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Esse livro foi baixado gratuitamente por Miguel Jorge Souza em 9 de dezembro de 2022 no site da Letra Capital Editora.

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Conselho Editorial
Série Letra Capital Acadêmica

Beatriz Anselmo Olinto (Unicentro-PR)


Carlos Roberto dos Anjos Candeiro (UFTM)
Claudio Cezar Henriques (UERJ)
João Medeiros Filho (UCL)
Leonardo Santana da Silva (UFRJ)
Luciana Marino do Nascimento (UFRJ)
Maria Luiza Bustamante Pereira de Sá (UERJ)
Michela Rosa di Candia (UFRJ)
Olavo Luppi Silva (UFABC)
Orlando Alves dos Santos Junior (UFRJ)
Pierre Alves Costa (Unicentro-PR)
Rafael Soares Gonçalves (PUC-RIO)
Robert Segal (UFRJ)
Roberto Acízelo Quelhas de Souza (UERJ)
Sandro Ornellas (UFBA)
Sergio Azevedo (UENF)
Sérgio Tadeu Gonçalves Muniz (UTFPR)
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Pedro Torres
Pedro R. Jacobi
Fabiana Barbi
Leandra R. Gonçalves
Organizadores

Governança e Planejamento Ambiental:


adaptação e políticas públicas
na Macrometrópole Paulista
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Copyright © Pedro Torres, Pedro R. Jacobi, Fabiana Barbi,


Leandra R. Gonçalves (Orgs.), 2019
Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998.
Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida por meio impresso ou eletrônico,
sem a autorização prévia por escrito da Editora/Autor.

Editor: João Baptista Pinto


Capa: Luiz Guimarães
Foto: Celia Regina de Gouveia Souza
Projeto Gráfico e Editoração: Luiz Guimarães
Revisão: Rita Luppi

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

G742
Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole
Paulista / organização Pedro Torres ... [et al.]. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Letra Capital, 2019.
272 p. : il. ; 15,5x23 cm.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7785-680-0
1. São Paulo (SP) - Política e governo. 2. Planejamento regional - São Paulo (SP).
3. Política ambiental - São Paulo (SP). I. Torres, Pedro.
19-58870 CDD: 363.7098161
CDU: 502.1(815.6)
Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária CRB-7/6439

Letra Capital Editora


Telefone (21) 22153781 / 35532236
www. letracapital.com.br
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Sumário
Apresentação - Aproximando ciência e política para a tomada
de decisão em adaptação às mudanças climáticas...........................................7
Carlos A. Nobre
Introdução - Cidades, metrópoles ou metrópoles expandidas devem
se planejar para enfrentar as mudanças climáticas....................................... 11
Pedro Torres, Pedro Jacobi, Fabiana Barbi e Leandra Regina Gonçalves
Capítulo 1 - Saberes interdisciplinares para adaptação: comunidades,
academia e meio ambiente...............................................................................15
Luísa Schmidt, Carla Gomes e Pedro R. Jacobi
Capítulo 2 - Democracia e governança do clima: diálogos Norte-Sul................23
Klaus Frey e Jutta Gutberlet
Capítulo 3 - Inovações na governança climática urbana: uma breve
visão geral das tendências globais................................................................... 31
Jeroen van der Heijden
Capítulo 4 - Governança da água para adaptação e resiliência
no Antropoceno................................................................................................40
Micaela Trimble e Néstor Mazzeo
Capítulo 5 - Economia, estratégias e políticas públicas em adaptação...............46
Gustavo Velloso Breviglieri e Guarany Ipê do Sol Osório
Capítulo 6 - Gênero e adaptação aos impactos das mudanças climáticas..........53
Danielle Tega e Fabiana Barbi
Capítulo 7 - Adaptação, vulnerabilidades e saúde nas metrópoles ....................60
Christovam Barcellos
Capítulo 8 - Como impulsionar ações que alinhem adaptação
e sustentabilidade urbana nas cidades paulistas? .........................................69
Gabriela Marques Di Giulio
Capítulo 9 - Adaptação, governos locais e Redes Transnacionais de Municípios....76
Fabiana Barbi
Capítulo 10 - Ciência e política: desafios e oportunidades para gestão
do território macrometropolitano..................................................................82
Luciana Yokoyama Xavier e Leandra Regina Gonçalves
Capítulo 11 - A Macrometrópole Paulista e os desafios para o
planejamento e gestão territorial....................................................................90
Silvana Zioni, Luciana Travassos, Sandra Momm e Ana Lia Leonel
Capítulo 12 - Transportes e mobilidade urbana: desafios da adaptação
às mudanças climáticas na Macrometrópole Paulista ................................100
Silvana Zioni
Capítulo 13 - Breve levantamento de eventos climáticos extremos
na Macrometrópole Paulista.......................................................................... 114
Beatriz Milz e Ana Carolina Campos
Capítulo 14 - Apontamentos sobre urbanização, adaptação
e vulnerabilidades na MMP ..........................................................................120
Luciana Travassos, Sandra Momm e Pedro Torres
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Capítulo 15 - A Macrometrópole Paulista e o desafio de adaptar-se


à dinâmica da vulnerabilidade......................................................................127
Andrea Ferraz Young
Capítulo 16 - Desafios para a adoção de medidas adaptativas
em municípios de pequeno porte: experiências no
Vale Histórico Paulista...................................................................................138
Sílvia Helena Zanirato
Capítulo 17 - Risco, Desastre e Adaptação na MMP...........................................152
Samia Nascimento Sulaiman, Katia Canil, Fernando Rocha Nogueira e
Pedro Roberto Jacobi
Capítulo 18 - Reflexões sobre a adaptação às mudanças climáticas
na Zona Costeira no contexto da Macrometrópole Paulista ..................... 161
Leandra Regina Gonçalves, Luciana Yokoyama Xavier,
Marina Ribeiro Corrêa e Alexander Turra
Capítulo 19 - O Nexo Água–Energia–Alimento e os desafios
da governança ambiental da Macrometrópole Paulista ............................. 171
Vanessa Empinotti, Leandro Giatti, Paulo A. A. Sinisgalli e Célio Bermann
Capítulo 20 - Mudanças climáticas, alterações potenciais e estratégias de
mitigação de seus efeitos na biodiversidade da Macrometrópole Paulista.....178
Tiago S. Vasconcelos
Capítulo 21 - Adaptação baseada em Ecossistemas para
a Macrometrópole Paulista............................................................................185
Paulo A. A. Sinisgalli , Alexandre Igari, Wilson Cabral de Sousa Jr.,
Camila Espezio de Oliveira, Marianne Frederick e Alberto Medici
Capítulo 22 - Agricultura, ruralidades e adaptação na MMP............................192
Arilson Favareto e Vanessa Empinotti
Capítulo 23 - Informação e formação: como a mídia percebe e
relata os eventos climáticos severos na Macrometrópole Paulista.............208
Pedro Luiz Côrtes
Capítulo 24 - Panorama brasileiro sobre adaptação às mudanças
climáticas no contexto de áreas urbanas ..................................................... 219
José A. Marengo
Capítulo 25 - Caminhos para a agenda de adaptação no Brasil:
do plano nacional à escala municipal...........................................................226
Mariana Nicolletti
Capítulo 26 - A Política de Mudanças Climáticas no Estado de São Paulo .....234
Jussara de Lima Carvalho
Capítulo 27 - Educação para a adaptação: caminho para o protagonismo,
criatividade e corresponsabilização ............................................................. 241
Edson Grandisoli
Capítulo 28 - Adaptar para quem e como? Adaptação e justiça ambiental
na Macrometrópole Paulista..........................................................................248
Pedro Torres e Ana Lia Leonel
Glossário ................................................................................................................257
Organizadores .......................................................................................................261
Sobre os autores: ...................................................................................................262
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Apresentação

Aproximando ciência e política para a


tomada de decisão em adaptação
às mudanças climáticas
Carlos A. Nobre1

G lobalmente, as mudanças climáticas já apresentam im-


pacto significativo, como, por exemplo, o aumento do ní-
vel do mar, o encolhimento das áreas cobertas por gelo no Ártico,
a exacerbação dos extremos climáticos ocasionando desastres na-
turais e perdas de safras agrícolas, entre muitos outros. Em muitas
megacidades, esse efeito é multiplicado pelas mudanças climáticas
de origem local, especialmente o impacto da “ilha urbana de ca-
lor”, aumento da impermeabilização para o escoamento das águas,
poluição urbana e emissão de particulados, remoção de vegetação
etc. Todos esses impactos urbanos estão presentes de forma acen-
tuada na Macrometrópole Paulista (MMP). As mudanças climáti-
cas observadas na MMP devido ao acelerado processo de urbani-
zação – transcorrido quase sempre de forma caótica e muito longe
de um planejamento adequado – são sentidas diuturnamente na
vida da cidade e de sua sofrida população: nos últimos 80 anos, a
temperatura média se elevou cerca de 3°C e o diferencial de tem-
peratura entre a cidade e áreas vegetadas ao redor da MMP chega
a 7° C em dias ensolarados; os episódios de chuvas destruidoras
(por exemplo, acima de 100 mm em 24 horas) já ocorrem uma vez
por ano em média, em comparação a uma ocorrência por década
até a década de 1940. Em resumo, mudanças climáticas de fato já
chegaram à MMP, há tempos e de forma contundente e impactan-
te. Nos vários cenários traçados pelo Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC – Intergovernmental Panel on
Climate Changes), somente no final deste século, e no caso de

1
Pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP. Pesquisador aposentado do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

o Acordo de Paris não ter sucesso, as temperaturas globais terão


aumentado 3°C em relação ao período pré-industrial, valores já
atingidos nos pontos mais urbanizados da MMP.
Considerando esse quadro de mudanças climáticas exacerba-
das e já sentidas na MMP, pode-se perguntar quais foram as po-
líticas públicas de adaptação tomadas nas últimas décadas, uma
vez que essas mudanças já eram claramente discerníveis mesmo
antes de o tópico das mudanças climáticas globais tornar-se rele-
vante. De fato, quase sempre foram medidas de adaptação reativas
e de baixa efetividade como, por exemplo, os piscinões. Como no
caso das mudanças climáticas globais, são as populações pobres e
vulneráveis da MMP as mais afetadas pelas mudanças climáticas
observadas. E as projetadas mudanças climáticas futuras podem
colocar mais obstáculos à redução da pobreza.
É interessante notar que, somente no momento em que o
tema de políticas de adaptação e aumento da resiliência frente às
mudanças climáticas globais adquiriram aderência internacional,
acopladas a marcos globais de sustentabilidade, como o crescen-
temente importante marco dos Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável que coloca enorme ênfase na construção de cidades
sustentáveis e resilientes, inicia-se um esforço de buscar soluções
de adaptação para a MMP. Bem dentro da tradição brasileira, res-
pondemos principalmente a pressões externas – que de qualquer
modo são urgentes e mandatórias na questão da adaptação às mu-
danças climáticas – ao invés de termos nossas próprias políticas
que abarquem os muitos desafios nacionais de sustentabilidade.
Adaptação é sempre visto como algo complexo, envolvendo
ações em nível local que não se dissociam de ações de desenvol-
vimento prioritárias como redução da pobreza, saúde, empregos,
qualidade de vida, mas que dependem também de apoio de po-
líticas e instituições, inclusive quanto ao seu financiamento, que
são normalmente nacionais. No século XXI, torna-se essencial
igualmente buscar soluções no terreno das inovações tecnológicas.
O livro Adaptação às mudanças climáticas na Macrometrópole
Paulista – Diálogos entre política e ciência reúne destacados pesqui-
sadores nacionais e internacionais num notável e pioneiro esforço
acadêmico interdisciplinar que cobre, em profundidade, em seus
28 capítulos todos os aspectos relevantes da temática da adapta-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

ção às mudanças climáticas para esta Macrometrópole Paulista de


mais de 25 milhões de habitantes, refletindo uma diversidade de
perspectivas. Descreve em detalhes as mudanças climáticas que já
ocorrem, seus impactos e os riscos futuros para a MMP em termos
de saúde humana, desastres naturais, mobilidade e o desenvolvi-
mento econômico. Ao mesmo tempo, aborda as várias dimensões
das políticas públicas de adaptação e sugere caminhos para sua
implementação, inclusive trazendo exemplos de outras metrópoles
do mundo, em direção ao bem-estar humano, redução da pobreza
e preservação ambiental para uma macrometrópole sustentável e
resiliente.
Trata-se de um livro dirigido para uma ampla gama de leito-
res, desde estudantes universitários e pesquisadores interessados
em seus múltiplos temas, passando para praticamente todos os
tomadores de decisão em políticas públicas pela centralidade do
tema na questão de desenvolvimento sustentável, até o público em
geral que deseje informação de qualidade sobre mudanças climá-
ticas e a Macrometrópole Paulista. Este livro aumentará a visibi-
lidade da temática de adaptação e da necessidade de se buscar
soluções criativas e inovadoras para uma MMP mais sustentável.

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Introdução

Cidades, metrópoles ou metrópoles


expandidas devem se planejar para
enfrentar as mudanças climáticas
Pedro Torres1, Pedro Jacobi1,
Fabiana Barbi2 e Leandra Regina Gonçalves3

E ntre março e julho de 2018, o Instituto de Energia e Am-


biente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP) e a Fun-
dação Getúlio Vargas, Centro de Estudos em Sustentabilidade (FG-
V-CES) realizaram uma pesquisa internacional com uma rede de
parceiros ligados ao Centro de Cambio Climático y Toma de Deci-
siones, com sede no Uruguai, com o objetivo de analisar as lacunas
de conhecimento para a área de adaptação em relação aos gestores
públicos em escala municipal, estadual e nacional.
Foram realizados questionários com gestores públicos e entre-
vistas com especialistas em adaptação às mudanças climáticas, que
tenham ocupado, ou ocupem, cargos na administração pública.
Uma das conclusões preliminares do estudo indica que, atualmen-
te, não temos carência de produção da informação científica sobre
adaptação às mudanças climáticas, ao contrário, ela tem sido ob-
jeto de inúmeras pesquisas e publicações recentes4. O que ainda
demanda mais desenvolvimento, do ponto de vista da governança
ambiental, é a produção de material e a capacitação dos gestores
que atuam na ponta do processo decisório, nas mais diversas esca-
las, sobre a temática.
A iniciativa deste livro já é, portanto, uma resposta propositiva
ao diagnóstico encontrado na referida pesquisa. Buscando, ainda,

1
Instituto de Energia e Ambiente (IEE). Universidade de São Paulo (USP). Projeto
Temático FAPESP 2015/03804-9.
2
Universidade Católica de Santos e NEPAM-UNICAMP.
3
Instituto Oceanográfico (IO). Universidade de São Paulo (USP).
4
Mais informações sobre o Projeto LatinoAdapta e o Informe Brasil estão disponíveis no
website http://www.cambioclimaticoydecisiones.org/proyecto-latinoadapta/

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

de forma inovadora, uma produção científica que a partir de uma


linguagem mais fácil de ser entendida atinja o maior número possí-
vel de interessados. Que, ainda, seja aplicável, reproduzível, e inspire
outras iniciativas semelhantes nas mais diversas áreas do saber. Para
tanto, reunimos um time extremamente qualificado de especialis-
tas, do Brasil e de outros países, mostrando que, do ponto de vista
da ciência, existe sólida produção, para o desafio de escrever um
livro que seja útil ao grande público e à sociedade como um todo.
Acreditamos que essas iniciativas, em um ambiente acadêmi-
co marcado pelo excesso do produtivismo e apologia ao mundo
qualis, são fundamentais para a construção de um novo paradigma
epistemológico na forma como precisamos encarar no século XXI,
sobretudo a partir do sul-global, a nossa relação com a produção
de políticas públicas para as cidades, a gestão dos recursos comuns,
assim como a justiça e a governança ambiental urbana.
As cidades, em especial as metrópoles – e suas extensões como a
Macrometrópole Paulista (TORRES, RAMOS e GONÇALVES, 2019)
–, têm sido mencionadas, cada vez com maior frequência, como com-
ponentes do problema e também das soluções aos efeitos das mudan-
ças climáticas. O principal painel intergovernamental para pesquisas
em mudanças climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU),
o IPCC, atento à questão, realizou em março de 2018, pela primei-
ra vez, o Cities & Climate Change Science Conference, endossando a
importância da discussão das cidades como centro dos debates climá-
ticos, como já recomendava a 43a sessão do IPCC em Nairobi (2016).
Essa sessão recomendava que no sétimo ciclo de avaliação (AR7) fosse
incluído um “Special Report on Climate Change and Cities”, consi-
derando trabalhar com acadêmicos, profissionais urbanos, órgãos e
agências científicas a fim de estimular relatórios científicos e publica-
ções revisadas por pares sobre o assunto.
E por que as cidades, as metrópoles? Estas representam mais
de 70% das emissões globais de dióxido de carbono (CO2), prove-
nientes de combustíveis fósseis (SETO et al., 2014) e são espaços
vulneráveis aos impactos advindos das mudanças climáticas (REVI
et al., 2014). Somado a isso, o processo de urbanização em escala
planetária se mantém em ritmo acelerado, sobretudo em regiões
do sul-global, como a América Latina – região mais urbanizada do
mundo –, China, Índia e África.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Embora quase um consenso em fóruns de debates interna-


cionais, as ações ou a liderança das cidades como atores ativos em
relação aos efeitos das mudanças climáticas em escala subnacional
continua frágil no Brasil. No Estado de São Paulo, maior Produto
Interno Bruto (PIB) do país, ou não existem legislações específicas
sobre mudanças climáticas, planos de adaptação ou mitigação, ou
quando existem, como no caso da cidade de São Paulo, seu cum-
primento fica à mercê da conjuntura momentânea como registra-
do na alteração da Lei 14.933, de 2009, que estipulava que em 2018
nenhum ônibus da capital fosse movido com combustível fóssil,
para a Lei 16.802, de 17 de janeiro de 2018, que estende novamen-
te o prazo para mais 20 anos.
Nos confrontamos, como no caso supracitado, e não é novida-
de, na frágil governança de nossos recursos naturais e bens comuns,
na ausência de um planejamento ambiental estratégico, justo e factí-
vel. Nesse sentido, mostra-se imperativo reforçar o caráter pedagógi-
co e de formação do conhecimento em relação ao tema, implodindo
e explodindo as paredes da academia ou dos fóruns internacionais.
Um dos principais desafios da governança é, sem dúvida, a integra-
ção intergovernamental, o aperfeiçoamento da gestão municipal –
com gestores e tomadores de decisão qualificados – respaldados por
uma administração que possua uma visão de longo prazo, e uma
gestão baseada mais na prevenção do que na ação emergencial e
curativa (JACOBI e NASCIMENTO, 2016).
No caso da adaptação às mudanças climáticas, objeto central
neste livro, trata-se de planejar e governar as incertezas e comple-
xidades, pois não sabemos quando nem em qual proporção virão
os impactos. Mas isso não deve ser desculpa para a inação. Ao con-
trário, a governança dos riscos e desastres naturais, buscando a
construção de ambientes urbanos mais resilientes é uma questão a
ser endereçada, sobretudo sendo o município o responsável princi-
pal pela gestão ambiental, territorial e de risco do desastre, “assim
como é o espaço primeiro do cidadão e de seus deveres e direitos
democráticos” (JACOBI e NASCIMENTO, 2016).
Dessa forma, os capítulos abordam temas referentes à gover-
nança das mudanças climáticas nas cidades, metrópoles e na Ma-
crometrópole Paulista, além de outros temas relacionados a essa
questão, como recursos hídricos, planejamento e gestão territorial,

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

eventos climáticos extremos, zonas costeiras, nexo água-energia


-alimento, biodiversidade, agricultura, questões de gênero, de saú-
de, percepção da mídia, divulgação científica, justiça ambiental e
educação. O livro também é produto das reflexões feitas acerca do
tema no âmbito do Projeto Temático FAPESP “Governança Am-
biental da Macrometrópole Paulista face à variabilidade climática
(2015/0308-9)” que produz e dissemina conhecimento, extrapo-
lando as barreiras das disciplinas, apresentando uma abordagem
interdisciplinar com a finalidade de construir diálogos entre a
ciência e a política.

