Você está na página 1de 32

Luís de Camões - A Lírica / Rimas

Os poemas de Camões podem ser divididos em duas partes:

1ª PARTE: a medida velha, de inspiração tradicional:

As redondilhas:
- Maior (7 sílabas métricas)
- Menor (5 sílabas métricas)

Inspirou se nos poetas tradicionais e a forma de sua poesia pode ser:


- Cantigas: Com um mote de 4 versos e estrofes de 8, 9 ou 10 versos
- Vilancetes: Com um mote de dois ou três versos e 1 ou 2 estrofes de sete versos (sétima)
cada 1
- Esparsa: não tem mote e é composta por uma única estrofe de 8 a 10 versos
- Trovas ou endechas: não tem mote e tem uma ou mais estrofes com 4(=quadra) ou 8
(=oitava) versos .

Exemplo de Cantiga:

Cantiga Alheia

Mote

Na fonte está Lianor

Lavando a talha e chorando,

Às amigas perguntando:

- Vistes lá o meu amor?

Voltas

Posto o pensamento nele,

Porque a tudo o amor obriga,

Cantava, mas a cantiga


Eram suspiros por ele.

Nisto estava Lianor

O seu desejo enganando,

Às amigas perguntando:

- Vistes lá o meu amor?

O rosto sobre ua mão,

Os olhos no chão pregados,

Que, do chorar já cansados,

Algum descanso lhe dão.

Desta sorte Lianor

Suspende de quando em quando

Sua dor; e, em si tornando,

Mais pesada sente a dor.

Não deita dos olhos água,

Que não quer que a dor se abrande

Amor, porque, em mágoa grande,

Seca as lágrimas a mágoa.

Despois que de seu amor

Soube novas perguntando,

De improviso a vi chorando.

Olhai que extremos de dor!


Exemplo de Vilancete: (da medida velha, ou seja, das redondilhas, é o que costuma sair
mais no teste)

Descalça vai para a fonte

Mote:
Descalça vai para a fonte leonor pela verdura;
Vai formosa e não segura.

Voltas:
Leva na cabeça o pote,
O texto nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata.
Sainho de chamalote;
Traz a vasquinha de cote.
Mais branca que a neve pura;
Vai formosa e não segura.

Descobre a touca a garganta,


Cabelos de ouro o trançado,
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta;
Chove nela graça tanta
Que dá graça a formesura;
Vai formosa e não segura.

Exemplo de uma Esparsa:

Os bons vi sempre passar

Os bons vi sempre passar


No mundo graves tormentos;
E para mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado:
Assim que só para mim
Anda o mundo concertado.

Exemplo de Trova ou endecha:


Endechas a Bárbara escrava

Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que pera meus olhos
Fosse mais fermosa.

Nem no campo flores,


Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.

Ua graça viva,
Que neles lhe mora,
Pera ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.

Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas bárbara não.

Presença serena
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda a minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo;
E. pois nela vivo,
É força que viva.

2ª PARTE : é a medida nova. O poeta inspirou-se nos poetas clássicos


(Classicismo).
Na medida nova temos os sonetos de inspiração clássica.
Os sonetos são compostos por duas quadras(estrofes de 4 versos) e dois
tercetos (estrofes de 3 versos). Os versos são todos decassílabos (= 10 sílabas
métricas).
Camões inspirou-se em Petrarca( Petrarquismo): na lírica camoniana, a
construção do retrato da mulher está associada à ausência da amada, ou seja, o
sujeito poético descreve o que imagina e não o que vê. Como o desejo não se
realiza, porque a amada está ausente, a figura da amada, fica “pintada”
(IDEALIZADA), no pensamento do sujeito poético, sendo a causa do seu sofrimento.
O retrato feminino é idealizado (física e psicologicamente) é feito com cores suaves:
a pele muito clara, os olhos claros, o cabelo louro, o “honesto riso” num rosto
suavemente iluminado, breve luz que dá cor ao amor.

Camões tem influência das ideias petrarquistas, mas dá originalidade


aos seus sonetos. De que forma?
Contrariamente às amadas reais, Camões pinta a jovem da lírica tradicional,
inserida num ambiente concreto, referindo o vestuário (tipo e cores), o brilho e cores
do cabelo, a fita do cabelo, formando um desenho gracioso, com cor, luz e
movimento, como se confirma no Vilancete “Descalça vai para a fonte”, mas
também faz um retrato diferente da mulher, como podemos ver na Trova “Endechas
a Bárbara Escrava”.

Exemplo de um soneto

Ondados fios de ouro reluzente,


Que, agora da mão bela recolhidos,
Agora sobre as rosas estendidos,
Fazeis que a sua beleza se acrescente;

Olhos, que vos moveis tão docemente,


Em mil divinos raios encendidos,
Se de cá me levais alma e sentidos,
Que fora, se de vós não fora ausente?

