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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

DEPARTAMENTO DE LITERATURA /
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
LETRAS

PROJETO DE PESQUISA PÓS-DOUTORAL


TÍTULO:
FIGURAÇÕES DA ESCRITURA NA FICÇÃO DE ANTÓNIO LOBO
ANTUNES E SEU DIÁLOGO COM O PENSAMENTO DE BLANCHOT
(vol. 2).

AUTOR DO PROJETO: Cid Ottoni Bylaardt, Professor Associado IV do Departamento de


Literatura da UFC, e Professor Permanente do Programa de Pós-
Graduação em Letras da UFC
Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2 - CA
LL - Letras e Linguística
Doutor em Literatura Comparada pela UFMG
Estágio Pós-Doutoral em Literatura Comparada pela Universidade
de Coimbra – Portugal

CENTRO/UNIDADE: Centro de Humanidades/Curso de Letras

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DEPARTAMENTO/ Departamento de Literatura / Setor de Literatura Brasileira /
SETOR / PROGRAMA: Programa de Pós-Graduação em Letras / Área de concentração:
Literatura Comparada

LOCAL DE Universidade Federal do Ceará


EXECUÇÃO:

ÁREA DO Literatura
CONHECIMENTO
PREDOMINANTE:

ÁREAS DO Filosofia, História, Sociologia, Ciências Humanas em geral


CONHECIMENTO
CORRELATAS:

INÍCIO: Março / 2022 CONCLUSÃO: Janeiro/2023

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PROJETO DE PESQUISA

AUTOR: Cid Ottoni Bylaardt


TÍTULO: Figurações da escritura na ficção de António Lobo Antunes e seu diálogo
com o pensamento de Blanchot (vol. 2).
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: Literatura Comparada
LINHA DE PESQUISA: Estudos Comparados de Literaturas de Línguas Modernas

RESUMO
Este projeto de pesquisa pós-doutoral propõe um estudo dos últimos seis
romances de António Lobo Antunes, todos escritos e publicados no século XXI,
considerando as concepções de escritura de Maurice Blanchot e de outros pensadores
que com ele dialogam, como Foucault, Deleuze, Derrida, Barthes e Agamben. Os
romances de Lobo Antunes que serão estudados são Não é meia noite quem quer
(2012), Da Natureza dos Deuses (2015); Para aquela que está sentada no escuro à minha
espera (2016); Até que as pedras se tornem mais leves que a água (2017); A última porta
antes da noite (2018); A outra margem do mar (2019) e Diccionario da linguagem das
flores, (2020).
É importante relembrar a trajetória de estudos do escritor português empreendidos
por mim. No ano de 2005, realizei Estágio de Doutorado em Évora, Portugal, com apoio do
CCNPq, onde finalizei minha tese de doutorado, defendida em abril de 2006. Na tese,
Intitulada Lobo Antunes e Blanchot: o diálogo da impossibilidade”, foram
estudados sete romances de Lobo Antunes, a saber: Tratado das paixões da
alma; A ordem natural das coisas; O manual dos inquisidores; Não entres tão depressa
nessa noite escura; Que farei quando tudo arde?; Boa tarde às coisas aqui em baixo,
Hei-de amar uma pedra. A orientadora da tese foi a Profa. Dra. Silvana Pessoa, da
UFMG, e foi assistida em Portugal pelo Prof. Dr. Jorge Figueiredo Jorge, da
Universidade de Évora.
Em 2011, foi publicado um livro pela Editora Universidade da UFC, do
PPGLetras, contendo os estudos dos sete romances abordados na tese e mais seis outros
que foram realizados entre 2006 e 2011, perfazendo um total de treze ensaios
publicados no livro. O livro recebeu o mesmo título da tese, e os romances
acrescentados foram Ontem não te vi em Babilónia; O meu nome é legião; O
arquipélago da insónia; Que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar; Sôbolos
rios que vão e Comissão das lágrimas.

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Ainda em 2011, fiz Estágio Pós-Doutoral em Coimbra, em interlocução com a
professora Ana Paula Arnaut, com auxílio financeiro do CNPq. Nos dez meses em que
estive em Portugal desta feita, foram escritos oito ensaios, uma resenha e uma tradução,
além da finalização de um romance, Limpai nossos lábios impuros, já publicado. Esta
produção resultante do Estágio Pós-doutoral rendeu-me uma Bolsa de Produtividade do
CNPq no ano de 2012, sucessivamente renovadas, sendo que a atual vai até o ano de
2022, inclusive. No ano de 2022, no mês de agosto, deverei também propor minha
progressão de Professor Assistente IV da UFC para Professor Titular, com apresentação
de tese oriunda desta proposta de estudos pós-doutorais.
Voltando aos estudos antunianos, até o presente momento, já foram publicados
um total de 19 ensaios e resenhas sobre a obra do escritor português, além dos treze
textos constantes do livro citado.

