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RECUPERAÇÃO DE ÁREAS

DEGRADADAS
AULA 2

Prof. Francisco von Hartenthal


O PROJETO DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS (PRAD)

CONVERSA INICIAL

A recuperação de áreas degradadas foi prevista na Política Nacional de


Meio Ambiente, Lei n. 6.938/1981, e no Art. 225 da Constituição Federal de 1988.
Porém, os documentos legais que estabelecem as exigências mínimas para a
elaboração do Projeto de Recuperação de Área Degradada ou Alterada (PRAD)
são a Instrução Normativa n. 4, de 2011, do IBAMA, e a Instrução Normativa n.
11, de 2014, do Instituto Chico Mendes (ICMBio), que trata de procedimentos
para o PRAD em Unidades de Conservação.
Outros órgãos ambientais podem emitir regulamentos próprios que
orientem a elaboração dos PRADs, conforme as peculiaridades ambientais de
cada região, tendo como base as instruções normativas mencionadas. Além
disso, também os diferentes tipos de degradação são disciplinados, com
objetivos próprios para a recuperação.
No entanto, conhecer as normas é imprescindível, mas não o suficiente.
Também é preciso ter um bom trânsito pelas ciências socioambientais afeitas à
Recuperação de Áreas Degradadas e ter noções da atividade econômica que
deu origem à degradação. Caso contrário, o PRAD corre o risco de funcionar
apenas no papel.

TEMA 1 – LINHA DO TEMPO DO PRAD

A recuperação de uma área degradada deve ser compreendida em um


contexto temporal. Temos um estado atual de degradação e queremos, para o
futuro, uma nova condição, cuja qualidade ambiental será comparada a uma
situação do passado. Essa é a linha mestra de todo o projeto de recuperação.
Nesse sentido, o art. 1º, parágrafo 2º, da IN 4/2011 estabelece que o
PRAD deverá conter “informações, diagnósticos, levantamentos e estudos
que permitam a avaliação da degradação” – ou seja, a comparação do presente
com o passado – e “medidas adequadas à recuperação da área” – o caminho a
seguir do presente para o futuro (IBAMA).
O melhor diagnóstico ambiental da situação anterior, não degradada, é
dado pelos estudos ambientais executados para o Licenciamento Ambiental do
empreendimento. Caso esses estudos sejam incompletos ou inexistentes por
quaisquer motivos, ou apenas para complementá-los, é possível utilizar estudos

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referentes a áreas próximas, com as mesmas características ambientais, ou
ainda produzi-los especificamente para o PRAD.

TEMA 2 – DIAGNÓSTICO DA DEGRADAÇÃO

Conhecendo o estado anterior, devemos relacioná-lo com a situação


atual. Para isso, os Termos de Referência do PRAD (presentes nas instruções
normativas do IBAMA e do ICMBio) demandam três informações fundamentais:
a descrição da atividade causadora do impacto, a causa da degradação e os
efeitos ao ambiente.
Diferentes atividades podem ter originado a degradação, como pecuária,
agricultura, indústria, mineração e acúmulo de resíduos. Conforme a atividade,
o tipo de degradação será diferente. Alguns exemplos de degradação são:
desflorestamento, remoção de solo e subsolo, ou poluição de cursos d'água.
Além disso, os efeitos podem variar entre perda de biodiversidade, erosão do
solo, contaminação química da água etc.
Uma mesma atividade pode ter impactos diferentes conforme a região. O
regime de chuvas, a existência de um rio, a permeabilidade do solo, ou a
existência de um povoamento na vizinhança são informações essenciais que
devem ser apresentadas no diagnóstico da degradação do PRAD.
O art. 3° da IN 11/2014 estabelece que as medidas de recuperação devem
ser fundamentadas “nas características bióticas e abióticas da área e em
conhecimentos secundários sobre o tipo de impacto causado, a resiliência da
vegetação e a sucessão secundária” (ICMBio). Repare na necessidade de
conhecimentos sobre a ecologia da região, que devem estar presentes no
diagnóstico do PRAD.

TEMA 3 – DIAGNÓSTICO DA ÁREA

Deve-se caracterizar com precisão a área sobre a qual incidiu a atividade


que originou a degradação. Isso é mais do que apenas descrever a degradação.
A identificação de resquícios não impactados, por exemplo, é essencial ao
adequado diagnóstico da área degradada.
O TR-PRAD exige informações de acesso à área a ser recuperada e
imagens georreferenciadas de seus limites e coordenadas. Atualmente, o
acesso a esse tipo de imagem é barato e acessível, seja por meio de sites ou