Honesto riso, que entre a mor fineza


De perlas e corais nasce e parece,
Se na alma em doces ecos não o ouvisse!...

Se, imaginando só tanta beleza,


De si em nova glória a alma se esquece,
Que será quando a vir?... Ah! Quem a visse…

INTERPRETAÇÃO DO POEMA:

. Na descrição da mulher apresentada no poema, o sujeito poético associa a


sua beleza a elementos naturais.
1.1 Faz o retrato desta figura feminina.
O sujeito poético, neste poema, descreve a figura feminina como um ser
perfeito e idealizado, referindo que ela tem cabelos loiros e brilhantes -”Ondados
fios de ouro reluzente”, as suas faces são rosadas “ sobre as rosas
estendidos”, os seus olhos tem um brilho único “mil divinos raios
encendidos” e são doces “Olhos, que vos moveis tão docemente” , os seu
dentes são comparados a pérolas e corais, o que mostra que são brancos e perfeitos
“De perlas” e os seus lábios são comparados a corais -”corais nasce e
parece” , pois têm uma cor viva.

1.2 Identifique o recurso expressivo que permite estabelecer a relação entre a


beleza da mulher e os elementos naturais.
O recurso expressivo que permite estabelecer uma relação entre a beleza da
mulher e os elementos naturais é a metáfora. Assim, podemos considerar o poema
todo ele uma metáfora para descrever a figura feminina que aos olhos do sujeito
poético é um ser perfeito.

2. Além das características físicas realçadas no texto, o sujeito poético


salienta também traços psicológicos da mulher amada.
2.1 Refira dois desses traços, fundamentando a sua resposta com versos do
poema.
o sujeito poético evidencia a figura feminina não só através de traços físicos, mas
também psicológicos como a serenidade e a delicadeza “Olhos, que vos moveis
tão docemente” , a honestidade “Honesto riso” e a timidez “Se na alma em
doces ecos não o ouvisse!”.

3. Comprove que esta composição poética é formalmente um soneto.


Esta composição poética é formalmente um soneto, pois é composta por
duas quadras e dois tercetos, com versos decassílabos (“On/da/dos/ fi/os/ de
ou/ro/ re/lu/zen/te”.

Análise de outros poemas:

Um mover d’olhos, brando e piadoso

Um mover d’olhos, brando e piadoso,

sem ver de quê; um riso brando e honesto,

quási forçado; um doce e humilde gesto(1) ,

de qualquer alegria duvidoso;

um despejo (2) quieto e vergonhoso;

um repouso (3) gravíssimo e modesto;

ũa pura bondade, manifesto


indício da alma, limpo e gracioso;

um encolhido ousar; ũa brandura;

um medo sem ter culpa; um ar sereno;

um longo e obediente sofrimento;

esta foi a celeste fermosura

da minha Circe (4), e o mágico veneno

que pôde transformar meu pensamento.

Notas:

(1) Rosto
(2) Desembaraço, ousadia
(3) Tranquilidade
(4) Na mitologia grega, Circe era uma feiticeira, especialista em venenos.

1. Apresente, por palavras suas, cinco características da mulher descrita no poema.

Trata-se de uma mulher discreta, humilde, doce, pura e calma.

2. Preencha o texto seguinte, selecionando dos vocábulos propostos os adequados,


tendo em conta a informação presente no soneto.

• física • indefinido • psicológica • retrato • celeste • definido • qualidades

O sujeito lírico realça uma beleza a. psicológica , destacando b. qualidades

morais da mulher (“despejo quieto e vergonhoso”, v. 5; “encolhido ousar”, v. 9). Trata-se


de uma mulher divina, quase inumana, o que justifica a utilização do adjetivo c. “
celeste ” para a designar. O recurso ao determinante artigo d. indefinido
favorece a imprecisão do e. retrato e parece sugerir uma mulher imaginada,
idealizada.

3. Identifique o recurso expressivo que se estabelece entre as expressões “celeste


fermosura” (v. 12) e “Circe” (v. 13).

O recurso expressivo é a antítese, pois apresenta ideias contrárias, ou seja, o


sujeito poético refere a figura feminina tanto pode ser um ser doce e divino “celeste
fermosura”, como uma feiticeira “Circe”.

4. Divida o soneto em dois momentos, apresentando o assunto de cada um deles.

O soneto pode dividir-se em dois momentos: o primeiro, dos versos 1 ao 11, o


sujeito lírico apresenta uma enumeração das características psicológicas da mulher; o
segundo, dos versos 12 ao 14, onde o sujeito poético se centra nos efeitos que a beleza
da figura feminina exerce sobre ele.

5. Estabeleça uma relação entre esta composição poética e o soneto “Ondados fios
d’ouro reluzente” destacando uma diferença e uma semelhança existentes entre eles.

