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Teoria da comunicação

Book · September 2019

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Ricardo Henrique Almeida Dias


Jilin International Studies University
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Ricardo Henrique Almeida Dias
Ricardo Henrique Almeida Dias

Teoria
da Comunicação
UNIFACVEST

Reitor: Geovani Broering


Pró-Reitora de Administração e Finanças: Soraya Lemos Erpen Broering
Pró-Reitor Acadêmico: Roberto Lopes da Fonseca
Pró-Reitor de Pesquisa e Extensão: Renato Rodrigues

Equipe de produção

Coordenadores do projeto: Simone Regina Dias e Marco Maschio Chaga


Designer educacional: Simone Regina Dias
Projeto gráfico e diagramação: Daniel Boppré

Este material é resultado do Projeto de pesquisa “Estudos sobre narrativa e


tecnologia educacional”, vinculado à linha de pesquisa Linguagens, micronarrativas
e tecnologias, do Programa de Mestrado Profissional em Práticas Transculturais da
UNIFACVEST.

Os professores que fazem parte desse Projeto são: Arceloni Neusa Volpato; Eduard
Marquardt; Maryaulê Malvessi Mittmann; Marco Maschio Chaga e Simone Regina Dias.
CONHECENDO O AUTOR

Ricardo Henrique Almeida Dias é Bacharel em Comunicação Social:


Habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Mestre e Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas.
É professor no Centro Universitário Unifacvest - Lages-SC, instituição na qual
ministra disciplinas do campo das ciências humanas e sociais de diversos cursos
de graduação com ênfase nas habilitações da área de comunicação social:
publicidade e propaganda, jornalismo e fotografia. Faz parte da coordenação
do projeto de criação do mestrado em comunicação, é líder do Grupo de
Estudos e Pesquisas em Cultura e Comunicação.

Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8797223564596061


CONHECENDO A DISCIPLINA

Prezado estudante,

Nesta disciplina iremos estudar principais teorias da comunicação e as


contribuições das outras disciplinas das ciências humanas e sociais nos estudos
em comunicação. Veremos o papel dos meios de comunicação de massa ao
longo da história e das novas tecnologias de informação e comunicação na
atualidade.

Após o término da disciplina, você será capaz de analisar criticamente os


meios de comunicação de massa, bem como as mediações dos comunicadores.
Estará apto a compreender os discursos que circulam no processo de produção
dos enunciados que podemos ver nos meios de comunicação, ou seja, estará
apto a entender o que está por trás da produção das notícias, peças publicitárias
e fotografias que temos contato no cotidiano.
Sumário

UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO À TEORIA DA COMUNICAÇÃO


Objetivo de aprendizagem
O que vamos aprender aqui?
Tópicos de estudo
1.1 O modelo de Lasswell
1.2 Teorias da comunicação
Em resumo
Referências

UNIDADE 2 – MASS COMMUNICATION RESEARCH


Objetivos de aprendizagem
O que vamos aprender aqui?
Tópicos de estudo
2.1 Mass Communication Research
Em resumo
Referências

UNIDADE 3 – A INDÚSTRIA CULTURAL E A ESCOLA DE FRANKFURT


Objetivos de aprendizagem
O que vamos aprender aqui?
Tópicos de estudo
3.1 Produção científica dos autores pertencentes à Escola de
Frankfurt
Em resumo
Referências

UNIDADE 4 – OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E A CONSTRUÇÃO


SOCIAL DA REALIDADE
Objetivos de aprendizagem
O que vamos aprender aqui?
Tópicos de estudo
4.1 Estudos culturais
4.1.1 Espiral do silêncio
4.2 Sobre as pesquisas na área de comunicação
Referências
UNIDADE 1
INTRODUÇÃO À TEORIA
DA COMUNICAÇÃO

Objetivo(s) de aprendizagem
Ao fim dessa unidade, você será capaz de identificar a relevância do
desenvolvimento de teorias para explicar o fenômeno da comunicação.

O que vamos aprender aqui?


Nesta unidade iremos aprender como se constituíram as teorias que tiveram
por objetivo explicar os processos comunicativos. A comunicação é definida pelo
ato de trocar informações, usando os sistemas simbólicos como suporte, ou seja,
a linguagem verbal e não-verbal. Por exemplo, aqui no Brasil nos comunicamos
através de um sistema simbólico constituído pela língua portuguesa. Podemos
também nos comunicar usando gestos, cores e sinais, o que constitui a linguagem
não-verbal.

Comunicar é o ato de transmitir uma mensagem e, eventualmente,


receber outra mensagem como resposta. A comunicação deve envolver também
a intencionalidade dos sujeitos que se comunicam, o que possibilita a vida em
comunidade.

No processo de comunicação pode estar envolvido algum tipo de aparato


técnico que serve de intermédio aos locutores. Uma pessoa ministrando uma
palestra se vale de um aparato técnico, o microfone, para amplificar sua voz e se
comunicar com a plateia. Nos meios de comunicação de massa, uma pessoa pode
se comunicar com milhões e até bilhões de outras pessoas, como um apresentador
de uma rede de televisão de vasto alcance.

Outro fator importante para a comunicação é a persuasão, já que


jornalistas, publicitários e os demais profissionais da comunicação visam também
persuadir, ou seja, fazer com que as pessoas a quem ele se dirige compartilhem
das mesmas ideias comunicadas, acreditando nas notícias como verdades e
que os produtos possuem todas as características positivas que lhes são atribuídos.
Na persuasão, duas pessoas com ideias distintas, ao se comunicarem, chegam
a um consenso. Enfim, para compreender um fenômeno tão complexo quanto a
comunicação, diversos pesquisadores a estudaram, produzindo teorias para explicar
esse fenômeno.

Antes de nos debruçarmos sobre as diversas teorias produzidas acerca da


comunicação, devemos nos perguntar: qual é o sentido de criar teorias sobre algo?
Qual é o significado de “teoria”?

Uma teoria envolve todo o conhecimento necessário para explicar e prever


determinado fenômeno. Por exemplo, a física desenvolvida por Isaac Newton explica
as órbitas dos planetas em torno do Sol e consegue prever com precisão os eclipses
lunares e solares. Newton conseguiu prever qual seria a velocidade de escape da
gravidade da Terra para colocar um corpo em órbita e, desse modo, foi relevante
para a ida do homem à Lua, mesmo que isso tenha acontecido 242 anos após a sua
morte. Assim, o conhecimento que é desenvolvido a partir de uma teoria pode ser
aplicado muito tempo depois do seu desenvolvimento.

A mesma lógica serve para a comunicação. Muitas teorias da comunicação


foram desenvolvidas durante e logo após a Segunda Guerra Mundial, principalmente
no que se refere aos efeitos dos meios de comunicação de massa no comportamento
das pessoas. Elas conseguiram explicar a enorme influência dos meios de comunicação
na sociedade e previram como uma sociedade influenciada pelos meios poderia
ser usada politicamente, ou seja, para que as pessoas aderissem a determinado
posicionamento político.

Mesmo em situações cotidianas estamos imersos em conhecimentos que se


constituem em teorias que foram desenvolvidas por séculos. O ligar de uma lâmpada
nos remete à teoria da eletricidade. O ato de ligar um televisor, dos moldes antigos,
pode ser remetido ao que foi produzido na pesquisa dos raios catódicos, que se
refere à teoria da eletricidade. Mesmo a vestimenta do apresentador do jornal diário
tem uma teoria embutida, uma vez que a teoria da informação nos demonstra os
problemas do ruído na comunicação, como apresentado por Shannon e Weaver, na
teoria matemática da comunicação.

Um apresentador de telejornal nunca aparecerá com roupas de cores fortes,


já que isso provocaria distração nos telespectadores por eles ficarem prestando
atenção na cor e não na informação, um típico caso de ruído na comunicação. Enfim,
ao estudarmos as teorias da comunicação, podemos ter uma boa ideia de como se
processa o emissor e o receptor da mensagem, além dos canais e efeitos conseguidos.
Tópicos de estudo

1.1 O modelo de Lasswell

De acordo com Antonio Hohlfeldt, no verbete “Comunicação”, da Enciclopédia


Intercom de Comunicação (MELO et al., 2010), a comunicação é a troca de informações
entre uma fonte ou emissor e um receptor. Em 1948, Harold Lasswell, em seu artigo
intitulado “A estrutura e função da comunicação na sociedade”, propôs um modelo
para comunicação baseado nos fatores:

- Quem?
- Diz o quê?
- Em qual canal?
- Para quem?
- Com quais efeitos?

A proposta de Lasswell teve por objetivo superar o modelo de comunicação


baseado na teoria hipodérmica. Essa teoria tem esse nome por partir do princípio de
que as pessoas são inoculadas por mensagens através dos meios de comunicação da
mesma maneira que uma agulha de uma seringa veicula vacinas e medicamentos.

Todas as pessoas são atingidas pelas mídias (sinônimo de meios de comunicação)


da mesma maneira e reagem do mesmo jeito. Essa teoria, também chamada de “bala
mágica” - uma vez que essa bala atinge todas as pessoas do mesmo modo -, não se
preocupa em investigar os efeitos dos meios de comunicação, já que estes são dados
como previstos.

A proposta de Lasswell supera a teoria hipodérmica por levar em conta a


resistência do público e a previsão de efeitos opostos aos previstos. Os jornalistas
e publicitários podem ter a intenção de transmitir determinadas mensagens, mas
o público pode resistir à informação ou reagir de maneira inesperada e, às vezes,
até contrária à informação passada pelos comunicadores. Wilbur Schramm vai mais
além, ao propor que as posições do emissor e do receptor são intercambiáveis. Quem
é emissor pode se tornar receptor mais adiante e vice-versa (MELO et al., 2010).

Para Wolf (2006), o esquema de Lasswell tem implicações do ponto de vista


da pesquisa, já que qualquer um dos fatores define e organiza um setor específico da
pesquisa. O estudo dos emissores usa como referencial teórico a análise de controle
sobre o que é difundido. Já o estudo da segunda variável (“diz o quê?”) se vale da
análise de conteúdo das mensagens para produzir conhecimento. A terceira variável
(“em qual canal?”) se preocupa em analisar os meios, e a parte final do esquema
(“para quem?” e “com quais efeitos?”) utiliza como referencial teórico a análise da
audiência e dos efeitos.

