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Ensino

Profissional

QUÍMICA EXTENSÃO 3
Equilíbrio químico
heterogéneo
Maria da Conceição Dantas
Maria Teresa Fontinha
Marta Duarte Ramalho
Revisão científica: João Sotomayor
Extensão 3

Equilíbrio
químico
heterogéneo

1 Equilíbrio químico
heterogéneo
Equilíbrio químico
1 heterogéneo
1.1 Equilíbrio de solubilidade

Geólogo na Caverna dos Cristais, na região de Naica, México. Estes cristais de selenite
são os maiores cristais conhecidos e formaram-se ao longo de milhares de anos.

Não há solventes universais, isto é, solventes que dissolvam todo e


qualquer soluto. Não são só as características do solvente que determinam
a solubilidade, mas também a relação entre as características do solvente
e as características do soluto.
Soluto
A dissolução é o processo espontâneo de dispersão de um soluto num
solvente que conduz à formação de uma solução. Este processo depende
das características do soluto e do solvente (Fig. 1).

Solvente Solução
Quando se trata de uma dissolução de sólidos em líquidos, a uma de-
terminada temperatura, essa dissolução pode ser acelerada aumentando
o estado de divisão do soluto (ficando as partículas de soluto com menores
Fig. 1 Dissolução de açúcar em água. dimensões) e a agitação.

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

Nem o estado de divisão do soluto nem a agitação da solução fazem


aumentar a solubilidade: permitem apenas que o soluto se dissolva mais
rapidamente no solvente.
Ao adicionarmos um soluto sólido, pouco a pouco, a um solvente líquido,
a uma dada temperatura constante, verifica-se que a certa altura não se
consegue dissolver mais soluto. Diz-se então que se obteve uma solução
saturada a essa temperatura.
A solubilidade, s, é o valor da concentração da solução saturada.
Geralmente, a solubilidade exprime-se como a quantidade de soluto
(em gramas) que se pode dissolver em 100 g de solvente, a uma dada
temperatura.

massa de soluto
s= × 100
massa de solvente

Devido às suas características, a água consegue dissolver um grande


número de substâncias, tanto sólidas como líquidas ou gasosas. Contudo,
nem todos os sais se dissolvem bem em água: por exemplo, o cloreto de
sódio é muito solúvel em água, mas já o cloreto de prata é muito pouco
solúvel em água.

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

1.2 E
 quilíbrio de solubilidade em
soluções saturadas de sais
pouco solúveis

Como já referimos, há sais que se dissolvem muito pouco em água;


são exemplos o carbonato de cálcio, CaCO3, o sulfato de bário, BaSO4,
e o cloreto de prata, AgC.
Se a um copo com água se adicionar carbonato de cálcio, CaCO3, em
Ca2+ (aq)
pó, só uma quantidade muito pequena desse sal se dissolve: a solução fica
rapidamente saturada, o que é verificado pelo sólido que se deposita no
CO32– (aq) fundo do copo, sem se dissolver. À temperatura da experiência, a solução
fica saturada com uma quantidade muito pequena de sal dissolvido.
CaCO3 (s)
A parte do sal que se dissolve dissocia­‑se completamente em iões (Fig. 2).
Fig. 2 Passagem dos iões Ca2+ e CO32–
do sólido para a solução, e desta para CaCO3 (aq) → Ca2+ (aq) + CO32– (aq)
o sólido.
Na solução saturada existe a quantidade máxima possível de iões
Ca2+ e CO32–, à temperatura da experiência. No entanto, se se juntar um
pouco de carbonato de cálcio radioativo, passado pouco tempo a solução
fica radioativa. Isso indica que houve dissolução de mais sólido, pois o
carbonato de cálcio, CaCO3, radioativo, deu origem a iões radioativos, que
terão passado à solução.
Como a solução já tinha a concentração máxima possível em iões,
conclui­‑se que parte dos iões positivos e negativos se juntaram, dando
origem ao sólido, isto é, precipitando. Verifica­‑se assim que há uma
situação de equilíbrio entre o CaCO3 sólido e os iões Ca2+ e CO32–, em
solução aquosa.
CaCO3 (s) → 2+ 2–
← Ca (aq) + CO3 (aq)

Este é um exemplo de equilíbrio heterogéneo, pois envolve com­po­


nentes em estados físicos diferentes. Tal como qualquer outro equilíbrio,
este equilíbrio é dinâmico: há uma troca recíproca entre iões da rede
cristalina e da solução.

