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19802021 27
artigo article
das cidades
Abstract This article reflects on the limits and Resumo O presente artigo reflete sobre os limites
possibilities for articulating the anti-asylum stru- e possibilidades de articulação entre a Luta An-
ggle with participatory city master plans (PMPs) timanicomial e os Planos Diretores Participativos
in Brazil with the aim of helping enhance anti das cidades (PDPs) no Brasil, com vistas ao cuida-
-asylum care in liberty and guaranteeing the ri- do antimanicomial em liberdade para as pessoas
ghts of people experiencing mental suffering. De- em sofrimento mental, bem como à garantia de
parting from the premise that the city is neither a realização e à ampliação dos seus direitos. Ao par-
therapeutic nor a caring environment, this analy- tir da premissa de que a cidade não é por si tera-
sis seeks to weave together the challenges of “living pêutica nem tampouco cuidadora, desenvolvemos
in liberty” with urban planning policies guided by uma analítica que busca entrecruzar os desafios
PMPs. To this end, we analyzed terms pertaining do “morar em liberdade” com as políticas de de-
to the anti-asylum struggle and Brazil’s mental senvolvimento urbano nos municípios brasileiros
health reform in the PMPs of the 15 highest-sco- – estas, orientadas pelos PDPs. Assim, analisamos
ring cities in the Connected Smart Cities Ranking. citações concernentes ao temário da Luta Antima-
The findings show that it is important for the anti nicomial e Reforma Psiquiátrica Brasileira (RPB)
-asylum struggle to dispute municipal urban poli- nos PDPs dos 15 municípios mais bem avaliados
cies in wider legislative arenas in order to promote no ranking de qualidade urbana nacional, de
further advances in deinstitutionalization and a acordo com a Plataforma Connected Smart Cities.
transformation of the social place of madness, and Com base nessa pesquisa, pudemos refletir sobre a
guarantee the rights of people experiencing men- importância de a Luta Antimanicomial disputar
tal suffering in cities. as políticas urbanas municipais para articular,
Key words Citizenship, Deinstitutionalization, em arenas ainda mais ampliadas na via legislati-
Social participation, City planning, Mental he- va, avanços nos termos da desinstitucionalização,
alth transformação do lugar social da loucura e reali-
1
Programa de Pós-
Graduação em Geografia, zação dos direitos de cidadania para pessoas em
Universidade Federal situação de sofrimento mental nas cidades.
Fluminense. Rua Gal. Palavras-chave Cidadania, Desinstitucionaliza-
Milton Tavares s/n Instituto
de Geociências, Campus ção, Participação social, Planejamento das cida-
Praia Vermelha Boa Viagem. des, Saúde mental
24210-346 Niterói RJ Brasil.
lucasthonorato@
yahoo.com.br
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Honorato GLT
na, o processo de construção dos PDPs deve bus- Planejamento e gestão em Saúde: saúde públi-
car a configuração de uma arena social ampliada ca; planos setoriais de saúde; padrões da Orga-
de disputa, como lugar privilegiado da participa- nização Mundial de Saúde; pesquisa em saúde;
ção social, instaurando uma contenda entre dife- informação em saúde; secretaria de saúde; Siste-
rentes projetos de cidade (e de viver a, na e com a ma Único de Saúde (SUS); modelos de atenção à
cidade) em pauta naquela realidade local. saúde; vigilância em saúde; vigilância epidemio-
É justamente considerando a obrigatoriedade lógica; rede de atenção à saúde; Política Nacional
da ampla participação social na construção dos de Saúde; novas tecnologias em saúde; gestão da
PDPs (mesmo que, neste artigo, a eficiência da rede municipal de saúde; gestão interfederativa do
participação não esteja sendo precisada), nos di- SUS; Política Municipal de Saúde; gestão partici-
rigimos rumo a uma investigação sobre as for- pativa; unidades de saúde primárias e secundárias;
mas com que a temática da Saúde Mental, sob a rede de saúde integrada e hierarquizada; Progra-
ótica da Luta Antimanicomial e RPB, se consoli- ma Saúde da Família;
dou no texto da Lei desse central instrumento das Efeitos em saúde das atividades e do habitar a
políticas do urbano. cidade: saúde dos habitantes vizinhos; risco poten-
Para a triagem, análise e comparação dos cial para a vida e saúde; saúde (em relação a sanea-
PDPs de diferentes cidades do país nos referen- mento e poluição); agravos à saúde da população;
ciamos no ranking de qualidade urbana, elabora- Rede de serviços e equipamentos: agentes de
do anualmente pela plataforma Connected Smart saúde; resíduos de saúde; saúde do trabalhador;
Cities – que se baseia nos seguintes indicadores: centros de saúde; hospitais gerais; hospitais espe-
Economia, Educação, Empreendedorismo, Go- cializados; postos de saúde; ambulatórios; saúde
vernança, Meio Ambiente, Mobilidade, Acessibi- bucal.