Os estudos da Mass Communication Research, como veremos na próxima


unidade, se ocuparam principalmente da análise dos efeitos e da análise dos
conteúdos. De acordo com Wolf (2006), essa escola de investigação aprofundou
também no estudo das análises dos controles que a mídia procura exercer nas massas.
Buscando superar o modelo de Lasswell, as pesquisas em comunicação desenvolvidas
a partir dos anos 1940, por outro lado, também consideram que o processo
comunicacional, na verdade, é bem mais complexo. Para Hohlfeldt (2010, p. 234):

Assim sendo, desenvolveu-se a teoria do duplo fluxo da comunicação, segundo o qual


um emissor original emite certas informações a uma série de receptores que, por
seu lado, imediatamente se transformam em emissores e reenviam aquela mesma
informação a uma outra série mais ampla de receptores potenciais. Isso constitui
fundamentalmente o processo da chamada comunicação de massa. Teorias mais
recentes indicam que os processos comunicacionais mais eficientes são aqueles
que atendem às expectativas do receptor, uma vez que as mensagens devem suprir
determinadas necessidades dos mesmos (teoria dos usos e das gratificações).

Pesquise !
Procure em sites de pesquisa diagramas do esquema da
comunicação de Lasswell.

1.2 Teorias da comunicação

Antes de prosseguirmos com a abordagem das várias teorias da comunicação,


precisamos recorrer à história para ver como e por que essas teorias surgiram. De um
ponto de vista histórico, a invenção da imprensa por Gutemberg no século XV deu
um grande avanço à circulação da livre informação, o que trouxe desdobramentos
sociais consideráveis. Entretanto, é a partir do século XIX que os dispositivos técnicos
se aprimoram para criar as condições para a comunicação de massa, ou seja, um
grupo de pessoas, no caso, os jornalistas e donos dos meios de comunicação, se
comunica com milhares de pessoas a partir do jornal.

Para Mattelart (2004), nessa época surgiram as noções fundadoras da


comunicação que a vê como um fator de integração das sociedades humanas. O século
XIX foi marcado pela expansão dos grandes impérios, principalmente o britânico e o
francês. Com o aprimoramento das formas de produzir produtos comunicativos, tais
como o jornal, o livro, a revista e, posteriormente, o telégrafo e o rádio, podia-se
ter informações de várias partes do mundo, apesar da demora para a transmissão de
informações, se comparada aos dias atuais.

As ciências da comunicação, para Mattelart (2004, p. 13), surgiram no bojo


das redes físicas proporcionadas pelos meios de comunicação: “o pensamento
da sociedade como organismo, como conjunto de órgãos que cumprem funções
determinadas, inspira as primeiras concepções de uma ‘ciência da comunicação’”.

A história das teorias da comunicação é caracterizada pelos fracionamentos


entre algumas dicotomias. O estudo em comunicação se situa em um campo de
tensão entre o biológico e o social, sendo que o ato de comunicação envolve tanto
aspectos da biologia e anatomia do corpo humano para emanar fonemas a partir das
cordas vocais quanto a constituição social desse indivíduo que se comunica conforme
os determinantes sociais a que está submetido. Assim como outra dicotomia, a
natureza e a cultura. Por cultura compreendemos tudo o que é transformado pelo
homem, enquanto que a natureza é algo que independente da ação humana. A
comunicação depende tanto de aspectos culturais quanto naturais. Exemplos de
comunicação baseada na cultura estão nos veículos de comunicação de massa, já que
eles precisam de dispositivos técnicos que foram desenvolvidos a partir do controle
da natureza pela cultura tecnocientífica para se tornarem possíveis, e o discurso, a
relação de efeitos de sentidos entre interlocutores. Outras dicotomias são a tensão
entre a economia, o mercado e a cultura, as perspectivas micro e macro, o local e o
global, o indivíduo e a sociedade, o livre arbítrio e os determinantes sociais.

Uma das consequências dessa tensão entre opostos está na grande diversidade
de modelos teóricos que foram propostos para explicar a comunicação. Ora foca-se
nos dispositivos técnicos, ora dá-se atenção aos papéis sociais dos comunicadores.
Enquanto algumas pesquisas abordam os efeitos dos meios de comunicação em
milhões de pessoas, outras investigações acumulam conhecimento através da análise
da interação dos meios de comunicação em vinte pessoas. O que é importante
entendermos aqui é que todas as pesquisas se influenciam mutuamente, às vezes
trazendo contribuições relevantes ou criando obstáculos para a compreensão da
comunicação.

Para Jesús Martín-Barbero, filósofo e um dos grandes pesquisadores da


comunicação no mundo, em entrevista à revista Pesquisa Fapesp (MOURA, 2009),
há basicamente três maneiras de enfocar a comunicação em nosso mundo latino-
americano:

as duas primeiras estiveram em contraposição. Partimos da visão hegemônica que dois


pesquisadores norte-americanos construíram no fim da Segunda Guerra Mundial, com
base em um profundo mal-entendido: um engenheiro de telefonia chamado [Claude]
Shannon teve a ousadia de chamar teoria geral da comunicação a um livro que fala de
economia da transmissão de informação, ou seja, como fazer para que a transmissão
de informação tivesse o menor ruído possível e durasse o menor tempo possível,
portanto, com a menor redundância possível. Essa proposta de um engenheiro de
telefones, manipulada por [Harold] Lasswell e [Paul] Lazarfeld, se converteu na
grande teoria da comunicação. Quando voltei à Colômbia em 1973, depois de meu
doutorado, entrei no campo de comunicação e o encontrei identificado com essa
concepção de transmissão de informação – ora, à luz do que vejo, a comunicação
está nos modos de se comunicar das pessoas nas ruas, na casa, na igreja, na praça
– nada tinha a ver com a ideia de transmissão da informação como estava proposta
(p. 11).

Para o filósofo, a conversação cotidiana está cheia de ruído e de redundância.


Mesmo o jornalismo também depende da redundância para se tornar eficaz. Conforme
Felipe Pena (2008, p. 18), a redundância é essencial para a comunicação, sendo que
ela está diretamente ligada à eficácia da comunicação. “Sem ela, o verbo comunicar
é quase uma impossibilidade”.

Segundo Martín-Barbero (2009), os que armaram essa armadilha de estudar a


comunicação cotidiana a partir das pesquisas sobre comunicação telefônica e teoria
da informação de Shannon foram Lasswell e Lazarsfeld. Eles passaram a estudar com
base na teoria da informação os grandes fenômenos de opinião pública.

Para mim, o mais terrível foi se identificar comunicação com transmissão. Ora,
transmissão é um conceito muito mecânico, e a comunicação, incluídas a opinião
pública e a publicidade, é muito menos mecânico. Portanto, os dois propuseram uma
concepção que depois chamamos de instrumental. Era puramente instrumental, o
meio era um instrumento (MOURA, 2009, p. 11).

Saiba
Um dos textos mais interessantes sobre a relação entre as
mensagens, os mensageiros e os meios está na obra do teórico
da comunicação Marshall McLuhan. Este autor propôs a expressão
“aldeia global” para descrever a interconexão humana em
escala global via meios eletrônicos de comunicação Em sua obra
intitulada “Os meios de comunicação como extensão do homem”,
ele demonstra como os meios em si influenciam na recepção da
mensagem pelas pessoas. Disponível em <http://ref.scielo.org/
dfdggc>
Um dos contrapontos à ideia de resumir os estudos em comunicação aos meios
está na Escola de Chicago: um grupo de pesquisas que envolveu a comunicação,
sociologia, antropologia e urbanismo nas décadas de 1920 e 1930 do século XX. Essa
vertente possui um enfoque microssociológico dos modos da comunicação em uma
organização. Ela busca a harmonia a partir da reflexão sobre a função do instrumento
científico na resolução dos grandes desequilíbrios sociais em determinada comunidade.

Entre os membros da Escola de Chicago se destaca Robert Park, um jornalista


que pesquisou em sua tese de doutorado a massa e o público. Ele propôs que a cidade
é um espectroscópio da sociedade, ou seja, podemos analisar a sociedade inteira
a partir de uma cidade. A cidade é um laboratório social, na qual pode-se notar a
questão da imigração e a integração desses imigrantes na sociedade norte-americana
no período entre guerras (de 1920 a 1940). Em 1921, Park e seu colaborador E. W.
Burguess postulam a ideia de “ecologia humana”. Por ecologia, entende-se a ciência
das relações entre o organismo com o entorno, que se refere a todas as condições de
existência.

Na perspectiva de Mattelart (2004), três elementos definem uma comunidade:


uma população organizada em um território, mais ou menos enraizada nele e cujos
membros vivem uma relação de interdependência mútua de caráter simbiótico. Nessa
“economia biológica”, a “luta pelo espaço” é que rege as relações interindividuais.
Essa competição é um princípio organizativo. Nas sociedades humanas, competição e
divisão do trabalho conduzem a formas não planificadas de cooperação competitiva.
Essa nova divisão do trabalho, através da nova ecologia humana, demandará cada
vez mais profissionais especializados para exercer o trabalho com eficácia. Dentro
dessa ecologia humana é que os meios de comunicação vão sendo aprimorados. A
comunicação não pode ser vista fora dessa ecologia, sendo que mesmo os aparatos
tecnológicos são pensados em funcionamento dentro dessa ecologia.

A Escola de Chicago se baseia em estudos etnográficos, ou seja, observação


participante em bairros e comunidades e análise das histórias de vida. Cooley (apud
MATTELART, 2004) se dedicou ao estudo das interações simbólicas dos atores sociais a
partir da etnografia, ou seja, um método de pesquisa no qual o pesquisador observa
com detalhe todas as mudanças e ações de alguém em determinado sistema. Ele
foi o primeiro a usar a expressão “grupo primário”. Esse grupo primário é a base da
formação da natureza social e dos ideais do indivíduo.

