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14/09/2017 Pocket: Conheça as palavras 'intraduzíveis' que revelam emoções que você possivelmente nem sabe que sente

Conheça as palavras 'intraduzíveis' que


revelam emoções que você possivelmente
nem sabe que sente
www.bbc.com

Conheça as palavras 'intraduzíveis' que revelam


emoções que você possivelmente nem sabe que sente
David Walker BBC Future

Você já se sentiu um pouco mbuki-mvuki - aquela vontade irresistivel de


tirar as roupas enquanto dança? Ou talvez tenha batido aquele kilig - uma
tremedeira nervosa ao falar com alguém de quem gosta? E o que dizer do
uitwaaien - que de ne os efeitos revitalizantes de uma caminhada aa vento?

Essas palavras - do bantu (África), tagalo (Filipinas) e holandês - não


possuem correspondente direto em inglês, mas representam experiências
emocionais precisas, negligenciadas na língua mais importante do mundo. E
se o pesquisador Tim Lomas, da Universidade do Leste de Londres, estiver
no caminho certo, talvez elas em breve se tornem mais familiares.

Um projeto de Lomas, batizado Lexicogra a Positiva, quer capturar os


diferentes "sabores" de sentimentos positivos (alguns são bem amargos)
encontrados pelo mundo, para que possamos começar a incorporá-los em

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nosso cotidiano.

O inglês já incorporou "palavras de emoção" de outras línguas - como o


"frisson" do francês ou o "schadenfreude" (prazer derivado do fracasso
alheio) do alemão - , mas há muitas palavras que ainda não chegaram ao
nosso vocabulário. Lomas identi cou centenas dessas experiências
"intraduzíveis" - e está apenas começando.

Aprender essas palavras, a rma ele, pode nos oferecer um entendimento


mais rico de nós mesmos. "Elas oferecem uma maneira bem diferente de ver
o mundo", diz.

Lomas a rma que se inspirou após ouvir uma palestra sobre o conceito
nlandês de sisu, que é um tipo de "determinação extraordinária diante da
adversidade".

Segundo nlandeses, as ideias de "perseverança" e "resiliência" não chegam


nem perto de descrever a força interior contida nesse termo local. É algo
"intraduzível" nesse sentido: não ha equivalente direto ou fácil no
vocabulário do ingles que capture essa profundidade do termo.

Intrigado, Lomas começou a buscar mais exemplos, entre amigos


estrangeiros e na literatura acadêmica. Os primeiros resultados do projeto
foram publicados em 2016 no periódico Journal of Positive Psychology.

Muitos dos termos se referiam a sentimentos positivos bem especí cos, que
dependem de circunstâncias particulares:

- Desbundar (português) - abandonar as inibições para se divertir

- Tarab (árabe) - um estado de êxtase ou encantamento induzido pela música

- Shinrin-yoku (japonês) - o relaxamento que vem de um banho na oresta,


em sentido gurado ou literal

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- Gigil (tagalo) - a vontade irresistível que beliscar ou apertar alguém muito


querido ou amado

- Yuan bei (chinês) - um senso de realização completa e perfeita

- Iktsuarpok (inuíte) - a ansiedade sentida ao esperar por alguém, aquela de


car sempre checando se a pessoa já chegou

Mas outras palavras representam experiências ainda mais complexas e


amargas, que podem ser cruciais ao nosso amadurecimento.

- Natsukashii (japonês) - um sentimento nostálgico de falta do passado, com


alegria pela lembrança, mas tristeza pelo tempo que não volta mais

- Wabi-sabi (japonês) - uma "sublimidade desolada e obscura", centrada na


transitoriedade e imperfeição na beleza

- Saudade (português) - uma nostalgia melancólica por uma pessoa, lugar ou


coisa que está longe no tempo ou espacialmente - um desejo vago por algo
que pode nem existir

- Sehnsucht (alemão) - um desejo intenso por estados alternativos de


vivência e realizações da vida, mesmo que sejam inatingíveis

Além dessas emoções, a lexicogra a (redação e produção de dicionários) de


Lomas também enumerou características pessoais e comportamentos que
podem determinar nosso bem-estar de longo prazo e modos como
interagimos com outras pessoas.