Referências
BAI, Xuemei; DAWSON, Richard J.; ÜRGE-VORSATZ, Diana; DELGADO, Gian
C.; BARAU, Aliyu Salisu; DHAKAL, Shobhakar; DODMAN, David; LEONARD-
SEN, Lykke; MASSON-DELMONTE, Valérie; ROBERTS, Debra C.; SCHULTZ,
Seth. Six research priorities for cities and climate change. Nature, vol. 555, p.
23-25, 2018.
EMPLASA, 2019. https://emplasa.sp.gov.br/MMP
JACOBI, Pedro R.; NASCIMENTO, S. S. Governança ambiental urbana em face
das mudanças climáticas. Revista USP, v. 109, p. 133-142, 2016.
REVI, Aromar; SATTERTHWAITE, David; ARAGÓN-DURAND, Fernando;
CORFEE-MORLOT, Jan; KIUNSI, Robert B. R.; PELLING, Mark; ROBERTS, De-
bra; SOLECKI, William; GAJJAR, Sumetee Pahwa; SVERDLIK, Alice. “Towards
transformative adaptation in cities: the IPCC’ss Fifth Assessment”, Environment
and Urbanization, vol. 26, n. 1, pages 11-28, 2014.
TORRES, P.; RAMOS, R.; GONÇALVES, L. Conflitos ambientais na Macrome-
trópole Paulista: Paranapiacaba e São Sebastião. Revista Ambiente & Sociedade,
vol. 23, 2019.
SETO, K. C. et al., (Eds.) Climate change 2014, mitigation of climate change:
Contribution of Working Group III to the Fifth Assessment Report of the In-
tergovernmental Panel on Climate Change. Cambridge: Cambridge University
Press, 2014.

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Capítulo 1

Saberes interdisciplinares para adaptação:


comunidades, academia e meio ambiente
Luísa Schmidt1, Carla Gomes1 e Pedro R. Jacobi2

Palavras-chave: Adaptação. Coprodução de conhe-


cimento. Interdisciplinaridade. Metodologias parti-
cipativas. Processos transformativos.

Écada vez maior a evidência de que as mudanças climáticas


se devem, antes de mais, aos padrões de crescimento eco-
nômico e de consumo que são hoje dominantes à escala plane-
tária. O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas
(IPCC) deixa muito claro, no relatório especial sobre o aquecimen-
to global de 1,5ºC, lançado em outubro de 2018, que limitar o au-
mento da temperatura a esse nível seria fundamental para evitar
impactos profundos e irreversíveis nos ecossistemas e no bem-es-
tar e segurança das populações. No entanto, acrescenta, isso impli-
cará transições profundas e aceleradas nos sistemas de gestão do
solo, da energia, indústria, transportes e das cidades, de forma a
atingir a neutralidade carbônica até 2050, o que será muito difícil
de alcançar com a tecnologia de que hoje dispomos (IPCC, 2018).
As mudanças climáticas vêm assim evidenciar, mais do que
qualquer outro dilema ambiental, as contradições inerentes ao pró-
prio conceito de desenvolvimento sustentável, tal como foi absorvido
pelo discurso político dominante (REDCLIFT, 2005). Se até aqui se
procurava aplicar aos problemas ambientais soluções técnicas que
não comprometiam as estruturas institucionais vigentes, atualmen-
te a escala da mudança ambiental chegou a um ponto de ruptura,
em que é já evidente, em vários níveis, o esgotamento dos recursos
do planeta (ROCKSTRÖM et al., 2009; STEFFEN et al., 2015).
1
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Universidade de Lisboa.
2
Instituto de Energia e Ambiente (IEE) e Instituto de Estudos Avançados (IEA), Uni-
versidade de São Paulo (USP). Pesquisador responsável do Projeto Temático FAPESP
2015/03804-9.

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Nesse contexto, a problemática da adaptação às mudanças cli-


máticas tem assumido um papel central na reflexão em torno das
dimensões do desenvolvimento e das alternativas que se configu-
ram. O agravamento dos níveis de afetação climática tem provo-
cado um aumento da vulnerabilidade socioambiental, ao mesmo
tempo que aumenta também a consciência do público face à in-
cidência e intensidade dos eventos extremos, com os decorrentes
prejuízos econômicos.
Todavia, como sustenta O’Brien (2012), nas políticas e ações de
adaptação subsiste uma tensão entre a acomodação às mudanças ine-
vitáveis e esperadas – com uma preponderância das soluções técnicas
– e uma abordagem transformativa, que abra caminho à criação deli-
berada de alternativas de organização social. O desafio climático tra-
z-nos uma oportunidade de explorar modelos alternativos de desen-
volvimento econômico e social, que vão mais longe na concretização
dos valores do bem-estar humano e da justiça social, interrogando as
raízes sociais e econômicas da vulnerabilidade (PELLING, 2011).
A mudança climática, como problema complexo, caracteri-
zado pela incerteza e por uma pluralidade de perspectivas, re-
quer também, do ponto de vista da produção de conhecimento,
uma resposta transversal, que não se compadece com a compar-
timentação disciplinar característica do sistema científico nem
com uma divisão rígida de fronteiras entre os mundos natural e
social (BERKES & TURNER, 2006). Mais do que isso, exige que
se extravasem os papéis convencionais do cientista, do decisor
e do cidadão, em favor de uma coprodução de conhecimento
entre os diversos atores e grupos sociais (AGRAWAL, 2009).
Ao longo da última década, assistimos à emergência gradual de
uma nova abordagem integrada à ciência climática, que implica uma
desconstrução das estruturas tradicionais do saber a vários níveis:

a) a ultrapassagem do cisma entre ciências naturais e sociais,


com a emergência de múltiplos projetos integrados, que pro-
curam compreender melhor o fenômeno socioambiental da
mudança climática, antecipando cenários de risco futuro;
b) a transversalidade disciplinar, nas ciências naturais, so-
ciais e humanas (ex. colaboração mais estreita entre cien-
tistas sociais, como sociólogos, historiadores, economistas

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

e antropólogos) e emergência de novos campos disciplina-


res de fronteira;
c) a integração de diversos tipos e fontes de conhecimento,
incluindo um maior reconhecimento do chamado conhe-
cimento “leigo”, tradicional ou local.

Adaptação do sistema educativo: interdisciplinaridade


e diversidade
Num contexto marcado pela degradação planetária global,
chama a atenção a prevalência da racionalidade cognitivo-instru-
mental que está na sua origem. Coloca-se o desafio de ruptura com
a compartimentação do conhecimento, e isto envolve um conjunto
de atores do universo educativo em todos os níveis. Abre a possibi-
lidade de potencializar outras racionalidades para o engajamento
dos diversos sistemas de conhecimento, da formação e profissionali-
zação docente, de profissionais em geral e da comunidade universi-
tária, fortalecendo conteúdos e conhecimentos baseados em valores
e práticas sustentáveis, indispensáveis para estimular o interesse, o
engajamento e a responsabilização.
Sem renunciar às especialidades disciplinares atualmente
em vigor, mas certamente contribuindo para sua reformulação
e desenvolvimento, a noção do meio ambiente e sustentabilidade
recoloca o ser humano no centro das preocupações e dos progra-
mas científicos.
A emergência da questão ambiental, e particularmente das
mudanças climáticas, induz um processo mais complexo do conhe-
cimento e do saber para apreender os processos materiais que con-
figuram o campo das relações sociedade-natureza (MORIN, 2007).
As transformações sociais em curso convocam cada vez mais con-
cepções interdisciplinares para orientar estratégias de pesquisa e
de formação de políticas ambientais e de desenvolvimento susten-
tável, devendo-se reconhecer os efeitos das políticas econômicas
vigentes sobre a dinâmica dos ecossistemas e sobre as condições de
vida das sociedades (FUNTOWICZ, 2000). Os enfoques de conhe-
cimento se consolidam tendo como referentes os estudos em torno
dos efeitos da problemática ambiental sobre as transformações me-
todológicas, bem como os diálogos interdisciplinares que abrem

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um novo horizonte para o diagnóstico das mudanças socioambien-


tais e propiciam a formulação de diferentes abordagens em torno
da sustentabilidade ambiental (JACOBI, 2012).
Por outro lado, a multiplicação dos problemas ambientais, e
muito particularmente as mudanças climáticas, tem imposto às di-
versas disciplinas científicas temas para os quais estas não estavam
anteriormente preparadas e para cujo enfrentamento são obriga-
das a reformular os parâmetros de ensino e pesquisa.
A ênfase em práticas que estimulam a interdisciplinaridade e
a transversalidade revela o grande potencial que existe para o tra-
balho com temáticas que incitam mudanças no comportamento, na
responsabilidade socioambiental e na ética ambiental, o que estimula
outro olhar. Trata-se da importância de compreender a complexidade
envolvida nos processos e o desafio de ter uma atitude mais reflexiva
e atuante e, por conseguinte, que os cidadãos se tornem mais res-
ponsáveis, cuidadosos e engajados em processos colaborativos com o
meio ambiente (WALS, 2007). Tal aponta para a necessidade de esti-
mular uma participação mais ativa da sociedade no debate dos seus
destinos, como uma forma de estabelecer um conjunto socialmente
identificado de problemas, objetivos e soluções (JACOBI, 2012).
O caminho a ser desenhado passa, assim, necessariamente
por uma mudança no acesso ao conhecimento e à informação, por
transformações institucionais e da lógica de governança corporativa
e pela formação de lideranças focadas nas premissas que norteiem
a construção de uma sociedade sustentável, a partir do exercício de
uma cidadania ativa e da mudança de valores individuais e coletivos.
Desse modo, os processos educativos devem orientar-se para
formar as gerações atuais não somente para aceitar a incerteza e
o futuro, mas para gerar um pensamento complexo e aberto às
indeterminações, às mudanças, à diversidade, à possibilidade de
construir e reconstruir em um processo contínuo de novas leitu-
ras e interpretações do já pensado, configurando possibilidades de
ação naquilo que ainda está por pensar.
Emergem, assim, programas de formação de recursos humanos
baseados numa perspectiva interdisciplinar, contemplando uma nova
articulação das conexões entre as ciências naturais, sociais e exatas.
Isso representa um exemplo concreto do estabelecimento de uma co-
laboração organizada entre as diferentes disciplinas que constituem

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o campo da ciência – para integrar ensino e pesquisa orientado para


a reflexão, análise e formulação de propostas de ação.

A adaptação como motor de transformação social


A necessidade de adaptação à mudança climática tem estimu-
lado uma aproximação às esferas de decisão, assumindo-se que
o esforço dessa adaptação requer uma colaboração mais estreita
entre decisores políticos – nas diversas escalas, global, nacional
e local –, cientistas e cidadãos, entendidos como stakeholders que
partilham o risco comum da mudança climática, embora com di-
ferentes necessidades, percepções e interesses.
As instituições públicas, bem como a academia, são cada vez
mais desafiadas a irem além da abordagem convencional top-down
e assumirem uma filosofia de aprendizagem mútua (ADGER et
al., 2005). Nesse contexto, emergem modelos participativos como
a investigação-ação, bem como os conceitos da coprodução de co-
nhecimento e dos facilitadores na transmissão de conhecimento
(knowledge brokers) (DILLING & LEMOS, 2011).
A capacitação dos gestores públicos, por exemplo, é uma com-
ponente crucial dos processos adaptativos. Experiências recentes
de coprodução de estratégias de adaptação, em nível municipal, de-
monstraram como a capacitação reforça a capacidade de resposta
das instituições locais, criando simultaneamente um maior sentido
de compromisso político entre os decisores locais e uma articulação
virtuosa entre ciência e política. Por um lado, o foco no nível local
permite uma resposta de proximidade que tenha em devida conta
as especificidades de cada território, em nível biofísico, social e eco-
nômico. Por outro lado, esses decisores passam a desempenhar um
papel fulcral, como elos com os restantes municípios, permitindo a
criação de uma rede de disseminação das boas práticas adaptativas
replicáveis noutras zonas geográficas (SCHMIDT et al., 2018).
Face à urgência da adaptação climática, e à evidência de que
esta não será possível sem mudanças institucionais e de comporta-
mentos, as abordagens participativas fomentam assim a correspon-
sabilização entre instituições e actores sociais, maior transparência
e legitimidade dos processos de decisão e um acompanhamento
efectivo da implementação das políticas públicas.

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A vulnerabilidade e as percepções de diferentes stakeholders, em


diversas escalas espaciais e temporais, tem de ser considerada em
qualquer opção de adaptação. Estas estarão em constante negocia-
ção, pois os critérios que a elas presidem, de carácter social e am-
biental, poderão mudar ao longo do tempo (ADGER et al., 2005).
Nesse processo de aprendizagem social é crucial o papel dos know-
ledge brokers, membros da comunidade – decisores locais ou outros
stakeholders – que vão facilitar a disseminação de ideias, práticas e
conhecimentos adaptativos. A coprodução de conhecimento per-
mitirá, assim, criar relações de confiança entre os stakeholders, cru-
ciais para as ações de adaptação no terreno, bem como aumentar a
consciência sobre os riscos climáticos (McNIE, 2013).
Uma outra dimensão que tem vindo a ganhar visibilidade, no
contexto da adaptação climática, é a possibilidade de integrar, de
uma forma mais efetiva do que até aqui, o conhecimento e as práticas
de grupos sociais tipicamente negligenciados na produção de conhe-
cimento científico, como por exemplo, os pescadores tradicionais ou
os agricultores familiares. Se até há pouco tempo o conhecimento
“leigo”, tradicional, ou local era secundarizado, atualmente o concei-
to está presente no discurso político internacional, e também no con-
texto da investigação sobre adaptação. Para uma verdadeira integra-
ção será necessário, no entanto, repensar o papel tradicionalmente
atribuído a cada matriz de conhecimento (KLENK et al., 2017).
Em qualquer caso, para quebrar o hiato existente entre o re-
conhecimento da emergência climática e a construção real de prá-
ticas capazes de estruturar as bases de uma sociedade sustentável e
adaptada, coloca-se a necessidade de fortalecimento das tradicional-
mente designadas “comunidades de prática” (WENGER, 1998) 3 e da
aprendizagem social (GLASSER, 2007)4, bem como processos que
permitam ampliar o número de pessoas no exercício desse conhe-
cimento e a comunicação entre essas pessoas, de modo a potenciar
interações que tragam avanços substanciais na produção de novos
repertórios e práticas de mobilização social para a sustentabilidade.
O maior desafio será criar oportunidades de aprendizagem
3
Conforme Wenger (1998): “Comunidades de prática são grupos de pessoas que
compartilham uma preocupação ou paixão por algo que fazem e aprendem como
fazê-lo melhor na medida em que interagem com regularidade”.
4
Aprendizagem social é entendida aqui como um processo de mudança cultural orien-
tado para o enfrentamento dos problemas socioambientais da atualidade.

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social ativas, nas quais se verifique o real envolvimento dos sujeitos


em relações de diálogo que favoreçam: a percepção da diversidade
de opiniões e visões de mundo; a mediação de interesses indivi-
duais e coletivos; e a possibilidade de ampliação de repertórios que
aumentem a capacidade de contextualizar e refletir.
Urge, pois, aprofundar o desenvolvimento de metodologias co-
laborativas, em escalas múltiplas, que procurem consagrar um pro-
cesso de governança funcional, integrador e transparente, o que im-
plica, para além da participação, outras componentes, tais como a
abertura à informação e ao diálogo, a responsabilidade partilhada,
a eficácia e a coerência. Sendo a adaptação às alterações climáticas
um processo de aprendizagem social, a construção de compromis-
sos com uma base social alargada reforça a legitimidade das políti-
cas e fortalece as respectivas prioridades de atuação. A participação
de stakeholders é, pois, fundamental para maximizar sinergias e asse-
gurar uma boa coordenação e conjugação de respostas e recursos,
bem como promover a qualidade e a aceitação das opções políticas
adotadas e potenciar o sucesso na sua implementação.
O último relatório do IPCC aponta a necessidade de mudanças
profundas no sistema econômico, político e sociocultural, o que ape-
nas será possível através de uma transformação estrutural nas lógicas
de produção e disseminação de conhecimento sobre as mudanças
climáticas. A este nível é importante uma abordagem integrada que
ultrapasse barreiras entre ciências naturais e sociais, implicando uma
transversalidade disciplinar e a inclusão de novos saberes. Torna-se
ainda necessário adotar novas práticas de adaptação, que passam
por um maior envolvimento de diferentes atores e por metodologias
transformativas, que favoreçam uma mobilização para a mudança.