Se existe comunicação é em virtude das diversidades individuais. O indivíduo está


submetido às forças da homogeneidade, mas tem porém a capacidade de escapar
dela. Encontramos aqui a tensão subjacente nas investigações de Dewey, para quem
a comunicação é ao mesmo tempo a causa e o remédio da perda da comunidade
social e da democracia política (COOLEY apud MATTELART, 2004, p. 36).
Uma perspectiva que dá menos margem ao sujeito escapar dos determinismos
sociais, que são em grande parte reforçados pelos meios de comunicação, está
na Escola de Frankfurt. Veremos, na unidade 3, as ideias dessa escola com mais
profundidade. Uma das noções mais importantes para a Escola de Frankfurt está na
noção de indústria cultural. A cultura popular, que produz bens culturais de maneira
massificada, serial e padronizada, a saber filmes, programas de rádio e televisão,
revistas, jornais, faz isso com a intenção de manipular a sociedade de massas de
maneira passiva.

Saiba
Clique neste link e saiba mais sobre a atuação da Escola de Frankfurt:
<https://goo.gl/wftXR5>

Dois teóricos dessa corrente são os filósofos alemães Max Horkheimer e


Theodor Adorno. As pesquisas que eles desenvolveram sobre a indústria cultural
argumentam que o entretenimento produzido em massa, por sua própria essência,
atrai vastas audiências e tem por objetivo trazer lucratividade para essa própria
indústria como qualquer outra.

Horkheimer e Adorno compararam a indústria cinematográfica americana e a


Alemanha fascista. Eles destacam a presença da cultura produzida em massa, criada
e disseminada por instituições exclusivas e consumida por uma audiência passiva
e homogeneizada em ambos os sistemas, tanto o americano quanto o fascista.
Por audiência homogeneizada entendemos pessoas que consomem os meios de
comunicação e não se sentem transformadas pelas informações que lhe são passadas.
Uma audiência que reproduz e compartilha as opiniões que os meios de comunicação
transmitem sem refletir sobre essas opiniões.

Para entender todo esse fenômeno complexo que envolve a comunicação,


foram criadas diversas teorias para explicar esse fenômeno, como veremos ao longo
da disciplina. Muitas dessas teorias são, às vezes, contraditórias, mas são igualmente
relevantes para analisarmos a situação atual do jornalismo, da publicidade, da
fotografia e de diversas manifestações culturais.

Mesmo teorias produzidas no século XIX e começo do século XX são relevantes


para compreendermos a atualidade do jornalismo, como, por exemplo, a valorização
do jornalismo local face às novas tecnologias da informação e da comunicação. A
Escola de Chicago, em sua metodologia, já chamava a atenção para a relevância em
se estudar as microcomunidades para se ter um cenário propício para se compreender
toda a sociedade. Assim, esperamos que ao longo da disciplina você possa notar
como essas teorias se relacionam com a realidade cotidiana e presente.
Em resumo

Nesta unidade, delineamos alguns aspectos principais das teorias da


comunicação. Primeiro, definindo o que é comunicação e expondo algumas teorias,
como a da informação de Shannon e Weaver, bem como a Escola de Chicago. A
comunicação é definida pelo ato de trocar informações, usando os sistemas simbólicos
como suporte, ou seja, a linguagem verbal e não-verbal. A teoria da informação
nos demonstra que a comunicação deve ocorrer sem redundância e sem ruídos.
Jesús Martín-Barbero nos conta que essa teoria é relevante para se compreender
os aparatos técnicos, como a tecnologia telefônica, mas não para entendermos a
comunicação cotidiana em que não podemos fugir do ruído e sempre há redundância,
como a repetição constante do replay do lances em uma partida de futebol. Vimos
também que a Escola de Chicago nos mostra a importância do estudo das pequenas
comunidades para entendermos a sociedade. A interação dos membros de uma
sociedade é relevante para os estudos da comunicação, já que os membros usam
os meios de comunicação para interagirem. Por fim, vimos algumas noções sobre a
indústria cultural.

Referências

MATTELART, A. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2004.

HOHLFELDT, A. Comunicação. In: MELO, José Marques de et al. Enciclopédia


INTERCOM de Comunicação. São Paulo: INTERCOM, 2010.

MOURA, M. Jesús Martín-Barbero: As formas mestiças da mídia. Pesquisa Fapesp, São


Paulo, n. 163, 2009.

PENA, F. A teoria do jornalismo no Brasil. In: SOUZA, Jorge Pedro (org.). Jornalismo:
história, teoria e metodologia: perspectivas luso-brasileiras. Porto: Edições
Universidade Fernando Pessoa, 2008.

WOLF, M. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença, 2006.


UNIDADE 2
MASS COMMUNICATION RESEARCH

Objetivo(s) de aprendizagem
Ao finalizar esta unidade, você estará apto a verificar o papel das pesquisas
em meios de comunicação de massa desenvolvidas nos EUA na primeira metade
do século XX.

O que vamos aprender aqui?


Nesta unidade iremos estudar as teorias da comunicação desenvolvidas a
partir do período entre as grandes guerras mundiais, ou seja, entre 1920 e 1940.
Uma das escolas de maior influência está na Mass Communication Research, que
em tradução literal, pode ser algo como “Pesquisa de Comunicação de Massa”.
As investigações dentro dessa corrente tiveram por objetivo analisar os efeitos
sociais, culturais e psicológicos das mensagens transmitidas pelos meios de
comunicação de massa.

As pesquisas buscaram compreender a reação do público frente a essa comunicação


de massa para produzir comportamentos padronizados na população. Um estudo
que é exemplo dessa tendência é a pesquisa das eleições por Paul Lazarsfeld.
Ao investigar a eleição no estado americano de Ohio, em 1940, ele pôde ver a
grande influência do rádio no comportamento do eleitorado. Pesquisas desse tipo
foram desenvolvidas para avaliar o impacto também da televisão, jornal, revista
e das campanhas publicitárias.

Antes de prosseguirmos, precisamos ter uma ideia clara do que se refere ao termo
“massa” quando se fala dos meios de comunicação de massa. Massa aqui deve
ser entendida pelo conjunto de vastos segmentos da população em determinado
tempo.

A comunicação de massa refere-se à transmissão de mensagens em grande escala


para uma ampla gama de pessoas. Relaciona-se ao jornal diário, à revista, ao
livro, ao rádio, à televisão, ao filme e à internet, que agrega todos os outros
meios.
Tópicos de estudo

2.1 Mass Communication Research

Para Mattelart (2004), a corrente da Mass Communication Research começou


em 1927 quando da publicação do livro de Harold Lasswell intitulado Propaganda
techniques in the World War (Técnicas de propaganda na guerra mundial, sem tradução
para o português). Lasswell utilizou a experiência da Primeira Guerra Mundial para
analisar os meios de comunicação e o uso deles pelos governos para formar opiniões
junto à população, sendo que, nessa época, os grandes meios de comunicação eram
o telégrafo, o telefone, o cinema e o rádio.

Uma das grandes contribuições de Lasswell foi o relacionamento entre


propaganda e democracia. De acordo com Mattelart (2004, p. 37), “a propaganda se
constitui no único meio de suscitar a adesão das massas; também é mais econômica
que a violência, a corrupção ou outras técnicas de governo desta natureza”. Essa
visão instrumental dos meios de comunicação é uma perspectiva importante para
a compreensão do papel dos meios nessa época. Os meios são considerados como
onipotentes, ou seja, possuem poder absoluto e total para a circulação eficaz das
mensagens. Nessa perspectiva, a audiência é considerada como um branco amorfo,
isto é, algo que pode ser pintado e moldado conforme a intenção dos que controlam
os meios de comunicação. Esse modo de ver acredita que a audiência obedece
cegamente ao esquema estímulo-resposta, do ponto de vista da agulha hipodérmica
que estudamos na unidade 1.

Um das vertentes de produção do conhecimento mais importantes para


compreendermos essa perspectiva está na teoria do condicionamento ou teorias
do estímulo-resposta. Várias pesquisas foram desenvolvidas no século XX com o
objetivo de estudar o procedimento no qual um estímulo biológico é produzido com
relação a um estímulo anteriormente neutro. Por exemplo, ao se tocar um sino logo
antes de alimentar os cachorros, isso faz com que, em certo tempo, eles tenham
comportamentos correspondentes à alimentação, tais como liberação de saliva e
enzimas digestivas, com o simples tocar do sino, antes de receberem o alimento.

Experimentos desse gênero tiveram início com os estudos de Ivan Pavlov e


ganharam fama com B. F. Skinner e se transformaram na corrente conhecida como
behaviorismo, ou comportamentalismo, uma escola da psicologia que foi dominante
em grande parte do século XX.

Do ponto de vista da comunicação, acreditava-se que as mensagens dos


meios de comunicação poderiam atingir a audiência com base no mesmo esquema
de estímulo e resposta. Determinada peça publicitária poderia provocar reações
automáticas nas pessoas e fazer com que elas comprassem o produto de maneira
também automática, facilitando o aumento dos lucros das empresas envolvidas.
Assim como os efeitos da propaganda política.
Pesquise !
Procure em sites de busca o termo “caixa de Skinner”. Após
ler sobre o assunto, responda: você concorda que os meios de
comunicação podem condicionar a audiência da mesma maneira
que Skinner propôs para os comportamentos humanos?

Com a aproximação da Segunda Guerra Mundial, foram produzidas várias


obras sobre o poder absoluto dos meios de comunicação e da propaganda. Mattelart
(2004) cita o exemplo da obra do russo Serge Tchakhotine, que já no título podemos
notar essa tendência: A violação das massas pela propaganda política. Tchakhotine
dedicou sua obra a H. G. Wells, a quem considera um grande amigo e pensador do
futuro. Nessa época, Wells publicou a sua obra A guerra dos mundos. Orson Welles
criou uma versão da obra para um programa de rádio, o que se constituiu em um dos
grandes fenômenos de comunicação e os efeitos que eles produzem na audiência.

No Halloween, o dia das bruxas nos Estados Unidos da América, em 1938,


Orson Welles transmitiu sua adaptação da obra de H. G. Wells, A guerra dos mundos,
para a rádio local, a CBS de New York. Os primeiros dois terços do programa de uma
hora de duração foram apresentados como uma série de boletins de notícias que
sugeriam que uma verdadeira invasão de alienígenas vindos do planeta Marte estava
ocorrendo.

Muitos ouvintes acreditaram que o drama de Welles era real, o que gerou pânico
generalizado. Outros que sintonizaram a rádio no meio do programa entenderam que
havia começado uma guerra mundial, devido ao aumento das tensões entre as nações
europeias, que teriam culminado no conflito mundial dois anos depois. Com o caso,
ficou comprovado o enorme poder dos meios de comunicação em produzir reações
em massa, já que o grau de realismo conferido a uma novela de ficção fez com que
as pessoas acreditassem e reagissem com pânico a essa mensagem ficcional.