lidade, Saúde, Segurança, Tecnologia e Inovação Desse inventário, destacamos dois detalhes
e Urbanismo. O Ranking CMC 2016 propõe um interessantes em PDPs específicos. O primeiro de-
mapeamento das cidades com maior potencial de les, em relação ao PDP da cidade de Niterói-RJ18,
crescimento e desenvolvimento urbanos no país. datado de 2019, que foi o documento que mais
Embora se trate de uma avaliação com interes- mencionou a palavra “saúde” (61 menções) dentre
ses corporativos, seu método articula o ranque- todos os analisados. Embora a maioria dos termos
amento de diferentes indicadores com vistas ao já alinhavados acima sejam também recorrentes
desenvolvimento, à qualidade de vida e à susten- nesse outros merecem destaque: atenção integral
tabilidade das cidades, traçando um panorama à saúde da mulher, da criança e do adolescente;
comparativo relevante da situação urbana delas saúde e qualidade de vida da população idosa,
– pondera-se no ranqueamento as diferenças em das pessoas com deficiências e doenças crônicas;
relação ao tamanho das cidades e a situação re- planejamento de ações em saúde; três níveis de
gional delas. atenção à saúde; perfil epidemiológico; saúde da
Das cem cidades ranqueadas, nos ativemos família; unidades de saúde especializadas e labo-
em buscar os PDPs das 15 mais bem colocadas, ratoriais; e, informações em saúde e pesquisa em
filtrando buscas nas leituras dos documentos a saúde.
partir de palavras-chave. Iniciando uma busca Segundo, apesar da quantidade expressiva de
preliminar com base no termo “saúde”, encontra- referências no PDP citado anteriormente, é no
mos um cenário de ampla variedade nas formas PDP de Curitiba-PR19, que se trata do único PDP
de menção, com diferentes tipos de empregos, dentre os analisados que faz referência direta aos
sentidos e correlações com assuntos diversos. termos “saúde coletiva” e “determinantes da saú-
Eles foram classificados de acordo com os se- de”. O mesmo acontece com o termo “saúde co-
guintes temas: munitária”, que consta apenas no PDP da cidade
Direitos constitucionais: saúde (em termos de Porto Alegre-RS20 – embora este não faça qual-
legais); proteção à saúde; saúde humana; saúde quer menção à Saúde Mental.
ambiental; recuperação da saúde individual e co- Do ponto de vista das menções mais rigorosa-
letiva; necessidades de saúde; promoção da saú- mente vinculadas aos mecanismos de gestão, pla-
de; prevenção da saúde; saúde e cidadania; aten- nejamento e organização das redes em Saúde, é o
ção integral em saúde; boas condições de saúde PDP da cidade do Rio de Janeiro-RJ21 que merece
e segurança; saúde e bem-estar; atenção à saúde; maior destaque, por ser o único a evidenciar o ter-
saúde da mulher, das crianças e adolescentes, dos mo “plano metropolitano de saúde”.
idosos, de pessoas com deficiências e doenças Outros importantes detalhes também devem
crônicas; ser observados, como o caso do PDP de Barue-
31
Quadro 1. Sistematização de menções a termos ligados ao temário da Saúde Mental e Luta Antimanicomial nos Planos Diretores
Participativos (PDPs) das 15 cidades mais bem pontuadas no Ranking CMC 20.