Constante de produto de solubilidade, ou produto


de solubilidade
Para a reação em equilíbrio, CaCO3 (s) → 2+ 2–
← Ca (aq) + CO3 (aq)
a constante de equilíbrio será:
[Ca2+]e [CO2–]
3 e
K=
[CaCO3]e

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

No entanto, quando a concentração de um componente é constante, o


seu valor é incluído no valor da constante de equilíbrio. Ora, a concentra-
ção de um sólido puro não depende da quantidade de sólido, é constante,
o que nos permite definir o produto de solubilidade, Ks.

Para a reação em questão, será:

Ks = [Ca2+]e [CO32–]e

Outro exemplo: consideremos o fluoreto de cálcio, CaF2 (Fig. 3). Para a


reação em equilíbrio,
Fig. 3 Mineral fluorite, principal fonte
CaF2 (s) → 2+ –
← Ca (aq) + 2 F (aq)
de extração do fluoreto de cálcio, CaF2.

o produto de solubilidade será:

Ks = [Ca2+]e [F–]2e

Relação entre a solubilidade e o produto de solubilidade


Consideremos de novo a reação de equilíbrio entre o carbonato de
cálcio, CaCO3, sólido e os iões cálcio, Ca2+, e os iões carbonato, CO32–, em
solução. Cada mole de CaCO3 que se dissolve dissocia­‑se, originando 1 mol
de iões cálcio, Ca2+, e 1 mol de iões carbonato, CO32–. Como numa solução
saturada desse sal estão dissolvidos s mol por dm3, então a concentração
de iões cálcio, Ca2+, em solução será de s mol dm–3. Igualmente,
a concentração de iões carbonato, CO32–, será s mol dm–3.

Assim:

CaCO3 (s) →
← Ca (aq) + CO3 (aq)
2+ 2–

ci / mol dm–3 – 0 0

ceq / mol dm–3 – s s

Então, neste exemplo, temos:

Ks = [Ca2+]e [CO32–]e
Ks = s2 ⇔ s = √Ks

Analisemos agora a seguinte reação de equilíbrio:

CaF2 (s) → 2+ –
← Ca (aq) + 2 F (aq)

Neste caso, cada mole de CaF2 que se dissolve origina uma mole de
Ca2+ e duas moles de F–.

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

Como na solução saturada estão dissolvidas s moles por cada dm3,


então no equilíbrio a concentração dos iões em solução será s mol dm–3
de Ca2+ e 2s mol dm–3 de F–.

CaF2 (s) →
← Ca (aq) + 2 F (aq)
2+ –

ci / mol dm–3 – 0 0

ceq / mol dm–3 – s 2s

Como Ks = [Ca2+]e [F–]2e , a relação entre o produto de solubilidade e a


solubilidade deste sal é a seguinte:

Ks = s (2s)2 → Ks = 4s3 ⇔ s =  K4
3 s

Por último, consideremos a reação de equilíbrio do fosfato de cálcio,


Ca3(PO4)2, com os seus iões constituintes, Ca2+ e PO43–.