. No soneto “Ondados fios d’ouro reluzente”, o sujeito lírico destaca sobretudo a beleza
física da mulher, enquanto neste realça a sua perfeição moral. Mas, em ambas as
composições poéticas, a mulher é uma figura indefinida, incorpórea, quase divina, que
se encontra distante do sujeito lírico e que não pode ser alcançada, apenas desejada.

Descalça vai para a fonte

a este mote:

Descalça vai para a fonte

Leanor pela verdura;

Vai fermosa e não segura.

VOLTAS

Leva na cabeça o pote,


o testo nas mãos de prata,

cinta de fina escarlata(1),

saínho (2)de chamalote (3) ,

traz a vasquinha de cote (4),

mais branca que a neve pura;

vai fermosa, e não segura.

Descobre a touca a garganta,

cabelos d’ouro o trançado,

fita de cor d’encarnado,

tão linda que o mundo espanta;

chove nela graça tanta

que dá graça à fermosura;

vai fermosa, e não segura.

NOTA:

(1) cor vermelha viva, tecido que tem essa cor

(2 )veste sem mangas de formato redondo e sem abas

(3) tecido de lã ou pêlo, geralmente com seda

(4 ) casaco curto e muito justo ao corpo, de uso diário


1. Classifique o poema, justificando com três características formais do mesmo.

Trata-se de um vilancete, dado ser constituído por mote de três versos e duas
glosas de sete. Os versos são redondilha maior.

2. Partindo do mote e da primeira volta, refira a condição social de Leanor.

Leanor é uma mulher do mundo rural, pertencente ao povo, como se comprova


pela atividade descrita no mote – vai descalça buscar água à fonte – e pelo seu
vestuário descrito na primeira volta.

3. Complete o texto que se segue, de acordo com a informação presente no poema.

No poema, estão presentes várias cores: o a. verde dos caminhos percorridos por
Leanor, que remete para um espaço b. campestre/rural , fértil, e simultaneamente
nos sugere a juventude de donzela; as cores da c. prata e do d. ouro ,
ambas associadas ao caráter superior, invulgar, da e. beleza da jovem; a f. brancura
da neve, associada, por um lado, à cor da pele, característica da mulher descrita ao
modo g. petrarquista , e, por outro, a um traço psicológico – a sua pureza; e o
h. vermelho (“escarlata”), cor forte, viva, que i. contrasta
com as outras cores e que permite uma leitura mais erótica do poema. Leanor é jovem,
bela, pura, mas sensual, e j. atrai o olhar daqueles por quem passa, nomeadamente o
do k. . sujeito poético.

4. Interprete o significado da expressão “chove nela graça tanta / que dá graça à


fermosura” (vv. 12-13).

O sujeito lírico destaca, por meio de uma metáfora (“chove nela graça tanta”, v.
12), a perfeição e a beleza da mulher, concluindo que esta acrescenta beleza à própria
formosura, ultrapassando o próprio modelo, a própria essência de beleza.

5. Apresente uma proposta de interpretação para o verso “vai fermosa, e não


segura”(vv. 7 e 14).

A jovem exibe a sua beleza, mas esta formosura traz-lhe insegurança, uma vez que ela
está mais exposta aos olhos daqueles por quem passa, ou seja, ao amor.
Endechas (1)

a ua cativa (2)com quem andava d’amores

na Índia, chamada Bárbora

Aquela cativa,

que me tem cativo,

porque nela vivo

já não quer que viva.

Eu nunca vi rosa

em suaves molhos,

que para meus olhos

fosse mais fermosa.

Nem no campo flores,

nem no céu estrelas,

me parecem belas
como os meus amores.

Rosto singular,

olhos sossegados,

pretos e cansados,

mas não de matar.

Ua graça viva,

que neles lhe mora,

para ser senhora

de quem é cativa.

Pretos os cabelos,

onde o povo vão

perde opinião

que os louros são belos.

Pretidão de Amor,

tão doce a figura,

que a neve lhe jura

que trocara a cor.

Leda (3) mansidão

que o siso acompanha;

bem parece estranha,

mas bárbora não.


Presença serena

que a tormenta amansa;

nela enfim descansa

toda a minha pena.

Esta é a cativa q

ue me tem cativo,

e, pois nela vivo,

é força que viva.

NOTA:

(1)composição poética de tom melancólico e triste

(2) escrava

(3)alegre

1. Após a leitura do poema, assinale as seguintes afirmações como verdadeiras ou


falsas. Corrija as falsas sem recorrer à negativa.

a. Na primeira estrofe, o termo “cativa” remete para a condição social da mulher


retratada. VERDADEIRO

b. O sujeito poético considera-se um cativo, pois está preso na Índia. FALSO – O sujeito
poético considera-se um cativo, pois está preso aos encantos da mulher amada.
c. Os olhos da mulher retratada são verdes como os campos. FALSO – Os olhos da
mulher narrada são pretos.

d. Na segunda estrofe, o poeta serve-se da hipérbole para realçar as características


excecionais da mulher amada. VERDADEIRO

e. A mulher retratada corresponde aos padrões de beleza física da época renascentista.