A respeito da articulação entre a obra de António Lobo Antunes e a de Maurice


Blanchot, pode-se dizer que uma estabelece com a outra um diálogo rico e
surpreendente. Para o pensador francês, a literatura só se realiza no domínio da
impossibilidade, na busca não-explicitada da escrita, na compulsão de escrever. A
escritura antuniana sucumbe a esse domínio órfico, propiciando o advento de duas
grandes figurações: a errância e a dispersão, as quais se desdobram em vários outros
aspectos, como a desordem das vozes e dos depoimentos; a mentira e a inutilidade da
escrita; a ausência de função utilitária; a impossibilidade da morte; a desarmonia e o
dissenso; a tolice do todo-dito no mundo; a apresentação de um contramundo em
detrimento do relato em espelho; a anulação da hierarquia entre escritor e
personagem; a luta do personagem para mudar a escrita; a incompletude e a
insolubilidade do relato; a potência silenciosa da palavra fria, a palavra que não
conforta, não apazigua e não mostra caminhos.
Nossa crença é de que há aí vasto material para se conduzir uma investigação
comparatista que mostre pontos de vista relevantes para o desenvolvimento de uma
reflexão crítica sobre a obra do ficcionista português.

INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

O propósito deste projeto é investigar as figurações da escritura do romancista


português António Lobo Antunes, a partir das concepções de literatura de Maurice
Blanchot e, por desdobramento, do pensamento pós-estruturalista e pós-moderno de
Foucault, Deleuze, Barthes, Derrida, e Giorgio Agamben, principalmente. Por meio da

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utilização desse suporte teórico, pretende-se empreender uma investigação crítica dos
últimos romances de Lobo Antunes.
Partindo do pressuposto de que o princípio do dialogismo constituirá o eixo
articulador deste estudo, passamos a expor a seguir os motivos por que julgamos ser
fecundo o diálogo entre a escritura de Lobo Antunes e a de Blanchot e dos filósofos
mencionados. A exposição dos motivos passa inicialmente por considerações sobre as
obras dos autores mencionados, para que se possam estabelecer as conexões
pretendidas.
Em António Lobo Antunes, personagens e narradores assumem vozes
constantemente interrompidas, digressivas, cronologicamente desordenadas,
compondo um mosaico de estilhaços, numa superposição vertiginosa de imagens.
Tanto quanto a ação, o espaço e o tempo são igualmente fragmentados em porções
descontínuas. Predomina nos romances um clima de vazio, ou de negatividade, que
decreta o colapso irreversível da narrativa utilitária, portadora da tradição e do saber
de uma comunidade, baseada na experiência. Estão ausentes nela quaisquer
resquícios de projetos políticos ou sociais, ou de quaisquer laivos de esperança na
humanidade. Instaura-se aí uma antiutopia, própria de uma consciência que explora o
desencantamento do mundo e a descrença em ações de transformação social,
caracterizando a desordem e a insolubilidade das coisas.
A ficção de Lobo Antunes permite uma análise crítica a respeito das maneiras
como a escritura se desvincula de estados de coisas e de combinações de
propriedades que ordenam o mundo das tarefas, ou seja, as ocupações dos humanos
na vida real, que constituem “a vida e o trabalho do dia”, na concepção de Blanchot,
isto é, o mundo do dia-a-dia, sem renunciar às palavras que todo mundo usa. Um dos
principais objetivos deste estudo será refletir sobre o grau de desordem que Lobo
Antunes insere na escrita, colocando-a em excêntrico em relação à estruturação do
edifício mimético, que tradicionalmente preside o cerimonial literário, e levando-a, por
conseguinte, à ruptura com o saber da comunidade em que se insere e com a
narrativa da tradição.
Essa ruptura configura a crise do saber narrativo e da representação na escritura
de Lobo Antunes, que promove uma subversão das categorias do ter, do fazer e do
dizer, ligadas ao mundo “real”. Temos aí um relato sem ordem, sem verdade, sem
exemplo e sem mensagem, construído sobre a dispersão e a errância da palavra.
Tal “desordem” se percebe, por exemplo, na multiplicidade de vozes que erram
sem autoridade em vários dos romances do escritor português, as quais parecem
destroçar a presumida ordenação da sociedade portuguesa.