Ca3 (PO4)2 (s) →


← 3 Ca (aq) + 2 PO4 (aq)
2+ 3–

ci / mol dm–3 – 0 0

ceq / mol dm–3 – 3s 2s

Como Ks = [Ca2+]3e [PO43–]2e, a relação entre o produto de solubilidade


e a solubilidade deste sal é a seguinte:

Ks = (3s)3 (2s)2 → Ks = 108 s5 ⇔ s =  108K


5 s

Conclui­‑se assim que, para sais estequiometricamente idênticos, como


o sulfato de cálcio, CaSO4, e o cloreto de prata, AgC, quanto maior é o
valor do produto de solubilidade, Ks, maior é a solubilidade do sal, e vice­
‑versa.
Exemplos (a 25 oC):
Ks (AgC) = 1,6 × 10–10 e s = 1,26 × 10–5 mol dm–3
Ks (CaSO4) = 2,4 × 10–5 e s = 1,82 × 10–2 mol dm–3

Só em sais com fórmulas Noutros casos, um produto de solubilidade mais elevado não corres­
estequiométricas idênticas se pode
ponde necessariamente a uma solubilidade mais elevada para o sal.
deduzir (sem cálculos) que ao maior
valor de Ks corresponde maior Exemplos (a 25 oC):
solubilidade.
Ks (AgC) = 1,6 × 10–10 e s = 1,26 × 10–5 mol dm–3
Ks (Ag2CO3) = 6,2 × 10–12 e s = 1,16 × 10–4 mol dm–3

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

Exercício resolvido

1. Qual a concentração dos iões Ag+ e CrO42– numa solução saturada


de Ag2CrO4, a 25 ºC?
O produto de solubilidade do sal cromato de prata, a 25 ºC,
é Ks = 1,3 × 10–12

Resolução

. Cálculo da solubilidade (s) a partir do valor de Ks


A equação de equilíbrio de uma solução saturada de cromato de prata
em contacto com o sólido

Ag2CrO4 (s) →
← 2Ag (aq) + CrO4 (aq)
+ 2–

ci / mol dm−3 – 0 0
−3
ceq / mol dm – 2s s

Ks = [Ag+]2e [CrO42–]e → Ks = (2s)2 (s) ⇔ Ks = 4s3

⇔s=  3 Ks
4
→s= 
3 1,3 × 10–12
4
s = 6,88 × 10–5 mol dm–3

. Cálculo das concentrações dos iões


[Ag+] = 2s → [Ag+] = 1,38 × 10–4 mol dm–3
[CrO42–] = s → [CrO42–] = 6,88 × 10–5 mol dm–3

Resultado: [Ag+] = 1,4 × 10–4 mol dm–3


[CrO42–] = 7 × 10–5 mol dm–3

Exercícios para resolver


PROFESSOR
1. A 25 °C, o produto de solubilidade do sulfato de prata, Ag2SO4,
é 1,20 × 10–5. SOLUÇÕES
Calcule a solubilidade deste sal à temperatura assinalada. 1. s = 1,44 × 10–2 mol dm–3

2. m = 1,1 g
2. Determine a massa de cloreto de chumbo, PbC2, que se pode dis-
solver, no máximo, em 250 mL de água, supondo que não há varia-
ção de volume.
Dados: Ks (PbC2) = 1,70 × 10–5; M (PbC2) = 278,10 g mol–1

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

1.3 Formação de precipitados

Juntando volumes aproximadamente iguais de soluções de AgNO3 e


de NaC, ambas com a concentração de 1,0 × 10–6 mol dm–3, não se deteta
qualquer alteração. No entanto, adicionando também volumes iguais das
mesmas soluções, mas de concentração 1,0 × 10–2 mol dm–3, forma­‑se um
precipitado branco de cloreto de prata, AgC (Fig. 4).

Uma aplicação importante do produto de solubilidade é permitir saber


se, juntando duas soluções de sais muito solúveis, se formará ou não um
precipitado de um outro sal pouco solúvel.
Fig. 4 Precipitado branco de AgC. No exemplo que demos, havendo formação de precipitado, a equação
que traduz a reação é:
AgNO3 (aq) + NaC (aq) → AgC (s) + NaNO3 (aq)
e a equação iónica correspondente, eliminando os iões espetadores, que
não participam na reação, é:
Ag+ (aq) + C– (aq) → AgC (s)
Assim, coloca­‑se a seguinte questão: quando é que a presença em
solução de iões de um sal pouco solúvel leva à formação de precipitado
desse sal?
A resposta será: haverá formação de precipitado quando as concen­
trações dos iões do sal em solução forem tais que levem à saturação da
solução nesse sal.