FALSO – A mulher retratada foge aos padrões de beleza da época renascentista, por
ser negra e ter os cabelos pretos.

f. O sujeito poético traça apenas o retrato físico da mulher. FALSO– O sujeito poético
traça o retrato físico da mulher, mas também são realçados traços psicológicos, como
a serenidade.

g. A neve (quarta estrofe) surge associada por semelhança à cor da pele de Bárbara. .
FALSO – A neve contrasta com a cor negra da pele da mulher, e gostaria até de mudar
a sua cor.

h. Na utilização do adjetivo “bárbora” (quarta estrofe) há um jogo de palavras com o


nome próprio da mulher amada. VERDADEIRO

i. Na última oitava, a palavra “pena” refere-se apenas ao instrumento de escrita. FALSO


– Na última oitava, a palavra "pena" refere-se ao instrumento de escrita, mas indica
também sofrimento ou dor.

j. O poema apresenta versos em redondilha maior. FALSO – O poema apresenta versos


com redondilha menor.

Alegres campos, verdes arvoredos

Alegres campos, verdes arvoredos,

claras e frescas águas de cristal,

que em vós debuxais ao natural,

discorrendo da altura dos rochedos;

silvestres montes, ásperos penedos,


compostos em concerto desigual,

sabei que, sem licença de meu mal,

já não podeis fazer meus olhos ledos.

E, pois me já não vedes como vistes,

não me alegrem verduras deleitosas,

nem águas que correndo alegres vêm.

Semearei em vós lembranças tristes,

regando-vos com lágrimas saudosas,

e nascerão saudades de meu bem.

1. Identifique os elementos da Natureza contemplados no poema, referindo o tipo


de ambiente que a sua descrição cria.

São referidos os campos, os arvoredos, as águas, os montes e os penedos. A


descrição destes elementos cria um ambiente harmonioso e belo (locus
amoenus)

2. Mencione a classe de palavras que contribui para a descrição da Natureza.


Os adjetivos estão ao serviço da descrição da Natureza e, uma vez que se
encontram antepostos ao nome, sugerem uma ideia de descrição subjetiva,
aumentando os efeitos produzidos pela sua localização na frase.

3. Assinale o(s) interlocutor(es) do sujeito lírico, referindo o recurso expressivo


que se associa à sua identificação.

Os interlocutores do sujeito lírico são todos os elementos da Natureza


referidos nos cinco versos iniciais. A apóstrofe aponta para a sua identificação.
4. Com base nas segunda e terceira estrofes, refira a importância da flexão
verbal para a caracterização dos sentimentos do sujeito lírico em dois tempos
distintos.

Dirigindo-se aos elementos da Natureza, o sujeito afirma “me já não vedes como
vistes” (v. 9). O contraste entre o pretérito perfeito do indicativo (vistes) e o
presente do indicativo (verde) marca a diferença entre um estado de felicidade
passado e a tristeza do presente. Por essa razão, também afirma “já não podeis
fazer meus olhos ledos” (v. 8), indicando, através do uso do presente do
indicativo, que é no momento atual que a felicidade lhe é impossível.

5. Um ambiente negativo vai, gradualmente, substituindo a serenidade e a


alegria que se percecionam na primeira quadra.

5.1 Complete o esquema com os dados necessários para a explicitação dessa


gradação.

ESTROFES DOMÍNIOS DE SENTIMENTOS DESCRIÇÃO/


REFERÊNCIA EXPLICAÇÃO

1ª QUADRA NATUREZA a. ALEGRIA b. Descrição


valorativa,
eufórica
(harmoniosa
e alegre) da
Natureza
associada
ao passado
do “eu”

2ª QUADRA E Natureza c. TRISTEZA d. A tristeza vai-se


1ºTERCETO EU instalando no
sujeito poético, o
que se denuncia já
na adjetivação
disfórica dos
“montes” e
“penedos”; a alegria
da Natureza já não
influencia o “eu” .

2º TERCETO EU e. Tristeza f. Dominado pela


Natureza tristeza, o sujeito
lírico exercerá a sua
negatividade sobre
a Natureza,
semeando nela os
seus infortúnios e
regando-a com
lágrimas de
saudade.

Aquela triste e leda madrugada

Aquela triste e leda madrugada,

cheia toda de mágoa e de piedade,

enquanto houver no mundo saudade

quero que seja sempre celebrada.

Ela só, quando amena e marchetada1


saía, dando ao mundo claridade,

viu apartar-se2 d’ũa outra vontade,

que nunca poderá ver-se apartada.

Ela só viu as lágrimas em fio,

que d’uns e d’outros olhos derivadas

s’ acrescentaram em grande e largo rio.

