de
informação. 85% dos entrevistados, no primeiro trimestre de 2005, de grandes centros
urbanos, representando uma população de mais de 34 milhões de pessoas revelaram
que acompanham o dia a dia do País e do mundo pelos telejornais. A análise revela
que os resultados sobre a busca de notícias na tevê, mesmo em relação à classe
econômica, não apresenta resultados muito diferentes: 89% dos entrevistados das
classes A e B e 82% das classes C, D e E ligam a televisão para se informar através
dos telejornais.
Os estudos sobre esse fenômeno estão a exigir do mundo acadêmico, em
particular, dos pesquisadores um olhar mais atento e maiores investigações sobre os
telejornais de rede nacional, os noticiários regionais e locais que contribuem de uma
forma relevante para a construção de parte da realidade social da realidade brasileira
diariamente (BERGER;LUCKMANN,1995 ).
A agenda diária de cobertura dos fatos pelos telejornais influencia a agenda
pública. As conseqüências desse agendamento e do enquadramento dos
acontecimentos feito pelos noticiários sugerem que eles não só nos propõem sobre o
que é que devemos pensar, como também nos propõem como pensar (McCOMBS;
SHAW, 1993).
O modelo de que o jornalismo reproduz o real tal como ele, sendo uma
espécie de fotografia da realidade, já não encontra praticamente mais guarida nas
pesquisas desenvolvidas na área (TRAQUINA, 2004), (SCHUDSON, 2002) (PENA,
2005). O espaço em que essa visão de reprodução ainda se mantém de uma maneira
forte é nas redações das empresas de jornalísticas em função de dois mitos da prática
profissional, que não são a preocupação deste trabalho: a imparcialidade e a
objetividade, que permitiriam ao jornalista afirmar que o distanciamento dos fatos
garantia notícia ser o espelho da realidade (SCHUDSON, 1978).
O processo de produção da notícia é extremamente complexo e envolve desde
seja, eles têm “óculos” especiais a partir dos quais vêem certas coisas e não outras:
“eles operam uma seleção e uma construção do que é selecionado” [grifo nosso],
essa.
2. A ORGANIZAÇÃO DO MUNDO
A imagem que a mídia constrói da realidade é resultado de uma atividade
profissional de mediação vinculada a uma organização que se dedica basicamente a
interpretar a realidade social e mediar os que fazem parte do espetáculo mundano e o
público. Compartilhamos com a afirmação de Gomis (1991) e consideramos que a
mídia não só transmite, mas prepara e apresenta uma realidade dentro das normas e
das regras do campo jornalístico.
Como argumenta o autor, o que a mídia apresenta não é nem espelho nem
janela da realidade e não poderia ser de outra maneira, uma vez em ambos as
metáforas não são levadas em conta. No entanto, elas são essenciais para a mídia em
particular na produção da notícia. A linguagem permite “fazer presente” uma
diversidade de objetos que se acham ausentes do “aqui e agora”.
A mídia hoje é essencial para a vida em sociedade. Os telejornais cumprem
uma função de sistematizar, organizar, classificar e hierarquizar a realidade. Dessa
forma contribuem para uma organização do mundo circundante.
Fishman (1990, p. 51) diz que o mundo é burocraticamente organizado pelos
jornalistas. De certa forma é o que o editor-chefe de um telejornal faz todos os dias
quando organiza o espelho do jornal. Ou seja, a ordem de entrada das matérias que
vão ao ar num telejornal. Numa pesquisa que realizamos sobre a definição das
notícias num telejornal local observamos que a abertura do noticiário sempre era
como uma notícia de impacto do dia; e, no encerramento, as notícias mais leves
(eventos culturais, mostras, etc.), normalmente, encerravam o informativo televisivo
VIZEU, 2000).
Hall (2005) explica que na construção das notícias os jornalistas mobilizam
enquadramentos conhecidos e fazem alguns ajustes que fazem o velho e o banal
parecerem novos. Segundo o autor, as notícias já estão praticamente escritas antes dos
jornalistas sentarem nos terminais de computador das redações e redigirem suas
matérias.
Chandler (2005) lista alguns procedimentos no processo de produção da
notícia num telejornal que mostram que os fatos que vão virar notícias não só
selecionados, mas ativamente construídos. Ele observa que ao fim de uma entrevista
gravada são feitas imagens de detalhes da entrevista para serem utilizados na edição
da fala do entrevistado. O objetivo é ocultar o processo de edição procurando dar um
efeito de realidade para a matéria.
Tuchmann (1980) explica que os telejornais utilizam ângulos determinados na
produção das reportagens com enquadramentos que buscam conferir significados
sociais as relações espaciais. Uma imagem mais próxima procura enfatizar aspectos
mais dramáticos da matéria, ocorrendo o contrário quando a imagem é mais geral o
que procura transmitir uma espécie de reprodução da realidade, é como se essa
estivesse sendo mostrada de uma forma objetiva tal como é, produzindo um efeito de
real.
De acordo com a autora, nas práticas diárias os jornalistas fazem
enquadramentos das múltiplas realidades. Um exemplo disso é a tipificação dos
acontecimentos em notícias: duras (as factuais do dia. Ex: um acidente de ônibus
com mortos); leves (shows, peças de teatros, etc. que não precisam ir ao ar no
telejornal no dia em que foram gravadas porque não perdem atualidade) e as súbitas
(uma ruptura no cotidiano. Ex: acidente de avião).