Para avaliar uma solução relativamente à saturação num determinado


sal, há que determinar o quociente da reação de solubilidade, Qs.
Haverá condições de formação de precipitado quando o quociente da
reação, Qs, for maior do que o respetivo Ks.

Em síntese:

• Se Qs < Ks ⇒ não há formação de precipitado.


• Se Qs = Ks ⇒ atinge-se a saturação.
• Se Qs > Ks ⇒ há formação de precipitado.

À semelhança do cálculo de Qc, o cálculo de Qs é realizado usando para


o efeito as concentrações das espécies iónicas presentes num sistema
reacional, num dado momento.

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

Por exemplo, para prever a formação de precipitado de AgC num


determinado momento, a expressão para o cálculo do quociente da reação
de solubilidade é:
Qs = [Ag+] [C–]

Exercício resolvido

2. Adicionaram­‑se 0,10 g de nitrato de prata a 50 cm3 de uma solução


aquosa de acetato de sódio de concentração 0,05 mol dm–3.
Haverá formação de precipitado?
(Despreze a variação de volume.)
Dados: Ks (AgCH3COO) = 4,4 × 10–4; M (AgNO3) = 169,88 g mol–1

Resolução

Se houver precipitação, a equação correspondente será:


AgNO3 (aq) + NaCH3COO (aq) → AgCH3COO (s) + NaNO3 (aq)
e a equação de equilíbrio na solução saturada será:
AgCH3COO (s) → + –
← Ag (aq) + CH3COO (aq)

. Cálculo das concentrações dos iões Ag+ e CH3COO− em solução


[CH3COO–] = [NaCH3COO] = 0,05 mol dm–3
AgNO3 (aq) → Ag+ (aq) + NO3– (aq)
nAg+ = nAgNO
3
m 0,10
nAg+ = nAgNO → nAg+ = ⇔ nAg+ = ⇔ nAg+ = 5,89 × 10–4 mol
3 M 169,8
n 5,89 × 10–4
[Ag+] = → [Ag+] = ⇔ [Ag+] = 0,0118 mol dm–3
V 50 × 10–3

. Cálculo do quociente da reação


Qs = [Ag+] [CH3COO–] → Qs = 0,0118 × 0,05 ⇔ Qs = 5,9 × 10–4
Qs > Ks

Resposta: Como Qs > Ks, há formação de precipitado.

Exercícios para resolver


PROFESSOR
3. Adicionaram­‑se 40,0 cm3 de solução de nitrato de magnésio
0,02 mol dm–3 a 60,0 cm3 de uma solução de hidróxido de sódio SOLUÇÕES
0,05 mol dm–3.
Verifique se há formação de precipitado. 3. Como Qs > Ks há formação de
precipitado.
Dado: Ks [Mg(OH)2] = 1,1 × 10–11
4. Como Qs > Ks há formação de
4. Misturaram­‑se volumes iguais de solução de nitrato de prata precipitado.
0,0010 mol dm–3 e de solução de cloreto de potássio 0,0020 mol dm–3.
Preveja se há formação de precipitado.
Dado: Ks (AgC) = 1,6 × 10−10

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

1.4 F
 atores que alteram o equilíbrio
de solubilidade

Em muitas situações há interesse em formar um precipitado, mas em


muitos outros casos é preciso solubilizar precipitados.
O princípio de Le Châtelier ajuda­‑nos a prever como varia a solu­
bi­lidade de um sal sob o efeito de vários fatores, dado que se trata
de uma situação de equilíbrio químico. O princípio de Le Châtelier pode
ser enunciado da seguinte forma:

Se num sistema em equilíbrio se introduzir uma perturbação,


o sistema vai reagir no sentido de contrariar essa perturbação.

Efeito da temperatura
De acordo com o princípio de Le Châtelier, se a dissolução for um fenó­
meno exotérmico, o valor do produto de solubilidade e a solubilidade do
sal diminuem com o aumento de temperatura.