Referências
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Capítulo 2

Democracia e governança do clima:


diálogos Norte-Sul
Klaus Frey1 e Jutta Gutberlet2

Palavras-chave: Governança. Democracia. Clima.


Diálogos Norte-Sul.

N este artigo queremos refletir sobre o papel da demo-


cracia e da governança em relação às possibilidades e
dilemas de um enfrentamento efetivo dos riscos relacionados às
mudanças climáticas. Embora a ênfase desta coletânea seja a Ma-
crometrópole Paulista, a nossa intenção neste capítulo é colocar a
temática numa perspectiva mais ampla. De início, é fundamental
ressaltar que existe uma forte dependência de qualquer política do
clima, seja local ou regional, de uma política correspondente em
nível internacional, do regime internacional do clima, capaz de
proporcionar diretrizes adequadas e dar orientação para uma po-
lítica que seja consistente em diferentes escalas territoriais. Daí re-
sulta a importância em nossa reflexão da adoção de uma perspec-
tiva de escalas: do global ao local. Na medida em que os conflitos
derivados das variações climáticas vêm se acirrando, a macrome-
trópole se tornará crescentemente objeto de políticas de mitigação
e adaptação, assim como arena política para a cooperação regional
e a negociação democrática para uma efetiva governança do clima.
Queremos explorar a ideia de que, no futuro, a macrometrópo-
le desempenhará um papel crescente no âmbito de uma governança
do clima e que terá que ser de caráter multinível, policêntrico, par-
ticipativo e politizado, para que se possam alcançar respostas tecni-
camente efetivas, ambientalmente sustentáveis, socialmente justas e
politicamente democráticas. Para avançar nesta reflexão, o capítulo
1
Universidade Federal do ABC (UFABC), Programa de Pós-Graduação em Políti-
cas Públicas (PGPP) e Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão do
Território (PGT). Pesquisador Principal do Projeto Temático FAPESP 2015/03804-9.
2
University of Victoria, Canada, pesquisadora visitante na UFABC com bolsa FAPESP
(Processo 2018/07702-4), associada ao Projeto Temático FAPESP 2015/03804-9.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

é dividido em três partes, além desta introdução. Na primeira parte


analisamos sucintamente a governança global do clima da perspecti-
va Norte-Sul; na segunda, abordamos alguns dilemas democráticos
relacionados às mudanças climáticas, para, na parte final, apresentar
alguns desafios que se colocam para as cidades e as grandes metró-
poles, com ênfase nas possibilidades de uma governança democrática
do clima da Macrometrópole Paulista.

Governança global do clima na perspectiva do


diálogo Norte-Sul
Se comparadas com grande parte das demais políticas públicas
setoriais, as políticas ambientais apresentam algumas características
particulares como: a necessidade da adoção de abordagens inter-
setoriais e interdisciplinares; sua interdependência estreita com as
atividades econômicas, tanto com relação à de produção quanto do
consumo. Portanto, o alto potencial de conflito inerente às políticas
ambientais; sua complexidade técnico-científica no que concerne os
impactos espaciais e temporais, exigindo a recorrência permanente
ao conhecimento técnico-científico dos experts e peritos. Estas par-
ticularidades da política ambiental se revelam ainda mais graves no
caso da política do clima, fazendo das mudanças climáticas, segun-
do Fiorino (2018, p. 27), “o maior problema de ação coletiva da his-
tória”. Enquanto tais problemas não provocam desastres concretos,
eles tendem a se acumular gradualmente, dependendo do progres-
so científico para tornar as ameaças ecológicas visíveis e, consequen-
temente, politicamente tratáveis pelo sistema político.
Um dos dilemas das mudanças climáticas é que frequentemen-
te ocorre um desacoplamento entre os lugares onde esses problemas
são primordialmente gerados e os lugares onde eles principalmen-
te causam danos ambientais, econômicas e sociais (em geral locali-
zadas no Sul Global). Assim, soluções efetivas e socialmente justas
para os problemas globais dependem de uma “visão cosmopolita”
(BECK, 2007, p. 315); e com isso, do abandono dos impulsos egoís-
tas e de curto prazo que ainda dominam no jogo atual da gover-
nança global do clima (FRANCHINI, VIOLA, BARROS-PLATIAU,
2017), colocando em evidencia a centralidade da “ justiça climática”
como desafio da governança global do clima.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Os princípios da justiça ambiental e climática reconhecem o


enorme abismo que separa os pobres dos ricos quanto à disponibi-
lidade de recursos, colocando em questão o “direito ao desenvolvi-
mento” (MRF, 2015, p. 1) dos países mais pobres e dos pobres nas so-
ciedades tanto dos países do Sul quanto do Norte. A falta de acesso
a recursos torna impossível que grande parte da população humana
mundial leve uma vida decente, algo absolutamente essencial a se
reverter. A dimensão da problemática relacionada com a mudança
climática destaca a verdadeira interdependência com todas as for-
mas de vida e entre os diversos mundos, reconhecendo-se que essas
relações devem “levar a um paradigma novo e respeitoso de desen-
volvimento sustentável, baseado na necessidade urgente de ampliar
e transferir tecnologias verdes e apoiar estratégias resilientes de bai-
xo carbono para os mais pobres, para que elas se tornem parte do
esforço combinado de mitigação e adaptação” (MRF, 2015, p. 1).
Bulkeley et al. (2014) ainda chamam a atenção em relação aos
gradientes de riqueza e pobreza de recursos que existem entre as
populações no Sul Global, onde os afluentes e influentes geralmente
não são identificados como sendo pessoas privilegiadas, com mais
recursos e que, portanto, deveriam arcar com diferentes graus de
responsabilidade na discussão de justiça climática. Assim, torna-se
necessário fazer essas diferenciações e incluir na discussão da justiça
climática as grandes disparidades socioeconômicas que existem, às
vezes na mesma comunidade ou na mesma cidade ou região.
Todavia, na literatura é bastante disseminado um ceticismo
relativo à capacidade do atual sistema de governança global de
promover o equilíbrio planetário necessário para a humanidade
se manter dentro do “espaço seguro do desenvolvimento huma-
no”, ou seja, dentro dos “limites do ‘campo de jogo planetário’ da
humanidade, se quisermos ter certeza de evitar uma maior mu-
dança induzida pelo homem em escala global” (ROCKSTRÖM et
al., 2009, p. 1), demandando “níveis de cooperação nunca antes
alcançados pela sociedade internacional na governança global”
(FRANCHINI, VIOLA, BARROS-PLATIAU, 2017, p. 178).
A expectativa de que a ciência – representada na política do cli-
ma pelo Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas – sim-
plesmente investigue e depois sensibilize a política sobre o problema
da mudança global do clima, permitindo assim que esta possa desen-

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volver as soluções adequadas, parece pouco realista e vem esbarrando


nas estruturas e relações de poder da sociedade capitalista em que
predomina a busca pelo lucro, a acumulação do capital e a explora-
ção da natureza de forma que os avanços alcançados não passam de
mecanismos de modernização ecológica, mas que no final das contas
evitam as mudanças societais e econômicas estruturais que a atual
idade do Antropoceno parece demandar (FRANCHINI, VIOLA,
BARROS-PLATIAU, 2017). Como então alcançar as políticas e de-
cisões coletivas necessárias para implementar as ações coletivas para
uma verdadeira transformação socioecológica estrutural capaz de
viabilizar estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáti-
cas? Esta pergunta coloca a política e a própria democracia no centro
da atenção e serão por isso investigadas a seguir.

A democracia no contexto das mudanças climáticas


Os princípios da justiça do clima ressaltam a importância de as-
segurar que as decisões tomadas sobre mudança climática sejam par-
ticipativas, inclusivas, transparentes e que os tomadores de decisão
prestem contas de seus atos perante a sociedade (accountability). Signi-
fica que os mais vulneráveis às mudanças climáticas sejam ouvidos e
que as práticas de mitigação e de adaptação focalizem principalmente
nesses grupos. No nível regional e da macrometrópole de São Paulo,
isso significa identificar as desigualdades, as vulnerabilidades e a es-
cassez de recursos no âmbito desse território, dando prioridade aos
trabalhos preventivos que beneficiem essas populações.
Uma governança que visa à sustentabilidade, à mitigação e
adaptação às mudanças climáticas e, simultaneamente, pretende
ser democrática, includente e justa, tem que necessariamente en-
volver os diversos atores da sociedade nas práticas de governar.
Governança interativa (FREY, 2004) representa justamente uma
adaptação do sistema político-administrativo à diversidade, com-
plexidade e dinâmica da sociedade contemporânea.
Não é fácil alcançar a expectativa de conciliar interesses de
múltiplos atores públicos e privados que intervêm num território,
alcançando um resultado que seja benéfico ou pelo menos aceitá-
vel a todos. O processo participativo requer um elevado nível de
organização e de mobilização da sociedade para resolver os pro-

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blemas comuns, construindo saídas de natureza coletiva. No con-


texto do Sul Global, se colocam ainda inúmeras outras dificulda-
des, que são decorrentes da crise fiscal, da falta de investimentos
públicos ou dos níveis elevados de corrupção nos setores público
e privado. Nas discussões e nas deliberações surgem conflitos e
discordâncias. Entendemos o conflito como força da transforma-
ção dentro dos processos democráticos para a sustentabilidade,
como se expressa na democracia agonística, que pressupõem que
o conflito é a essência da política e da democracia (RANDOLPH
& FREY, 2019). Segundo Mouffe (2006), há necessidade de trans-
formar antagonismos em agonismos e inimigos em adversários,
por meio de arenas nas quais os conflitos podem vir à tona. Ain-
da ressalta que é indispensável um projeto contra-hegemônico
baseado nos princípios da justiça socioambiental, dada a insus-
tentabilidade do sistema capitalista, focado prioritariamente na
busca do lucro.
Nessa perspectiva, não se deve nem aspirar à eliminação do
conflito e nem abrir mão do diálogo e da contínua negociação. Tan-
to o conflito quanto a busca do consenso são elementos essenciais
da política quanto da democracia. A política democrática nunca
acontece sem conflitos, ao mesmo tempo em que a governabilida-
de depende de compromissos, de consensos possíveis, temporários,
nunca permanentes (MOUFFE, 2006; RANDOLPH & FREY, 2019).
Na governança do clima entram em choque abordagens opostas en-
tre aqueles que exigem atuações imediatas para mitigar e reverter
o quadro imposto pelas forças que provocam a mudança climáti-
ca, e o poder hegemônico que continua defendendo o desenvol-
vimento baseado no crescimento, no produtivismo e consumismo
(ESCOBAR, 2015). Uma percepção agonística da democracia abre
espaços onde diferentes atores se fazem presentes e onde os confli-
tos podem se manifestar e ser abertamente discutidos e resolvidos
para promover as necessárias transformações sociais, ambientais
e políticas. Como na prática é difícil essa negociação construtiva,
se pode observar através dos exemplos de cidades que têm imple-
mentado orçamento participativo, planejamentos no nível de bacia
hidrográfica ou a participação deliberativa por meio de conselhos
de políticas públicas.

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Uma governança democrática do clima para as


cidades e metrópoles?
O aumento da temperatura e de eventos climáticas extremos,
levando a inundações, deslizamentos, destruição de infraestrutura
e secas prolongadas já estão entre os grandes desafios nos centros
urbanos adensados. No contexto do Sul Global ainda se adicio-
na a questão da inequidade, como a exposição desigual ao stress
térmico. Pouca atenção tem sido dada ao impacto combinado dos
efeitos das ilhas de calor locais e das mudanças climáticas globais,
que afetam sobremaneira os moradores de baixa renda na perife-
ria das cidades. Crescimento populacional e déficit habitacional
principalmente para habitantes de baixa renda são fatores agra-
vantes no contexto do Sul Global. As disparidades entre bairros
de alta e de baixa renda em relação à presença de espaços verdes
já foram comprovadas em cidades no mundo inteiro, porém são
particularmente óbvias no Sul Global (WOLCH et al., 2014). A
falta de infraestrutura e serviços básicos resulta em impactos es-
pacialmente desiguais que prejudicam desproporcionalmente as
populações marginalizadas e vulneráveis. Esses aspectos relaciona-
dos à (in)justiça climática precisam estar na agenda internacional,
entrando nas negociações globais sobre o clima.
A perspectiva das relações Norte-Sul perpassa todas as nego-
ciações do regime internacional do clima e exige das grandes me-
trópoles do mundo exercerem um papel crescente na mitigação dos
impactos da mudança climática. Defendemos o conceito de uma
governança ambiental “glocal”, de caráter policêntrico, multinível
que esteja pautada num modelo de democracia agonística. Porém,
como Purcell (2009) adverte, essa forma de democracia pode tam-
bém ser cooptada pelo poder hegemônico, sem desafiar de fato as
fundações do projeto neoliberal. Ele ainda indica a necessidade de
buscar uma prática democrática que seja “inequivocamente hostil
à neoliberalização” (PURCELL, 2009, p. 147). Essa transformação
da agenda política, atendendo à governança do clima, requer um
enfoque em forças e movimentos que muitas vezes atuam fora do
Estado, por meio de práticas insurgentes cuja força motriz está
localizada no seio da sociedade civil e na vida cotidiana das pes-
soas. Daí a necessidade de dar mais atenção ao potencial papel dos

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diversos movimentos populares, chamados de insurgentes pelas


suas práticas contestadoras e de resistência contra as práticas he-
gemônicas de planejamento e intervenção dos governos locais de
cunho neoliberal (por ex. Movimento dos Catadores, Movimento
dos Sem Teto e outros coletivos e movimentos populares de base).
Enquanto os “espaços convidados”, controlados pelos atores gover-
namentais, visam primordialmente legitimar as políticas insusten-
táveis, frequentemente de interesse apenas de setores dominantes,
autores como Miraftab (2018) apostam na capacidade desses movi-
mentos populares ocuparem novos territórios, os “espaços inven-
tados”, dos quais, assim espera-se, movimentos e projetos de fato
contra-hegemônicos possam emergir.
Por outro lado, é evidente que transformações efetivas em di-
reção a uma política local e regional de clima dependem tanto de
movimentos ambientais ativos e fortes, de movimentos populares
demandando justiça social e climática, de um mídia atenta e críti-
ca, como também de uma comunidade científica interdisciplinar e
politicamente consciente, além de governos capazes de intermediar
conflitos e de exercer liderança na busca de caminhos sustentáveis.
Ainda podemos reverter muitos dos grandes impactos prog-
nosticados se agirmos com responsabilidade e com compromisso
com a sustentabilidade. As cidades, e particularmente as grandes
aglomerações, são espaços ideais para mitigar os efeitos da mudança
climática através de transformações na produção, na construção,
no transporte, na geração e uso de energia, na redução e mudança
de hábitos no consumo, e com políticas participativas, trabalhando
ativamente os reais conflitos existentes ao invés de evitá-los ou silen-
ciá-los. As cidades e metrópoles, com suas grandes aglomerações
de pessoas e seu elevado capital social, buscando desenvolver e im-
plementar políticas inovadoras e de transformação, fundamentadas
em justiça social e ambiental, têm o potencial de realizar as trans-
formações necessárias para enfrentar os riscos aos quais estamos
crescentemente expostos no contexto do Antropoceno.
Ressaltamos a urgência de uma governança de clima que seja
decolonial, que conteste o domínio único do conhecimento ocidental
e que valorize outros saberes construídos através das experiências do
cotidiano, traduzidos em teorias e práticas que visam explicar os fe-
nômenos e processos urbanos no contexto específico do Sul Global.

29
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Por fim, a nossa reflexão aponta para a necessidade de examinarmos


mais profundamente o impacto das lutas dos movimentos sociais ur-
banos e de suas práticas insurgentes, na interação com os governos
e outros setores dominantes, para averiguarmos o seu potencial para
mudar agendas políticas em direção à justiça do clima.

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Capítulo 3

Inovações na governança climática


urbana: uma breve visão geral
das tendências globais
Jeroen van der Heijden1

Palavras-chave: Inovação. Governança climática


urbana. Tendências Globais. Redes de cidades.

Introdução – Governança climática urbana

M uitas vezes é enfatizado que as cidades são o epicentro


de atividades e comportamentos que contribuem para
as mudanças climáticas. Também que é nas cidades onde as con-
sequências da mudança climática seriam mais severas. Ao mesmo
tempo, estas são amplamente consideradas como os locais onde as
diversas dimensões das ações, sejam elas econômicas e tecnológicas
para a mudança e mitigação do clima têm o melhor potencial de
serem implementadas e ampliadas (IPCC, 2018; ONU, 2018). Bus-
cando utilizar seu potencial de mitigação e adaptação ao clima, as
cidades ao redor do mundo desenvolveram rapidamente os locais
de governança inovadora e experimental para estimular a ação cli-
mática (ROSENZWEIG et al., 2018).
Desde a década de 1990, pesquisadores e estudiosos vêm ma-
peando, explorando e interrogando essas intervenções de gover-
nança climática urbana, buscando entender se ajudam a acelerar a
transição para cidades de baixo carbono e resilientes. Inicialmente,
essa literatura apresentava narrativas esperançosas de práticas lo-
cais promissoras e às vezes apresentava cidades como os saberes do
planeta diante da mudança climática (BARBER, 2013; BRESCIA &
MARSHALL, 2016; C40 & ARUP, 2017; MEYER, 2013; NEWMAN,
BEATLEY, & BOYER, 2009). Mais recentemente, no entanto, os
estudiosos têm usado um tom mais crítico, indicando que nosso co-

1
Victoria University of Wellington, New Zealand.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

nhecimento sobre o que é uma governança efetiva do clima urbano


é fragmentado e disperso, e que muitas cidades ao redor do mundo
não estão tomando medidas necessárias para mitigar e adaptar-se à
mudança climática de forma efetiva (por exemplo, BAI et al., 2018;
JOHNSON, 2018; LUQUE-AYALA, MARVIN e BULKELEY, 2018;
RECKIEN et al., 2018; ROMERO-LANKAO, BURCH, & HUGHES,
2018; SENNET, BURDETT, & SASSEN, 2018).
A seguir, quatro tendências globais na governança climática
urbana são extraídas dessa extensa literatura, e é apresentada ao
leitor uma visão de como as cidades em todo o mundo estão res-
pondendo às mudanças climáticas. Esta revisão não é exaustiva,
mas deve fornecer aos leitores interessados indicações suficientes
a serem seguidas.