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com a utilização de drones. Uma visão geral da região, com a devida resolução,
pode evitar imprevistos e reduzir custos em etapas posteriores.
Mas apenas as imagens não são suficientes para a caracterização do
local. É necessário descrever o clima, o bioma, a fitofisionomia e a bacia
hidrográfica da área a ser recuperada e seus arredores. Essa caracterização
pode ser realizada a partir de dados secundários, ou seja, estudos e documentos
produzidos por terceiros, mas de reconhecida qualidade.
É preciso também ir a campo e verificar in loco os focos da degradação.
As condições do solo requerem descrições técnicas apropriadas quanto à
presença de processos erosivos e outros indicadores. Alterações em cursos
d’água podem ser verificadas com imagens, mas a existência de substâncias
prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente só será verificada com testes
laboratoriais. Se houve desflorestamento, levantamentos sobre a cobertura
vegetal adjacente à área degradada são necessários, com a identificação das
plantas ao nível de espécie e com o nome popular.
O PRAD deverá ser protocolizado em duas vias, uma impressa e outra
em meio digital. Com justificativas coerentes, o órgão ambiental pode requerer
informações complementares, de acordo com especificidades da região, da
atividade degradadora ou do Projeto. No entanto, se isso acontecer, significa que
a primeira versão mostrou-se insuficiente, com todos os estudos e avaliações
realizados e, muitas vezes, com vários profissionais já desmobilizados. Essa
revisão gera novos custos e deve ser evitada.

TEMA 4 – OBJETIVOS DO PRAD

Conforme o porte do empreendimento ou o tamanho da área a ser


recuperada, o Projeto de Recuperação pode ser simplificado. O PRAD
Simplificado também pode ser utilizado se isso for justificado por análises
técnicas, conforme o diagnóstico inicial. Porém, o objetivo principal do PRAD
sempre será o de restituir a capacidade de regeneração natural das áreas
degradadas, ainda que sem retornar às condições ambientais anteriores.
É necessário informar expressamente todos os resultados que se deseja
alcançar e os indicadores para avaliá-los. Por exemplo, contenção de processos
erosivos, verificando-se a extensão e profundidade de voçorocas ou a
capacidade de infiltração da água no solo; aumento da diversidade biológica,
com listas de espécies; recuperação de nascentes, com medição de vazão de

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água, entre outros. Os objetivos podem ser especificados quantitativa e
qualitativamente, por meio dos indicadores e de imagens.
Deverá ser dada atenção especial à proteção e conservação do solo e
dos recursos hídricos. Conhecendo a atividade que deu origem à degradação,
pode-se inferir a probabilidade de ter havido contaminação e por quais
substâncias. Deve-se, então, medir a presença desses contaminantes e projetar
a sua concentração esperada para o futuro. Se existirem dispositivos legais que
determinem concentrações específicas, essas normas devem ser usadas como
parâmetro.
A execução do Projeto deve ter início em até 90 dias após a sua
aprovação pelo órgão ambiental. Ao fim de três anos, se os objetivos propostos
não tiverem sido alcançados, a área degradada não será considerada como em
efetiva recuperação, ensejando a continuidade do PRAD.

TEMA 5 – O MÉTODO DE RECUPERAÇÃO

Os objetivos do PRAD devem ser ponderados pelos custos necessários


para atingi-los. Essa é a equação que determinará os métodos escolhidos.
A primeira ação para garantir a recuperação deverá ser a proteção da
área, a fim de evitar o avanço da degradação. Isso será feito eliminando-se ou
diminuindo a presença de fatores de risco, como espécies invasoras (e.g. gado),
risco de incêndio, erosão, dentre outros. Em áreas onde houve alteração ou
remoção de solo e forem necessárias obras de engenharia, estas devem ser
feitas antes de qualquer outra intervenção (ICMBIO, 2014).
O PRAD deverá informar os métodos e técnicas a serem empregados,
devendo ser utilizados aqueles de eficácia já comprovada. Daí a necessidade de
se conhecer outros projetos bem-sucedidos, buscar atos normativos dos órgãos
ambientais, fazer cursos de atualização, ler informativos técnicos e trabalhos
acadêmicos. O PRAD deve conter embasamento teórico rigoroso e, salvo em
casos específicos, não é o lugar para propor inovações técnicas.
O reflorestamento deve ser de espécies nativas da região, com mudas e
sementes adquiridas, preferencialmente, de produtores locais. Se na área
existirem espécies ameaçadas de extinção, elas necessariamente devem estar
presentes no projeto. A utilização de espécies com dispersão por animais
também deve ser privilegiada.

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Periodicamente, será necessário apresentar Relatórios de
Monitoramento, exceto se expressamente liberado pelo órgão ambiental. Por
isso, é importante produzir dados que demonstrem a evolução do projeto. Fotos
são imprescindíveis e devem registrar sempre os mesmos pontos, para fins de
comparação. Os Relatórios de Monitoramento e de Avaliação servem como
comunicações periódicas ao órgão ambiental, ocasiões em que serão
detalhadas todas e quaisquer irregularidades e problemas.
Condições específicas podem exigir mudanças no Projeto. Se isso
ocorrer, o órgão ambiental deve ser informado, com as devidas justificativas. Por
isso, o monitoramento deve ser capaz de detectar os sucessos ou insucessos
das estratégias utilizadas, bem como os motivos dos resultados obtidos.
Todas as intervenções que se fizerem necessárias para a manutenção do
processo deverão ser especificadas, com o detalhamento dos custos de todas
as atividades previstas. Gastos com pessoal, quantidade de mudas utilizadas e
de insumos químicos e orgânicos, equipamentos, combustível, material usado
em construções, tudo deve ser orçado e especificado. As atividades devem ser
mensuradas e mapeadas, para que possam ser monitoradas posteriormente.