Fig. 5 A dissolução de sulfato de cobre Se, pelo contrário, a dissolução for um fenómeno endotérmico, o valor
em água é um processo endotérmico: do produto de solubilidade e a solubilidade do sal aumentam com o
formação de cristais de CuSO4 por
aumento da temperatura (Fig. 5).
arrefecimento.

Em síntese:

Aumento de A solubilidade
temperatura diminui
Dissolução
exotérmica
Diminuição de A solubilidade
temperatura aumenta

Aumento de A solubilidade
temperatura aumenta
Dissolução
endotérmica
Diminuição de A solubilidade
temperatura diminui

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

Efeito da concentração
Se no equilíbrio de uma solução saturada de um sal pouco solúvel se
fizer variar a concentração dos iões da solução, a solubilidade vai variar.
AB (s) → + –
← A (aq) + B (aq)
Aumentando a concentração de qualquer dos iões em solução,
o equilíbrio desloca­‑se no sentido inverso, diminuindo a solubilidade.
Pelo contrário, diminuindo a concentração de qualquer dos iões em
solução, o equilíbrio desloca­‑se no sentido direto, aumentando a solu­
bilidade e dissolvendo­‑se o precipitado. A variação da concentração dos
iões em solução pode ocorrer pelos seguintes efeitos:
• do ião comum;
• da adição de ácidos.

Efeito do ião comum


A solubilidade de um composto iónico em água, de acordo com o
princípio de Le Châtelier, diminui se aumentar a concentração de qualquer
dos seus iões em solução (um ião comum).
Como exemplo, comparemos, a 25 oC, a solubilidade do cloreto de prata,
AgC, em água e numa solução de cloreto de sódio 0,10 mol dm–3 (solução
que contém o ião comum C–). O valor do produto de solubilidade, Ks, para
o cloreto de prata é 1,6 × 10–10, a 25 oC.
Em água:
AgC (s) →
← Ag (aq) + C (aq)
+ –

ci / mol dm–3 – 0 0

ceq / mol dm–3 – s s

Ks = [Ag+]e [C–]e → Ks = s2 ⇔ s = 1,6 × 10–10 ⇔ s = 1,26 × 10–5 mol dm–3


Numa solução de NaC 0,10 mol dm–3, onde [C–] = 0,10 mol dm–3:

AgC (s) →
← Ag (aq) + C (aq)
+ –

ci / mol dm–3 – 0 0,10

ceq / mol dm–3 – s’ 0,10 + s’ ≈ 0,10

Como s’ vai ser muito menor que 0,10 mol dm–3 (por AgC ser um sal
muito pouco solúvel), pode desprezar­‑se na soma 0,10 + s’.
Como a temperatura não varia, o valor de Ks é o mesmo.
Ks = [Ag+]e [C–]e
1,6 × 10–10 = s’ × 0,10 ⇔ s’ = 1,6 × 10–9 mol dm–3
Como já tínhamos previsto teoricamente, verifica­‑se que a solubilidade
diminui devido ao efeito do ião comum.

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

Efeito da adição de ácidos

Praticamente todos os carbonatos, Quando o anião do sal pouco solúvel é uma base conjugada de um
hidróxidos e fosfatos, muitos ácido fraco, esse sal pode ser solubilizado pela adição de um ácido forte.
sulfuretos e sais pouco solúveis Exemplifiquemos com o precipitado de carbonato de cálcio, CaCO3, com
em água, podem dissolver-se
os seus iões em solução.
em ácidos fortes.
CaCO3 (s) → 2+ 2–
← Ca (aq) + CO3 (aq)

Adicionando um ácido forte, os iões CO32– vão aceitar protões desse


ácido.
CO32– (aq) + 2 H+ (aq) → CO2 (g) + H2O ()

? A concentração dos iões CO32– em solução vai ser, assim, reduzida. Pelo
Investigue os efeitos da dissolução princípio de Le Châtelier, o equilíbrio desloca­‑se no sentido direto, aumen­
do dióxido de carbono, CO2, em água tando a solubilidade do carbonato de cálcio. Adicionando uma quantidade
e elabore um relatório.
suficiente de ácido, todo o precipitado pode ser solubilizado.