Redes urbanas: construção de capacidade conjunta


Ao olhar a literatura sobre a governança climática urbana,
a primeira tendência global que se destaca é o rápido desenvolvi-
mento de redes de cidades (ACUTO & RAYNER, 2016). Estas são
órgãos essenciais, mas muitas vezes informais, nos níveis translo-
cal e internacional, incluindo órgãos formais em nível local (JOR-
DAN & TURNPENNY, 2015), pois ajudam as cidades a aprender
umas com as outras, compartilham ideias e melhores práticas e
trabalham juntas para atingir um objetivo comum. Três redes de
cidades conhecidas são o Governos Locais pela Sustentabilidade
(Local Governments for Sustainability – ICLEI), o Grupo de Li-
derança Climática de Cidades (C40) e o Pacto Global de Prefeitos
pelo Clima e a Energia A primeira é uma rede internacional de
mais de 1.500 cidades, vilas e regiões, fundada em 1990; a segunda
é uma rede de mais de 80 das maiores cidades do mundo, funda-
da em 2005; e a terceira é uma rede de mais de 7.000 autorida-
des locais e regionais (a maioria de países europeus), fundada em
2008 (VAN der HEIJDEN, 2018). Existem algumas evidências de
que as redes municipais ajudam a superar as barreiras regionais e
nacionais à governança climática, incluindo a dificuldade de de-
senvolver e implementar a regulamentação obrigatória e a falta
de capital institucional, particularmente municípios menores. Por
exemplo, cidades progressistas em nações menos progressistas po-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

dem encontrar cidades com ideias parecidas em países mais pro-


gressistas. Além disso, através da combinação de recursos (fundos,
pessoal e assim por diante), essas redes são, em teoria, capazes de
realizar experimentos mais rigorosos (estas são discutidas abaixo)
do que as cidades podem conseguir por conta própria (ACUTO &
RAYNER, 2016; BANSARD, PATTBERG, & WIDERBERG, 2017).
Um exemplo típico de cidades que trabalham em prol de uma
meta conjunta em uma rede de cidades é um subgrupo das cidades
dos C40s que se organizaram como Connecting Delta Cities Network.
Esta é uma rede de cidades delta que ativamente busca a adaptação
climática urbana e de resistência às alterações climáticas em suas
cidades. O seu caráter único é que liga as cidades-membro no nível
da política por meio de um memorando de entendimento bilateral.
Isso estimula as cidades a compartilhar políticas e práticas, a ajudar-
se mutuamente a desenvolver e implementar ações climáticas e gerar
lições para a comunidade mais ampla de cidades-membro (FRAN-
CHESCH-HUIDOBRO, DABROWSKI, TAIB, CHANC e STEAD,
2017). O site da rede (www.deltacities.com) oferece uma riqueza de
informações e conhecimentos desenvolvidos por essas cidades e aces-
síveis às outras cidades que enfrentam desafios semelhantes.

Colaboração: trabalhando com cidadãos e empresas


Uma segunda tendência global na governança climática urbana
é a colaboração entre governo (local), cidadãos e empresas. Tem sido
muito argumentado que os governos não podem resolver a comple-
xidade societal, ambiental e os problemas econômicos (tais como
adaptação climática urbana e mitigação) por si, e que precisam co-
laborar com indivíduos e organizações fora do governo (ANSELLl
& GASH, 2008, 2017; GOLLAGHER & HARTZ-KARP, 2013). Em
pinceladas largas, o argumento é que a colaboração permite usar
recursos e conhecimento fora do governo na formulação de políti-
cas, bem como criar uma interdependência mútua para os progra-
mas de políticas e intervenções de governança implementadas. Essa
colaboração deverá resultar em soluções de contexto apropriado, e
produzir níveis mais elevados de aceitação das (e, em última análise,
a partir, de conformidade com) intervenções de governo desenvol-
vidas, do que aqueles desenvolvidos exclusivamente pelos governos

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

(GÓMEZ-ALVAREZ, RAJACK, LOPEZ-MORENO, & LANFRAN-


CHI, 2017; SIDIKI, CARBONI, KOSKI, & SADIQ, 2015).
Exemplos ilustrativos do processo de governança climática ur-
bana colaborativa são o desenvolvimento do Plano de One Less Nu-
clear Powerplant Policy (OLNPP) e o Seoul Plan in Seoul, da Coreia
do Sul. Tanto as políticas como as intervenções de governança subse-
quentes foram desenvolvidas em estreita consulta com os cidadãos,
e permitiram o envolvimento dos cidadãos na implementação de
ações climáticas urbanas. O OLNPP é o resultado de um processo
de desenvolvimento envolvendo 16 debates entre o Governo Metro-
politano de Seul e representantes da sociedade civil durante quatro
meses em sua fase de elaboração. O esboço do plano foi então apre-
sentado em reunião ampliada da prefeitura, da qual participaram
mais de 400 cidadãos. Eles faziam parte de um processo de revisão
envolvendo 22 discussões em grupo, que resultaram em mais de 100
ideias para ações de mitigação da mudança climática. Muitas dessas
ideias se refletiram no OLNPP (SMG, 2012). No desenvolvimento
do Plano 2030 de Seul, 220 cidadãos e especialistas estiveram envol-
vidos em cinco estágios no desenvolvimento de planos. O plano foi
revisado em audiência pública e em sessões de planejamento local
(WON-SOON, 2014; YI & JUNG, 2017). Isso representou para Seul
uma nova abordagem para o planejamento urbano colaborativo,
que ganhou para a cidade, em 2018, o Prêmio Lee Kuan Yew World
City para boa governança urbana e o Prêmio 2016 de Gotemburgo
para o Desenvolvimento Sustentável.

Experimentação: tentativa estruturada e erro


Uma terceira tendência global na governança climática urba-
na é a experimentação como um modo de governança. E o reflexo
disso é que experimentos, governos municipais e outras formas de
atuação formulam intervenções, processos e instrumentos de gover-
nança promissores para acelerar a ação climática local (BULKELEY,
CASTAN BROTO, & EDWARDS, 2015; JOHNSON, TOLY &
SCHROEDER, 2015). Os experimentos não devem ser confundidos
com empreendimentos ad hoc de implementação de novas formas
de governança. São tentativas intencionais de testar a governança
alternativa em locais deliberadamente estabelecidos, com base em

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

processos ou instrumentos em funcionamento para a produção de


conhecimento. A experimentação é um processo de tentativa e erro
estruturado para finalmente chegar a intervenções de governança
climática urbana eficazes em cenários específicos. E é essencial para
a experimentação a medição da mudança e ajuste de intervenções
para as lições aprendidas (EVANS, KARVONEN, & RAVEN, 2016;
JOHNSON et al., 2015; KARVONEN & VAN HEUR, 2014).
Uma ilustração de um experimento de governança climáti-
ca urbana é o muito elogiado Programa Cap and Trade, em Tó-
quio, introduzido originalmente em 2010 (CASTAN BROTO &
BULKELEY, 2013). O programa abrange aproximadamente 1.300
grandes edifícios comerciais ou propriedades compostas por vários
edifícios (como campi universitários). Combina reduções obrigató-
rias de emissões com operações de crédito voluntário e cobre 20%
das emissões de carbono de Tóquio. Em suma, os proprietários
dos edifícios podem
​​ obter as reduções de emissões exigidas, refor-
mando seus edifícios ou comprando créditos para compensar as
emissões de seus edifícios. Se atingem níveis mais altos de redução
do que o necessário, obtêm créditos que podem negociar com os
proprietários que não conseguem obter as reduções necessárias. O
programa continua a partir de um roteiro de divulgação obrigatória
de carbono, agora descontinuado, para grandes instalações comer-
ciais e industriais que estava em vigor de 2002 a 2009. As lições
aprendidas com esse programa foram essenciais para o desenvolvi-
mento do Programa Cap and Trade. De especial interesse é que o
programa aumenta o nível de reduções exigidas a cada cinco anos
para atingir cada vez mais elevadas reduções globais, e permitir que
os proprietários planejem o reequipamento de suas carteiras de pro-
priedade ao longo do tempo e aprendam a trabalhar com essa nova
abordagem para a redução de emissões (TRENCHER et al., 2016).

Programas voluntários: avançar sem força


Uma quarta e última tendência global digna de menção é
uma ampla variedade de programas voluntários e formas de go-
vernança implementadas em cidades do mundo todo que buscam
estimular a ação climática proativa de indivíduos e organizações,
mas sem a força da lei (VAN der HEIJDEN, 2017). A adesão a es-

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ses programas inclui recompensas exclusivas para aqueles que se


comprometem com eles, incluindo informações e conhecimento,
suporte financeiro e acesso a redes de pares e clientes (POTOSKI
& PRAKASH, 2009). Os programas voluntários geralmente se as-
semelham à estrutura das formas tradicionais de governança, que
consistem em um conjunto de regras, processos de monitoramen-
to e fiscalização e penalidades, por não conformidade ou recom-
pensas por cumprimento (COGLIANESE & NASH, 2014). Espera-
se geralmente que sejam mais fáceis de desenvolver e implementar
porque não precisam passar pelas verificações e balanços neces-
sários para as intervenções obrigatórias e podem ter como alvo
grupos específicos de empresas ou cidadãos, em vez de propor
uma solução “tamanho único”, como as intervenções obrigatórias
geralmente fazem (SIK & KRIZNIK, 2017).
Um exemplo típico é o Better Buildings Partnership, em Sy-
dney, Austrália, lançado em 2011. O programa reúne a Câmara
Municipal e os 14 principais proprietários da cidade. O objetivo é
reduzir as emissões de carbono, resíduos, energia e consumo de
água em edifícios pertencentes a esses grandes proprietários. Jun-
tos, são responsáveis ​​por mais de 50% de todos os imóveis comer-
ciais no distrito comercial central de Sydney. O programa exige
que seus participantes reduzam as emissões de carbono de seus
edifícios existentes em 2030 em 70% a partir das emissões de 2006
(BETTER BUILDINGS PARTNERSHIP, 2013). Os proprietários
participantes assinaram uma carta para o prefeito de Sydney pro-
metendo que farão melhorias em seus edifícios para atingir esse
objetivo. Em troca, a prefeitura os mantém envolvidos em possíveis
deliberações políticas para que possam planejar seus portfólios de
propriedade de acordo. Além disso, busca reduzir as barreiras re-
gulatórias que os proprietários de imóveis enfrentam na adapta-
ção de suas propriedades, e a cidade promove o desempenho e a
liderança dos participantes do programa em vários meios de co-
municação, incluindo um site dedicado ao programa.

Conclusão
Em suma, não faltam inovações na governança climática ur-
bana. As quatro tendências e exemplos aqui apresentados apenas

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tocam na superfície da ampla variedade de formas de governança


climática urbana nas quais as cidades estão envolvidas. Entretan-
to, toda essa inovação e o conjunto de respostas são suficientes
para conter a mudança climática? Ou pelo menos para prepa-
rar as cidades para as consequências de um clima em mudança?
Infelizmente, a resposta parece ser que fornecem um bom ponto
de partida, mas é necessária uma aceleração na velocidade e na
escala da ação climática urbana.
Estudiosos que têm esperanças quanto às cidades como salva-
dores do planeta, diante das mudanças climáticas, apontam que
as inovações de governança do tipo aqui apresentado contribuem
para mudar a narrativa rapidamente desde a assinatura do Acordo
de Paris de 2015. De forma crescente, os estudiosos apontam que
as cidades não podem conter as mudanças climáticas e responder
adequadamente às suas consequências apenas por si mesmas. Eles
defendem um rápido aumento das inovações bem-sucedidas em
escala regional e nacional, para articulação entre diferentes níveis
de governança visando permitir um fluxo de conhecimento e re-
cursos, para transcender as soluções técnicas para aqueles que mu-
dam seu comportamento em direção a medidas mais cautelosas,
requisitos obrigatórios em nível nacional (FUHR, HICKMANN, &
KERN, 2018; SMEDS & ACUTO, 2018; VAN der HEIJDEN, 2017).
Concluindo, afirmo que existe uma riqueza de informações
disponíveis de como, onde e com quais resultados as cidades ao
redor do mundo testam intervenções inovadoras de governança
climática. No lugar de testar abordagens ainda mais inovadoras,
agora parece que as cidades precisam dialogar mais, se interco-
nectar e aprender umas com as outras, e assim replicar as soluções
mais promissoras de cada uma.

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Capítulo 4

Governança da água para adaptação e


resiliência no Antropoceno
Micaela Trimble1 e Néstor Mazzeo2

Palavras-chave: Governança adaptativa. Sistemas


socioecológicos. Janelas de oportunidade. Resiliên-
cia à água. Mudanças climáticas.

Introdução

Água é essencial para a vida; é a corrente sanguínea da


biosfera (uma camada de 20 quilômetros onde todos os
organismos vivos estão embutidos). Conecta pessoas e lugares, de-
sempenhando um papel fundamental para a subsistência humana
e para funções e serviços ecossistêmicos em ecossistemas terrestres
e aquáticos1. Sistemas aquáticos e bacias hidrográficas são siste-
mas socioecológicos, o que significa que eles envolvem complexas
interações entre componentes sociais e ecológicos (o primeiro en-
volvendo elementos econômicos e políticos também). Essas intera-
ções são influenciadas por fatores internos e fatores em múltiplos
níveis, o que os torna imprevisíveis2.
O fornecimento de serviços ecossistêmicos relacionados à
água é influenciado pelas mudanças climáticas através dos efeitos
das chuvas e da temperatura nos fluxos dos rios, no armazenamen-
to de água e na qualidade da água, entre outros. Mudanças nos pa-
drões de uso da terra (por exemplo, devido ao aumento das áreas
agrícolas) e infraestruturas para armazenamento e distribuição de
água são algumas das ações humanas que influenciam os sistemas
de água. O século XXI está enfrentando uma crise global da
água. Em vários lugares do mundo há crises envolvendo escassez
de água, desastres relacionados à água, problemas relacionados

1
South American Institute for Resilience and Sustainability Studies (SARAS).
2
SARAS; CURE – Universidad de la República.

40
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à água potável e saneamento, degradação de ecossistemas, entre


muitos outros.
Essas crises fazem parte do Antropoceno, a era em que os
seres humanos são a força predominante que influencia os ecos-
sistemas e as mudanças ambientais globais no planeta Terra3. Ten-
dências globais no crescimento populacional, consumo de energia,
terra arável, desmatamento, concentrações de dióxido de carbono
e outros estressores correspondem às tendências na quantidade e
qualidade da água, ou seja, aumento do uso de água e diminuição
da qualidade da água.
Em um contexto de rápidas mudanças ambientais globais e
múltiplas crises hídricas, a atenção à governança é fundamental,
pois pode levar à implementação de estratégias para resolver os
problemas. Os sistemas de governança envolvem o estabelecimen-
to de regras para a tomada de decisões e os padrões de interação
entre os diferentes atores ou partes interessadas (como agências
governamentais, organizações não governamentais, agricultores,
cidadãos etc.). Neste capítulo, abordamos a necessidade de uma
transformação nos regimes de governança da água. Em particular,
nos concentramos na governança adaptativa como uma aborda-
gem adequada para os tempos dinâmicos e mutáveis ​​em que vive-
mos, nos quais a resiliência precisa ser um alvo desejado.

Tempos de transição: para a governança adaptativa


da água
A água tem sido historicamente gerenciada seguindo uma
abordagem tecnocrática baseada no paradigma de previsão e con-
trole, tentando controlar variáveis ​​únicas (como o fluxo do rio).
No entanto, essa abordagem (ainda existente e predominante até
certo ponto) levou a inúmeras implicações negativas, dando ori-
gem a paradigmas alternativos, como a gestão integrada de recur-
sos hídricos (GIRH). Alguns dos pilares da GIRH são a integra-
ção entre setores, diferentes usos e usuários; a incorporação das
dimensões econômica, social e ambiental da sustentabilidade; e a
participação de múltiplos atores. Embora muitos países em todo o
mundo tenham feito mudanças em sua legislação para incluir os
princípios de GIRH, sua implementação permanece lenta e, por-

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tanto, a GIRH não promoveu mudanças profundas ainda nesse


cenário1,4.
Outra abordagem que tem sido cada vez mais defendida é a
governança adaptativa. Através da interação de atores, redes e múl-
tiplas organizações, é voltada para lidar com a incerteza e a com-
plexidade dos sistemas socioecológicos. A governança adaptativa
é caracterizada por pelo menos quatro dimensões5: (1) construir
conhecimento – combinando diferentes sistemas de conhecimento
(local, tradicional, científico) –; (2) práticas de gestão adaptativa –
através de ciclos iterativos de aprender fazendo –; (3) instituições
flexíveis (regras em uso) e sistemas de governança multinível (por
exemplo, abrangendo atores municipais, estaduais e federais); e
(4) lidar com perturbações externas, incerteza e surpresa. Algu-
mas estratégias propostas para atender aos requisitos da gover-
nança adaptativa são: deliberação analítica, envolvendo as partes
interessadas em discussões informadas das regras; aninhamento,
alocando autoridade em vários níveis de local para global; e varie-
dade institucional, empregando misturas de tipos institucionais6.
A governança adaptativa deve compreender arranjos ins-
titucionais policêntricos (com múltiplos centros de tomada de
decisão, cada um operando com algum grau de autonomia), já
que a interação entre os níveis organizacionais pode fomentar
o aprendizado e aumentar a diversidade de opções de resposta
e, assim, o sistema poderia estar melhor preparado para lidar
com a incerteza e a mudança. Há evidências empíricas de que os
regimes de governança policêntrica, com distribuição de poder,
mas estruturas de coordenação eficazes, têm um desempenho
mais alto em atingir metas relacionadas à água e também estão
associados à maior capacidade de responder aos desafios da mu-
dança climática7.
No Brasil e em outros países da América do Sul há sinais de
que a governança da água tem passado gradualmente do modo
tradicional para uma abordagem descentralizada, participativa e
potencialmente adaptativa. As políticas nacionais de recursos hídri-
cos (aprovadas de 10 a 20 anos atrás, dependendo do país) represen-
tam uma legislação de aprimoramento para essa transição. Fóruns
multilaterais (como comissões ou comitês de bacias hidrográficas),
compostos por atores governamentais e não governamentais, foram

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implementados e mostram alguns elementos de governança adapta-


tiva, embora com inúmeras limitações a serem superadas.