Outros temas que o pesquisador da comunicação Harold Lasswell buscou


compreender foram os assuntos públicos, a opinião pública e as eleições. De acordo
com Mattelart (2004), os anos 1930 do século passado ofereceram um laboratório real
para o estudo da propaganda política. Fatos que constituíram esse laboratório social
e midiático foram as várias eleições de Franklin Delano Roosevelt a partir de 1932,
o começo do New Deal e das técnicas de formação da opinião pública. A propaganda
teve um papel fundamental para mobilizar a população em torno dos programas do
Welfare State, que é um conceito de governança em que o Estado possui um papel-
chave na proteção e promoção do bem-estar social e econômico dos cidadãos. Ele
tem por princípio a igualdade de oportunidades e distribuição de riquezas e foi a
filosofia base para o New Deal, ou Novo Acordo, que foram uma série de programas
implementados nos Estados Unidos nos anos 1930 que tiveram por objetivo tirar o
país da grave crise econômica, a Grande Depressão de 1929.

Por mexer em temas sensíveis do ponto de vista popular por um longo período
de tempo (1933 a 1937), tais como a previdência social, as relações trabalhistas e as
reformas fiscais, monetárias e do sistema bancário, a mobilização da população foi
fundamental para a implementação eficaz das alterações na economia americana.
Assim, os meios de comunicação e as pesquisas de opinião foram fundamentais para
esse propósito.

As pesquisas pré-eleitorais de Gallup, Roper e Crossley conseguem prever a


reeleição do presidente Roosevelt em 1936. Para Mattelart (2004), um dos indícios da
formação de um campo de investigação em opinião pública foi a criação da revista
The Public Opinion Quartely pela Associação Americana para a Pesquisa de Opinião
Pública. Ela foi a primeira revista acadêmica sobre as comunicações de massa. Essas
pesquisas foram usadas na elaboração das estratégias de propaganda dos governos,
como pesquisado por Harold Lasswell. Em 1935, ele propôs um estudo sistemático do
conteúdo dos meios de comunicação e a elaboração dos indicadores para a análise
das tendências vigentes para a construção de políticas públicas.

Após a Segunda Guerra Mundial, a comunicação começou a ser investigada


a partir da perspectiva teórica do funcionalismo, que é uma das teorias também
encontrada na sociologia. O funcionalismo é um campo de trabalho que percebe
a sociedade como um sistema complexo na qual as partes trabalham em conjunto
para promover o seu funcionamento e estabilidade. Do ponto de vista dos meios de
comunicação, uma perspectiva funcionalista procura investigar as funções dos meios
no funcionamento da sociedade.

Ainda para Mattelart (2004), os estudos da comunicação se baseiam


majoritariamente na análise dos efeitos e na análise de conteúdo. Um referencial
teórico que busca analisar o conteúdo aspira à descrição objetiva, sistemática e
quantitativa do conteúdo que os meios de comunicação transmitem.

A observação dos efeitos dos meios de comunicação nos receptores, a avaliação


constante, com fins práticos, das trocas que se operam em seus conhecimentos,
seus comportamentos, suas atitudes, suas emoções, suas opiniões e seus atos, estão
submetidos à exigência de resultados formulada por quem as financiam, preocupados
por avaliar a eficácia de uma campanha de informação governamental, de uma
campanha de publicidade ou de uma operação de relações públicas das empresas e, no
contexto da entrada na guerra, das ações de propaganda dos exércitos (MATTELART,
2004, p. 40).

De um ponto de vista funcionalista, Lasswell (apud MATTELART, 2004, p. 41)


estabelece três funções principais do processo de comunicação na sociedade:
a) A vigilância do entorno, revelando tudo o que poderia amenizar ou afetar ao
sistema de valores de uma comunidade ou das partes que a compõe.
b) a relação posta dos componentes da sociedade para produzir uma resposta ao
entorno.
c) a transmissão da herança social.

Os sociólogos Paul Lazarsfeld e Robert Merton adicionaram uma quarta


função, que consiste no entretenimento. Lazarsfeld já vinha de uma linha de pesquisa
financiada pela Fundação Rockefeller sobre o rádio. De acordo com Breton e Proulx
(2002), Lazarsfeld, em conjunto com Frank Stanton e Hadley Cantril, criaram, em
1937, uma empresa com a finalidade de estudar o que significava o rádio na vida das
pessoas. Uma das finalidades seria o entretenimento.

Conforme Mattelart (2004), Lazarsfeld e Merton também complicaram o


esquema distinguindo a possibilidade de disfunções, assim como as funções latentes
e manifestas. Nem sempre a comunicação se dá de maneira 100% eficaz, sendo que
podem ocorrer interpretações distintas da mensagem transmitida pela audiência na
qual, desse modo, faz com que a comunicação se daria de maneira disfuncional.
Outra forma de disfunção tem a ver quando pensamos a sociedade como um todo.
Os meios de comunicação, do ponto de vista funcionalista, podem contribuir para a
adaptação ou ao ajuste em um sistema dado.

Já as disfunções, para Lazarsfeld e Merton, podem ser vistas como moléstias.


Há uma disfunção que eles chamaram de narcotizadora, pois faz com que a população
fique politicamente apática. “Nesse jogo de funções e disfunções, o sistema social
se compreende em termos de equilíbrio e desequilíbrio, de estabilidade e de
instabilidade” (MATTELART, 2004, p. 42).

Um exemplo de pesquisa efetuada por Lazarsfeld sobre o rádio foi através de


um método denominado analisador de programas ou máquina dos perfis. De acordo
com Mattelart (2004), esse dispositivo era encarregado de registrar as reações do
ouvinte em termos de gosto, rejeição ou indiferença. Os ouvintes expressavam suas
satisfações pressionando um botão verde e seus descontentamentos com o botão
vermelho. Para expressar indiferença, bastava não apertar nenhum dos botões. Após
o sucesso dessa técnica de pesquisa, o aparato foi adaptado ao cinema. Os resultados
serviram para se elaborar programas de rádio e filmes com maior possibilidade de
trazer impacto à audiência.

Pesquisas do tipo contrastavam com as pesquisas anteriores de caráter mais


histórico e com compromisso social que marcaram a Escola de Chicago, como vimos
na unidade anterior. Os estudantes formados por Lazarsfeld se tornaram gurus da
indústria publicitária. Eles têm por objetivo produzir pesquisas que demonstrem
o processo de motivação do consumidor, bem como suas condutas durante o
desenvolvimento do ato de comprar.
De acordo com Mattelart (2004), nessa fase surgem as pesquisas com
questionários fechados, em vez da investigação com procedimentos clínicos, de
psicanálise e da antropologia cultural. Essa perspectiva atenderá melhor a busca
pelas informações referentes ao consumo e à identificação do produto e da marca
através da imagem que os consumidores possuem com relação a eles.

Saiba
Podemos encontrar estudos recentes sobre recepção da
mensagem dos meios de comunicação no trabalho da pesquisadora
em comunicação Maria Immacolata Vassallo de Lopes. Em 1995,
a autora investigou a recepção da novela “A Indomada” junto a
quatro famílias de condições sociais diferentes. Leia a entrevista
concedida pela autora sobre suas pesquisas no site: <goo.
gl/7qDvRs>

Adentrando os anos 1940 e 1950 do século XX, os pesquisadores da comunicação


perceberam a existência de um elemento intermediário entre o ponto inicial e o
ponto final do processo de comunicação. A principal inovação adveio da crítica ao
modelo mecanicista de Lasswell de efeito direto, automático e indiferenciado. Esses
pesquisadores buscaram fugir da ideia de efeito massificador da sociedade composta
pela massa “branca e amorfa”. Aqui foi retomada a ideia de grupo primário, que foi
proposta pela Escola de Chicago, na qual há intermediários no processo comunicativo.
O fluxo de comunicação é um processo de duas etapas em que a função dos líderes
de opinião são decisivas. Para Mattelart (2004, p. 48), “no primeiro escalão estão as
pessoas relativamente bem informadas por estarem diretamente expostas ao meios
de comunicação. No segundo as que frequentam menos os meios de comunicação e
que dependem das outras para obter a informação”.

Kurt Lewin é um dos pesquisadores em comunicação que se dedicou a essa


noção de intermediários no processo de comunicação. De acordo com Mattelart
(2004), ele estudou a decisão de grupo, o fenômeno do líder e as reações de cada
membro perante uma mensagem comunicada por diferentes meios. O grupo cara a
cara pode ser uma família ou famílias, uma classe na escola, um clube de jovens, um
grupo de trabalho, os funcionários de um hospital ou de uma oficina.

A Segunda Guerra Mundial foi um período no qual Lewin estudou essas ideias frente
à mobilização em torno do esforço de guerra em uma economia de privação. Ele se
dedicou a sintonizar as estratégias de persuasão como objeto de troca das atitudes
das donas de casa sobre os regimes de alimentação (MATTELART, 2004, p. 53).
A partir das pesquisas de Lewin é que vai se formando a noção de gatekeeper,
ou controlador do portão, que é quem controla o fluxo de informação, função que
assegura o líder de opinião informal. Outro pesquisador importante dessa tendência
foi Carl Hovland.

Para Mattelart (2004), Carl Hovland é conhecido pelos estudos experimentais


que realizou sobre a persuasão ao longo da Segunda Guerra Mundial. Ele pesquisou
como os filmes de propaganda aliada repercutiram junto aos soldados americanos,
buscando compreender como os filmes que ilustravam as causas e os objetivos do
conflito produziam efeitos na moral das tropas, seu grau de informação e sua atitude
em combate. Esses estudos de laboratório deram lugar, depois da guerra, a uma
importante série de investigações sobre os modos de melhorar a eficácia da persuasão
de massas. Esses experimentos mudaram a imagem que se tinha do comunicador, a
natureza do conteúdo e a audiência. Ele também deu origem a um livro de receitas
para se criar um bom persuasor e como fazer com que a mensagem fique cada vez mais
persuasiva, ou seja, capaz de alterar o funcionamento psicológico do indivíduo e de
induzi-lo a realizar comportamentos e ações desejados pelo emissor da mensagem.
Fundada em princípio por uma crença no poder absoluto dos meios de comunicação,
a Mass Communication Research se esforçou mais adiante a relativizar seus efeitos
nos receptores, mas nunca colocou em dúvida a visão instrumental do esquema
de Harold Lasswell, que sintetiza toda a pesquisa em comunicação na resposta à
questão: “Quem diz o que por qual canal a quem e com qual efeito?”.