Em síntese:

Efeito do ião A reação


A solubilidade
comum desloca-se no
diminui
sentido inverso

A reação
Efeito da adição A solubilidade
desloca-se no
de ácidos aumenta
sentido direto

A importância do equilíbrio de solubilidade


? Devido ao seu grande poder dissolvente, a água, ao atravessar ou
Recolha os rótulos de três águas
estan­do em contacto com diversos tipos de solos, dissolve alguns dos
de mesa diferentes e compare-as
quanto à salinidade total, acidez, seus constituintes, sobretudo sais. Por esta razão, todas as águas naturais
dureza e componentes específicos possuem em solução sais diversos, que contribuem para a dureza da
(determinados iões, espécies químicas água. A dureza da água (determinada pela sua concentração em iões Ca2+
anfotéricas, pares ácido-base
conjugados).
e Mg2+) também pode ter origem artificial. No tratamento das águas para
consumo humano, o ajustamento do pH nas estações de tratamento de
águas faz­‑se passando a água por um leito de pedras calcárias, o que reduz
o dióxido de carbono, CO2, mas ao mesmo tempo aumenta a concentração
em iões Ca2+.
?
Pesquise a remoção de poluentes de Um dos processos utilizados para tratar águas de efluentes é a preci-
águas, nomeadamente o tratamento pitação química. Neste processo são criadas as condições para que os
de águas municipais – os diversos iões dos elementos prejudiciais presentes na água formem compostos
tipos de tratamentos de água para
abastecimento da população.
insolúveis através de reações de precipitação. Estes precipitados podem
ser removidos por sedimentação e filtração ou ser usados noutros trata-
mentos posteriores.

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

A produção de vinho a partir das uvas é considerado um processo


químico. O fabrico do vinho passa por várias etapas, nomeadamente a
fermentação (etapa mais importante e complicada, onde a intervenção dos
químicos é crucial)

Na sua forma mais básica, a fabricação do vinho é simples. É feito


a partir da fermentação do sumo de uva (mosto) e é muito importante
a qualidade das castas utilizadas assim como o tratamento dos terrenos
da sua plantação.
O álcool no vinho surge com a fermentação dos açúcares – glicose e
frutose – feita por um elevado número de leveduras. Esta fermentação
denomina-se fermentação alcoólica, pois transforma os açúcares em
álcool e dióxido de carbono. Após a fermentação, o vinho pode ou não ser
deixado a maturar.
A maturação é um processo que ocorre entre o final da fermentação e
o envase. Dependendo do tipo de vinho, este processo ocorre em moldes
diferentes:
• vinho tinto – o processo ocorre maioritariamente em barris de car-
valho;
• vinho branco – o processo ocorre em cubas de aço inox.
À saída da cuba onde ocorre a fermentação, o vinho ainda não se
encontra totalmente limpo, pois contém detritos vegetais e leveduras,
mortas na sua maior parte, que assentam por gravidade – as chamadas
borras, as quais, no entanto, podem não assentar na totalidade, turvando o
vinho. É preciso, em alguns casos, clarificar o vinho.
Não existe um processo de clarificação adequado a todos os vinhos
pois, dependendo da natureza do vinho, se é tinto, branco, ou até mesmo
rosé, ou se se pretende que seja bebido novo ou após alguns anos, há que
saber escolher o processo de clarificação. ?
1. Pesquise a diferença entre os dois
Dois métodos possíveis de fazer a clarificação do vinho são a purificação
métodos de clarificação dos vinhos
e a filtração. Estes dois processos podem ser usados isoladamente ou em assinalados no texto.
conjunto. Se o método de purificação for suficiente, não existe necessidade 2. Indique qual a desvantagem da
de recorrer à filtração. clarificação por filtração.