Porte
Plano Termo
Ranking Nota da Promulgação Menções Texto
Diretor empregado
cidade
1 37,901 + 500k São Paulo 01 de Agosto 1 (31) Centro de Aten- CAPÍTULO VIII, Seção I, Parágrafo
(SP) de 2014 ção Psicossocial Único - Os Equipamentos Urbanos e
(CAPS) Sociais estão
relacionados no Quadro 10 anexo a
esta lei
2 37,224 + 500k Florianó- 14 de Janeiro 0 - -
polis (SC) de 2014
3 36,545 + 500k Curitiba 17 de Dezem- 1 Uso de substân- Seção VI, Art. 116, X - desenvolver
(PR) bro de 2015 cias entorpecen- ações de prevenção ao uso de substân-
tes e álcool cias entorpecentes e álcool, criando
métodos e
formas de atendimento especializado,
objetivando tratamento eficaz, huma-
nizado e no âmbito do
Sistema Único de Saúde - SUS
4 36,303 + 500k Campinas 27 de Dezem- 0 - -
(SP) bro de 2006
5 36,251 100 a Vitória 13 de Outubro 1 Sanatório Capitulo II, Seção I, Art. 152: No cál-
500k (ES) de 2016 culo do coeficiente de aproveitamento,
com exceção das edificações
destinadas ao uso residencial unifa-
miliar, não serão computados: IV -
áreas de varandas, contíguas a salas ou
quartos, que não ultrapassem: b) 20%
(vinte por cento) da área destinada ao
respectivo cômodo em unidades de
hospedagem de hotéis, motéis, apar-
t-hotéis, pensões, hospitais, casas de
saúde e de
repouso, sanatórios e maternidades
Porte
Plano Termo
Ranking Nota da Promulgação Menções Texto
Diretor empregado
cidade
9 34,869 + 500k Porto 1 de Dezem- 0 - -
Alegre bro 1999, com
(RS) complemen-
tares até 22 de
Julho de 2010
10 34,608 + 500k Belo 8 de Agosto de 0 - -
Horizonte 2019
(MG)
11 34,411 + 500k Niterói 3 de Julho de 2 Atenção à Saúde Capitulo IV, Art. 253: As diretrizes que
(RJ) 2019 Mental; Centros integram as políticas de Desenvolvi-
de Convivência mento Social incluem a Educação, a
Saúde, a Assistência Social, Esporte e
Lazer são: VII - ampliar e promover
ações intersetoriais voltadas ao forta-
lecimento da atenção à saúde mental,
com ênfase no enfrentamento da
dependência de crack e outras drogas,
no conjunto de unidades hospitalares
da cidade; E, Art. 267. São objetivos
do Sistema Municipal de Proteção do
Patrimônio Cultural: VII - estimular
a revitalização de prédios históricos
localizados nas ZEPAC-APAU para
atividades voltadas ao idoso, tais como
clínicas médicas, centros de convivên-
cia e equipamentos de saúde em geral
12 34,297 + 500k Rio de 1 de Fevereiro 1 Recuperação SEÇÃO III - DA ASSISTÊNCIA SO-
Janeiro 2011 Psicossocial CIAL, SUBSEÇÃO II, Art. 267. A Polí-
(RJ) tica de Assistência Social se fará através
de programas definidos pelo Conselho
Municipal de Assistência Social, que
compreenderão a criação, recuperação
e manutenção de Centros de Atendi-
mento aos necessitados; o incentivo à
construção e manutenção de hospeda-
gem, com programas de recuperação
psicossocial, voltados especialmente
para a população de rua; a garantia
de ampla acessibilidade aos locais de
atendimento; e a divulgação ampla dos
programas de assistência social
13 34,214 100 a Barueri 10 de Dezem- 0 - -
500k (SP) bro de 2004
14 34,002 + 500k Campo 4 de Dezem- 0 - -
Grande bro de 2018,
(MS) com comple-
mentar em
3 de Abril de
2019
15 33,557 + 500k Recife (PE) 14 de Dezem- 0 - -
bro de 2018
Fonte: Autor, 2020, a partir do Ranking CMC 20; Planos Diretores municipais.
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Honorato GLT
Gostaríamos de destacar a menção “Atenção Reitera-se: Qual o lugar dos loucos na cidade?