As janelas de oportunidade para transformações de


governança
Os fatores que desencadeiam mudanças nas abordagens de
gestão e governança geralmente estão relacionados a problemas
de gerenciamento, incluindo crises de recursos reais ou imagina-
das, conflitos entre usos ou usuários ou conflitos entre usuários
e agências de gerenciamento. Mudanças significativas são mais
prováveis ​​de ocorrer quando (i) problemas conhecidos, (ii) solu-
ções disponíveis, e (iii) política, se juntam em momentos críticos,
proporcionando uma janela de oportunidade. Frequentemente,
mudanças internas ou externas inesperadas, criando uma janela
de oportunidade, são pré-requisitos para transformações socioe-
cológicas. Essas janelas de oportunidade para a melhoria da gover-
nança se situam entre a fase de preparação e a fase de transição de
uma transformação socioecológica8,9.
Crises percebidas ou reais (por exemplo, causadas por mer-
cados externos, condições de recursos naturais, políticas governa-
mentais) muitas vezes desencadeiam transformações, pois promo-
vem aprendizagem, geração de conhecimento e auto-organização,
abrindo espaço para novas trajetórias de gestão. Soluções são o
segundo elemento de janelas de oportunidade; o desacordo entre
os grupos de partes interessadas sobre as ações que devem ser to-
madas pode ocorrer mesmo quando houver algum acordo sobre
as forças motrizes por trás da crise. Mudanças transformadoras
que ocorrem como resultado de crises ecológicas, mudanças nos
componentes sociais do sistema, ou mudança político-econômica,
definem e criam novas configurações de sistemas ao introduzir
novos componentes e formas de governar os sistemas socioecológi-
cos. Em alguns casos, tem sido possível transformar a governança
em resposta a uma crise específica (como no Northern Highlands
Lake District, EUA). No entanto, muitos sistemas socioecológicos
se transformam tarde demais, quando já ocorreu degradação sig-
nificativa e perda de utilidade do sistema, ou não aproveitam ja-
nelas de oportunidade quando elas surgem (a oportunidade de

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mudança é muitas vezes limitada a um período muito curto de


tempo) 8.

Governança para sistemas socioecológicos


resilientes
O termo “resiliência da água” foi cunhado recentemente para
se referir não à resiliência da água, mas ao papel que a água desem-
penha na resiliência dos ecossistemas e sociedades, em uma era de
rápidas mudanças globais1. A resiliência tem inúmeras definições,
mas refere-se à capacidade do sistema de viver com a mudança e o
desconhecido, além de reagir a ele. Assim, antecipação, inovação e
aprendizado também são facetas da resiliência. Suas três dimensões
principais são: persistência, adaptabilidade e transformabilidade9.
Resiliência como persistência é sobre ter a capacidade de mudar e
se adaptar continuamente, enquanto continua no mesmo caminho
(isso poderia ser uma armadilha se um sistema estiver em um estado
indesejável; em outras palavras, resiliência pode ser uma coisa ruim,
e contexto, precisa ser reduzido). Resiliência como adaptabilidade
é sobre a capacidade de continuar a desenvolver o caminho que o
sistema está empreendendo, mas inovando e mudando, a fim de
viver com a mudança. Por último, a resiliência como transformabili-
dade é sobre a mudança de caminhos (ou a capacidade de fazê-lo) e
cruzar limiares para o desenvolvimento sustentável, algo crucial no
Antropoceno.
Sete princípios importantes para o pensamento de resiliên-
cia, que também se aplicam à resiliência da água, são: 1) manter
a diversidade e a redundância, 2) gerenciar a conectividade, 3)
gerenciar variáveis ​​lentas e feedbacks, 4) promover sistemas com-
plexos de pensamento adaptativo, 5) incentivar a aprendizagem,
6) ampliar a participação e 7) promover sistemas de governança
policêntricos. Pesquisas recentes que analisaram as relações entre
governança e resiliência mostraram que alguns dos atributos de
governança que conferem resiliência aos sistemas socioecológicos
são a policentricidade, participação diversificada e inclusiva, trans-
parência, liderança, adaptabilidade e flexibilidade10. A governança
adaptativa da água inclui essas dimensões e, portanto, pode contri-
buir para a construção de bacias hidrográficas resilientes.

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Considerações finais
Transformações em sistemas de governança implicam importan-
tes mudanças culturais e entre outras. A educação desempenha um
papel fundamental nesse processo; em particular, o ensino superior
na América Latina precisa deixar para trás os paradigmas fragmen-
tados e reducionistas, que limitam o intercâmbio entre os domínios
disciplinares e a interação entre os sistemas de conhecimento. Além
disso, a incerteza deve ser entendida como uma propriedade intrín-
seca de qualquer sistema complexo e adaptativo e, portanto, deve ser
incorporada como tal nos processos de tomada de decisão.

Referências
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building resilience for complexity and change. New York: Cambridge University
Press; 2003.
DIETZ, T.; OSTROM, E.; STERN, P. C. The struggle to govern the commons.
Science, 302, p. 1.907-12, 2003.
FOLKE, C.; CARPENTER, S.; WALKER, B.; SCHEFFER, M.; CHAPIN, T.; RO-
CKSTRÖM, J. Resilience thinking: integrating resilience, adaptability and trans-
formability. Ecology and Society. [Internet]. 2010 [cited 2018 Oct 20];15(4):20.
Available from: http://www.ecologyandsociety.org/vol15/iss4/art20/
FOLKE, C.; HAHN, T.; OLSSON, P.; NORBERG, J. Adaptive governance of
social-ecological systems. Annual Review of Environment and Resources, 30, p.
441-473, 2005.
OLSSON, P.; GUNDERSON, L. H.; CARPENTER, S. R.; RYAN, P.; LEBEL,
L.; FOLKE, C.; HOLLING, C. S. Shooting the rapids: Navigating transitions to
adaptive governance of social-ecological systems. Ecology and Society. [Inter-
net]. 2006 [cited 2018 Oct 20];11(1):18. Available from: http://www.ecologyand-
society.org/vol11/iss1/art18/.
PAHL-WOSTL, C. Water governance in the face of global change: from unders-
tanding to transformation. Cham: Springer; 2015.
PAHL-WOSTL, C.; LEBEL, L.; KNIEPER, C.; NIKITINA, E. From applying
panaceas to mastering complexity: Toward adaptive water governance in river
basins. Environmental Science Policy, 23, p. 24-34, 2012.
PLUMMER, R.; BAIRD, J.; MOORE, M-L.; BRANDES, O.; IMHOF, J.; KRIE-
VINS, K. Governance of aquatic systems: What Attributes and Practices Promo-
te Resilience? International Journal of Water Governance, 2(4), p. 1-18, 2014.
ROCKSTRÖM J.; FALKENMARK, M.; FOLKE, C.; LANNERSTAD, M.; BAR-
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Cambridge University Press; 2014.
STEFFEN, W.; ROCKSTRÖM, J.; RICHARDSON, K.; LENTON, T. M.; FOLKE,
C.; LIVERMAN, D.; et al. Trajectories of the Earth System in the Anthropoce-
ne. PNAS. 2018;115(33):8252-8259.

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Capítulo 5

Economia, estratégias e políticas


públicas em adaptação
Gustavo Velloso Breviglieri1 e
Guarany Ipê do Sol Osório1

Palavras-chave: Adaptação. Bens coletivos. Incer-


teza. Políticas públicas. Desenvolvimento.

Introdução

I
ndependentemente da ambição dos esforços futuros de miti-
gação de gases de efeito estufa (GEE), alguma quantidade de
adaptação à mudança do clima (MC) é inevitável, devido às emissões
passadas. Por um lado, a capacidade adaptativa é uma característica
natural da espécie humana; por outro, a incerteza com relação aos
impactos da MC requer ajustes na maneira com que indivíduos, em-
presas e governos antecipam eventos futuros e tomam suas decisões.
Aqui, apresentamos, embora não esgotemos, conceitos e ferramen-
tas relevantes para melhor compreender, propor e priorizar alterna-
tivas para enfrentar um problema complexo como o da adaptação
à MC. É nossa expectativa que o leitor consiga, então, acessar com
propriedade outros textos e trabalhos sobre o tema.

Conceitos básicos e razões para a ação pública em


adaptação
De início, discussões sobre adaptação podem se beneficiar da
classificação dos bens econômicos (aqueles que possuem utilidade
para os indivíduos, porém escassos) de acordo com seu grau de ri-
validade (quando o consumo por um indivíduo reduz o consumo de
outros) e excludabilidade (quando um indivíduo que não pagou pelo
acesso ao bem pode ser prevenido de fazê-lo), vide Quadro 1.

1
Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGV)

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Quadro 1
Classificação dos bens econômicos
Grau de rivalidade
Grau de Baixo Alto
excluda-
Alto Bens de clube/pedágio Bens privados
bilidade
Ex.: teatros, clubes. Ex.: alimentos, automóveis.
Baixo Bens públicos Bens comuns
Ex.: defesa nacional, Ex.: estoques pesqueiros,
previsão do tempo. regulação do clima global.
Fonte: adaptado de Ostrom (2010).

Assim, é possível observar que algumas medidas adaptativas,


como a provisão de informações sobre condições climáticas e sis-
temas de alerta, possuem características de bens públicos. Outras,
como a aquisição de equipamentos de ar-condicionado, possuem
características de bens privados. Tal classificação sugere a melhor
forma de provisão e gestão dos bens destinados à adaptação: bens
e serviços com altos graus de rivalidade e excludabilidade, normal-
mente, requerem menor atenção da administração pública. Entre-
tanto, outras considerações são relevantes, por exemplo, de acordo
com o grau de interdependência entre provedores e usuários de
um bem ou serviço:

§ Interdependência unidirecional: quando provedores


e beneficiários pertencem a grupos distintos de atores.
Exemplo: prevenção do aumento da temperatura média
do planeta entre diferentes gerações.
§ Interdependência bidirecional: quando provedores e
beneficiários pertencem ao mesmo grupo. Exemplo: ges-
tão de infraestrutura hídrica compartilhada (BISARO &
HINKEL, 2016).

Há, aqui, maior justificativa para a ação pública no primeiro


caso, ao passo que opções de autogoverno (self-governance) po-
dem ser protagonistas no segundo. Mais especificamente com rela-
ção aos bens públicos ou comuns para a adaptação (conjuntamen-
te chamados de “bens coletivos”), Nordhaus (2006) faz distinção
entre aqueles de caráter aditivo ou conjunto:

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§ Adaptação aditiva: quando qualquer contribuição individual


acarreta em aumento no volume de bens adaptativos coleti-
vos. Exemplo: a instalação de telhados verdes por qualquer
residência reduz os riscos de inundação em sua área.
§ Adaptação conjunta: quando há quantidade mínima de
atores que deve simultaneamente contribuir para o provi-
sionamento de um bem adaptativo coletivo para que este
seja ofertado. Exemplo: todos os produtores rurais de uma
região devem reservar porções de suas propriedades para
manter suas funções ambientais, tais como a proteção do
solo e de corpos d’água, a conservação da biodiversidade e
a atenuação de desequilíbrios no clima local.

Em ambos os casos a ação pública pode desempenhar funções


essenciais e de suporte, seja para incentivar a adaptação por entes
privados (gerenciar conflitos, garantir equidade, assegurar contra-
tos, produzir e disseminar informações, garantir coerência entre
diferentes políticas e seus instrumentos), seja pela provisão direta
de medidas de adaptação via investimento público (HALLEGATE,
LECOCQ, & PERTHIUS, 2011).

Estratégias para priorização de ações de adaptação


Tendo por base as classificações introduzidas acima, e com-
preendendo que os recursos para a promoção de ações de adapta-
ção são escassos, é possível, então, discutir algumas estratégias para a
priorização de medidas de adaptação. Em primeiro lugar, não é mais
possível tomar por base apenas os padrões e dados climáticos históri-
cos; é necessário fazer projeções acerca do clima e economia futuros.
Nesse sentido, as Análises Custo-Benefício (ACB), Custo-Efeti-
vidade (ACE) e Multicritério (AMC), ferramentas tradicionalmente
empregadas para subsidiar o processo de tomada de decisão, tanto
no setor privado quanto público, buscam comparar diferentes cursos
de ação em razão de seus custos (de implementação, operação e ma-
nutenção) e seus benefícios, em termos monetários, como a redução
de perdas econômicas em decorrência de evento climático extremo,
ou não monetários, como a quantidade de vidas salvas.
Em condições de baixa incerteza, essas análises podem ser

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suficientes para embasar a tomada de decisão, uma vez que custos


e benefícios tendem a ser claros. Já a tomada de decisão sob alta
incerteza, característica da MC, requer o emprego de ferramen-
tas capazes de identificar aquelas medidas de adaptação que são
bem-sucedidas sob ampla gama de cenários climáticos possíveis2,
comumente divididas em dois grupos:

§ Medidas de nenhum arrependimento (no-regret): aquelas


que se revelam custo-benéficas mesmo que nenhuma MC
(adicional) ocorra.
§ Medidas de baixo arrependimento (low-regret): aquelas
que requerem pequenos esforços adicionais para lidar
com os impactos das MC.

Ranquear bens adaptativos de acordo com seus custos e bene-


fícios pode ser suficiente para bens privados e de clube, em que o
próprio provedor usufrui (isoladamente) do bem. Para bens coleti-
vos, no entanto, é possível identificar seis tipos de dilemas sociais,
com diferentes incentivos para que os indivíduos se engajem (ou
não) em esforços de adaptação. O Quadro 2 apresenta possíveis
respostas para esses dilemas.

Quadro 2
Dilemas sociais para adaptação com bens
coletivos e possíveis respostas
Bidirecional Bidirecional
Adaptação Unidirecional
(oferta) (demanda)
Aditiva Contribuição de Contribuição de Redução do uso
qualquer agente qualquer agente por qualquer
gera benefícios gera benefícios agente gera bene-
adicionais para um incrementais a fícios a todos.
terceiro. todos. Resposta: Instru-
Resposta: Instru- Resposta: Ins- mentos baseados
mentos econômicos trumentos eco- em mercados
(subsídios); provi- nômicos (subsí- (sistemas de per-
são estatal. dios); códigos de missões comercia-
construção. lizáveis).

2
Vide FGVces e ANA (2018) para aplicação prática de ACB para múltiplos cenários
climáticos na bacia hidrográfica dos rios Piancó-Piranhas-Açu (RN e PB).

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Conjunta Contribuição de to- Todos devem Todos devem


dos agentes de um contribuir para reduzir o uso do
grupo geram bene- gerar benefícios bem para gerar
fícios para terceiros para quaisquer benefícios a quais-
(outro grupo). agentes. quer agentes.
Resposta: Co- Resposta: Ins- Resposta: Com-
mando e controle; trumentos de partilhamento de
instrumentos eco- comunicação; informações.
nômicos atrelados a consultas públi-
cobenefícios. cas.
Tipo de
Coletivos Coletivos Comuns
bem
Fonte: adaptado de Bisaro e Hinkel (2016).

De modo resumido, situações de adaptação aditiva sofrem do


chamado “problema do carona” (quando alguém se beneficia de
um bem ou serviço sem ter que pagar por eles), em que a adoção
de instrumentos econômicos tende a fazer com que os custos e
benefícios de uma decisão sejam internalizados por quem as toma.
Já para a adaptação conjunta e bidirecional, o alinhamento de ex-
pectativas entre os agentes pode bastar. Naturalmente, o contexto
e o arranjo institucional já existente influenciam no grau de ade-
quação das possíveis respostas a cada dilema.

Adaptação: decisões privadas e políticas públicas3


Modelos econômicos são comumente baseados em duas pre-
missas: indivíduos maximizam seu bem-estar (da maneira que con-
cebem) e possuem expectativas racionais (levam previsões sobre
o futuro em consideração). Isto é, se indivíduos antecipam que
o clima futuro será diferente, quais ações podem tomar para se
proteger? As instituições (políticas públicas) que os cercam podem
ampliar ou restringir seu rol de opções adaptativas.
No agregado, a maneira com que a economia se ajusta a cho-
ques, via alteração de preços relativos, já é uma forma de adaptação.
Ainda assim, há lacunas que podem ser preenchidas pela ação pú-
blica na garantia da equidade ao longo de um território, na busca
por coerência entre diferentes políticas, na integração da MC nos
3
Seção inspirada nas abordagens e exemplos oferecidos por Kahn (2016) e Fankhau-
ser (2016).

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planejamentos energético, hídrico, de transportes, entre outros.