A clarificação é também um procedimento muito utilizado na indústria


alimentar, nomeadamente no fabrico de sumos de frutas. Os sumos de
frutas existentes no mercado são obtidos de várias frutas e são muito bem
aceites pelas suas propriedades nutritivas. De acordo com as diferentes
características físico-químicas de cada fruta, os sumos têm diferentes
graus de turvação natural. Esta turvação e os sedimentos destes sumos
são devidos à presença de materiais insolúveis, os quais são responsáveis
pelo sabor, aroma e cor do sumo, entre outros.
Por exemplo, um sumo de pera passa por vários processos desde que
chega à fábrica até à sua comercialização. O fruto é primeiro classificado, ?
limpo, triturado e sofre uma prensagem, dando origem ao mosto. Depois, Pesquise a diferença entre os três
a clarificação pode ser realizada através de processos químicos, de métodos de clarificação dos sumos de
fruta identificados no texto.
processos físicos ou até bioquímicos.

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

Na indústria farmacêutica o efeito terapêutico de um fármaco depende,


entre outros fatores, da solubilidade das suas moléculas. A solubilidade é um
dos parâmetros mais importantes para alcançar a concentração desejada de
um fármaco na circulação sanguínea. Existem várias formas de aumentar
a solubilidade dos fármacos, nomeadamente modificando a sua estrutura,
adicionando compostos solubilizadores e controlando o pH, entre outras.

Nas grutas calcárias formam­‑se agulhas sólidas que pendem do


teto (estalactites) e outras que se elevam do solo (estalagmites) (Fig. 6).
O carbonato de cálcio, CaCO3, é muito insolúvel em água, mas é muito solú­-
vel na presença de dióxido de carbono, CO2. A formação de grutas calcárias
e a posterior formação de estalactites e estalagmites nessas grutas baseia­
‑se na alteração do estado de equilíbrio, traduzido pela equação:

CaCO3 (s) + H2O () + CO2 (g) → 2+ –


← Ca (aq) + 2 HCO3 (aq)

A solubilidade dos gases em água aumenta com a pressão. Assim, a


grande profundidade a concentração do dióxido de carbono, CO2, em
Fig. 6 As estalactites e as estalagmites águas profundas é elevada, o que faz deslocar o equilíbrio para a direita,
resultam da deposição de carbonato
provocando a dissolução do calcário (carbonato de cálcio, CaCO3) e
de cálcio contido numa solução
saturada. facilitando a formação de grutas.

Por sua vez, nas águas de infiltração nessas grutas, contendo Ca2+
e HCO3–, a água vai evaporando, o que faz deslocar o equilíbrio para a
esquerda, formando­‑se CaCO3.
Por outro lado, como no interior das grutas a pressão é menor do que
em profundidade, a con­centração do dióxido de carbono, CO2, dissolvido
nas águas de infiltração diminui, o que também faz deslocar o equilíbrio
para a esquerda, favore­cendo a formação de carbonato de cálcio sólido,
CaCO3 (s).

Remoção de poluentes de águas


Um dos processos utilizados para tratar águas de efluentes é a
precipitação química. Neste processo são criadas as condições para
que os iões dos elementos prejudiciais presentes na água formem
compostos insolúveis através de reações de precipitação. Estes
precipitados podem ser removidos por sedimentação e filtração ou ser
usados noutros tratamentos posteriores.
Um elemento químico que constitui uma grave preocupação em
efluentes industriais é o fósforo. O fósforo, na forma de fosfatos, constitui
um nutriente essencial para as plantas. Contudo, a sua presença em
elevadas quantidades em rios e lagos conduz à eutrofização, ou seja, a
um crescimento excessivo de algas (Fig. 7) e posterior morte dos peixes.
Fig. 7 Eutrofização na Lagoa das Para remover o fósforo das águas é comum a utilização de alumínio.
Furnas, São Miguel. Recorre-se ao sulfato de alumínio, A2(SO4)3, cujos iões A3+ vão reagir com

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1 Equilíbrio químico heterogéneo

os iões fosfato, PO43–, conduzindo à precipitação de fosfato de alumínio


(Ks = 9,84 × 10−21):

A3+ (aq) + PO43– (aq) → APO4 (s)