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A literatura não mais belas-letras, em oposição à escrita convencional, é capaz de
dar a qualquer corpo obscuro a capacidade do brilho ou condená-lo ao esquecimento
porque a escritura deixa de se enquadrar em esquemas de representação para
promover a errância da letra sem pai, a heresia da conspurcação das belas letras, o
espírito errante que desafia a coerência entre a ordem das palavras e a das coisas. O
compartilhamento da letra por todos, concretizado nas múltiplas vozes que tagarelam
em vários textos de Lobo Antunes, é uma contingência igualitária que propicia um
novo tipo de desigualdade decorrente da deslegitimação. Tal desigualdade, ligada à lei
dos astutos, opõe-se à existente no sistema de legitimação.
Essa contingência, entretanto, não salva ninguém, tornando-se mais um fator de
tormenta do que de alívio para a escritura, expressando-se em errância e dispersão,
que assumem várias figurações nos romances a serem estudados.
Por conseguinte, o que sobressai nos romances do escritor português é o trabalho
com a linguagem, que a cada livro faz-se mais presente, de forma mais contundente,
na medida em que as outras categorias da narrativa se retiram paulatinamente. Esse
processo de desnarrativização da escrita romanesca acentua-se de forma mais nítida
a partir de Não entres tão depressa nesta noite escura, intensificando-se então a
indefinição de vozes, a desmaterialização da trama narrativa e a encenação da
linguagem.
A leitura de António Lobo Antunes convida a uma concepção bastante especial de
literatura, que abordaremos aqui considerando as seguintes categorias: a autoria, a
forma e a concepção de criação literária.

A autoria. Uma das investigações mais fecundas que se pode fazer na obra de
Lobo Antunes funda-se na figura daquele que escreve. Podemos afirmar que ele
desaparece, em seu sentido convencional. O autor está morto. Mas quem escreve? A
morte do autor no sentido blanchotiano, posteriormente retomado por Roland Barthes,
está relacionado à ausência do condutor todo-poderoso que fala a linguagem do
dictare. Temos então a eliminação do tradicional pai da escrita para presenciarmos
metamorfoses dos enunciadores em direção à impossibilidade, situação exemplificada
de maneira comovente na figura de Paulo, de Que farei quando tudo arde?, que não
consegue desvencilhar-se da escrita, assim como não pode livrar-se da figura do pai
travesti, num movimento semelhante ao da personagem Maria Clara de Não entres tão
depressa nesta noite escura. De maneira similar, acompanhamos a angústia dos
personagens de Eu hei-de amar uma pedra, que vagueiam pelo romance atarantados
pela abdicação do escritor, o qual se retira e deixa nas mãos deles a tarefa de terminar
o relato. Em Ontem não te vi em Babilónia, personagens e escritor não se decidem

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sobre quem deve findar o romance, que afinal é dado como terminado pela voz da
menina que morre enforcada o tempo todo durante os relatos:
e não fazia mal, não tem importância, não se preocupem com o livro (não estou a
girar sozinha é com a minha mãe que eu giro)
porque aquilo que escrevo pode-se ler no escuro. (p. 479)

Terminam as palavras de escritura, a personagem continua a girar abraçada à


mãe, como continuam a girar as palavras do livro em sua trajetória circular, ou
espiralada, que não pode parar jamais, a escrita incessante cujo conteúdo não
interessa, não é motivo de preocupação, pode-se ler no escuro, mesmo porque é um
texto escrito no escuro, sem idéias que o iluminem, sem ensinamentos que o abonem.
O livro não tem utilidade, afinal, não passa de um monte de páginas escritas, a
estabelecer uma estranha relação com a vida, uma relação desviada para onde só se
afirma o que não interessa.
O escritor é condenado a assumir a paixão dos personagens e da narrativa,
encenando, por exemplo, o ser que se apresenta de forma canhestra como António
Antunes em Tratado das paixões da alma. Ao se misturar à trama, ele se torna o
subversivo, o transgressor da ordem, o que falha como escritor da tradição. Ele passa
a ser o porta-voz do sem-sentido, ele que se esconde entre seus personagens em O
manual dos inquisidores e em A ordem natural das coisas, que transtorna e deixa
confuso o Paulo de Que farei quando tudo arde?, com sua intromissão inconveniente.
À página 121 de Boa tarde às coisas aqui em baixo, ele confessa ter perdido o
controle da personagem Marina, uma de suas mais belas criações, que assume sua
própria concepção independente de quem escreve: "a Marina que pensavas haver
criado e se criou a si mesma". Em seguida, o autor declara-se doente, contaminado
pelo livro, que teima em seguir sua própria sina. Em Ontem não te vi em Babilónia, ele
emerge da narrativa para anunciar: "(Chamo-me António Lobo Antunes, nasci em São
Sebastião da Pedreira e ando a escrever um livro)" (p. 465).
Há em Lobo Antunes uma tendência de o autor se deixar levar e se perder pela
escrita, o que Maurice Blanchot considera um anátema do escritor, exemplificado no
mito de Orfeu, que desce aos infernos em busca de Eurídice. Aqueles que resistem, e
conseguem não soçobrar, Blanchot relaciona a Ulisses, que ouviu o canto das sereias
amarrado ao mastro para não se deixar seduzir por aquilo que ele chama a exigência
profunda da obra. No caso de Antunes, consideramos as amarras ao mastro as suas
tentativas de manter um pé no mundo, para não soçobrar totalmente. São exemplos
dessas amarras a arquitetura simétrica dos romances, as ancoragens a textos
canônicos como o Tratado das paixões de Descartes, em Tratado das paixões da
alma; ou à Bíblia, em Não entres tão depressa nesta noite escura, ou a um pretenso