Ela viu as palavras magoadas

que puderam tornar o fogo frio,

e dar descanso às almas condenadas.

Análise

Este soneto abre com uma antítese e pode dividir-se em dois momentos:

O primeiro momento, correspondente à primeira quadra, refere-se ao presente do sujeito


poético e expressa o seu desejo para o futuro.

O segundo momento, referente às restantes estrofes, funciona como justificação do


desejo expresso anteriormente.

O sujeito lírico centra-se no momento passado, em que a madrugada personificada


presenciou a separação dos amantes.

O “eu” poético personifica a Natureza, recorrendo, sobretudo, à sensação visual,


presente no pretérito perfeito simples do indicativo do verbo ver (“viu”).

A antítese presente em “triste e leda” permite estabelecer um contraste entre a beleza e


a alegria da Natureza e o sofrimento do par amoroso.
O sofrimento vivido no momento da separação é expresso através de uma hipérbole –
“as lágrimas em fio […] s’acrescentaram em grande e largo rio” – e de um paradoxo.

TEMA DA REFLEXÃO SOBRE A VIDA PESSOAL

O dia em que eu nasci, moura e pereça

O dia em que eu nasci, moura e pereça1 ,

não o queira jamais o tempo dar,

não torne mais ao mundo, e, se tornar,

eclipse nesse passo o sol padeça.

A luz lhe falte, o sol se [lhe] escureça,

mostre o mundo sinais de se acabar,

nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,

a mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,

as lágrimas no rosto, a cor perdida,

cuidem que o mundo já se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,

que este dia deitou ao mundo a vida

mais desgraçada que jamais se viu!


1. Atente na primeira quadra.

1.1 Refira o desejo expresso pelo sujeito lírico, caracterizando o seu estado de
espírito.

O sujeito lírico exprime o desejo de que o dia do seu nascimento desapareça, não se
tornando a repetir. Esta aspiração permite caracterizar o sujeito, destacando-o pela
negativa, como um ser sofredor e martirizado.

1.2 Faça o levantamento de expressões que comprovem o tom disfórico empregue.

As palavras que exprimem o tom disfórico são “moura”, “pereça”, “eclipse” e “padeça”.

2. Considere as segunda e terceira estrofes.

2.1 Comprove a criação por parte do “eu” lírico de um ambiente apocalíptico (fim do
mundo), justificando as suas afirmações com expressões textuais.

O “eu” lírico refere um conjunto de elementos apocalíticos, como o eclipse do sol (“o sol
se [lhe] escureça”, v. 5), o aparecimento de monstros ("nasçam-lhe monstros”, v. 7), a
chuva de sangue (“sangue chova o ar”, v. 7), o não reconhecimento dos filhos pelas
próprias mães (“a mãe ao próprio filho não conheça”, v. 8).

3. Comente as reações dos seres humanos perante esse ambiente desejado pelo “eu”.

. O sujeito deseja que as pessoas fiquem pasmadas perante a sucessão de


acontecimentos, acreditando que o mundo está à beira do fim, o que será uma forma de
realçar a tragédia que este associa à sua vida e à revolta que sente.

4. Atente agora no último terceto.

4.1 Identifique o interlocutor do sujeito poético, referindo o recurso expressivo


empregue.

O sujeito dirige-se à “gente temerosa”, identificando o seu interlocutor por meio de uma
apóstrofe.

4.2 Comprove com o levantamento de expressões que esta estrofe apresenta o motivo
pelo qual o “eu” lírico formulou o desejo expresso na primeira quadra.
“que este dia deitou ao mundo a vida / mais desgraçada que jamais se viu!” (vv. 13-14)

4.3 Identifique o recurso expressivo presente no último verso, justificando o seu


emprego.

O final do poema é marcado pela hipérbole, como forma de intensificação do caráter


excecional do poeta e do seu destino trágico.

A lírica camoniana apresenta uma reflexão sobre a PASSAGEM


(passagem/estagnação) do tempo e sobre a DESORDEM (ordem/desordem)
que o sujeito poético vê dentro e fora de si.

A ideia de desconcerto presente na lírica camoniana dá-nos uma visão do mundo em


que o mal é SUPERIOR (superior/inferior) ao bem.

Perante a consciência da passagem do tempo, o poeta torna-se um ser cada vez mais
SOLITÁRIO (solitário/solitário).

O poeta considera-se vítima de um destino IMPLACÁVEL (generoso/implacável) para o


qual contribuíram fatores externos e internos.

A melancolia que caracteriza a lírica camoniana advém de fatores externos ao poeta,


mas também das FALHAS (falhas/virtudes) que caracterizam a sua vida.

Correm turvas as águas deste rio

Correm turvas as águas deste rio,

que as do Céu e as do monte as enturbaram;

os campos florecidos se secaram,

intratável se fez o vale, e frio.