- Dadirri (aborígene australiano) - um ato profundo e espiritual de escutar


de forma re exiva

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- Pihentagyú (húngaro) - signi ca literalmente "com o cérebro relaxado" e


descreve pessoas de pensamento ágil que trazem piadas ou soluções
so sticadas

- Desenrascanço (português) - livrar-se de uma situação embaraçosa de


maneira criativa

- Sukha (sânscrito) - felicidade genuína e duradoura, independentemente


das circunstâncias

- Orenda (huron) - poder humano de mudar o mundo diante de forças


poderosas como o destino

Há muitos outros exemplos no site de Lomas, onde você também pode


submeter suas próprias sugestões de palavras. O pesquisador reconhece que
muitas das descrições que oferece até agora são apenas aproximações dos
signi cados verdadeiros dos termos. "O projeto é um trabalho em aberto, e
estou permanentemente tentando re nar as de nições. Comentários e
sugestões das pessoas são muito bem-vindos."

No futuro, Lomas espera que outros psicólogos possam investigar as causas


e consequências dessas experiências - para ampliar nossa compreensão das
emoções para além dos conceitos em inglês que dominaram as pesquisas até
agora.

Mas estudar esses termos não re ete um interesse apenas cientí co; Lomas
acredita que conhecer melhor essas palavras pode de fato mudar a maneira
como sentimos, ao chamar nossa atenção para sensações que até então
ignorávamos.

"Em nosso uxo de consciência - aquela enxurrada de diferentes sensações e


emoções - há tanta coisa para processar que muitas passam despercebidas",
a rma o psicólogo.

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"Os sentimentos que aprendemos a reconhecer e rotular são aqueles que


percebemos - mas há muitos outros que talvez nem saibamos. Acho que
incorporar essas novas palavras pode nos ajudar a articular áreas da
experiência que mal notamos."

Classi cando emoções


Para comprovar sua ideia, Lomas cita o trabalho de Lisa Feldman Barrett, da
Universidade Northeastern, que mostra que nossas capacidades de
identi car e classi car emoções podem ter efeitos mais abrangentes.

A pesquisa de Barrett se inspirou na observação de pessoas que usam


diferentes palavras para descrever as mesmas emoções, enquanto outras são
bem precisas nas descrições.

"Algumas pessoas usam palavras como ansiedade, medo, raiva e nojo para se
referir a um estado geral de se sentir mal", diz ela. "Para elas, as palavras são
sinônimos, mas outras são sentimentos diferentes associados a ações
distintas."

Isso é algo chamado "granularidade das emoções" e ela normalmente mede


esse indicador pedindo que entrevistados deem notas a seus sentimentos a
cada dia por algumas semanas. Ela calcula a variação e as nuances nesses
relatórios: se os mesmos termos sempre coincidem, por exemplo.

Ela descobriu que isso determina como lidamos com a vida. Se você tem
mais facilidade em descrever se se sente desesperado ou ansioso, por
exemplo, você pode ter mais facilidade para lidar com esses sentimentos: se
irá conversar com um amigo ou assistir a uma comédia.

Nesse sentido, o vocabulário de emoções é quase como um arquivo, que


permite recorrer a um número maior de estratégias para lidar com a vida.

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Pessoas com indices altos de granularidade de emoções são melhores em se


recuperar do estresse e tem menor propensão a beber para se recuperar de
situações difíceis. E podem até ter melhores performances acadêmicas.

Marc Brackett, da Universidade de Yale, apontou que ensinar crianças de 10


e 11 anos um vocabulário de emoções mais amplo elevou as notas e
promoveu melhor comportamento em sala de aula. "Quanto mais granular é
a nossa experiência das emoções, mais somos capazes de compreender
nossa vida interior", diz Brackett.

Brackett e Barrett concordam que a "lexicogra a positiva" de Lomas pode


ser um bom impulso para começar a identi car os contornos mais sutis de
nosso horizonte emocional. "Acho que é nem útil - você pode pensar nas
palavras e conceitos associados como ferramentas para a vida", diz Barrett.
Elas podem até nos inspirar para novas experiências, ou apreciar
experiências antigas sob um novo olhar.

Esse é um caminho de pesquisa que Lomas gostaria de explorar no futuro.


Enquanto isso, ele continua a ampliar seu dicionário - que já tem quase mil
termos.

De todas as palavras que descobriu até agora, o pesquisador diz que costuma
se pegar re etindo sobre conceitos japoneses como wabi-sabi (aquela
sublimidade obscura envolvendo transitoriedade e imperfeição). "Ele
dialoga com a ideia de encontrar beleza em fenômenos imperfeitos e
velhos", a rma ele. "Ver o mundo por meio desse prisma pode ser uma
maneira diferente de se envolver na vida."

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