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manual da Santa Inquisição, em O manual dos inquisidores. No caso de Descartes,
como vimos, a semelhança fica na referência, porque as paixões do romance não têm
a pretensão de levar as pessoas a viverem melhor. As referências bíblicas da mesma
maneira situam-se em uma configuração de sentidos contrária à intenção piedosa e
moralizadora do texto cristão. O manual dos inquisidores, por sua vez, é uma
construção simbólica no livro que carrega essa referência.
Essa maneira ambígua e hesitante como o escritor se relaciona com a escrita
parece-nos uma forma de ele assumir a paixão de seus personagens, de inverter as
posições do mestre e do refém. Este é um componente fundamental da idéia de
literatura reivindicada por Maurice Blanchot: paixão. É ao mesmo tempo sofrimento e
amor intenso, a ponto de ofuscar a razão, um furor incontrolável, fanatismo
imensurável, e ao mesmo tempo uma exigência a que o escritor não pode furtar-se,
por mais que tente ordenar-se e enquadrar-se. Afundar é imperioso, e o que faz o
homem soçobrar é a arte.

A forma. Lobo Antunes não apresenta uma forma literária definida e enquadrada em
parâmetros pré-estabelecidos. Quase todos os seus livros ostentam em suas primeiras
páginas a palavra romance, o que não define uma forma, considerando a infinidade de
textos que se abrigam sob essa denominação. Observe-se que, para complicar mais
um pouco a questão de gênero, o autor chama poema a Não entres tão depressa
nesta noite escura.
Quanto à técnica narrativa, o que chama a atenção inicialmente na escrita
antuniana é o afloramento da diversidade de locutores, que carreia a proliferação dos
sentidos, a pulverização, a fragmentação, as divergentes direções escriturais. A
multiplicidade de vozes, as várias emanações de locução dispersam as palavras e
aniquilam a noção de centro, dispensando-o. Essa dispersão alia-se à morte da
palavra útil, à eliminação da monossemia: é impossível circunscrever o significado do
texto literário, porque ele não consegue se exprimir sem ambiguidade. A noção
blanchotiana de désoeuvrement aponta para a impossibilidade de se congelar o
sentido da palavra literária para utilizá-la nas condições diárias. Lobo Antunes realiza
aí uma noção especial de símbolo, ligada à existência de uma imagem sem referente -
exemplificada de forma magistral por Maurice Blanchot na figuração das imagens
cadavéricas desenvolvidas no capítulo "Les deux versions de I'imaginaire" de L'espace
littéraire.

A criação literária. Considerando a produção da escritura, tomo como exemplo o


romance O meu nome é Legião. Lobo Antunes comparece mais uma vez com um

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grande romance, em que, como sempre, a grande estrela é a escritura. Tudo o mais
parece pretexto para que o texto brilhe, nada obstante serem todos os elementos
cuidadosamente encaixados para que no final se tenha uma história, embora trôpega,
que se ergue sobre os fragmentos espalhados pelas trezentas e oitenta páginas.
Antes de mais nada, o importante é constatar que há seres que escrevem todo o
tempo, em geral de maneira compulsória, contra a própria vontade, mas não há como
parar de escrever. Não se pode deixar de estabelecer um símile entre essa obsessão
de escrever dos personagens-enunciadores e o caráter de escritor compulsivo de
Lobo Antunes. O processo de criação é denunciado à página 265, num parágrafo
parentético:
(via-se que nortada porque a roupa ia mudando de forma e dali a pouco feixes ao
comprido das ondas em que uma ocasião um golfinho, um cachalote ou um
golfinho, menor que um cachalote, um golfinho, ao mergulharem círculos brancos
que deixam de ser brancos e a água lisa de novo, quem me garante que um
golfinho e por essa ordem de idéias quem me garante que o meu irmão e eu,
estou a fazer um livro, a mão escreve o que as vozes lhe ditam e tenho dificuldade
em escutá-las, se as vozes ditam não é mentira, é tal qual, o meu irmão e eu
ordenam elas e portanto ponho o meu irmão e eu a cavarmos um buraco, não,
ponho o meu irmão a cavar um buraco e eu distraído com os pássaros, assim está
certo)