A pesquisa em comunicação geralmente se ocupa dos conteúdos e dos efeitos,


sendo que a comunicação se refere ao jornalismo, publicidade e propaganda,
relações públicas, novelas, cinema, dentre outras manifestações da comunicação.
Assim, apesar da relativização do poder dos efeitos com as pesquisas desenvolvidas
a partir dos anos 1970, os meios de comunicação ainda possuem grande poder em
transmitir mensagens que provoquem reações na audiência.

Figura 1 - Aldeia global

Fonte: Wikimedia
Mesmo com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação
– a Internet – que fez com que qualquer cidadão munido de um smartphone se
transformasse em um jornalista ou publicitário, ou seja, o cidadão passa a ter poder
de mídia. Ele pode se comunicar com milhões e até bilhões de pessoas usando um
dispositivo móvel no quintal de casa, situação que era possível anteriormente, só
através da grande mídia.

Veremos, na próxima unidade, que o esquema de Lasswell foi extremamente


útil para a pesquisa em comunicação, mas deixou de lado certos aspectos importantes,
tais como o papel da cultura e do contexto social e histórico em que os meios de
comunicação e os comunicadores estão envolvidos.

Em resumo

Nesta unidade, vimos como o campo teórico da comunicação denominado


Mass Communication Research se constituiu como um campo consolidado de pesquisas
em comunicação no século XX. As investigações dentro dessa corrente tiveram por
objetivo analisar os efeitos sociais, culturais e psicológicos das mensagens transmitidas
pelos meios de comunicação de massa, bem como compreender a reação do público
frente a essa comunicação de massa para produzir comportamentos padronizados na
população.

Vimos como, nessa corrente de produção do conhecimento, os meios são


considerados instrumentos possuidores de poder absoluto e total na finalidade
de circular mensagens de maneira 100% eficaz. Nessa perspectiva, a audiência é
considerada como um branco amorfo, isto é, algo que pode ser pintado e moldado
conforme a intenção dos que controlam os meios de comunicação.

Referências

BRETON, P.; PROULX, S. Sociologia da comunicação. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

MATTELART, A. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2004.


UNIDADE 3
A INDÚSTRIA CULTURAL
E A ESCOLA DE FRANKFURT

Objetivo(s) de aprendizagem
Ao fim dessa unidade, você será capaz de compreender a atuação da
Escola de Frankfurt e as teorias críticas da comunicação, bem como identificar
a importância dos conceitos de indústria cultural, cultura de massa, capitalismo
industrial e da racionalidade técnica.

O que vamos aprender aqui?


Nesta unidade iremos aprender noções sobre a produção científica
dos autores pertencentes à Escola de Frankfurt, dentre eles, destacamos Max
Horkheimer, Theodor Adorno, Jürgen Habermas, Erich Fromm e Herbert Marcuse.
Essa escola se desenvolveu na cidade alemã de Frankfurt, em torno do Instituto
para Pesquisa Social na Universidade Goethe de Frankfurt.

Foi uma escola de teoria e filosofia social fundada no período entre as


duas guerras mundiais e representou a fuga tanto do capitalismo quanto do
crescente avanço do comunismo. Por isso, a Escola de Frankfurt é denominada
neomarxista, por ser uma evolução das ideias do filósofo Karl Marx, mas sem se
identificar totalmente a ele por vislumbrar uma saída ao capitalismo que não fosse
comunista. Neomarxistas por aceitarem também contribuições da sociologia,
psicanálise e filosofia existencial no desenvolvimento dos seus trabalhos.

Em 1935, devido à situação política desfavorável na Alemanha, o Instituto


se estabeleceu em Nova York, onde se afiliou à Universidade de Columbia. Nessa
época, a Escola de Frankfurt ganhou fama em função da boa recepção dos seus
trabalhos quando traduzidos para a língua inglesa. Em 1953, o Instituto foi
realocado em Frankfurt.
Tópicos de estudo

A tradição funcionalista da pesquisa em comunicação, que vimos na unidade


2 com a Mass Communication Research, assumia a posição de que o avanço nas
tecnologias de comunicação de massa iriam, consequentemente, fazer com que a
democracia evoluísse.

De acordo com Mattelart (2004), os meios de comunicação, nessa perspectiva,


seriam mecanismos decisivos para a regulação da sociedade e reprodutora dos valores
do sistema social, de modo que com essas inovações técnicas a democracia sempre
sai ganhando. Essa perspectiva não é aceita integralmente pela Escola de Frankfurt,
especialmente quando esse grupo de pesquisadores já se encontrava exilado nos
Estados Unidos da América.

3.1 Produção científica dos autores pertencentes à Escola de Frankfurt

Também conhecida por teoria crítica, a Escola de Frankfurt foi a primeira


instituição alemã de orientação marxista. Os estudos iniciais têm como objeto a
economia capitalista e a história do movimento operário.

Pelo fato de serem marxistas e judeus, logo quando Adolf Hitler tomou o poder
na Alemanha, em 1933, os pesquisadores do Instituto para Pesquisa Social emigraram
para os EUA. Lá, Theodor Adorno, que também era músico, aceitou o convite de
Paul Lazarsfeld para pesquisar os efeitos culturais dos programas musicais de rádio
no Escritório de Pesquisa de Rádio da Universidade de Princeton, uma das primeiras
instituições permanentes de análise dos meios de comunicação. A colaboração entre
os dois pesquisadores terminou em 1939, já que Adorno se recusava a pesquisar usando
questionários fechados elaborados pelo patrocinador da pesquisa, que financiava as
investigações sobre os meios de comunicação para aumentar o impacto dos meios e
assim aumentar também o lucro das empresas envolvidas. Pesquisas sobre os efeitos
das mensagens transmitidas pelos meios de comunicação junto às audiências, como
vimos na unidade 2.

Para Adorno (apud MATTELART, 2004), esse tipo de pesquisa criaria obstáculos
para a análise do sistema e da sociedade como um todo, bem como deixava de lado as
consequências culturais, sociológicas e seus pressupostos sociais e econômicos. Por
essa falta de compatibilidade entre as duas tendências – funcionalista e da análise
social do sistema – é que os teóricos da Escola de Frankfurt começaram a usar o
adjetivo “crítica” para definir seu campo teórico.

De todo modo, a pesquisa de Adorno sobre os programas musicais na rádio


foram úteis para a criação posterior do conceito de indústria cultural, termo muito
importante para a compreensão dos estudos da Escola de Frankfurt.
De acordo com Mattelart (2004), Adorno criticava o tipo de música que se
torna relegada à condição de enfeite da vida cotidiana e denunciava o que chamava
de felicidade fraudulenta da arte afirmativa, ou seja, uma arte integrada ao sistema.

Mesmo o jazz, que pretendia ser um gênero musical livre, uma vez que veio do
seio da cultura popular das comunidades negras de New Orleans, Adorno demonstra
que esse estilo musical também representa o sistema, o status quo dos dominantes.
A função social primordial da cultura deveria consistir na redução da distância entre
o indivíduo alienado e a cultura afirmativa. Entretanto, a cultura favorece não o
que deveria, que é a resistência, mas, pelo contrário, promove a integração à classe
dominante.

Antes de prosseguirmos, surge a necessidade de discutirmos o que seria um


indivíduo alienado e uma cultura afirmativa.

Destaque
Procure em sites de busca o termo “caixa de Skinner”. Após
ler sobre o assunto, responda: você concorda que os meios de
comunicação podem condicionar a audiência da mesma maneira
que Skinner propôs para os comportamentos humanos?

Já uma cultura afirmativa, de acordo com Marcuse (2006), pretende fazer


com que se eleve o indivíduo a uma esfera de valores autônoma. Existe um mundo
mais valioso que é diferente do mundo de fato da luta diária pela existência, sendo
que qualquer indivíduo pode realizar para si a partir do interior.

Para Marcuse (2006, p. 95), “Somente nessa cultura as atividades e os objetos


culturais adquirem sua solenidade elevada tanto acima do cotidiano: sua recepção
se converte em ato de celebração e exaltação”. Desse modo, uma cultura afirmativa
fará com que o indivíduo deixe de ser alienado.

Refletindo...
Para o pesquisador da comunicação Theodor Adorno, as
produções culturais no âmbito popular passam a falsa sensação
de expressão livre das classes menos favorecidas, já que também
fazem parte do sistema dominante. Você concorda com esse
posicionamento do autor? Reflita sobre a posição de Adorno com
relação à produção cultural brasileira atual.
O conceito de indústria cultural foi criado por Adorno e Horkheimer nos
anos 1940. Eles expuseram esse conceito na obra Dialética do Iluminismo, na qual a
indústria cultural percebe os homens como consumidores ou empregados, adaptando
seus produtos ao consumo das massas e, em larga medida, determinando o próprio
consumo. Os autores analisaram a produção industrial dos bens culturais como um
movimento de caráter global de produção da cultura como mercadoria.

De acordo com Mattelart (2004), os produtos culturais, os filmes, os


programas radiofônicos, as revistas manifestam a mesma racionalidade técnica, ou
seja, o mesmo esquema de organização e planificação por parte da administração
comparável à fabricação de carros em série ou pelos projetos de urbanismo. Cada
setor da produção está uniformizado e todos estão em relação com os demais. A
indústria cultural cria bens padronizados para satisfazer as numerosas demandas que
os padrões da produção devem responder.

Por meio de um modo industrial de produção se obtém uma cultura de massa


feita com uma série de objetos que levam claramente a característica da indústria
cultural: serialização, padronização e divisão do trabalho.

Mattelart (2004) deixa claro que essa situação não é o resultado de uma
lei da evolução da tecnologia enquanto tal, mas da sua função na economia atual.
“Em nossos dias a racionalidade técnica é a racionalidade da própria dominação. O
terreno em que a técnica adquire seu poder sobre a sociedade é o terreno dos que a
dominam economicamente” (MATTELART, 2004, p. 78).