à Saúde Mental” no PDP de Niterói-RJ. Em um Por mais que pareçam perguntas “novas”, elas
primeiro momento, ela parece “afeita” aos prin- já apareceram no cenário nacional em contex-
cípios da Luta Antimanicomial e RPB, porém, tos pontuais da luta política em municípios es-
nota-se que, apesar de ter sido um PDP promul- pecíficos, como nas manifestações ocorridas em
gado em 2019 (que teoricamente deveria estar Brasília em agosto de 2011. À época, conforme a
adequado à Lei da Reforma Psiquiátrica e demais reportagem do Correio Braziliense, Márcia Guiot
normativas subsequentes, o que inclui a Portaria Henning, presidente da Anankê, afirmou:
GM/MS nº 3.088/20112), a adoção do termo cita- A Reforma Psiquiátrica previu espaços nos cen-
do coloca-se em detrimento do termo “Atenção tros urbanos para inserção social das pessoas com
Psicossocial”, tal como foi cunhado pela Portaria sofrimento psíquico, acabando com instituições de
que institui as RAPS no Brasil. Contudo, no que caráter asilar. Mas quando Plano Diretor foi cria-
diz respeito à linguagem, o mais importante des- do, essa transformação ainda não tinha acontecido.
taque versa sobre o cuidado aos “dependentes de É preciso que isso seja revisto. [...] Não queremos
crack e outras drogas”, contrastando com o texto essas pessoas marginalizadas mais uma vez. Não
da Portaria supracitada, que qualifica a temáti- somos hospitais, não produzimos lixo hospitalar,
ca em termos de sofrimento ou transtorno mental temos atividades psicoterapêuticas, como dança,
e com necessidades decorrentes do uso2. Porém, a artes plásticas. Nossa função é diferenciada26.
informação mais relevante talvez seja o fato de o Mas, de fato, quais seriam os limites e possibi-
texto definir uma diretriz específica para a Saúde lidades da Luta Antimanicomial nos PDPs?
Mental que, embora ressalve-se o direcionamen-
to intersetorial, orienta as ações para as unidades Limites e possibilidades
hospitalares (que entre as quais figura o Hospital para a sáude mental
Psiquiátrico de Jurujuba – HPJ). Isto diverge do
princípio estruturante da RPB, que prioriza os Iniciar essa discussão nos obriga a não perder
recursos extra-hospitalares. de vista que os PDPs não apenas definem parâ-
No caso da menção “Recuperação psicosso- metros urbanísticos, como também versam sobre
cial”, no PDP do Rio de Janeiro-RJ, não é irrele- zoneamentos estratégicos, definição de planos e
vante o fato de a única citação estar enquadrada metas e, principalmente, sobre diretrizes e prin-
entre as diretrizes para Assistência Social, com ên- cípios a serem observados pelos Planos Munici-
fase para as populações em situação de rua, fora pais, que orientam uma ampla gama de outros
do escopo das diretrizes e princípios da Saúde. setores que envolvem o funcionamento das cida-
Também cabe explicitar a presença do termo des – como a Saúde. Embora caiba destaque que
“Sanatório” (caso de Vitória-ES), considerado não há quaisquer obrigatoriedades legais em re-
obsoleto, posto que, tal qual “manicômio”, passou lação à previsão de diretrizes e princípios paras às
por longo processo de crítica e é rigorosamente políticas setoriais municipais, esta tem sido uma
vilipendiado pela Luta Antimanicomial e RPB. prática relativamente consagrada nas últimas dé-
Em suma, de forma geral, podemos constatar cadas, por conta da pressão dos movimentos so-
não só a timidez e a fragilidade das temáticas da ciais das cidades e dos novos ativismos urbanos27.
Saúde Mental nos PDPs analisados, como tam- Façamos um rápido exercício de conjectura,
bém importante inadequação em relação à lin- mesmo que tomemos unicamente o caso das RTs.
guagem pautada pela Luta Antimanicomial e ins- Existem questões estruturantes que concernem à
titucionalizada na RPB – que, lhes são anteriores. consolidação e articulação na cidade e que, recor-
Esse cenário denotaria que os sujeitos e agen- rentemente, enfrentam os seguintes problemas:
tes da Luta Antimanicomial e RPB não se fizeram As mudanças político-ideológicas entre as
representar nos espaços participativos no pro- gestões e as rupturas e descontinuidades das po-
cesso de elaboração dos PDPs? Ou esses sujeitos líticas:
e agentes não teriam conseguido força política Ao considerar a profunda vinculação da con-
suficiente na arena participativa para se fazerem solidação e funcionamento das RTs à vontade
representados nos termos das Leis? política e aos interesses das gestões vigentes, de-
Onde está a Luta Antimanicomial no planeja- correm-se cenários de insegurança para os mora-
mento das cidades? dores quando há mudanças na linha político-ide-
Como se pensa a implantação das Residên- ológica das Secretarias de Saúde e Coordenações
cias Terapêuticas (RTs) no planejamento do or- de Saúde Mental, que reverberam diretamente no
denamento urbano-territorial municipal? planejamento, bem como na construção e gestão
35
cam justamente na necessidade de a cidade pen- São diretrizes da Política de Saúde: [...] VI.