O fragmento acima é exemplar do jogo de indeterminações engendrado pela


escritura de Lobo Antunes. Os parênteses contêm observações sobre o relato que um
personagem anônimo, um policial que aparece pela primeira e última vez no texto,
está fazendo no momento, uma história que ele visivelmente não quer contar, mas é
obrigado. Considerando que a trama como um todo envolve uma investigação policial
de crimes cometidos por um grupo de crianças e adolescentes de 12 a 18 anos,
podem-se considerar todos os relatos que aparecem no romance como depoimentos
de pessoas que de alguma forma têm alguma ligação com os investigados — supõe-
se ainda que os depoimentos possam justificar a eliminação dos suspeitos de forma
truculenta pela polícia.
O verbo supor talvez seja o que melhor define a relação entre o leitor e a
matéria lida: nada é dito diretamente, as elocuções são fragmentárias, ninguém tem
certeza de coisa alguma, os gêneros textuais não condizem com o que se espera
deles. O texto acima ilustra a situação do romance, a começar pelos termos utilizados
pelo enunciador: "mudando de forma", "deixam de ser brancos", "a água lisa de novo",
"quem me garante que um golfinho", "quem me garante que o meu irmão e eu", "tenho
dificuldade em escutá-Ias", "não". Todas as expressões assinaladas são marcas de
indeterminação, exprimem transformações, dúvidas, imprecisões, dificuldades de
escrever, reescrituras, palinódias escriturais. Tudo isso em meio à imagem instável da
água, à sugestão de que os círculos brancos provocados pela movimentação dos

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seres desaparece sem deixar marcas, como a própria escritura, que se apaga a si
mesma constantemente, deixando tudo liso de novo e novamente em movimento. Ao
final do parágrafo, o locutor chega a uma forma que parece ser a "definitiva": "ponho o
meu irmão a cavar um buraco e eu distraído com os pássaros, assim está certo".
Enquanto um desempenha o que parece ser uma função útil, o outro divaga a
perseguir pássaros com o olhar. O irmão, entretanto, sabe-se pela escritura adjacente,
cava sua própria cova, buraco que o conduzirá à Austrália. Pode-se dizer que todo o
livro é assim, o que dificulta imensamente o trabalho do leitor, e ao mesmo tempo
desafia-o a acompanhar essa escrita gaga, que não flui, que não estabelece
associações óbvias, para não dizer da alinearidade, da atemporalidade e da atopia.
Deve-se ressalvar, entretanto, que todos os fatos relatados, quando se pode conferir
suas relações, têm um nexo, isto é, as conexões são bem engendradas, o autor
jamais se equivoca em detalhes que se interrelacionam.
Eis aí o Lobo Antunes, sempre a tartamudear. A idéia de gagueira, que Sílvio
Romero outrora invocou para condenar a escrita de Machado de Assis, e que Gilles
Deleuze apontou como traço essencial dos grandes escritores em seu ensaio
"Gaguejou ele ... ", de Crítica e clínica, ajustam-se admiravelmente à escritura
antuniana. É certamente uma escritura gaga, fragmentária, desequilibrada,
inadequada, embrulhada. Esses cinco adjetivos motivam a leitura de Lobo Antunes, e
ao mesmo tempo a dificultam, conduzindo-a a um desastre inevitável. Um desastre
fascinante, diga-se.
A partir de tais considerações, pode-se argumentar que o ponto central deste
estudo é a investigação dos componentes da escrita como errância e dispersão em
seis dentre os últimos romances de Lobo Antunes. Consideramos a errância e a
dispersão como as duas grandes figurações assumidas pela escrita de Antunes, as
quais se desdobram em inúmeros aspectos que serão examinados detalhadamente: a
desordem das vozes e dos depoimentos; a mentira e a inutilidade da escrita; a
ausência de função utilitária; a impossibilidade da morte; a desarmonia e o dissenso; a
tolice do todo-dito no mundo; a apresentação de um contramundo em detrimento do
relato em espelho; a anulação da hierarquia entre escritor e personagem; a luta do
personagem para mudar a escrita; a incompletude e a insolubilidade do relato; a
potência silenciosa da palavra fria, sem intimidade e sem felicidade, ou seja, a palavra
que não conforta, não apazigua e não mostra caminhos. Errância e dispersão, em
suma, como o movimento da literatura no sentido de arriscar o direito à verdade e à
morte, entregando-se ao não-essencial, que é a escritura.
O diálogo da escritura de Lobo Antunes com a de Blanchot relaciona-se à
concepção que este tem de literatura. O pensamento de Blanchot tornou possível a