A descarga indevida de efluentes industriais e urbanos também pode


conduzir à existência de metais pesados (como o mercúrio, o chumbo e
o cromo) em águas, o que constitui um grave problema, quer para o ser
humano, quer para as espécies aquáticas.
Para remover o cromo da água, ele é reduzido em meio ácido (com
pH < 2,5) do estado de oxidação +6 (solúvel em água) para o estado de
oxidação +3, recorrendo à adição de bissulfito de sódio, NaHSO3. O cromo
precipita então sob a forma de sulfato de cromo, que é praticamente
insolúvel em água:

4 H2CrO4 (aq) + 6 NaHSO3 (aq) + 3 H2SO4 (aq) →


→ 2 Cr(SO4)3 (s) + 3 Na2SO4 (aq) + 10 H2O ()

A precipitação de metais pesados também se consegue por adição


de uma base, geralmente hidróxido de sódio, NaOH. Este tratamento dos
efluentes conduz à formação de óxidos ou hidróxidos insolúveis. É o que
sucede no caso do chumbo:

Pb2+ (aq) + 2 OH– (aq) → Pb(OH)2 (s)

De um modo geral, a prevenção deste tipo de poluição (efluentes


industriais), ou seja, a redução de resíduos na fonte que os gera, é ?
amplamente difundida e tem como objetivo melhorar os resultados para o Elabore um pequeno trabalho
ambiente. A reciclagem, o tratamento através de processos físico-químicos explicando, de uma forma sucinta,
e biológicos devem ser utilizados. como se processam os tratamentos
de águas residuais industriais.

Exercício resolvido

3. O carbonato de cálcio, CaCO3, e o sulfato de cálcio, CaSO4, são sais


pouco solúveis. Indique qual destes sais tem a sua solubilidade mais
afetada quando se lhe adiciona um ácido forte.
Resolução

CaCO3 (s) → 2+ 2–
← Ca (aq) + CO3 (aq)
Adicionando um ácido forte, os iões CO32– (base fraca) vão aceitar protões
do ácido, de acordo com a equação:
CO32– (aq) + 2 H+ (aq) → CO2 (g) + H2O ()
Resposta: Com a adição de um ácido forte, a concentração de CO32– dimi-
nui, pelo que o sistema vai evoluir no sentido da reação direta, de acordo
com o princípio de Le Châtelier, aumentando a solubilidade do sal.
No caso do CaSO4, como o ião SO42– é uma base muito fraca (conjugada de
um ácido forte), não tem capacidade de aceitar protões do ácido pelo que
a solubilidade do sal não se altera.

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Extensão 3 Equilíbrio químico heterogéneo

Exercícios para resolver

PROFESSOR 5. Diga que espécies químicas se encontram presentes quando se dis-


solve em água cada uma das seguintes substâncias.
SOLUÇÕES
5.1 Cloreto de cálcio
5.1 Iões C– e Ca2+ 5.2 Etanol
5.2 Moléculas de CH3CH2OH 5.3 Hidróxido de potássio
5.3 Iões de OH– e K+
5.4 Moléculas de C6H12O6
5.4 Sacarose

6.1 aumenta; aumenta 6. Complete as frases que se seguem com os termos diminui, aumenta
6.2 diminui; mantém e mantém.
7. É um fenómeno endotérmico,
6.1 Quando a reação de equilíbrio é endotérmica, o aumento de
pois o aumento da temperatura temperatura ____ o valor de Ks e ____ o valor de solubilidade.
faz aumentar Ks, ou seja, 6.2 O efeito do ião comum ____ a solubilidade e ____ o valor do
favorece a reação direta, produto de solubilidade.
donde se conclui que esta é
endotérmica.
7. Os valores de solubilidade do sulfato de bário, a diferentes tempe-
raturas, são:
Temperatura (°C) Ks
18 8,7 × 10–11
25 1,1 × 10–10
50 2,0 × 10–10

Indique, justificando, se a dissolução do sulfato de bário é um fenóme-


no endotérmico ou exotérmico.

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