NA PRÁTICA

Vamos ver um exemplo simples de diagnóstico ambiental e objetivos para


o PRAD.

1. Identificação do empreendimento
 Nome do empreendimento: Fazenda Rio Azul.
 Localização e área do empreendimento: Município Rio Azul – PR.
 Coordenadas geográficas: S 20º 20' 20'' e W 50º 50' 50''.
 Corpo d’água e bacia hidrográfica: Rio Azul, Bacia hidrográfica do Rio
das Cores.
 Número de matrícula do imóvel rural: 1234567-89.
 Área a ser recuperada: ver fotos em anexo.
2. Objetivos
 Objetivo principal: recuperação de mata ciliar.
 Objetivos secundários: aumento da diversidade biológica e reversão de
processo de assoreamento do rio.
3. Metodologia

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 As espécies selecionadas devem possuir sistema radicular profundo,
crescimento rápido, disponibilidade de sementes e mudas na região, e
tolerância à seca. Foram selecionadas 28 espécies vegetais. O
espaçamento entre mudas será de 3m x 3m. Será usado cercamento
por arame farpado para evitar o pisoteamento pelo gado.

Tabela 1 – Lista de espécies selecionadas para o plantio da área a ser


recuperada

Família Nome científico Nome vulgar Grupo ecológico

Anacardiaceae Tapirira guianensis Cupuba Secundária Inicial

Anacardiaceae Schinus terebinthifolius Aroeira Pioneira

Moraceae Ficus clussifolia Gameleira Secundária tardia

4. Custos

Tabela 2 – Tabela de custos de cercamento

Ação Instalação Manutenção Total

Compra de arame farpado R$ 5.000 R$ 1.000 R$ 6.000

Compra de estacas R$ 2.000 R$ 500 R$ 2.500

Mão-de-obra R$ 1.000 R$ 500 R$ 1.500

FINALIZANDO

Nesta aula, conhecemos as Instruções Normativas n. 4/2011, do IBAMA


e a IN 11/2014, do ICMBio, as normas legais fundamentais para a elaboração de
um Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD). Falamos sobre a
linha do tempo do PRAD, conceito básico para entendê-lo. Também tratamos de
algumas informações imprescindíveis, que devem constar no PRAD a ser
aprovado pelo órgão ambiental.

LEITURA OBRIGATÓRIA

EMBRAPA. Plano de recuperação de áreas degradadas do aproveitamento


hidrelétrico (ahe) Corumbá, Goiás. 1996. Disponível em:

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<https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/130276/1/PlanodeRecupd
eareaPRADCOR.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2018.

FARIAS, T. Considerações sobre o Plano de Recuperação de Área Degradada.


Consultor Jurídico, 15 out. 2018. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2016-out-15/ambiente-juridico-consideracoes-
plano-recuperacao-area-degradada>. Acesso em: 11 jul. 2018.

IBAM-PQGA. Nota Técnica n. 3, de 2015. Guia prático para elaboração de


Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) em APP. Disponível em:
<http://www.amazonia-ibam.org.br/images/pqga/arquivos/003_prad.pdf>.
Acesso em: 11 jul. 2018.

ICMBIO. Roteiro de PRAD. Ministério do Meio Ambiente, jan. 2013. Disponível


em:
<http://www.icmbio.gov.br/parnaserradabocaina/images/stories/o_que_fazemos
/gestao_e_manejo/Roteiro_PRAD_versao_3.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2018.

PRAD Aula. ECOLOGIA EM AÇÃO, 21 out. 2016. Disponível em:


<https://youtu.be/Yq5YovkY87M>. Acesso em: 11 jul. 2018.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Lei da Política Nacional do Meio


Ambiente. Diário Oficial da União, 2 set. 1981. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6938.htm>. Acesso em: 11 jul. 2018.

_____. Constituição (1988). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.
Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso
em: 11 jul. 2018.

IBAMA. Instrução Normativa n. 4, de 13 de abril de 2011. Diário Oficial da


União, 14 abr. 2011. Disponível em:
<http://www.ibama.gov.br/sophia/cnia/legislacao/IBAMA/IN0004-130411.PDF>.
Acesso em: 11 jul. 2018.

ICMBIO. Instrução Normativa n. 11, de 11 de dezembro de 2014. Diário Oficial


da União, 12 dez. 2014. Disponível em: <
http://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/legislacao/Instrucao_normativa/
2014/in_icmbio_11_2014_estabelece_procedimentos_prad.pdf>. Acesso em:
11 jul. 2018.

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