Figura 1 – Escola de Frankfurt (em alemão, Frankfurter Schule) refere-se a uma escola
de teoria social interdisciplinar neomarxista

Fonte: <https://ordememquestao.wordpress.com/2015/04/20/informacoes-escola-de-frankfurt/>
A racionalidade técnica é o caráter coercitivo, ou seja, repressor, de uma
sociedade alienada, sendo que a indústria cultural sintetiza a quebra da cultura,
seu rebaixamento como mercadoria. “A transformação do ato cultural em um valor
destrói sua capacidade crítica e dissolve nele os caminhos para uma experiência
autêntica. A produção industrial seria a degradação da função filosófica e existencial
da cultura” (MATTELART, 2004, p. 78).

Herbert Marcuse é um dos pesquisadores da Escola de Frankfurt que vai se


dedicar com muito aprofundamento aos conhecimentos relativos à racionalidade
técnica. Ele pretende desmascarar as novas formas da dominação política que ocorre
com o advento das novas tecnologias. Na visão de Mattelart (2004), embaixo da
aparência de racionalidade de um mundo cada vez mais conformado pela tecnologia
e pela ciência se manifesta a irracionalidade de um modelo de organização da
sociedade que, ao invés de liberar o indivíduo, o subjuga.

A racionalidade técnica, a razão instrumental, reduziram o discurso e o


pensamento a uma dimensão única que faz concordar a coisa e a sua função, a
realidade e a aparência, a essência e a existência. Essa sociedade unidimensional
anulou o espaço do pensamento crítico (MATTELART, 2004, p. 81).

Outro pesquisador da Escola de Frankfurt a se ocupar da temática é Jürgen


Habermas. Ele desenvolveu sua própria teoria da racionalidade técnica em resposta
a Marcuse. Para Habermas, a ciência e a técnica são consideradas empreendimentos
históricos que refletem a aspiração da humanidade como um todo, ao contrário da
proposta de Marcuse, que defendia que as tecnologias foram criadas pelo grupo
dominante para exercer sua dominância com mais eficiência.

Outro ponto sensível tocado por Jürgen Habermas foi a questão do público.
Para o filósofo alemão, de acordo com Mattelart (2004), o espaço público se
caracterizaria como um espaço de mediação entre o Estado e a sociedade. Ele
permite a discussão pública em um reconhecimento comum do poder da razão e da
riqueza da troca de argumentos entre indivíduos, das confrontações de ideias e das
opiniões de especialistas. O espaço público pode ser, desse modo, auxiliado pelos
meios de comunicação de massa, já que pode permitir a discussão pública e a troca
de argumentos entre os atores sociais dentro desse espaço público. A publicidade
também é parte constituinte do espaço público, já que ela se define como a atividade
que coloca em conhecimento os elementos de informação que atraem o interesse
geral, proporcionando condições para a formação da opinião pública.

Voltando à racionalidade técnica, de acordo com Mattelart (2004), Habermas


demonstra que o desenvolvimento das leis de mercado e sua intrusão na esfera da
produção cultural não favorece o raciocínio por parte do indivíduo, sendo que esse
princípio da comunicação pública se inspira em um modelo comercial de fabricação
da opinião junto ao público. Aqui Habermas vê uma refeudalização da sociedade,
uma nova forma de feudalismo operando na sociedade.
Você pode estar se perguntando: o que seria uma nova forma de feudalismo
da sociedade? O que seria feudalismo? Aqui, se buscarmos uma definição para o que
é feudalismo, poderemos compreender melhor a ideia de um novo feudalismo na
sociedade proposta por Habermas.

Por feudalismo, compreendemos o sistema econômico predominante na Idade


Média, no período entre a queda do Império Romano do Ocidente, em 476 depois de
Cristo, e a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos em 1453. Foi uma forma
de estruturar a sociedade em torno de relações sociais que se relacionavam com
a posse de terra e a troca por serviço ou trabalho. Também envolvia um conjunto
de obrigações legais e militares recíprocas entre a nobreza guerreira, os senhores
feudais, os vassalos (que possuíam os feudos, mas eram submissos aos senhores) e os
servos que trabalhavam no feudo. Nesse sistema, os servos produziam, por exemplo,
alimentos, e recebiam em troca proteção dos vassalos, bem como pequenos espaços
de terra para a plantação de bens para sua própria subsistência. Assim, um feudo era
fechado em si mesmo e produzia suas próprias condições materiais de existência.

Agora, como poderemos imaginar uma nova forma de feudalismo na sociedade


atual proposta por Habermas? Aqui, o filósofo da Escola de Frankfurt pensou que a
padronização das opiniões poderia fazer com que as pessoas se fechassem em setores
homogêneos, tais como um feudo. A audiência pode se submeter a formadores de
opiniões da mesma maneira que os servos se submetem aos vassalos, que por sua
vez, se submetem aos senhores feudais. Os servos, nesse caso, a audiência, não
precisariam raciocinar para produzir suas próprias opiniões, já que os formadores de
opinião produziriam raciocínios sobre a realidade pública para eles.

De um ponto de vista mais atual, os pesquisadores da comunicação reforçam


as posições de Habermas sobre a nova forma de feudalização da sociedade com a
formação das bolhas da Internet, que são provocadas pelas plataformas midiáticas
das redes sociais, como, por exemplo, o Facebook.

Eli Pariser criou o termo “filtro bolha” para explicar o fenômeno no qual um
usuário só recebe informações sobre as coisas que se identifica. Ao se fazer uma busca
no Google, o algoritmo, que é o sistema que organiza os resultados da busca, seleciona
quais informações um usuário gostaria de ver com base nas informações disponíveis
sobre o usuário, tais como a localização, as buscas anteriores, o comportamento
de cliques dentro dos sites, dentre outras informações. A consequência disso, para
Pariser, é que os usuários não conseguem ter acesso às informações que discordam
de seus pontos de vista, isolando os usuários em suas próprias bolhas culturais ou
ideológicas, o que nos lembra da analogia com o feudalismo usada por Habermas.
Pesquise !
Busque pelo termo “o filtro invisível de Eli Pariser” em sites
de busca. Após você juntar informações suficientes sobre o assunto,
tente identificar o problema apontado por Pariser em redes sociais
e sites de busca na Internet. Você conseguiu detectar o problema
da falta de contato com outras realidades e ideias além das suas?

De acordo com Mattelart (2004), Habermas assumiu as exposições de Adorno


e Horkheimer sobre a manipulação da opinião, a padronização, a massificação e
a individualização do público, exposições que caracterizam a Escola de Frankfurt.
Para essa linha de pesquisa, a comunicação pública se dissolve em atitudes nas quais
o cidadão se converte em um consumidor com um comportamento emocional, de
maneira estereotipada e alienante. Habermas procura encontrar uma saída a essa
recepção alienada ao lembrar do movimento estudantil californiano do final dos anos
1960, que buscou novas formas de comunicação em prol da reconquista da autonomia
dos indivíduos. Podem ser restauradas novas formas de comunicação em um espaço
público ampliado no conjunto da sociedade.

Tal posicionamento nos proporciona condições para um modo de ver a


sociedade e a comunicação de uma maneira mais otimista, na qual a dominação
pelas classes dominantes, detentoras dos meios de comunicação, não acontece de
uma forma absoluta e incisiva.

Veremos, na próxima unidade, como os meios de comunicação podem auxiliar


na emancipação do indivíduo, ao torná-lo um sujeito ativo na sociedade, especialmente
quando as novas tecnologias de informação e comunicação foram aprimoradas,
dando origem à internet. Entretanto, as pesquisas sobre manipulação da audiência
denunciada pela Escola de Frankfurt ainda são pertinentes para a compreensão do
cenário da comunicação atual, nas quais poucas famílias e organizações midiáticas
detêm o poder de grande parte dos meios de comunicação.
Em resumo

Vimos, nesta unidade, alguns conceitos básicos desenvolvidos pela Escola de


Frankfurt, tais como a indústria cultural, a racionalidade técnica e a cultura de
massa, bem como as consequências desses conceitos nos estudos da comunicação,
tanto os do passado quanto os estudos que estão sendo desenvolvidos atualmente.
Por proporem um rompimento com a perspectiva funcionalista da comunicação,
presente nos estudos da Mass Communication Research, as pesquisas desenvolvidas
pela Escola de Frankfurt também são conhecidas por “teoria crítica”.

Estudamos que a teoria é crítica por denunciar que os estudos funcionalistas


deixam de lado a análise do sistema e da sociedade como um todo, bem como não
dão importância as consequências culturais, sociológicas e seus pressupostos sociais
e econômicos, que os teóricos de Frankfurt levam em conta.

Referências

MARCUSE, H. Sobre o caráter afirmativo da cultura. In: Cultura e Sociedade, v. 1.


São Paulo: Paz e Terra, 2006.

MATTELART, A. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2004.


UNIDADE 4
OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO
E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA REALIDADE

Objetivo(s) de aprendizagem
Ao fim dessa unidade, você será capaz de compreender as pesquisas
dos efeitos da comunicação a longo prazo, os estudos culturais e a escola de
Birmingham, a hipótese do agenda-setting e a função do gatekeeper. Irá entender
as pesquisas atuais em comunicação que envolvem a sociedade em rede, a
comunicação na Internet e perspectivas futuras das teorias da comunicação.

O que vamos aprender aqui?


Nesta unidade, iremos estudar as teorias da comunicação que se
preocuparam em dar uma atenção maior aos aspectos culturais e sociais da
comunicação, buscando compreender os efeitos da comunicação a longo
prazo. Efeitos que não são tão perceptíveis quanto a avaliação dos impactos da
comunicação pesquisadas pelo Mass Communication Research. Muitas vezes, a
audiência reage de uma maneira diferente que a prevista pelos comunicadores,
já que a audiência não está exposta somente as mensagens veiculadas pelos
meios de comunicação.

A audiência também é influenciada pela cultura e pela história de cada


indivíduo e de seu grupo social. Assim, os estudos culturais desenvolvidos pela
Escola de Birmingham, liderados pelos sociólogos Richard Hoggart e Stuart
Hall, tiveram por objetivo analisar a cultura através da dinâmica política, suas
fundações históricas, traços definidores e conflitos. Os pesquisadores dos estudos
culturais geralmente investigam como as práticas culturais se relacionam com a
sociedade como um todo, inclusive as instâncias de poder político, que incluem
a ideologia, a estrutura das classes, as formações nacionais, etnicidade, gêneros
e orientação sexual.