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leitura de autores como Sade, Hölderlin, Mallarmé e Kafka, a partir do estabelecimento
livre de uma relação sem relação que expõe as obras à exterioridade que as dispersa
na neutralidade. Blanchot propõe, assim, o pensamento de uma temporalidade
aporética que interrompe e ultrapassa a dialética hegeliana, contestando os valores
absolutos relacionados ao modelo conceitual e representacional. O movimento de
retorno pressuposto por Blanchot é sempre excêntrico, mais em direção à ausência do
signo do que à sua significação, o que impossibilita a unificação de um discurso, a
completude textual. A negatividade aqui não se apresenta com anulamento, mas como
afirmação do autrui. Para Hegel, o modelo de conhecimento reside na memória do
auto-conhecimento, ou seja, a negatividade dialética confia na função da memória
como recurso de autounificação e autopreservação; para Blanchot, a escritura
pertence ao esquecimento, numa forma radical de negação: a identidade é
desenraizada, deslocada e esquecida, a consciência encontra o outro num estado de
amnésia.
Em minha avaliação, a obra de Lobo Antunes não sustenta uma relação dialética
baseada na memória; poderíamos dizer, com Blanchot, que sua escritura relaciona-se
mais à memória do esquecimento, que não permite acomodações.
Outra questão desenvolvida por Blanchot, fundamentada em Nietzsche, e que
Lobo Antunes realiza, é a forma fragmentada. Há na utilização do fragmento, da
descontinuidade, uma recusa do sistema, uma paixão pelo inacabado, um desprezo
pela unidade. O discurso fragmentário, entre outras possibilidades, faz ouvir ainda a
linguagem da loucura, que se identifica com o discurso fora do poder, ausente das
tarefas, o desoeuvrement. Para Blanchot, a experiência literária só tem autenticidade
na contestação e no dilaceramento de sua linguagem; ela só tem autoridade na
ausência que apresenta, na morte que põe na obra, no vazio que escava.
Algumas outras questões já clássicas no pensamento de Blanchot serão
exploradas em sua relação com a obra de Lobo Antunes: Ulisses e as sereias, o olhar
de Orfeu, o ponto zero, o désoeuvrement, a palavra errante, a impossibilidade da
morte, o fora, a outra noite, a inspiração, o futuro, a experiência original.

OBJETIVOS
Analisar criticamente a construção de uma escrita que rompe com o saber e a tradição
(a “parole neutre” de que fala Blanchot) a partir da leitura e da investigação dos
seguintes romances de António Lobo Antunes: Da Natureza dos Deuses (2015); Para
aquela que está sentada no escuro à minha espera (2016); Até que as pedras se tornem
mais leves que a água (2017); A última porta antes da noite (2018); A outra margem do
mar (2019) e Diccionario da linguagem das flores, (2020).

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 Empreender uma investigação crítica, histórica e interdisciplinar da obra de Lobo
Antunes, em busca de respostas a questões que envolvem a autonomia ou a
absolutização da literatura.
 Examinar, segundo a literatura teórica pertinente, o processo de ruptura do
relato humanista nos romances supracitados, estabelecendo uma relação entre
essas narrativas e as obras de Blanchot, principalmente, e de Foucault,
Deleuze, Barthes, Derrida, e Giorgio Agamben.
 Relacionar os textos de Lobo Antunes ao pensamento de Maurice Blanchot
sobre a “exteriorização” da obra, ou de seu afastamento do mundo como
“exigência profunda” da escrita, que garante a autenticidade do texto literário
mediante o movimento exorbitante da paixão e do desejo.
 Investigar o jogo entre o autor, os narradores e os personagens, e que leva o
escritor a abandonar sua posição de prepotência para assumir a desordem do
relato, tornando-se refém de seu texto.