Passou o verão, passou o ardente estio 1 ,


ũas cousas por outras se trocaram;

os fementidos 2 Fados 3 já deixaram

do mundo o regimento, ou desvario 4.

Tem o tempo sua ordem já sabida;

o mundo, não; mas anda tão confuso,

que parece que dele Deus se esquece.

Casos, opiniões, natura e uso 5

fazem que nos pareça desta vida

que não há nela mais que o que parece.

1. verão

2.falsos

3.destinos

4 .vv. 7-8: já entregaram o governo do mundo / dos homens à loucura

5.natureza e costume.

1. Na segunda estrofe, o sujeito lírico dá conta da passagem do tempo.

1.1 Explicite como se processa esta ideia, relacionando-a com a primeira estrofe.

Esta ideia processa-se por meio da referência indireta às estações do ano,


sinalizadas pelas águas turvas (inverno), pelos campos de flores (primavera), pelos
campos secos (verão) e pelo frio (outono).
1.2 Analise a importância dos tempos verbais ao serviço da expressão desta ideia.

Na quadra, o pretérito perfeito permite marcar as ações passadas ("enturbaram",


"secaram", "fez"). Já o presente do indicativo aponta para a estação atual, contribuindo
para a noção da passagem do tempo.

1.3 Relacione os dois primeiros versos desta quadra com o conteúdo da primeira.

Estes versos reiteram a ideia da passagem do tempo expressa na primeira


quadra, associando-a, aqui, ao tópico da mudança inerente à passagem das diferentes
estações.

2. Explicite o conteúdo do primeiro terceto, considerando as realidades evidenciadas e


os elementos linguísticos.

O primeiro verso do terceto aponta para a transformação, natural que o tempo


opera na Natureza; os dois versos que se seguem transportam-nos para a realidade
humana e os seus comportamentos. Veja-se o advérbio de negação (“não”) a
estabelecer a oposição (reforçada pelo conector “mas”) entre a ordem natural das
coisas e os comportamentos humanos.

2.1 Interprete a referência à figura de Deus nesta estrofe.

Deus é referido como o garante da ordem do mundo. Desta forma, o sujeito julga
que a desordem que se verifica no mundo só poderá ficar a dever- -se a um possível
esquecimento por parte desse ser superior.

3. Identifique o recurso expressivo ao serviço da ilustração da desordem verificada no


mundo.

O recurso expressivo é a enumeração, presente no primeiro verso do segundo


terceto – "Casos, opiniões, natura e uso".

4. Relacione o conteúdo do poema com o tema da mudança e do desconcerto.

A mudança verifica-se na alteração cíclica da Natureza, em que tudo se


transforma; o desconcerto decorre da confusão humana.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

muda-se o ser, muda-se a confiança;

todo o mundo é composto de mudança,

tomando sempre novas qualidades.

Contìnuamente vemos novidades,

diferentes em tudo da esperança;

do mal ficam as mágoas na lembrança,

e do bem (se algum houve), as saüdades.

O tempo cobre o chão de verde manto,

que já coberto foi de neve fria,

e, em mim, converte em choro o doce canto.

E, afora 1 este mudar-se cada dia,

outra mudança faz de mor 2 espanto,

que não se muda já como soía 3 .

1 além de; 2 maior; 3 costumava


1. Complete o seguinte texto, com palavras suas e/ou expressões do poema, de modo
a obter uma breve análise do mesmo.

Este poema tem como tema a a. Mudança e pode dividir-se em três momentos. O
primeiro, correspondente à primeira estrofe, integra a apresentação e a afirmação de
um mundo em constante transformação, como se pode verificar nos versos b. três
e c. quatro . O segundo momento, correspondente às d. duas estrofes seguintes,
constitui a constatação do sujeito relativamente à forma como a mudança se opera,
sendo, para o ser humano, geralmente e. negativa , como atestam os três primeiros
versos da segunda estrofe e o f. último do primeiro terceto. Pelo contrário, na g.
Natureza , a mudança é cíclica e confunde-se com renovação, como se comprova com
os dois primeiros versos do primeiro h. terceto. Por fim, o terceiro momento é
introduzido pela conjunção copulativa “e” que inicia o último terceto. Aqui, o “eu” lírico
conclui que o próprio processo de mudança sofre os efeitos de mudança – i. “outra
mudança faz de mor espanto” / j. ”que não se muda já como soía “.

. O sujeito poético também é afetado pela mudança, consequente da passagem do k.


tempo , que lhe deixa o passado na memória, sejam as lembranças tristes, (associadas
aos factos negativos l. “as mágoas ”) sejam as saudades dos factos positivos (m.“ e
do bem(se algum houver”as saudades). Assim, no poema explora-se a n. antítese
(“verde manto” / “neve fria”; “choro” / “doce canto”) para descrever o contraste entre o
caráter cíclico e renovador da mudança na Natureza e a degradação que a mesma traz
ao ser humano – a perda do passado, o envelhecimento.