Inicialmente, surge uma condição necessária para a adaptação: a
disseminação de dados acerca dos riscos climáticos esperados; tal
provisão de informações tem características de bens públicos.
Se, por exemplo, a MC implica em verões mais quentes, em
áreas urbanas haverá procura maior por equipamentos de ar-condi-
cionado e similares; em áreas rurais, produtores rurais podem alte-
rar suas combinações de insumos e métodos produtivos. Em ambos
os casos, inovações tecnológicas podem tornar tais respostas mais
eficientes e menos custosas. Logo, um ambiente institucional robus-
to, conducente à inovação, com mercados de capitais desenvolvidos
e leis de patentes efetivas, torna-se fundamental.
No que diz respeito a eventos extremos, como inundações,
de um lado, a indústria de seguros pode, através de prêmios mais
altos, desincentivar a estadia de pessoas e ativos em áreas de maior
risco. De outro, o setor público pode colaborar com ações que gra-
dualmente promovam a realocação dos indivíduos e ativos para lo-
cais menos expostos, por exemplo, por meio de alíquotas diferen-
ciadas dos tributos sobre propriedades e políticas para a redução
de déficits habitacionais e regularização fundiária.
Por fim, indivíduos mais pobres tendem a sofrer mais com os
impactos da MC. Nesse sentido, o desenvolvimento econômico e
social tende a ser uma das melhores formas de adaptação. Desen-
volvimento reduz vulnerabilidades sociais (geração de riqueza, au-
mento de renda, melhora em indicadores de saúde e escolaridade
etc.) e, quando combinado com a incorporação de uma avaliação
climática, fortalece a capacidade adaptativa e diminui a exposição
a riscos (desenvolvimento resiliente ao clima). Logo, é importante
assegurar que as agendas de MC e desenvolvimento sejam sinér-
gicas e não concorrentes (do SOL OSÓRIO & SANTOS, 2016).).

Considerações finais
Os conceitos apresentados também são aplicáveis ao caso
brasileiro. Esperamos que o leitor, quando confrontado por um
problema relacionado à adaptação à MC, busque conferir suas
ideias com as classificações e ferramentas aqui introduzidas, iden-
tificando as maneiras mais adequadas para a provisão de um bem

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adaptativo. Assim, estratégias de adaptação no Brasil podem, por


exemplo, ser fortalecidas e melhor executadas.

Referências
BISARO, A.; HINKEL, J. Governance of social dilemmas in climate change
adaptation. Nature Climate Change, 6, p. 354-359, abril de 2016.
Do SOL OSÓRIO, G. I.; SANTOS, I. T. . O papel da governança para a integra-
ção da adaptação na estratégia de desenvolvimento. Cadernos Adenauer, XVII(2),
p. 51-68, 2016.
FANKHAUSER, S. Adaptation to climate change. Londres, UK: Centre for Climate
Change Economics; Grantham Research Institute on Climate, 2016.
FGVces e ANA. Análise de custo-benefício de medidas de adaptação à mudança do cli-
ma: trajetórias da aplicação na bacia hidrográfica dos rios Piancó-Piranhas-Açu.
São Paulo e Brasília: Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Ad-
ministração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas e Agência
Nacional de Águas, 2018.
HALLEGATE, S.; LECOCQ, F.; PERTHIUS, C. Designing Climate Change Adap-
tation Policies: An Economic Framework. Washington, DC: The World Bank,
2011.
KAHN, M. E. The Climate Change Adaptation Literature. Review of Environmen-
tal Economics and Policy, 10(1), p. 166-178, 2016.
NORDHAUS, W. D. Paul Samuelson and Global Public Goods. In: SZENBERG,
M.; RAMRATTAN, L.; GOTTESMAN, A. A. Samuelsonian Economics and the
Twenty-First Century (p. 88-98). Nova Iorque: Oxford University Press, 2006.
OSTROM, E. Beyond markets and states: polycentric governance of complex eco-
nomic systems. American Economic Review, 100(3), p. 641-672, junho de 2010.

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Capítulo 6

Gênero e adaptação aos impactos


das mudanças climáticas
Danielle Tega1 e Fabiana Barbi2

Palavras-chave: Gênero. Mulheres. Adaptação.


Resiliência. Mudanças climáticas.

Introdução

Acapacidade adaptativa aos impactos das mudanças cli-


máticas é altamente heterogênea dentro de uma so-
ciedade ou localidade. Desigualdades construídas por relações
de classe, raça/etnia, gênero, idade, entre outras, implicam
diferentes níveis de vulnerabilidade e, por consequência, de
capacidade adaptativa. O objetivo deste capítulo é apresentar
algumas considerações sobre gênero e adaptação aos impactos
das mudanças climáticas, enfatizando: a) como a perspectiva de
gênero foi incorporada ao debate internacional sobre mudanças
climáticas; b) de que modo as mulheres são atingidas por esses
impactos e como contribuem no enfrentamento do problema.
Por fim, as considerações finais apontam desafios existentes
para pensar e construir políticas climáticas que levem em conta
as especificidades de gênero.

Gênero e mudanças climáticas na agenda


internacional
Como aponta o documento da Comissão Interamericana de
Mulheres (CIM) sobre gênero e mudanças climáticas, as pesquisas
e as campanhas feministas desafiaram a invisibilidade dos temas de
gênero no debate da agenda internacional, promovendo a impor-
1
PAGU/UNICAMP.
2
Universidade Católica de Santos e NEPAM-UNICAMP.

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tância dessa perspectiva nas políticas e nos planos de adaptação e


mitigação das mudanças climáticas (CIM, 2008, p. 1).
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNU-
MA) de 1984 marca o primeiro processo no qual se reconheceu
o vínculo entre gênero e temática ambiental. Nesse momento, foi
criado um grupo de assessoras do PNUMA para pensar a conexão
entre a problemática da exclusão das mulheres e suas contribui-
ções reais e potenciais para a conservação do meio ambiente em
um contexto de desenvolvimento. No ano seguinte, a Conferência
Mundial para a Revisão e Avaliação das Realizações da Década
das Nações Unidas para a Mulher: Igualdade, Desenvolvimento e
Paz, realizada em Nairóbi (Quênia), abriu outro importante espa-
ço para a inserção da questão (idem, p. 2).
Não apenas os organismos internacionais, mas também os
movimentos internacionais de mulheres tiveram um papel fun-
damental para o desenvolvimento de uma plataforma de luta e
reivindicação em relação ao meio ambiente e ao desenvolvimento
sustentável. Ativistas autônomas, militantes de movimentos sociais
ou integrantes de organizações não governamentais diversas: mu-
lheres de diferentes partes do mundo realizaram, em 1991, na ci-
dade de Miami (EUA), o I Congresso Mundial de Mulheres por
um Planeta Saudável, que elabora a Agenda 21 de Ação das Mulhe-
res3. Em diálogo com essas iniciativas, a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no
Rio de Janeiro (Brasil) em 19924, adotou a perspectiva de gênero

3
Como explica Tathiana Haddad Guarnieri, a Agenda 21 foi uma plataforma de
ação preparada para ser entregue na Rio-92, que ocorreria no ano seguinte: “Não
apenas no processo preparatório como também durante a própria Rio-92, a parti-
cipação ativa do movimento de mulheres, particularmente por meio de ONGs, foi
decisiva para que se incluíssem algumas das propostas feministas nos documentos
oficiais da Conferência. No Fórum Global de ONGs, reunido no Aterro do Flamengo
concomitantemente ao evento oficial do Riocentro, o ‘Planeta Fêmea’ se constituiu
em espaço de articulação e elaboração de propostas de mulheres de todo o mundo.
Desde então, ficou clara a importância da atuação das mulheres para a gestão pla-
netária, consolidando-se, com isso, a participação feminina nos temas ditos globais”
(GUARNIERI, 2010, p. 15).
4
Os diferentes nomes pelos quais o evento é conhecido estão ligados às disputas
sobre o tratamento da questão ambiental, que não eram exclusivas dos governos,
mas também repercutiam nos movimentos da sociedade civil. Assim, o evento era
promovido como Eco-92 para os movimentos ecológicos; Cúpula da Terra para os
ambientalistas não radicais; Rio-92 para os brasileiros em geral (ALVES, 2001, p. 64).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

em suas políticas e programas de ação. Essa conferência repre-


sentou, assim, um marco no reconhecimento e fortalecimento do
papel das mulheres na promoção do desenvolvimento e da susten-
tabilidade ambiental (PNUD, 2008, p. 38).
Já a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, ocorrida em
1995 na cidade de Beijing (China), vinculou expressamente gêne-
ro, meio ambiente e desenvolvimento sustentável. Sua plataforma
de ação identificava 12 áreas temáticas prioritárias de preocupa-
ção, dentre as quais se encontrava a desigualdade de participação
nas decisões sobre o manejo dos recursos naturais e a proteção do
meio ambiente (DECLARAÇÃO, 2006). Propunha, nesse sentido,
o envolvimento ativo das mulheres nos mais diversos níveis de de-
cisão sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável, incenti-
vando a criação ou o fortalecimento de mecanismos que determi-
nassem o impacto do desenvolvimento e das políticas ambientais
nas vidas das mulheres.
Nesse cenário, outros foros e agendas internacionais passa-
ram a incorporar e aprofundar a relação entre gênero e meio am-
biente, gênero e desenvolvimento sustentável, gênero e mudanças
climáticas. A Comissão Interamericana de Mulheres, por exemplo,
reconhece em seu programa de trabalho para o biênio 2006-2008
o interesse dos Estados Membros do Caribe, da América Central e
do México sobre o tema do impacto dos desastres naturais às mu-
lheres. Desse modo, a comissão solicita que seja assegurada a in-
clusão da perspectiva de gênero em todos os trabalhos sobre esse
assunto na esfera política da Organização dos Estados Americanos
(OEA) (CIM, 2008, p. 2).
Mais recentemente, na última Conferência das Partes da
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima
(CQNUMC), a COP 23, realizada em Bonn (Alemanha) em 2017,
estabeleceu-se um Plano de Ação de Gênero a fim de apoiar a
implementação de decisões relacionadas a gênero no processo da
CQNUMC. Essa decisão busca promover a participação plena,
igual e significativa das mulheres e promover políticas climáticas
sensíveis ao gênero e à integração de uma perspectiva de gênero
na implementação da Convenção e no trabalho das Partes (UN-
FCCC, 2018a).

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Por que as mulheres são atingidas de maneira


específica pelas mudanças climáticas?
A inclusão de uma perspectiva de gênero na agenda inter-
nacional dos debates ambientais tem dupla importância. Por um
lado, aponta o reconhecimento de características próprias no
modo pelo qual as mulheres são atingidas pelas mudanças climá-
ticas. Por outro, permite que, conhecendo essas especificidades,
sejam pensadas formas de adaptação e mitigação do problema de
modo a reduzir as desigualdades de gênero.
As desigualdades historicamente construídas nas relações en-
tre homens e mulheres estão fortemente presentes quando pen-
samos na questão das mudanças climáticas e adaptação – e, em
algumas situações, com agravantes. A recente pesquisa realizada
pela ONU Mulheres sobre os 17 Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) e sua relação com a igualdade de gênero e os
direitos das mulheres aponta, por exemplo, que existem 122 mu-
lheres com idade entre 25 e 34 vivendo em situação de pobreza
extrema para cada 100 homens da mesma faixa etária em igual
situação (UN-Women, 2018). Já o Relatório sobre Pobreza e Di-
reitos Humanos nas Américas, aprovado em 2017 pela Comissão
Interamericana de Diretos Humanos (CIDH), enfatiza que mulhe-
res afrodescendentes e indígenas se encontram em uma situação
especial de vulnerabilidade ao sofrer historicamente uma tripla
discriminação baseada em relações de gênero, pobreza e raça/et-
nia (CIDH, 2017).
Tamanha desigualdade reflete-se na abordagem das mudan-
ças climáticas: no mundo em desenvolvimento, em particular, as
mulheres estão desproporcionalmente envolvidas em atividades
dependentes de recursos naturais, como a agricultura, em compa-
ração com ocupações assalariadas. Nesse sentido, participam com
maior força de atividades diretamente afetadas pelas mudanças
climáticas, como as mulheres do campo e da floresta, por exemplo,
em seus labores na agricultura e silvicultura. As mudanças projeta-
das para climas futuros devem afetar as mulheres através de uma
variedade de mecanismos: diretamente através da reduzida dispo-
nibilidade de água, vegetação e lenha, além das questões de saúde
relacionadas a populações vulneráveis.

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Convém ressaltar, contudo, que a vulnerabilidade das mulhe-


res nas economias agrícolas é afetada fundamentalmente pela falta
de acesso aos direitos, aos recursos econômicos, às fontes de rique-
za e aos meios de produção – encontram-se, muitas vezes, alheias
aos processos de informação e capacitação, às oportunidades de
financiamento, ao controle das terras agrícolas. Essa insegurança
tem implicações tanto para sua vulnerabilidade em um clima em
mudança, como também para sua capacidade de adaptação aos
meios de vida produtivos de um clima em mudança.
Do mesmo modo, estudos apontam que as mulheres são mais
vulneráveis do
​​ que os homens a desastres relacionados ao clima.
Ao tratar o cenário do sul da Ásia, por exemplo, Fordham (2003)
aponta os principais fatores que contribuem para a vulnerabilida-
de diferencial das mulheres no contexto dos riscos naturais: altos
níveis de analfabetismo, mobilidade mínima e oportunidades de
trabalho fora do lar, e, novamente, questões relacionadas à pro-
priedade de recursos como terra. As mudanças climáticas, portan-
to, têm implicações específicas de gênero em termos de vulnerabi-
lidade e capacidade adaptativa.
Além disso, relações sociais históricas limitaram de forma se-
vera o exercício dos direitos civis, políticos, econômicos e cultu-
rais das mulheres. A divisão sexual do trabalho impôs às mulheres
uma carga desproporcional ao cumprimento de tarefas domésti-
cas e de cuidados no âmbito familiar, restringindo drasticamente
o uso de seu tempo para outras atividades e objetivos, como uma
participação mais ativa na tomada de decisões sobre o meio am-
biente em todos os níveis.
Apesar dessas limitações socialmente impostas, as mulheres
recorrem a formas de resistência e adaptação que passam por ações
coletivas e comunitárias – mas que necessitam, de todo modo, for-
ça institucional para serem efetivadas. Desempenham um papel
crítico em resposta às mudanças climáticas devido ao seu conheci-
mento local e ao seu papel de liderança, tanto na gestão sustentável
de recursos como nas práticas sustentáveis nos âmbitos doméstico
e comunitário. A presença das mulheres nos espaços de liderança
tem levado a melhores resultados de projetos e políticas climáticas.
Ainda enfrentando dificuldades, sua participação no campo
político tem como resultado uma maior capacidade de resposta

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às necessidades de seus grupos de forma específica, e da socieda-


de em sentido geral: políticas ou projetos implementados sem a
significativa atuação das mulheres podem aumentar as desigual-
dades existentes e minimizar a eficácia das ações pretendidas
(UNFCCC, 2018b).
Os programas de adaptação sensíveis às questões de gênero
são, assim, mais eficazes para a proteção de vidas e meios de subsis-
tência. Afinal, as políticas que tratam desse problema tendo como
eixo o enfrentamento dessas assimetrias sofridas pelas mulheres,
parte mais vulnerável da questão, atingem todas e todos de um
modo geral – e ainda contribuem para o combate à desigualdade
de gênero.

Conclusões e desafios
As desigualdades de gênero observadas na vulnerabilidade e
na capacidade adaptativa refletem estruturas sociais mais amplas.
Intervenções climáticas que ignoram essas questões reforçam as
dimensões assimétricas de gênero da vulnerabilidade. A adoção
de tal perspectiva é uma ferramenta necessária para a avaliação da
capacidade adaptativa e para o desenvolvimento de intervenções
que busquem facilitar a adaptação aos impactos das mudanças cli-
máticas. Outro ponto a ser considerado é a necessária mudança
no foco da política: a capacitação mais proativa em lugar de um
gerenciamento apenas reativo de desastres contribui para a redu-
ção de desigualdades.
A participação desproporcional das mulheres nos proces-
sos de tomada de decisões e nos mercados de trabalho agrava
essas desigualdades e, muitas vezes, dificulta suas contribuições
nos debates sobre planejamento, formulação e implementação
de políticas climáticas (UNFCCC, 2018b). A baixa representati-
vidade de mulheres na política, problema presente na maioria
dos países, prejudica a existência de uma pluralidade de vozes
nesse processo. Com isso, as recorrentes desvantagens socioe-
conômicas das mulheres continuam a ser ignoradas e perma-
necem como um desafio crítico aos esforços de adaptação, uma
vez que o enfrentamento às mudanças climáticas envolve deci-
sões políticas de governos.

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Para tornar as respostas às mudanças climáticas mais efeti-


vas, é estratégico combater diferenças socioeconômicas e cultu-
rais em relação às mulheres. O acesso à informação, ao trabalho
e à educação, o compartilhamento de conhecimento, a escuta de
suas experiências como lideranças e maior representatividade das
mulheres na política institucional são pontos urgentes a serem tra-
tados. Nesse sentido, é necessário que a gestão pública trabalhe
com uma perspectiva de gênero para elaborar políticas públicas
e estratégias de enfrentamento às mudanças climáticas. É preciso
considerar, outrossim, especificidades existentes entre as próprias
mulheres: em uma sociedade estruturalmente racista, mulheres
negras e indígenas encontram-se em situação peculiar de vulnera-
bilidade e precarização, demandando olhares específicos nas polí-
ticas de adaptação aos impactos das mudanças climáticas.

Referências
ALVES, J. A. L. Relações internacionais e temas sociais – a década das Conferên-
cias. Brasília: IBRI, 2001.
CIDH – Comisión Interamericana de Derechos Humanos. Informe sobre pobreza y
derechos humanos en las Américas. OEA, 2017.
CIM – Comisión Interamericana de Mujeres. Género y cambio climático. Santiago:
CIM, 2008.
DECLARAÇÃO e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mu-
lher – Pequim, 1995. ONU, 2006.
FORDHAM, M. Gender, disaster and development: the necessity for integra-
tion. Natural Disasters and Development in a Globalizing World. p. 57-74, 2003.
10.4324/9780203402375.
GUARNIERI, T. H. Os direitos das mulheres no contexto internacional – da
criação da ONU (1945) à Conferência de Beijing (1995). Revista Eletrônica da
Faculdade Metodista Granbery, vol. 8, p. 1-28, 2010.
PNUD – Programa de las Naciones Unidas para el Desarrollo (2008). Guía recur-
sos de género para el cambio climático. México DF: PNUD, 2008.UNFCCC (2018a)
Report of the Conference of the Parties on its twenty-third session, held in
Bonn from 6 to 18 November 2017. Disponível em: https://unfccc.int/resource/
docs/2017/cop23/eng/11a01.pdf#page=13
UNFCCC (2018b) Introduction to Gender and Climate Change. Disponível em:
https://unfccc.int/topics/gender/the-big-picture/introduction-to-gender-and-
climate-change
UN-WOMEN. Turning Promises into Action: Gender Equality in the 2030 Agenda
for Sustainable Development. United States: AGS Custom Graphics, 2018b.