METODOLOGIA
A partir de uma perspectiva comparatista, o trabalho consistirá no estudo crítico
de cinco romances de Antônio Lobo Antunes para a verificação do grau de ruptura que
ele empreende com a tradição e a cultura tradicional na construção da escrita. O
diálogo comparatista se dará entre a escritura de Antunes e a de Maurice Blanchot,
tanto em seus textos de “esclarecimento”, como ele chama suas reflexões sobre a
literatura, como em sua ficção, ou seus “récits”.
O suporte filosófico será dado essencialmente por La part du feu, La bête de
Lascaux, L’entretien infini, L’espace littéraire, Le livre à venir e L’écriture du désastre,
de Maurice Blanchot. Sobre o escritor português e sua obra, serão consultados Os
romances de António Lobo Antunes, de Maria Alzira Seixo, que contém até agora a
fortuna crítica mais completa reunida em um só volume sobre a obra antuniana até o
ano de 2001; Conversaciones com António Lobo Antunes, de María Luisa Blanco,
contendo depoimentos do escritor; A escrita do mundo em António Lobo Antunes,
organizado por Eunice Cabral, Carlos J. F. Jorge e Christine Zurbach, com os anais do
Colóquio Internacional António Lobo Antunes, realizado em Évora em 2002.
Embora a investigação vá se centrar fundamentalmente no estudo comparado
da escrita de Lobo Antunes com as propostas de Blanchot, é evidente que outros
textos teóricos (ver bibliografia) comparecerão em momentos oportunos,
principalmente de Barthes, Derrida, Deleuze, Foucault e Agamben.

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MOTIVAÇÕES E RELEVÂNCIA DA REALIZAÇÃO DO ESTÁGIO NA UFMG, PLANO
DE ATIVIDADES E CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO
A motivação e a relevância de se realizar esse estágio pós-doutoral na
Faculdade de Letras da UFMG é motivada pela orientadora escolhida, Profa. Dra.
Silvana Pessoa. Além de ser profunda conhecedora da literatura portuguesa
contemporânea e da obra de Lobo Antunes, a professora Silvana foi minha orientadora
de doutorado entre 2003 e 2006. Nos anos que se seguiram, já desenvolvemos
projetos juntos, e sempre houve uma afinidade de interesses entre os trabalhos da
pesquisadora e o meu. É fundamental ainda citar-se o nível de excelência que desfruta
a pós-graduação em Estudos Literários da UFMG no cenário de pesquisa no Brasil.

PLANO DE PESQUISA DE PÓS-DOUTORADO


 Introdução – Apresentação dos autores e de suas obras e sua inserção no cenário
literário/filosófico contemporâneo. Comentários sobre sua fortuna crítica.
 Capítulo 1 – Ensaio sobre Da Natureza dos Deuses
 Capítulo 2 – Ensaio sobre Para aquela que está sentada no escuro à minha espera
 Capítulo 3 – Ensaio sobre Até que as pedras se tornem mais leves que a água
 Capítulo 4 – Ensaio sobre A última porta antes da noite
 Capítulo 5 – Ensaio sobre A outra margem do mar
 Capítulo 6 – Ensaio sobre Diccionario da linguagem das flores
 Conclusão.

PLANO DE ATIVIDADES E CRONOGRAMA


Março de 2022: chegada a Belo Horizonte, instalação, visita à UFMG e apresentação
à professora Silvana Pessoa; primeiros encontros, acerto das linhas gerais do trabalho
a ser desenvolvido, conhecimento da equipe de pesquisa, ambientação. Continuação
da pesquisa dos textos de Lobo Antunes e Blanchot.
Abril de 2022: Redação de um capítulo da tese.
Maio de 2022: encontros de trabalho com a orientadora. Redação da introdução do
trabalho.
Junho de 2022: encontros de trabalho com a orientadora; pesquisa bibliográfica.
Redação da introdução do trabalho.
Julho de 2011: encontros de trabalho com a orientadora; pesquisa bibliográfica;
participação e reuniões do grupo de pesquisa da UFMG e em cursos que sejam
oferecidos nesta e noutras universidades. Redação de um ensaio.

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Agosto e setembro de 2011: encontros de trabalho com a orientadora; pesquisa
bibliográfica; participação e reuniões do grupo de pesquisa da Universidade de
Coimbra e em cursos que sejam oferecidos nesta e noutras universidades. Redação
de um ensaio. Ministração de um minicurso de 30 horas sobre a obra de António Lobo
Antunes, já solicitado pela orientadora.
Outubro e novembro de 2001: encontros de trabalho com a orientadora; pesquisa
bibliográfica; participação e reuniões do grupo de pesquisa da Universidade de
Coimbra e em cursos que sejam oferecidos nesta e noutras universidades. Redação
de um ensaio.
Dezembro de 2011: etapa final do pós-doutorado na UFMG; conclusão do texto
referente à pesquisa de pós-doutorado.