2. Classifique o poema, justificando a sua resposta com a análise formal do mesmo


(estrofes, métrica, esquema rimático e tipo de rima).

Trata-se de um soneto, composto por duas quadras e dois tercetos, constituídos


por versos decassilábicos (Mu/dam/-s(e) os/tem/pos,/ mu/dam/-s(e) as/von/ta/ [des]).
A rima é interpolada e emparelhada nas quadras e cruzada nos tercetos, segundo o
esquema: abba/abba /cdc/ dcd.

TEXTO A

Que me quereis, perpétuas saudades?

Que me quereis, perpétuas saüdades?

Com que esperança ainda m'enganais?

Que o tempo que se vai não torna mais,


e se torna, não tornam as idades.

Razão é já, ó anos!, que vos vades,

porque estes tão ligeiros que passais,

nem todos para um1 gosto são iguais,

nem sempre são conformes as vontades.

Aquilo a que já quis é tão mudado

que quási é outra cousa; porque os dias

têm o primeiro gosto já danado2.

Esperanças de novas alegrias

não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado,

que do contentamento são espias.

TEXTO B

Os bons vi sempre passar sua ao desconcerto do mundo

Os bons vi sempre passar

no mundo graves tormentos;

e, para mais m'espantar,

os maus vi sempre nadar

em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim

o bem tão mal ordenado,

fui mau, mas fui castigado:

Assi que, só para mim

anda o Mundo concertado.

1. Analise o tema e a forma dos dois textos, completando o quadro seguinte.

TEXTO A TEXTO B

CLASSIFICAÇÃO DA SONETO ESPARSA


COMPOSIÇÃO

CLASSIFICAÇÃO DA VERSOS DECASSÍLABOS REDONDILHA MAIOR


MÉTRICA (SETE SÍLABAS
MÉTRICAS)

ESTILO (LÍRICA CLÁSSICO, MEDIDA NOVA MEDIDA VELHA,


CAMONIANA) REDONDILHA

MARCAS DE UM USO DA PRIMEIRA PESSOA USO DA PRIMEIRA PESSOA


DISCURSO PESSOAL “QUIS” “VI”, “MIM”.

TEMA A MUDANÇA O DESCONCERTO DO


MUNDO

2. Identifique, no texto A, os responsáveis pela situação atual vivida pelo sujeito poétic
Os responsáveis pela situação atual vivida pelo sujeito poético são o Destino
(Sorte/Fortuna) e o Tempo, que não permitem que ele atinja um estado de felicidade,
retirando-lhe qualquer esperança de ser feliz.
3. Justifique a introdução da experiência pessoal do “eu” no texto B.

A experiência do “eu” surge como oposição àquilo que acontece aos outros, que não
são castigados pelos seus erros. Para ele, o desconcerto não funcionou, pois errou, mas
não foi premiado, mas sim, pelo contrário, castigado.

4. Demonstre que as duas composições poéticas revelam um descontentamento do


sujeito poético face ao mundo em que vive.

Os dois textos remetem para um descontentamento, uma vez que o sujeito poético,
pela sua experiência de vida, conclui que qualquer esperança é enganadora, porque o
tempo tudo destrói, e que o mundo em que vive tem os valores invertidos.

TEMÁTICAS DA LÍRICA CAMONIANA

A REPRESENTAÇÃO DA MULHER AMADA

Na sua obra, Luís de Camões apresenta várias temáticas, sendo uma delas a
representação e a descrição da mulher segundo o modelo petrarquista – loira, de pele
clara e olhar luminoso, características que se associam à serenidade e à doçura do
retrato. Poemas como “Ondados fios de ouro reluzente” ou “Descalça vai para a fonte”
traduzem este tipo de beleza. Camões inspirou-se em Petrarca para representar na sua
lírica o modelo de mulher ideal e perfeita, contudo, Camões não é apenas um seguidor
de modelos clássicos. Pela sua experiência, refere os diferentes tipos de beleza
feminina. Em “Endechas a Bárbara escrava”, por exemplo, descreve uma mulher de pele
negra, cabelos e olhos escuros, uma “cativa que o tem cativo”. Concluindo, foi um poeta
que soube conjugar os ideais renascentistas com as suas próprias vivências.

O Amor é talvez o tema de maior destaque na obra de Camões, sendo fonte de


tensão e de conflito interior. Ao contrário do que sucede com Petrarca, Camões oculta
frequentemente a identidade da amada, o que permite duas interpretações possíveis: - uma
leitura onde a identidade da mulher amada está oculta, cabendo ao leitor interpretar as
pistas que permitiriam descobrir a identidade de uma mulher real; - uma leitura onde se
pode perceber que a mulher real não é o mais importante na escrita literária, mas sim o
Amor e os fenómenos a ele ligados. Uma fonte de tensão que surge na poesia de Camões
é a desproporcionalidade de sentimentos vividos pelo sujeito poético e pela amada, o que
implica que a vivência do amor, longe de ser uma experiência alegre e feliz, é
constantemente descrita como sendo algo de doloroso.

