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Juliano Andrade e Paula Emerick

The tango that happens between step and step

Muitas vezes vemos ou sentimos que o foco de um dançarino está no final de um passo:
quando uma transferência do peso já aconteceu ou um pivô já terminou, por exemplo. Isso faz
com que a dança se veja e se sinta cortada.

Assim, nossa dica sobre esse ponto é: dance o tango que acontece entre cada passo. Para isso,
use todo o corpo para dançar: perna de base, torso, costas, braços, mãos também estão
envolvidos no movimento, não somente a perna livre e os pés. Pense na dança como algo
dinâmico e não como algo pontual. Também controle cada transferência de peso e como o
eixo viaja no espaço: por todo o pé da perna de base (muita coisa pode acontecer no trajeto
entre o calcanhar e o metatarso), entre uma perna e outra e também como as articulações do
quadril, joelho e tornozelo trabalham para receber o peso do corpo para a nova perna de base.

A ideia é pensar que não existe um momento em que se deixa de dançar, nem mesmo durante
a pausa. Para ser gráficos, é diferente dançar uma linha contínua (ainda que com suas
variações de cor, textura, espessura, altura), do que dançar vários pontos desconectados. Isso
permitirá uma conexão mais profunda com seu parceiro, ampliará as possibilidades de
interpretar a música, trará mais estabilidade para o casal e fará com que seja visto e sentido
muito mais dança e tango cada vez que você se abraçar alguém para compartilhar um tango.

Quantidade ou qualidade?

O importante é o que fazemos ou como fazemos? Qual é a quantidade mínima de movimentos


diferentes necessária para tornar o bailar interessante?

Para nós, o movimento compõe uma primeira camada sem a qual não se atinge as demais
(musicalidade, conexão, interpretação...). O aluno iniciante provavelmente está focado
unicamente no que fazer.

O que buscamos alertar é para que se tenha cuidado com a armadilha da repetição mecânica e
sem reflexão do movimento. A busca e excitação somente pelo novo passo pode deixar a
dança vazia. Quanto mais alguém avança e amadurece, mais tende a buscar o como fazer cada
movimento. E, claro, em algum ponto há um retorno da busca por novas ferramentas para
depois explorar de novo como usá-la, num ciclo infinito, se pode dizer.

A reflexão pode ser muitas vezes algo trabalhoso, mas não menos gratificante e prazeroso. A
medida certa entre qualidade e quantidade é uma decisão muito pessoal, mas sugerimos que
não deixe sua balança pesar muito só para um lado.

Use contrastes

Uma dança muito mais interessante pode ser criada se você usar contrastes. E isso se aplica
em muitos aspectos. Podemos pensar em contrastes de diferentes tamanhos de passos
(grandes ou pequenos), de intensidade de movimento (intenso ou suave), de ocupação do
espaço (linear ou circular), de velocidade (lento ou rápido), de altura (alto ou baixo, o que cria
cadência na sua dança), de complexidade (simples ou complexo).

O que mais você pode usar para criar contrastes? Ao tentar responder essa pergunta, você
está abrindo possibilidades de fazer os mesmos passos de diferentes maneiras. Não existe uma
única maneira de caminhar. Um simples ocho pode parecer totalmente diferente dependendo
de como você sente que a música te leva a fazê-lo. Nossa recomendação então é: sempre
procure diferentes maneiras de se expressar e transite entre elas. Isso é importante tanto em
uma coreografia quanto no improviso.

To dance the silence

Isso é algo que você provavelmente já ouviu e que tem muitas acepções possíveis. Para nós,
dançar o silêncio está relacionado a saber explorar e dançar as pausas. A maneira mais clara de
fazer isso é fazer pausa quando a orquestra para, mas não só.

Muitas vezes dançar tango não se trata de fazer, mas de não fazer. Assim, deixar passar é tão
importante quanto agarrar algo na música. E para agarrar algo é necessário antes estar em
calmaria.

Outro importante detalhe sobre dançar o silêncio: pode parecer contraditório, mas nunca pare
de dançar enquanto você faz uma pausa. Para isso, duas principais ferramentas são:

1) continue se movimentando enquanto faz a "pausa", de maneira sutil, suave, muito lenta, de
modo que a pausa signifique não ausência de movimento, mas a desaceleração do corpo à
quase ausência de movimento (quase!). Para que você tenha a imagem e possa buscar a
sensação, pense num barco flutuando. A conexão deve continuar, o abraço pode se mover
suavemente, os corpos respiram, pode haver uma transferência de peso super lenta, os
músculos podem ir mudando de tonicidade, a perna livre pode adornar...;

2) numa pausa acentuada, em que a ideia é realmente parar e não reverberar como no caso
anterior, continue preservando a tensão que mantém a conexão dentro do abraço e não
simplesmente desconecte o seu corpo do momento ou do seu parceiro.

Não acredite em verdade absoluta

Não acreditamos que há uma verdade absoluta sobre como dançar tango. Faz parte da
aprendizagem e evolução no baile experimentar ideias contraditórias e pontos de vista
diferentes, para então descobrir como seu corpo se move. Naturalmente há técnicas que por
uma questão de biomecânica são mais eficientes para execução de certo movimento com
conforto. Também não podemos deixar de mencionar que a tradição do tango estabeleceu ao
longo do tempo alguns conceitos como sendo certos ou errados (forma de circulação na pista,
por exemplo, para citar um sobre o qual existe bastante consenso).

Nosso ponto, no entanto, é aconselhar você a manter a mente aberta para conseguir explorar
possibilidades e evoluir. Buscar sempre melhorar, mesmo que você se permita fazer isso de
forma lenta às vezes, requer algumas vezes quebrar paradigmas. Então é isso, antes de
construir conceitos, experimente diferentes possibilidades.
Juliano Andrade e Paula Emerick

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