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Capítulo 7

Adaptação, vulnerabilidades e
saúde nas metrópoles1
Christovam Barcellos2

Palavras-chave: Adaptação às mudanças climáticas.


Infraestrutura urbana. Saúde urbana. Epidemias.

Introdução

A
história da humanidade também pode ser resumida
como uma luta permanente contra a variabilidade. Con-
tra as intempéries foram criados os abrigos; contra a insegurança
alimentar inventaram a agricultura; contra as invasões, as mura-
lhas; contra as epidemias, as vacinas e o saneamento. Mais recente-
mente, os aparelhos de ar-condicionado, que dependem de um sis-
tema de geração e de distribuição de energia elétrica, bem como as
redes de abastecimento de água foram incorporados como bens e
serviços que buscam garantir conforto e segurança aos moradores
de cidades. Esses itens, cada vez mais presentes nas residências,
podem ser considerados como estratégias de adaptação à variabili-
dade e mudanças climáticas.
Esses sistemas técnicos se caracterizam por sua complexidade e
em algumas situações também por sua vulnerabilidade. Os sistemas
de abastecimento de água, por exemplo, têm como componentes
a captação de água em mananciais (superficiais ou subterrâneos),
o tratamento, e distribuição de água por meio de redes, e as ins-
talações domésticas de reservação e canalização interna. Qualquer
perturbação em um desses componentes compromete a integridade
desses sistemas, por vezes levando ao seu colapso. E esses sistemas
dependem de uma série interconectada de objetos técnicos, interde-
pendentes e hierárquicos, que se complementam e interagem.

1
O autor agradece à Rede Clima, CNPq e Ministério de Saúde pelo apoio técnico e
financeiro ao projeto Observatório de Clima e Saúde.
2
Fundação Oswaldo Cruz.

60
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Nesse sentido, o conceito de saneamento básico deve ser toma-


do como uma técnica, ou um conjunto de técnicas, talvez das mais
antigas da humanidade, que alteram a relação entre a sociedade
e a natureza. Segundo Milton Santos (1999) a produção desigual
do espaço geográfico é resultante da técnica, que está em perma-
nente desenvolvimento e incorporação pela sociedade como uma
racionalidade hegemônica. O desenvolvimento de tecnologias de
tratamento de água, como a cloração e a filtração, permitiu o uso
de rios, antes considerados impróprios, para o abastecimento de
grandes núcleos urbanos. Por outro lado, a descoberta do papel
de agentes microbiológicos na transmissão de doenças, como, por
exemplo, os resultados da investigação de John Snow sobre o surto
de cólera de 1854 em Londres, legitimou o uso dessas técnicas.
Segundo Hochman (1998), a ameaça do micróbio da doença gerou
“um sentimento de comunidade nacional, associado a demandas
pelo aumento das responsabilidades do Poder Público”. Essa nova
concepção de saúde exigiu a incorporação de novas ações de sanea-
mento nas cidades, para além das soluções individuais, bem como
a consequente responsabilização e fortalecimento do Estado. A ne-
cessidade de fornecer água com quantidade e qualidade adequadas
e, ao mesmo tempo, recolher e tratar os dejetos humanos é decor-
rência do processo de urbanização e tem como consequência o for-
talecimento e legitimação do Estado. A urbanização, nesse sentido,
tem o papel duplo de permitir um maior acesso a diversos serviços
públicos, mas por outro lado, promover um aumento de interações
entre agentes infecciosos e populações, aumentando o risco à saú-
de de grupos populacionais sem acesso a esses serviços ou onde
esses serviços são precários e vulneráveis (WILLIAMS, 1990).
Alguns exemplos de aplicação desse modelo hierárquico para
análise de sistemas complexos permitem a avaliação dos possíveis
riscos à saúde decorrentes de falhas desses sistemas. Uma situa-
ção de emergência, como as causadas por desastres naturais, pode
comprometer o abastecimento de água de diversas comunidades.
Nesse caso, uma solução para garantir a saúde da população é
o fornecimento de água em garrafas industrializadas ou cami-
nhões-pipa, que simbolizam o by-pass dos níveis intermediários
dessa estrutura. Do mesmo modo, a operação inadequada dos sis-
temas de abastecimento de água atinge todos os componentes su-

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bordinados, como as comunidades e domicílios. A contaminação


ou redução da oferta de água em mananciais pode afetar cidades
inteiras. Graves surtos de doenças de veiculação hídrica têm sido
relatados entre populações supridas por sistemas de abastecimen-
to que apresentam falhas nos dispositivos de tratamento da água
(LIGON e BARTRAM, 2016).
Mas essa vulnerabilidade também pode ser decorrente de
problemas ocorridos nos níveis mais básicos dessa estrutura. A
ausência de recursos que assegurem isolamento dos circuitos de
água e esgoto e o armazenamento seguro da água para consumo
nos domicílios comprometem a qualidade da água e a saúde da
população (FEWTRELL et al., 2005). No Brasil, é ainda comum
a existência de domicílios sem banheiro, mas ligados à rede geral
de abastecimento de água, e vice-versa, domicílios com banheiros,
mas sem canalização interna e externa de água, o que expõe uma
insegurança dos sistemas de abastecimento. Também esses níveis
mais básicos dessa estrutura podem gerar pressões de perturbação
do sistema, como, por exemplo, o aumento abrupto do consumo
de energia e de água durante ondas de calor (TORRENTE, 2014),
o que pode causar a interrupção desses serviços por sobrecarga de
demanda. Essa estrutura, resultado da interação entre seus com-
ponentes, é cada vez mais ampla e vulnerável. A tendência de uni-
versalização dos serviços de abastecimento de água se deu nas úl-
timas décadas com o aumento da cobertura dos serviços, sem que
fossem acompanhadas por medidas proporcionais de ampliação
da capacidade de captação, tratamento e armazenamento de água
(ANDREAZZI et al., 2007).

Universalização e precarização de sistemas técnicos


No Brasil, a maior parte da população urbana vem adquirin-
do acesso à água através da expansão de redes de abastecimento,
sem que, por outro lado, sejam promovidos a coleta e tratamento
adequado de esgotos e lixo. A combinação desses fatores traz um
novo desafio para a saúde pública, que deve ampliar seu olhar so-
bre a questão do saneamento, para além da cobertura de serviços,
e incluir o monitoramento e ações efetivas sobre a qualidade da
água e segurança de sistemas de abastecimento. Cada vez mais,

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o processo de urbanização e adensamento populacional produz


riscos que são característicos de grandes centros urbanos, com
mananciais e redes de distribuição de água vulneráveis (EZZATI
et al., 2005). Da mesma maneira em que as áreas urbanas não co-
bertas por sistemas de saneamento são especialmente suscetíveis
a doenças de veiculação hídrica, há por outro lado diversos rela-
tos de surtos de doenças de veiculação hídrica transmitidos pelo
sistema de distribuição de água (LIGON e BARTRAM, 2016). A
expansão precária desses sistemas, nesse caso, pode atuar também
como meio de amplificação de riscos e a cobertura dos serviços de
abastecimento de água, tomada isoladamente, já não representa
uma medida de proteção à saúde. Vale lembrar que uma gran-
de parcela da população servida por sistemas de abastecimento
de abastecimento de água são suscetíveis a diversas doenças infe-
ciosas, isto é, jamais foram expostas a alguns agentes infecciosos,
como o vírus da hepatite A, ou rotavirus, o que pode causar surtos
de grande magnitude entre esses grupos socioespaciais, antes ti-
dos como protegidos para essas doenças.
Por outro lado, não devemos esquecer que a cobertura de ser-
viços ainda não atingiu sua universalização, deixando excluídas
parcelas mais empobrecidas da população. Em São Paulo, coexis-
tem cerca de 20 mil pessoas em situação de rua, moradores de con-
juntos habitacionais precarizados, além de favelas (cerca de 11%
da população geral do município), cortiços e periferias de ocupa-
ção recente (GAMBA e RIBEIRO, 2012). Esses grupos socioespa-
ciais, não raro, buscam alternativas para suprir suas necessidades
fora dos sistemas e serviços formais de abastecimento e têm seus
riscos à saúde incrementados numa metrópole. Se o uso de poços
artesianos pode ser considerado uma solução razoável e segura em
áreas rurais, numa cidade com altíssima densidade populacional
e recursos hídricos saturados, esse recurso apresenta sérios riscos
de transmissão de doenças. Esses grupos estão permanentemente
expostos a diversos agentes infeciosos como a leptospirose, hepati-
te A e doenças diarreicas (SOARES et al., 2010).
Frequentemente, esses grupos estão sujeitos a uma sobre-
posição de riscos, por morarem em áreas consideradas como de
risco para enchentes e deslizamentos, ao mesmo tempo em que
apresentam condições socioeconômicas desfavoráveis e pequena

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capacidade de investimento e de adaptação às mudanças climáti-


cas (ALVES e TORRES, 2006). A cobertura de sistemas de sanea-
mento permanece extremamente desigual na cidade de São Paulo,
principalmente nos itens de qualidade da habitação, com falta de
rede de esgoto e coleta de lixo. Nesses domicílios, são comuns a
presença de vetores de doenças, como ratos e insetos (ALVES e
TORRES, 2006).

Regularidades e excepcionalidades
De fato, a maior parte dos relatórios sobre situações de vulne-
rabilidade climática nas cidades é baseada em indicadores como a
cobertura de sistemas de saneamento, indicadores socioeconômi-
cos e demográficos (VALVERDE, 2017). No Brasil, é no mínimo
contraditório que se observe um aumento da cobertura dos servi-
ços de abastecimento de água, que alcança 97,2 % da população
urbana (segundo dados da PNAD de 2016), e que ao mesmo tempo
sejam tão frequentes as Doenças Relacionadas ao Saneamento Am-
biental Inadequado (DRSAI). Uma possível explicação para essa
aparente contradição é a própria complexificação dos problemas
de saneamento, decorrente da diversidade de situações em que se
observa a relação saúde e saneamento. Os modelos que levam em
consideração somente a cobertura desses serviços não respondem
hoje às novas necessidades existentes no setor de saneamento. Ou-
tros indicadores devem ser considerados para analisar a situação
do saneamento e habitação dentro do quadro de complexidade
existente hoje nas cidades em situações de excepcionalidade.
Um dos maiores desafios, nesse sentido, tem sido a interrup-
ção desses serviços em casos de colapso dos sistemas e a ocorrência
de eventos climáticos extremos. Nessas situações, sobressaem as
medidas alternativas e improvisadas de suprimento de necessida-
des básicas da população, como a água, energia e alimentos. O que
fazer durante uma onda e calor se a rede de distribuição de ener-
gia é interrompida? Como obter alimento em situações em que o
comércio é suspenso devido a uma enchente?
Os indicadores hoje utilizados para se medir o grau de vulne-
rabilidade de grupos populacionais e territórios têm sido construí-
dos com base em condições de normalidade, coletados por meio de

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censos e inquéritos (ALVES e TORRES, 2006; VALVERDE, 2017).


No entanto, o quadro de vulnerabilidades pré-existentes pode ser
profundamente alterado devido à ocorrência de desastres de ori-
gem natural ou eventos climáticos extremos. Mas como, e em que
momento, os moradores de áreas atingidas por perigos, optam por
alternativas que possam reduzir danos?
Essas alternativas têm como base sua percepção de riscos, ca-
pacidade de planejamento e tomada de decisões (MARANDOLA
e HOGAN, 2005). Nesse sentido, eventos como o racionamento de
água na Região Metropolitana de São Paulo em 2104 e 2015 de-
sencadeiam processos perturbadores das condições de normalida-
de dos serviços urbanos e promovem uma repentina alteração das
condições das comunidades e domicílios. A adoção de alternativas
como a abertura de poços e o suprimento de água por meio de
caminhões-pipa foi uma opção por parte da população com maior
poder aquisitivo. Outras pessoas passaram a improvisar recipientes
de armazenamento de água no interior dos domicílios, facilitando
sua contaminação e a proliferação de mosquitos.
Essa situação de excepcionalidade causou um surto de diar-
reias3, com um incremento de milhares de casos no estado em 2014,
provavelmente devido ao consumo de água contaminada. No ano de
2015, o número de casos de dengue triplicou na cidade, e as visitas
de agentes de saúde apontaram um grande crescimento do uso de
recipientes improvisados para armazenamento de água4.
Ademais, deve-se pensar na combinação de eventos que são de-
sencadeados por desastres. O tsunami e acidente nuclear em Fukushi-
ma (Japão) em 2011 é um exemplo de um mesmo evento de origem
geológica que danificou uma usina nuclear e produziu consequências
em diversos setores da economia e da sociedade, no que ficou conhe-
cido como “desastre combinado” (HACHIYA et al., 2014).
A profusão de efeitos adversos disparados por um único
evento climático extremo é também evidente no caso das en-
chentes em Santa Catarina em 2008, que causaram a morte de
mais de 100 pessoas e o desabrigo de milhares. Essas enchentes
3
Registrado pelo Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE), da Secreta-
ria Estadual de Saúde (https://brasil.elpais.com/brasil/2015/07/10/politi-
ca/1436557827_946009.html). Acesso em: janeiro de 2019.
4
https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,com-impacto-da-crise-hidrica-casos-
de-dengue-triplicam-em-sp,1649623. Acesso em: janeiro de 2019.

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aumentaram os riscos de disseminação de doenças transmissí-


veis, ao mesmo tempo em que prejudicaram o atendimento da
população, devido ao colapso dos serviços de saúde, tanto pela
sobrecarga de demanda quanto pelos danos causados às suas ins-
talações (XAVIER et al., 2014).
Esses exemplos reforçam a necessidade de se incluir como
indicadores de vulnerabilidade as flutuações dos sistemas de sa-
neamento e o seu eventual colapso causado por perturbações de
origem extrínseca (geradas por desastres de origem natural) ou
intrínseca (disparadas pelo aumento de demanda, não corres-
pondidas pela capacidade dos sistemas). Assim, a vulnerabilida-
de é uma característica das populações e dos territórios, sendo
que o fenômeno social precede o ambiental (MARANDOLA e
HOGAN, 2005).
Nesse sentido, um sistema de indicadores que contemple as
condições atuais e projeções de futuro, considerando as vulnera-
bilidades dos sistemas, torna-se um importante instrumento que
permite a aquisição de novos conhecimentos bem como a comu-
nicação de riscos, para pesquisadores, porém não somente estes,
mas também gestores, como uma forma de divulgar os resultados
de suas políticas, ou se houver necessidade, adaptá-las para que
tenham os efeitos desejados.

Comentários finais
As grandes cidades brasileiras têm alcançado níveis de cober-
tura de sistemas de saneamento básico (entendidos como ações
de abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta de lixo
e drenagem urbana) satisfatórios. No entanto, esse progresso tem
se verificado mais pelo esforço individual de investimento nas ha-
bitações que pelo investimento público de ampliação desses siste-
mas. As restrições de oferta de água para os domicílios, que não
conseguem mais suprir as demandas crescentes; a contaminação
e comprometimento de mananciais de água; e a insuficiência de
programas de tratamento de esgotos e lixo comprometem a segu-
rança dos sistemas de saneamento, que são responsabilidades do
Estado. Situações de vulnerabilização desses sistemas tendem a se
agravar com as mudanças climáticas e ambientais em curso.

66
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Eventos climáticos extremos, como as secas, enchentes, des-


lizamentos e ventos tendem a gerar perturbações ou mesmo a
interrupção desses serviços. Grupos populacionais habituados a
serem supridos por sistemas complexos podem ser repentinamente
privados desses serviços, forçando uma alteração, mesmo que mo-
mentânea, dos seus padrões de vida. Os impactos desses eventos
sobre a saúde podem ser graves e se estender por grandes áreas.
Nesse sentido, um evento climático extremo não pode ser uni-
camente caracterizado pela sua baixa probabilidade de ocorrên-
cia, mas também por produzir fatos inesperados, e desencadear
processos sociais e ambientais aos quais as populações e os territó-
rios não estão adaptados.
Dessa maneira, destacam-se duas preocupações primordiais
para a Região Metropolitana de São Paulo e outras metrópoles de
países periféricos. De um lado, as políticas de saneamento devem
alcançar os excluídos, que se encontram dispersos, com pequena
capacidade de investimento e que acumulam problemas com ren-
da, educação, acesso a serviços de saúde. De outro lado, é necessá-
rio garantir a qualidade e segurança dos serviços de saneamento
para aqueles já incluídos nesses sistemas, que pela sua complexi-
dade e vulnerabilidade podem apresentar falhas, principalmente
durante eventos climáticos extremos.

Referências
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

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Capítulo 8

Como impulsionar ações que alinhem


adaptação e sustentabilidade urbana
nas cidades paulistas?1
Gabriela Marques Di Giulio2

Palavras-chave: Cidades. Mudanças climáticas.


Governança climática urbana. Adaptação.