sá-las. Nos documentos analisados, nem a Luta Obter um grau de resolutibilidade nos serviços
Antimanicomial, nem a RPB e, muito menos, os que considere a racionalização com os custos oti-
princípios da desinstitucionalização, estão arti- mizados dos serviços, assim como a efetividade e
culados de forma minimamente satisfatória com qualidade na resposta terapêutica, incluindo o livre
o planejamento urbano estrutural das cidades. O acesso às diversas alternativas de tratamento exis-
que apresentamos em termos empíricos deve ser tentes e à reversão do modelo hospitalocêntrico32.
problematizado no sentido de avançarmos e ocu- Por último, destacamos que, no que tange aos
parmos as políticas do urbano, não como um fim “direitos da cidade” (ou seja, da liberdade e ca-
em si, posto que as arenas públicas, privadas e do pacidade individual de exercício e uso dos recur-
comum respondem a determinações, processos e sos sociais urbanos), a perspectiva do Direito à
correlações de forças outras29,30. Ainda assim, esse Cidade os extrapola para afirmar a possibilidade
é um caminho necessário e inadiável para que a de reinvenção da cidade como radicalização do
cidade se concretize como um espaço convivial31, exercício da liberdade e como horizonte para a
de cuidado e produção de saúde. tomada de consciência e de poder das pessoas. O
Contudo, é importante considerar que as ci- Direito à Cidade é, portanto, a luta pelo direito à
dades analisadas a partir do ranking de qualidade vida urbana renovada, à apropriação da cidade
urbana são majoritariamente localizadas na re- como valor de uso e lugar do encontro vitalizante,
gião geoeconômica centro-sul brasileira (região vislumbrando a cidade como obra (em termos de
concentradora dos maiores níveis de densidade atividade participante). Direito à liberdade, à in-
técnica e fluxo de capitais, pessoas e informa- dividualização na socialização, ao habitat e ao ha-
ção). A única exceção foi a cidade do Recife-PE, bitar33 (p. 134). Não se trata de um direito indivi-
justamente ocupando a 15ª posição do referido dual, ou um direito a ser institucionalizado pelo
ranking, mas que ainda assim se destaca como Estado, mas de uma plataforma ético-política a
centralidade nacional. A amostragem aqui ana- ser constantemente encampada, (re)construída
lisada não abarca, portanto, a realidade de outras e (re)conquistada pelas lutas populares contra a
cidades deslocadas das centralidades nacionais e lógica mercantilizadora da cidade e da vida:
que, no entanto, possuem experiências particu- O direito à cidade é muito mais que a liberdade
lares e protagonismo na Luta Antimanicomial individual de ter acesso aos recursos urbanos: é um
– como Bauru-SP, Barbacena-MG, entre outras. direito de mudar a nós mesmos, mudando a cida-
Ainda que não tenham sido analisados no es- de. [...] A liberdade de fazer e refazer as nossas ci-
copo deste artigo, identificamos alguns casos que dades, e a nós mesmos, é, a meu ver, um dos nossos
preveem propostas concretas para a organização direitos humanos mais preciosos e ao mesmo tempo
da Saúde Mental na cidade via PDP. É o caso de mais negligenciados34 (p. 38).
Janaúba-MG, que compõe a região intermediá- Avante Luta Antimanicomial, ocupemos os
ria de Montes Claros-MG. O seu PDP, datado de Planos Diretores das cidades... pelo Direito à Ci-
2007, afirma, na Seção II (“Da Política Municipal dade Antimanicomial!
de Saúde”), Subseção I (“Dos processos gerais”),
no Art. 136:
37
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ografia Política, Geopolítica e Gestão do Território).
REBRAGEO: Niterói; 2018.
38
Honorato GLT
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