Como parte dos estudos culturais, a hipótese do agendamento faz com


que toda a mídia, bem como o jornalismo, estabeleça como as pessoas se
comunicam no cotidiano. Isso pode ser relacionado também com a teoria da
espiral do silêncio, como veremos ao longo da unidade.
Tópicos de estudo

4.1 Estudos culturais

A vertente de pesquisa em comunicação e sociedade denominada Cultural


Studies, ou Estudos Culturais, teve início com a fundação, em 1964, do Centro para
Estudos Culturais Contemporâneos da Universidade de Birmingham, no Reino Unido.
As pesquisas desenvolvidas pelo centro se caracterizaram pela ruptura com os estudos
anteriores baseados na Mass Communication Research e Escola de Frankfurt.

A obra de Raymond Williams, The long revolution, foi uma obra de ruptura com
as teorias da comunicação vigentes. Para Mattelart (2004), ela rompeu com a tradição
literária que situava a cultura fora da sociedade, ao propor que a literatura e a arte
são parte da comunicação social, já que postulou que a cultura é um processo global
através da qual os significados se constroem socialmente e historicamente. Williams
rompeu também com um marxismo redutor ao imaginar um marxismo complexo que
permite estudar a relação entre a cultura e as demais práticas sociais, ao invés de
colocar a cultura como submetida ao domínio da determinação social e econômica
como sugeria as formas mais tradicionais de marxismo.

De acordo com Mattelart (2004), desde seus primeiros trabalhos sobre os


meios de comunicação, Williams criticava o determinismo tecnológico. Em cada
uma das suas intervenções nesse campo, ele estudava as formas históricas que cada
instituição midiática – a televisão, a imprensa e a publicidade – adotava com relação
a cada realidade.

Outro pesquisador interessado nos estudos culturais é E. P. Thompson.


Conforme Mattelart (2004), para Thompson, o trabalho dos historiadores demonstra
que a cultura deve ser vista em sua pluralidade, já que a história é feita de lutas,
tensões e conflitos entre as culturas e modos de vida, conflitos estes que são
intimamente ligados às culturas e às formações das classes sociais. Desse modo,
todos esses conflitos influenciam as formas nas quais as pessoas se comunicam e
interagem com os meios de comunicação de massa, que faz com que a mensagem
possa ser interpretada de diferentes modos.

Mattelart (2004) explica que os estudos culturais realizados pelos pesquisadores


de Birmingham foram influenciados por diversas outras linhas de pensamento, tais
como o interacionismo social da Escola de Chicago, que faz com que os pesquisadores
britânicos recuperem a preocupação em trabalhar em uma dimensão etnográfica
e analisar os valores e as significações vividas, as formas nas quais as culturas dos
distintos grupos se comportam frente à cultura dominante, as definições próprias
que se dão aos atores sociais na sua situação e das condições em que vivem.

Dentro da sociologia, o interacionismo é uma perspectiva teórica que explica os


processos sociais, tais como os conflitos, atos de cooperação, formação de identidade,
dentre outras formas de interação humana. Essa teoria busca compreender como os
indivíduos moldam a sociedade e são moldados pela sociedade através de toda a
gama de significados que surgem a partir dessas interações.

Outra influência importante para a Escola de Birmingham é o filósofo francês


Roland Barthes, que faz com que os pesquisadores britânicos se interessem pela
especificidade do que é considerado cultural e adotem uma metodologia apoiada
na linguística para abordar a questão mestra naquela época que eram as leituras
ideológicas. A análise das revistas femininas, dos programas de ficção, da informação
em televisão, os discursos da imprensa, constituem o centro das investigações em
Birmingham.

Figura 1 – Roland Barthes foi um escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo

Fonte: Wikimedia

Destaque
Roland Barthes (1915-1980) foi um sociólogo e filósofo
francês que muito contribuiu por meio de estudos semióticos e
estruturalistas. Realizou análises semióticas das propagandas e
revistas, focado nas mensagens e no sistema de signos linguísticos
envolvidos.
Antonio Gramsci, filósofo marxista italiano, também influenciou as pesquisas
da Escola de Birmingham com a noção de hegemonia. Mattelart (2004) demonstra
que os pesquisadores britânicos tomaram emprestada a noção de hegemonia, já que
ela é a capacidade de um grupo social em exercer uma direção intelectual e moral
sobre a sociedade, sua capacidade de construir em torno de seu projeto um novo
sistema de alianças sociais. A noção de hegemonia mobiliza a classe dominantes,
cujo poder residiria por completo na sua capacidade para controlar as fontes do
poder econômico. Na análise do poder se introduz a necessidade de considerar as
negociações, os compromissos e as mediações. A noção gramsciana testemunhava
de forma precoce a rejeição a assimilar mecanicamente as questões culturais e
ideológicas às da classe e da base econômica e voltava a colocar em um primeiro
plano a questão da sociedade civil como distinta do Estado.

Figura 2 – Gramsci, filósofo italiano marxista

Fonte: Wikimedia

Do ponto de vista dos meios de comunicação, as classes dominantes procuram


exercer a sua hegemonia controlando os meios de comunicação, além de controlar as
fontes de poder econômico. Tendo controlado os meios de comunicação, as classes
dominantes exercem a sua hegemonia ao transmitir mensagens que fortaleçam a sua
capacidade hegemônica.

O sociólogo Stuart Hall foi um dos teóricos mais conhecidos da Escola de


Birmingham. Com relação à comunicação, ele questionou a divisão entre produtores
e consumidores realizada pelos pesquisadores da Escola de Frankfurt. Hall propôs
a ideia de que os produtos dos meios de comunicação de massa passam por um
processo denominado “codificação e decodificação”.

Esse modelo de comunicação foi criado por Stuart Hall em 1973, na qual
ele buscou uma teoria para explicar como as mensagens da mídia são produzidas,
disseminadas e interpretadas. Seu modelo de codificação e decodificação postula
que a TV, bem como outros meios de comunicação de massa, transmitem mensagens
que são decodificadas, ou interpretadas, em diferentes modos que dependem
das experiências pessoais, nível socioeconômico e pelo contexto cultural de um
indivíduo. Esse pensamento é contrário às outras teorias da comunicação que tiram
o poder das audiências. Hall demonstrou assim que os membros da audiência podem
possuir um papel ativo na decodificação das mensagens que se referem aos seus
contextos sociais. Eles podem até serem capazes de trocar e alterar, eles próprios,
as mensagens através da ação coletiva. O processo de codificar e decodificar é a
tradução de uma mensagem que possa ser facilmente compreendida.

Saiba que quando se decodifica uma mensagem se está extraindo o significado


da mensagem em termos do que se está apto para compreender. Assim, o ato de
decodificar se constitui na compreensão do que alguém já conhece sobre a mensagem,
baseado na informação dada ao longo da mensagem que está sendo recebida. Se há
uma larga audiência, ou se envolve apenas um indivíduo, decodificar é o processo de
obter, absorver, compreender e, às vezes, usar a informação que foi dada através de
uma mensagem verbal ou não-verbal. Para Hall (1980, p. 133):

O nível de conotação de um sinal visual, de seu contexto de referência e posição nos


diferentes campos discursivos de significado e associação, é o ponto onde já estão
codificados sinais que interceptam com o profundo código semântico de uma cultura
e toma uma dimensão ativa ideológica adicional.

Stuart Hall desenvolveu diversas pesquisas sobre a televisão. De acordo com


Mattelart (2004), Hall enfocou o processo de comunicação televisiva em quatro
momentos: produção, circulação, distribuição/consumo e reprodução. Esses quatro
momentos têm suas próprias modalidades e suas próprias formas e condições de
existência. Entretanto, eles estão articulados entre eles e determinados por relações
institucionais de poder. A audiência é ao mesmo tempo o receptor e a fonte da
mensagem, porque os esquemas de produção, que é o momento da decodificação,
respondem às imagens que a instituição televisiva faz da audiência e aos códigos
profissionais.

Ainda segundo Mattelart (2004), do lado da audiência, a análise de Hall


define três tipos de decodificação: dominante, de oposição e negociada. O primeiro
corresponde aos pontos de vista hegemônicos que aparecem como naturais,
legítimos e inevitáveis. Refere-se a um sentido comum de uma ordem social e de
um universo profissional. O segundo interpreta a mensagem a partir de outro marco
de referência, de uma visão de mundo contrária, como, por exemplo, traduzindo o
interesse nacional como interesse de classe. O código negociado é uma mescla dos
elementos de oposição e de adaptação, uma mescla de lógicas contraditórias que
subscreve em parte as significações e os valores dominantes, mas toma argumentos
de uma situação vivida, como, por exemplo, os interesses grupais, para refutar as
definições geralmente compartilhadas.

Outro trabalho interessante dentro da linha de pesquisa em estudos culturais


está na obra Everyday Television Nationwide, publicada em 1978 por Charlotte
Brunsdon e David Morley. De acordo com Mattelart (2004), o ponto de partida é uma
reflexão sobre os grandes gêneros populares que compreendem a comédia, esportes,
variedades, celebridades, séries policiais e séries humorísticas (as chamadas
sitcoms, como, por exemplo, Os Simpsons). Esses gêneros expõem a vontade de
explorar a forma em que esses programas de entretenimento das massas tratam
as contradições da vida e da experiência de homens e mulheres de estratos sociais
amplos e participam da construção de um sentido popular comum. Brunsdon e Morley
estudaram as representações de gênero, de classe social e dos grupos étnicos nesses
programas.

Pesquise !
Liste três sitcoms que você conhece. Para cada uma,
demonstre como elas expressam as contradições da vida cotidiana
e a sua relação com a experiência contemporânea, ou seja, como
essas sitcoms retratam a realidade.

Todos esses gêneros culturais, bem como as notícias veiculadas pelo jornalismo
e pelas peças publicitárias têm o poder de agendar a pauta pública, ou seja, os meios
de comunicação fazem com que o público se dedique a determinados temas nas
conversas cotidianas e no pensamento.