FORMA DE ANÁLISE DE RESULTADOS


A forma mais eficiente de análise de resultados desse tipo de trabalho é a
recepção do mesmo pela comunidade acadêmica. Essa avaliação, contudo, não é
imediata, demanda algum tempo para se formar e consolidar.
Num primeiro momento, a análise tem que passar necessariamente pela
autocrítica do autor, confrontando o projeto proposto com a realização. Paralelamente,
a própria equipe que acompanhará o trabalho, e especialmente a professora Silvana
Pessoa, com seu rigor crítico, farão avaliações da qualidade do trabalho realizado.
Num terceiro momento, os grupos de pesquisa em que atuo no Brasil darão
seu testemunho da relevância do trabalho realizado, o qual se incorporará
imediatamente ao acervo das pesquisas em andamento.
Na sequência, o trabalho estará exposto à apreciação da comunidade
acadêmica, que manterá em andamento o processo de avaliação.
Em termos materiais, o estágio pós-doutoral em Portugal produzirá um livro de
ensaios sobre os últimos romances de Lobo Antunes. Esse é um indicador mensurável
do compromisso assumido.

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Este projeto de pesquisa propõe um estudo de sete romances de Lobo Antunes,


considerando as concepções de escritura de Blanchot e de outros pensadores que com
ele dialogam.
Em 2005, realizei Estágio de Doutorado em Évora, Portugal, com apoio do
CCNPq, onde finalizei a tese, em que foram estudados sete romances de Lobo Antunes.
A orientadora da tese foi a Profa. Dra. Silvana Pessoa, da UFMG, e foi assistida em
Portugal pelo Prof. Dr. Jorge Figueiredo Jorge, da Universidade de Évora.
Em 2011, foi publicado um livro pela Editora Universidade da UFC contendo
treze ensaios sobre a obra de Lobo Antunes
Ainda em 2011, fiz Estágio Pós-Doutoral em Coimbra, com apoio do CNPq.
Produzi oito ensaios, uma resenha e uma tradução. Em 2012 obtive uma Bolsa PQ,
vigente até o momento. Em agosto de 2022, deverei propor minha progressão para
Titular.
Até o presente momento, já publiquei 19 ensaios e resenhas sobre a obra de
Antunes, além dos treze textos constantes do livro citado.
A respeito da articulação entre Lobo Antunes e Maurice Blanchot, pode-se dizer
que uma estabelece com a outra um diálogo rico e surpreendente. Para o pensador
francês, a literatura só se realiza no domínio da impossibilidade, na busca não-
explicitada da escrita. A escritura antuniana sucumbe a esse domínio órfico, propiciando
várias figurações: a errância e a dispersão; a mentira e a inutilidade da escrita; a
impossibilidade da morte; a desarmonia e o dissenso; a tolice do todo-dito no mundo; a
apresentação de um contramundo em detrimento do relato em espelho; a anulação da
hierarquia entre escritor e personagem; a luta do personagem para mudar a escrita; a
incompletude e a insolubilidade do relato; a potência silenciosa da palavra fria.
Nossa crença é de que há aí vasto material para se conduzir uma investigação
comparatista que mostre pontos de vista relevantes para o desenvolvimento de uma
reflexão crítica sobre a obra do ficcionista português

This research project proposes a study of seven novels by Lobo Antunes, considering
Blanchot's conceptions of writing and other thinkers who dialogue with him.
In 2005, I completed my Doctoral Internship in Évora, Portugal, with the support of
CNPq, where I finished my thesis, in which seven novels by Lobo Antunes were stud-
ied. The thesis advisor was Prof. Dr. Silvana Pessoa, from UFMG, and was assisted in
Portugal by Prof. Dr. Jorge Figueiredo Jorge, from the University of Évora.
In 2011, a book was published by Editora UFC containing thirteen essays on the work
of Antunes
Also in 2011, I did a Post-Doc in Coimbra, with CNPq's support. I produced eight es-
says, a review and a translation. In 2012, I received a PQ Scholarship, which is cur-
rently in effect. In August 2022, I will propose my progression to Holder (Titular).
Up till now, I have published 19 essays and reviews on Antunes' work, in addition to
the thirteen texts contained in the aforementioned book.
Regarding the articulation between Lobo Antunes and Blanchot, it can be said that one
establishes a rich dialogue with the other. For the French thinker, literature only takes

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place in the domain of impossibility, in the non-explicit search for writing. Antunian writ-
ing succumbs to this Orphic domain, providing various figurations: wandering and dis-
persion; the lie and the uselessness of writing; the impossibility of death; disharmony
and dissension; the foolishness of the all-said in the world; the presentation of a
counter-world to the detriment of the mirror account; the annulment of the hierarchy be-
tween writer and character; the character's struggle to change the writing; the incom-
pleteness and insolubility of the report; the silent potency of the word.
Our belief is that there is vast material there to conduct a comparative investigation that
shows relevant points of view for the development of a critical reflection on the
work of the Portuguese fiction writer.

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