Além dessas ainda há as notícias em desenvolvimento (notícias que vão
mudando ao longo do dia em função de novas informações. Ex: uma operação da
Polícia Federal para prender fraudadores da Receita Federal); e as notícias em
seqüência (há um calendário prévio dos acontecimentos. Ex: uma CPI normalmente
tem a agenda dos depoimentos da semana).
Tuchmann (1980) afirma que o enquadramento das notícias organiza a
realidade cotidiana e é parte importante dessa por causa do caráter público que é uma
característica essencial da notícia. Complementa afirmando que a notícia não só
define, redefine, constitui e reconstitui significados sociais; mas também define e
redefine, constitui e reconstitui maneiras de fazer coisas: os processos existentes e as
instituições.
Se a notícia televisiva contribui para a construção da realidade social, é
possível se afirmar que a informação noticiosa é uma forma de conhecimento. Mas,
que tipo de conhecimento? Esse é o segundo momento do nosso trabalho em que
procuramos construir um arcabouço teórico propondo que o telejornalismo é um lugar
de referência para homens e mulheres: o conhecimento do telejornalismo. Não há
notícia sem conhecimento.
Como afirma Van Dijk (2005, p.14): “Nada pode parecer tão trivial quanto a
tese de que sem conhecimento não haveria notícia alguma”. A afirmação,
aparentemente simples, revela a necessidade da discussão e da relevância do
Jornalismo como uma forma de conhecimento.
Um dos primeiros pesquisadores a trabalhar essa perspectiva foi Park (1972).
Com base no pensador William James, um dos principais representantes do
pragmatismo, movimento filosófico que exerceu profunda influência no pensamento
americano durante parte do século XX, existem dois tipos fundamentais de
conhecimento: o conhecimento de e o conhecimento acerca de.
Genro (1977) num interessante trabalho, fundamental para quem quer pensar o
jornalismo como uma forma social de conhecimento, apesar de reconhecer a
contribuição de a contribuição de Park, critica seus pressupostos teóricos afirmando
que ele não vai além da função orgânica da notícia e da atividade jornalística. No
entender dele, a postura assumida por Park é redutora porque supõe uma espécie de
senso comum isento das contradições internas, cuja função seria somente reproduzir e
reforçar as relações sociais vigentes, integrar os indivíduos na sociedade.
3. O CONHECIMENTO DO TELEJORNALISMO
Por isso, como alerta Freire (1987) - e é importante nas práticas sociais do
jornalismo -, precisamos ir além da mera captação dos fatos buscando não só a
interdependência entre eles, mas também o que há entre as parcialidades constitutivas
da totalidade de cada um. Nesse sentido, o jornalismo necessita estabelecer uma
vigilância constante sobre a sua própria atividade.
Freire (1997) argumenta que não acontece uma ruptura porque a curiosidade
ingênua, sem deixar de ser curiosidade, continuando a ser curiosidade se criticiza.
Continuando a explicação diz que ao criticizar-se, tornando-se curiosidade
epistemológica, metodicamente “rigorizando-se” na sua aproximação ao objeto,
conota seus achados de maior exatidão. A curiosidade metodicamente rigorosa do
método cognoscível se torna curiosidade epistemológica, mudando de qualidade, mas
não na essência.
Nesse diálogo que o Jornalismo estabelece, com base nas pesquisas que
estamos desenvolvendo, em particular nos dois trabalhos que acompanhamos as
práticas diárias dos jornalistas na produção da notícia (VIZEU, 2000); (VIZEU,2006)
podemos observar e elencar cinco funções do conhecimento do Jornalismo: exotérica,
didática, de familiarização e de segurança.
A postura esotérica de outros campos, por exemplo, todo um instrumental
teórico e prático que só diz respeito as práticas médicas e do domínio da instituição
médica, resulta num discurso hermético, restrito a um grupo. A função do campo
jornalístico é tornar esse discurso compreensível para o grande público.
4. A FUNÇÃO DIDÁTICA
A seguridade ontológica mostra a fé que a maior partes dos seres humanos tem
na continuidade de sua identidade própria e na “estabilidade” dos meios circundantes
de ação social e material. A crença na fidelidade das pessoas e das coisas, essencial a
noção de confiança, é fundamental para os sentimentos de segurança ontológica.
5. AS OPERAÇÕES/CONSTRUÇÕES DO TELEJORNALISMO
É o que de certa forma ocorre no País nas transmissões dos grandes eventos
midiáticos com a copa do mundo e as eleições. Os milhões de brasileiros e brasileiras
que acompanharam a cobertura pela televisão estabeleceram, de certa forma, uma
relação de pertencimento a uma comunidade, a uma Nação chamada Brasil. Eles
sabiam que naquele instante, em outras cidades, e em outros Estados, cidadãos que
eles provavelmente nunca encontrarão são brasileiros que nem ele. O telejornalismo
funcionaria como um lugar de referência. Ainda estamos trabalhando essa hipótese,
mas consideramos que outros e novos estudos podem contribuir para entendemos a
função do telejornalismo nas sociedades democráticas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GOMIS, L. Teoria del periodismo : cómo se forma el presente. México : Paidós, 1991.
______. Il est là, je le vois, il me parle. Revue Communications, nº38, Paris : Seuil,
1983. p.99-120