Concluindo, Camões inspirou-se no modelo da poesia de Petrarca para representar


a figura feminina como um ser perfeito e idealizado, mas também foi original e, a partir das
suas experiências de vida, descreveu a mulher não só à maneira petrarquista como também
à sua maneira, sendo a mulher um ser que tanto lhe pode causar felicidade como o pode
levar ao sofrimento amoroso.

A REPRESENTAÇÃO DA NATUREZA

Na sua obra, Luís de Camões apresenta várias temáticas, sendo uma delas a
representação da Natureza. Camões, na sua lírica, descreve a natureza como um Locus
amoenus, ou seja, um lugar aprazível, por norma, em ambiente bucólico (no campo), no
qual o sujeito poético descreve a natureza e um conjunto de elementos específicos,
como o campo fresco e verdejante, com um vasto arvoredo e flores coloridas, cujo doce
odor se espalha com a brisa. A vegetação é densa, mas constantemente renovada, dada
a grande fertilidade do terreno, e a passagem do tempo não conduz à destruição da
paisagem.

A paisagem ideal está, assim, sempre presente na poesia amorosa. É uma


Natureza harmoniosa, fresca, primaveril, de céu azul, fértil, que não se ressente da
passagem do tempo. Os animais estão perfeitamente integrados e em comunhão com
ela. É uma paisagem natural (campestre e florestal), com vegetação densa e verdejante
e abundante em água. É o espaço propício ao amor, onde a mulher amada está presente
e esta mulher é de tamanha perfeição que faz com que a natureza ainda se torne mais
bela e perfeita. Como exemplo, temos o poema “Se Helena apartar”, onde o sujeito
poético destaca o poder que a figura feminina detém, pois os seus olhos são o
suficiente para gerar beleza. Portanto, a beleza da natureza, dos campos verdejantes,
das serras, das fontes, tudo se deve aos olhos de Helena. E o próprio sujeito poético se
interroga, pois se a figura feminina transforma a beleza da natureza, então o que fará no
coração dos homens?

Concluindo, o Locus Amoenus está presente na lírica camoniana, é o espaço


propício à concretização do amor e torna-se ainda mais perfeito graças à presença da
figura feminina, da mulher amada.

O EU E O MUNDO

A lírica de Camões revela um sujeito poético que, perante o decurso da vida,


reflete sobre o tempo e a mudança, temas característicos da época renascentista.
Vemos também um “eu” que analisa o desconcerto que vê dentro e fora de si. Como
exemplo temos a esparsa “Os bons vi sempre passar”, onde o “eu” lírico revela o seu
descontentamento em relação ao mundo e àquilo que o rodeia. A desordem social e
psicológica, o absurdo do mundo e a existência, invencível, do mal, embora funcione
sempre como causa de espanto e de revolta, conjuga-se com o destino sujeito à
implacável mecânica do tempo – que tudo vai mudando e destruindo – o mundo
aparece, sob olhar da melancolia camoniana, como um lugar absurdo e injusto onde o
mal triunfa tantas vezes sobre o bem, como podemos ver no poema “mudam-se os
tempos, mudam-se as vontades”, ou seja, o sujeito poético está consciente da
constante mudança que provoca nele tristeza, pois sabe que o destino está traçado e
nada pode fazer para o alterar.
Na verdade, o poeta assume uma posição de um cada vez maior isolamento
perante os outros, manifestando um insistente desânimo face ao decurso da sua vida. O
soneto “O dia em que eu nasci, moura e pereça” é exemplo do desânimo e frustração do
sujeito lírico face à sua vida que não tem sentido algum e que o leva a sentir que mais
valia não ter nascido para que os erros cometidos não acontecessem. • O isolamento
do poeta reforça a noção sempre muito viva da sua firme singularidade: a melancolia
que o faz sofrer como vítima de um destino cruel e fatal, que desde sempre parece tê-lo
marcado e para o qual contribuiu um conjunto de diversos fatores, alguns involuntários,
mas outros dependendo dos seus erros. • O caráter excecional deste destino torna-se
um dos grandes tópicos de melancolia camoniana, mostrando alguém fortemente
desiludido com as provações a que foi sujeito ao longo dos anos e da sua experiência
de vida.

Concluindo, O sujeito poético revela-se um ser descontente com a sua vida, com
o mundo, deseja que as pessoas fiquem pasmadas perante a sucessão de
acontecimentos, acreditando que o mundo está à beira do fim, o que será uma forma de
realçar a tragédia que este associa à sua vida e à revolta que sente.

Você também pode gostar