Nessa perspectiva, o efeito dos meios de comunicação ocorrem a longo


prazo e não de maneira automática, a curto prazo, como imaginavam os teóricos da
comunicação filiados ao esquema de Lasswell, do Mass Communication Research e os
pesquisadores de viés behaviorista baseados na teoria do estímulo-resposta. Aqui, os
efeitos são sentidos em um período de tempo mais largo.

A hipótese do agendamento, ou agenda-setting, é uma das linhas de


pensamento dentro da teoria da comunicação que procura imaginar os efeitos da
comunicação a longo prazo. Essa hipótese não afirma que os meios de comunicação
moldam como as pessoas pensam, mas que os meios são poderosos em listar os
temas do que as pessoas pensam. Ela foi formulada principalmente pelos teóricos da
comunicação Max McCombs e Donald Shaw em 1972.

Para Hohlfeldt (1997, p. 44):

os meios de comunicação, embora não sejam capazes de impor o que pensar em


relação a um determinado tema, como desejava a teoria hipodérmica, são capazes
de, a médio e longo prazo, influenciar sobre o que pensar e falar, o que motiva
o batismo desta hipótese de trabalho (agendamento). Ou seja, dependendo dos
assuntos que venham a ser abordados – agendados – pela mídia, o público termina,
a médio e longo prazos, por incluí-los igualmente em suas preocupações. Assim, a
agenda da mídia termina por se constituir também na agenda individual e mesmo na
agenda social.

4.1.1 Espiral do silêncio

Outra teoria que é similar a do agendamento é a espiral do silêncio. Ela foi


proposta por Elisabeth Noelle-Neumann e considera que os meios de comunicação
têm um efeito decisivo na concepção que as pessoas fazem da realidade.

De acordo com Correia (2011), a teoria da espiral do silêncio parte do princípio


de que as pessoas receiam em ficar isoladas e buscam se integrar socialmente ao
prestar atenção ao seu entorno e aos comportamentos majoritários. Os indivíduos
que desejam popularidade e que têm por objetivo não se isolarem seriam cautelosos
com relação às opiniões e atitudes que configuram mudança. Assim, se a opinião
de mudança faz sentido e se os que compartilham essa opinião sentem que há
receptividade pública para a expressão dessas opiniões, elas não hesitariam em
expô-las. Entretanto, “se as mudanças estivessem a decorrer em sentido contrário
ou se as pessoas sentissem que não haveria receptividade pública para a exposição
das suas opiniões, tenderiam a silenciar-se” (CORREIA, 2011, p. 191).

De acordo com Noelle-Neumann:

O resultado é um processo em espiral que incita os indivíduos a perceber as


mudanças de opinião e a segui-las até que uma opinião se estabelece como a atitude
prevalecente, enquanto que as outras opiniões são rejeitadas ou evitadas por todos,
à exceção dos duros de espírito, que persistem na sua opinião. Propus o termo espiral
do silêncio para descrever este mecanismo psicológico. (NOELLE-NEUMANN apud
SOUSA, 2002, p. 171).

Esse termo tem consequências sérias se pensarmos os meios de comunicação,


já que os meios tenderiam a silenciar as opiniões que julgam minoritárias pela ausência
de referência. Os meios dariam mais espaço às opiniões dominantes, reforçando as
opções que são ou parecem dominantes. “Assim, a opinião pública no seu sentido de
espaço de controvérsia seria claramente objeto de uma distorção” (CORREIA, 2011,
p. 191).

Refletindo...
Você concorda que os meios de comunicação fazem com
que as opiniões que não são predominantes sejam silenciadas?
Você se lembra de algum evento que foi ocultado ou dado menor
importância por não representar a opinião da maioria das pessoas?
Justifique.

4.2 Sobre as pesquisas na área de comunicação

Após estudarmos algumas teorias da comunicação desenvolvidas na história,


vamos agora ter uma ideia de como a pesquisa em comunicação está sendo
desenvolvida atualmente. O campo da pesquisa em comunicação se constitui em um
campo consolidado no Brasil. São 44 programas de pós-graduação em comunicação
que produzem pesquisas dentro da área de comunicação, tais como jornalismo,
informação, rádio e TV, editoração, publicidade e propaganda, relações públicas,
dentre outros assuntos que se relacionam com a comunicação.

Nas pesquisas desenvolvidas atualmente, concede-se mais atenção a temas


menos abrangentes, que se contrapõem aos estudos de grandes tendências sociais
e globais. Assim, surgem pesquisas sobre determinada peça publicitária e eventos
noticiosos. É possível encontrar teses de doutorado que se detêm em um único
evento social que foi noticiado, como algum crime ou um acidente, o que nos lembra
do enfoque das pequenas narrativas e a micro-história, como propostas por Carlo
Ginzburg (1987).

Um tema bastante pesquisado atualmente está no impacto das novas


tecnologias de informação e comunicação, como, por exemplo, a internet e a
cibercultura, em todo o processo comunicativo. Para Pierre Lévy (1999, p. 17):

A cibercultura é um termo que especifica não apenas a infraestrutura material da


comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga,
assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo.
Figura 3 - Cibercultura: nuvem de tags

Fonte: Wikimedia

Com tantas informações disponíveis, cresce a responsabilidade de todos os


profissionais que lidam com a comunicação, tais como os jornalistas, publicitários
e assessores em tratar a informação para que somente as de qualidade chegue a
audiência, uma função que lembra um curador de informações. O termo pode ser
remetido também às teorias sobre o gatekeeper, ou mantenedor do portão. Este é
um bom exemplo de como teorias elaboradas no passado ainda podem ser úteis para
se compreender o presente, já que o termo gatekeeper foi cunhado por Kurt Lewin,
citado na unidade 2, quando ele imaginava zonas que funcionariam como filtros,
bloqueios, na qual dá consistência a um canal de mensagens.

Em termos mais simples, o gatekeeper é aquele jornalista, normalmente


editor-chefe, que decide quais acontecimentos são merecedores de receber um
tratamento jornalístico. Ele seleciona quais acontecimentos merecem ir para o
jornal.

Desse modo, o advento e popularização da internet fez com mudassem


os processos editoriais e de linguagem para aproveitar as novas possibilidades de
estruturação narrativa através do hipertexto, da multimídia e da interatividade,
como nos conta Corrêa (2005). Para a autora, qualquer forma narrativa para o meio
digital deve obrigatoriamente:
estar inserida no contexto retórico da policronia e da multidirecionalidade, sem que
isto comprometa a compreensão e a interpretação do sentido das mensagens por
parte dos receptores, seja qual for a sua coordenada temporal e espacial. Além disso,
deve incorporar as características-chave da comunicação nos meios digitais, a saber:
a hipertextualidade – a capacidade de interconectar diversos textos digitais entre si;
a multimedialidade – a capacidade, outorgada pelo suporte digital, de combinar na
mesma mensagem pelo menos um dos seguintes elementos: texto, imagem e som; e a
interatividade – a possibilidade do usuário interagir com a informação disponibilizada
no meio digital (CORRÊA, 2005, p. 106).

Por contexto retórico diferenciado, Corrêa (2005) afirma que o ciberespaço ou


redes digitais de informação transformam completamente os fatores referenciais de
tempo e espaço, que é o que caracteriza o policronismo: múltiplas relações temporais
que ocorrem entre a emissão e a recepção no ciberespaço. Essa policronia faz com que
uma mensagem emitida pelo emissor possa ser recebida em coordenadas temporais
completamente diferentes e por receptores distintos. Já a multidirecionalidade é o
compartilhamento de muitos para muitos, fazendo com que apenas no ciberespaço
possam ocorrer trocas personalizadas e interativas.

Com a progressiva influência das novas tecnologias de informação e


comunicação, a Internet, as redes de computadores, os dispositivos móveis, as redes
sociais, dentre outras tecnologias, o trabalho dos pesquisadores em comunicação se
constitui em um grande desafio. Anos de trabalho tentando compreender determinado
fenômeno da comunicação pode se tornar obsoleto em apenas um dia de lançamento
de determinada tecnologia. Entretanto, todo o conhecimento que foi acumulado
dentro do campo teórico da comunicação pode nos ajudar a compreender o estado
atual da comunicação, mesmo se esse conhecimento se torne ultrapassado. Essa
compreensão é proveniente do incremento do espírito crítico que o contato com a
história da produção desse conhecimento nos proporciona.

Finalizamos destacando que esperamos que, com essa disciplina, você tenha
despertado a atenção para conhecimentos que lhe ajudem a entender o ambiente
comunicativo que nos envolve e que tais conhecimentos o auxiliem na continuidade
do curso de graduação.
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Em resumo

Nesta unidade, vimos os estudos da comunicação que pensaram os efeitos


dos meios de comunicação em um período de tempo amplo. Efeitos não são tão
perceptíveis quanto as pesquisas anteriores, pois a audiência não está exposta
somente às mensagens veiculadas pelos meios de comunicação, sendo que o público
também é influenciado pela cultura e pela história de cada indivíduo e de seu grupo
social.

Vimos também como a pesquisa em comunicação está se delineando


atualmente. O advento das novas tecnologias de informação e comunicação estão
transformando todo o cenário comunicativo, aumentando a capacidade de interação
do público com os meios, e com uma quantidade de informação produzida que cresce
a cada dia, o que aumenta a responsabilidade dos profissionais que lidam com a
comunicação, já que cabe a estes filtrar as informações para que os temas relevantes
cheguem ao público.

Referências

CORRÊA, E. S. Comunicação digital: uma questão de estratégia e de relacionamento


com públicos. Organicom, São Paulo, n. 3, 2005.

CORREIA, J. C. O admirável mundo das notícias: teorias e métodos. Covilhã: UBI,


LabCom, Livros LabCom, 2011.

GINZBURG, C. O queijo e os vermes: o cotidiano e as ideias de um moleiro perseguido


pela inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

HALL, S. e colaboradores. Culture, media, language: working papers in cultural


studies. Londres: Hutchinson, 1980.

HOHLFELDT, A. Os estudos sobre a hipótese de agendamento. Revista FAMECOS,


Porto Alegre, n. 7, 1997.

LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

MATTELART, A. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2004.

SOUSA, J. P. Teoria da notícia e do jornalismo. Chapecó: Argos e Letras


Contemporâneas, 2002.

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