Introdução

M udanças climáticas. Eventos extremos. Alterações no cli-


ma. Nos últimos anos, a referência a esses termos tem
sido cada vez mais frequente nas gestões públicas municipais, seja
pela necessidade de buscar incorporá-los nas agendas políticas,
alinhando-se, assim, às diretivas preconizadas nacional e interna-
cionalmente; seja pela diversidade de experiências recentes, que
evidenciam, na prática, a concretude das alterações climáticas e a
urgência em lidar com seus impactos mais severos, como eventos
extremos de precipitação e associados à temperatura e seca. Se na
discussão internacional sobre mudanças do clima, as cidades com
seus governos locais são reconhecidas como importantes executo-
ras de políticas e impulsionadoras de ações nos processos de miti-
gação e adaptação, no contexto brasileiro a governança climática
urbana tem muito a avançar.
Na prática, o Brasil como um todo, ainda que tenha investido
esforços para integrar a questão climática em suas políticas e di-
retrizes, desempenha papel conservador nessa temática (BASSO,
VIOLA, 2017) e poucas são as cidades brasileiras que incorpora-
ram efetivamente nas suas agendas as mudanças do clima como

1
Os resultados apresentados neste capítulo integram projetos financiados pelo
CNPq (Proc. 446032/2015-8), Fapesp (Proc. 13/17665-5, 14/50313-8 e 17/50423-6)
e U-M/Brazil partnership.
2
Faculdade de Saúde Pública/Universidade de São Paulo.

69
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

norteadoras de políticas públicas (BARBI, 2015). No Estado de São


Paulo a realidade não é diferente e as ações concretas relacionadas
às mudanças do clima também têm sido limitadas (SIMÕES et al.,
2017).
Neste capítulo, proponho discutir algumas das barreiras que
dificultam o avanço da governança climática nos municípios bra-
sileiros, incluindo as cidades paulistas, e sinalizo oportunidades a
serem exploradas pelos governos locais para impulsionar ações que
alinhem mitigação, adaptação e sustentabilidade urbana.
O ponto de partida para essa reflexão é compreender o papel
das cidades, neste momento, no enfrentamento das crises contem-
porâneas (como a crise ecológica, a institucional e a de responsa-
bilidades) e no impulso às mudanças de paradigmas em relação à
construção de territorialidades e aos processos de produção e ges-
tão do espaço urbano (GIARETTA, DI GIULIO, 2018). No atual
contexto de globalização, no qual as localidades internalizam o
que é o global, as cidades se tornaram mais complexas, seja pelas
conexões e fluxos globais estabelecidos (SETO et al., 2010), seja
pela revolução tecnológica, que altera significativamente os mo-
dos de vida e as relações entre os indivíduos no espaço urbano
(DI FELICE, 2009). Nesse contexto, as cidades passaram a exercer
papel político revitalizado (GIDDENS, 2005), sendo compreendi-
das como lócus ideal de experimentações de novas tecnologias e
soluções direcionadas a diversas questões da atualidade, inclusi-
ve sustentabilidade e mudanças climáticas. Particularmente sobre
mudanças do clima, as cidades protagonizam papel importante
tanto na redução de emissões de gases de efeito estufa (mitigação),
testando soluções para mobilidade urbana, geração e consumo
energético, por exemplo; como na adaptação, ou seja, em diversos
processos, como planejamento urbano e gerenciamento de recur-
sos hídricos, entre outros, nos quais ajustamentos são feitos para
antecipar impactos adversos das mudanças climáticas e reduzir a
vulnerabilidade de lugares e de pessoas frente a esses possíveis
impactos.
No caso dos municípios do Estado de São Paulo, para além
da Política Nacional sobre a Mudança do Clima (de 2009), que
oficializa o compromisso voluntário do Brasil, junto à Convenção-
Quadro da ONU sobre Mudança do Clima, de redução de emis-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

sões de gases de efeito estufa, e o Plano Nacional de Adaptação


à Mudança do Clima (de 2016), que visa orientar iniciativas para
gestão e redução dos riscos provenientes dos efeitos adversos das
mudanças climáticas a médio e longo prazo, as cidades contam
também com as diretivas da Política Estadual de Mudanças Cli-
máticas, que vigora desde 2009. Por meio desse arcabouço legal, o
estado paulista estabelece compromisso frente ao desafio das mu-
danças climáticas globais, tanto sobre adaptações necessárias aos
impactos derivados das mudanças do clima quanto na contribui-
ção para reduzir ou estabilizar a concentração dos gases de efeito
estufa na atmosfera. Na prática, contudo, o maior estado brasileiro
em termos de população, com mais de 43 milhões de habitantes,
e de desenvolvimento econômico responsável por mais de 32% do
PIB nacional (SEADE, 2018), ainda tem muito a avançar. Para sus-
tentar esse argumento, apresento análises de parte de resultados
obtidos em dois estudos: (i) o primeiro, numa perspectiva mais
macro, sobre mudanças climáticas e adaptação no Estado de São
Paulo; (ii) e o segundo, numa perspectiva micro, focado na mega-
cidade de São Paulo.

Mudanças do clima e adaptação no Estado de


São Paulo
Recente análise sobre mudanças climáticas e adaptação (DI
GIULIO et al., em revisão) sugere que, de 332 cidades (de 645 mu-
nicípios paulistas que compõem o estado paulista) cujos agentes
municipais responderam a um questionário sobre essa temática
aplicado em 2015, apenas pouco mais de um terço (1/3) contava,
naquele ano, com um plano específico para prevenção e resposta
às situações de risco e emergência relacionadas a eventos climáti-
cos. Das cidades que apresentavam Planos Diretores (cabe lembrar
que no Brasil esse instrumento é obrigatório para municípios com
mais de 20 mil habitantes), somente cerca de um quinto (1/5) apre-
sentava um plano contemplando ações de prevenção e resposta às
mudanças climáticas.
Esses dados apontam duas perspectivas importantes para as
cidades paulistas. Primeiramente, os governos locais precisam in-
vestir na capacidade específica de adaptação (EAKIN et al., 2014),

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ou seja, na habilidade de antecipar, identificar e responder a ris-


cos relacionados a eventos climáticos (DI GIULIO et al., 2016). Na
prática, planos específicos voltados à prevenção e respostas aos
impactos das alterações climáticas são importantes instrumentos
para aumentar a capacidade de adaptação das cidades. Além de-
les, os governos locais precisam ampliar outras intervenções asso-
ciadas à gestão de riscos, como sistemas de alerta, mapeamentos
atualizados de áreas de risco, distribuição de água (em situações
de estresse hídrico), infraestrutura e obras públicas (represas e re-
servatórios, por exemplo).
Uma segunda perspectiva importante para as cidades paulis-
tas: os governos locais devem buscar sinergias entre ações focadas
nas mudanças climáticas e instrumentos de gestão e política urba-
na já vigentes, como é o caso do Plano Diretor que rege políticas
de planejamento e abrange diversos aspectos sensíveis aos impac-
tos climáticos, como infraestrutura, saneamento e habitação, por
exemplo. Nesse sentido, quanto mais os governos locais investirem
na habilidade de resposta social, econômica e política de seus mu-
nicípios – o que podemos chamar de capacidade genérica (EAKIN
et al., 2014) –, mais efetivamente eles contribuem para ampliar a
capacidade dessas localidades de enfrentar e responder a uma va-
riedade de estressores, inclusive os impactos mais severos associa-
dos às mudanças do clima. Na prática, medidas que combatam
inequidade socioeconômica, melhorem o acesso e as condições de
educação formal, ampliem a oferta de serviços de saúde, aumen-
tem as taxas de saneamento, contribuam com a ampliação da in-
fraestrutura verde – conhecidas na literatura como medidas sem
arrependimento (no regrets) – contribuem para maior capacidade
adaptativa dos municípios e seus residentes.

Mudanças do clima e adaptação na megacidade de


São Paulo
Essa segunda perspectiva apresentada, a de impulsionar ações
que respondam às mudanças climáticas por meio de instrumen-
tos de gestão e política urbana vigentes, pode ser observada na
capital paulista. Recentes análises sobre como a megacidade de
São Paulo, com mais de 12 milhões de habitantes, vem lidando

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

com as mudanças do clima (DI GIULIO et al., 2017, 2018) eviden-


ciam que, para além do arcabouço jurídico legal (como a Políti-
ca Municipal de Mudança do Clima, de 2009) e da participação
em redes internacionais focadas nessa temática (como o ICLEI
– Local Governments for Sustainability e o C40 – Cities Climate
Leadership Group), a cidade pode avançar quando busca integrar
respostas às mudanças climáticas em políticas públicas e ações já
existentes. Três iniciativas municipais podem ser apontadas como
exemplos nessa direção: o Plano Diretor Estratégico (PDE, 2014),
o Plano Municipal de Mobilidade Urbana (PlanMob/SP2015) e o
Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica
(PMMA, 2017). Ao contemplarem diretrizes no planejamento ur-
bano, uso e ocupação do solo, mobilidade e infraestrutura verde
da cidade, essas iniciativas sinalizam, pelo menos em teoria, pro-
postas de intervenções mais ajustadas às questões climáticas sem,
contudo, adotarem com força esses termos para justificar suas pro-
posições (DI GIULIO et al., 2017).
A efetividade dessas iniciativas, na prática, vai depender, ob-
viamente, de vontade política, de negociações com os diferentes
setores e atores (incluindo a iniciativa privada) e de recursos fi-
nanceiros, tecnológicos e humanos alocados. Essas observações
sugerem outras duas perspectivas válidas para São Paulo e para
as demais cidades paulistas neste momento. Quando se trata de
questões climáticas, a diferença entre adoção e implementação de
políticas é ainda mais pulsante.
Implementação requer ações governamentais concretas, o
que pode, inclusive, fomentar manobras de oposição e disputas de
interesse (RYAN, 2015). Nesse sentido, os governos locais devem
estar atentos ao que diversas experiências no mundo têm mostra-
do: quanto mais as políticas e ações focadas nas mudanças climá-
ticas estiverem conectadas aos problemas locais e urgentes e gera-
rem benefícios sociais, econômicos e ambientais, maior apoio da
sociedade e dos agentes políticos, em geral, elas tenderão a receber
(RYAN 2015; BULKELEY, 2010).
Além disso, para que a governança climática local ganhe
concretude, a presença ativa dos chamados empreendedores de
políticas públicas (policy entrepreneurs) é valiosa. Esses atores tra-
balham com os formuladores de políticas públicas (policy makers)

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

para promover mudança de políticas, criar oportunidades, trans-


formar estruturas que já existem e mobilizar outros atores para
apoiar inovações políticas e alcançar ações adaptativas nas cidades
(MINTROM et al., 2017).

Superando barreiras, criando oportunidades


Reconhecidamente, os governos locais desempenham papel
importante na proposição de estratégias para lidar com as mu-
danças climáticas. Na prática, contudo, existem barreiras que pre-
cisam ser superadas e questões-chave a serem enfrentadas. Nesse
sentido, os estudos realizados no âmbito do Projeto CiAdapta (DI
GIULIO et al., em revisão), cujo objetivo é compreender numa
perspectiva mais ampla como grandes cidades brasileiras lidam
com as mudanças climáticas e processos de adaptação, trazem im-
portantes pistas, particularmente quanto à necessidade de maior
diálogo e atuação integrada entre diferentes órgãos municipais
e maior articulação entre produtores e usuários da informação
técnico-científica para fomentar processos decisórios que alinhem
adaptação e sustentabilidade urbana.
Essas ações precisam estar alinhadas a outro desafio impor-
tante para as cidades paulistas neste século 21: maior sensibilização
e envolvimento da sociedade civil e da iniciativa privada para a
questão do clima e compartilhamento das decisões. Se os governos
locais são atores fundamentais nesse processo, é preciso reconhe-
cer que esse grupo de atores não é capaz sozinho de resolver a crise
climática dada sua complexidade e multidimensionalidade (BAR-
BI, 2015). Uma efetiva governança climática nas cidades requer coa-
lizões multisetoriais, parcerias, redes, alianças estratégicas e outras
formas de colaboração entre diferentes setores e organizações.

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Capítulo 9

Adaptação, governos locais e Redes


Transnacionais de Municípios
Fabiana Barbi1

Palavras-chave: Adaptação. Mudanças climáticas.


Governos locais. Redes transnacionais de municí-
pios. Política climática.

Introdução

O s governos locais tornaram-se agentes-chave na polí-


tica climática nos últimos 20 anos. Suas ações foram
intensificadas por Redes Transnacionais de Municípios (RTMs)
que atuam como direcionadoras da ação climática no nível lo-
cal, envolvendo os governos locais no desenvolvimento de polí-
ticas e ações efetivas como respostas às mudanças climáticas em
áreas urbanas. Dessa forma, os governos locais e as RTMs estão
juntos na linha de frente da governança climática (BULKELEY
e BETSILL, 2013).
As atividades desenvolvidas dentro dessas redes pelas cidades
posicionaram-nas como locais críticos para a governança climática
e têm mostrado avanços para a importância estratégica da gover-
nança climática urbana (BULKELEY et al., 2014).
Chegou o momento em que responder aos riscos das mudan-
ças climáticas não é mais opcional, sobretudo nas áreas urbanas.
Isso porque espera-se que os eventos meteorológicos e climáticos
extremos tragam riscos significativos para as sociedades e os ecos-
sistemas (IPCC, 2012).
As cidades estão particularmente ameaçadas pelas mudanças
climáticas devido a fatores que incluem a forte dependência de in-
fraestrutura de rede interconectada, alta densidade populacional,
grande número de pessoas em situação de vulnerabilidade socioe-
1
Universidade Católica de Santos e NEPAM-UNICAMP.

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conômica e ambiental e grandes concentrações de bens materiais


e culturais. Além disso, processos sociais, econômicos e políticos,
como estruturas de governança precárias ou projetos urbanos ina-
dequados, podem exacerbar os riscos das mudanças climáticas nas
áreas urbanas (CARTER et al., 2015).
Além disso, uma vez que os impactos das mudanças climáti-
cas são mais sentidos localmente, as cidades e seus governos locais
são agentes cruciais na produção de respostas a esse desafio em
termos de estratégias de adaptação aos riscos advindos das mu-
danças no sistema climático. Em todo o mundo, as RTMs desem-
penharam um papel catalítico crítico na mitigação das mudanças
climáticas e têm potencial para também apoiar a adaptação local.
Esse cenário inclui as cidades brasileiras.

Estratégias de adaptação nas cidades brasileiras


O Brasil tem 5.570 municípios, mas apenas oito deles pos-
suem políticas de mudanças climáticas aprovadas. São eles: Belo
Horizonte (MG), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), Manaus (AM),
Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Sorocaba (SP).
E dessas, apenas Rio de Janeiro e São Paulo possuem planos de
adaptação publicados, junto com Porto Alegre (RS) e Santos (SP).
Quase todos esses municípios são membros de RTMs relacionadas
às mudanças climáticas, principalmente o Governos Locais pela
Sustentabilidade (ICLEI) e a Rede de Cidades C-40 (BARBI e FER-
REIRA, 2017).
A Campanha Cidades pela Proteção do Clima (CCP) do
ICLEI foi a primeira a abordar as mudanças climáticas nas cidades
brasileiras e a que envolveu a maior parte delas. O ICLEI posicio-
nou essas cidades no debate sobre mudanças climáticas, trazendo
a questão para a agenda política local. A rede também permitiu
que os governos locais brasileiros realizassem experimentos de go-
vernança climática – até agora, com foco na mitigação (BARBI e
MACEDO, 2019).
A agenda de adaptação e resiliência começou a ser aborda-
da mais recentemente, desde 2017, especialmente através do Pacto
Global de Prefeitos pelo Clima e Energia, quando o ICLEI reu-
niu mais de 75 cidades brasileiras. Junto com outras cidades do

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

mundo todo, elas se comprometeram a promover a ação voluntária


pelo clima, envolvendo tanto estratégias de mitigação quanto de
adaptação. Dessa forma, a agenda de adaptação pode ser conside-
rada incipiente no nível local no Brasil.
Até o momento, a maioria das estratégias de adaptação nas
cidades brasileiras com políticas climáticas inclui o desenvolvimen-
to de um plano de adaptação, envolvendo vários setores governa-
mentais e estudos de vulnerabilidade. Nessas cidades, a agenda
climática está sendo abordada e formulada pelos Comitês Muni-
cipais de Mudanças Climáticas, responsáveis pela implementação
das políticas.
Esses comitês ainda estão muito ligados aos Departamentos
ou Secretarias de Meio Ambiente dentro da estrutura governamen-
tal do município, mas teoricamente devem envolver outros setores
do governo e outros agentes, como o nível estadual de governo,
institutos de pesquisa e universidades, organizações não governa-
mentais, setor privado e também o setor Legislativo.
Considerando os riscos das mudanças climáticas, os princi-
pais setores para as respostas de adaptação em nível local são: de-
senvolvimento urbano (gerenciamento do uso da terra); ambien-
te construído; infraestrutura e serviços urbanos; meio ambiente;
saúde e gestão de desastres. Isso mostra a diversidade de ações
possíveis e necessárias no nível local e, também, a variedade de
setores governamentais envolvidos na adaptação às mudanças cli-
máticas.

Barreiras à adaptação climática nas cidades


brasileiras
A análise das experiências das cidades brasileiras que possuem
políticas climáticas mostrou que as barreiras enfrentadas por essas
cidades estão mais relacionadas à dificuldade de envolver outros
agentes na implementação da política. E a própria implementação
da política, já que os Departamentos e Secretarias Municipais de
Meio Ambiente não possuem recursos financeiros e humanos su-
ficientes, na maioria dos casos. Há uma visão predominante de
que as estratégias de adaptação significam necessariamente obras
de infraestrutura e que, portanto, precisam de recursos financei-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

ros elevados. Certamente, os investimentos em infraestrutura são


necessários. No entanto, as soluções baseadas na natureza, como
a conservação e expansão de áreas verdes, não exigem a mesma
quantidade de investimento e também constituem estratégias-cha-
ve de adaptação.
Outra barreira é a falta de interação com outros níveis de go-
vernança. Muitos estados brasileiros aprovaram sua política climá-
tica (14 estados dos 27) e há também a política nacional, aprovada
em 2009. No entanto, essas medidas são desconexas. As mudanças
climáticas exigem formas inovadoras de governança multinível,
em que os governos locais atuem como agentes-chave, articulados
com os níveis estadual e nacional para elaborar e implementar
ações de adaptação.
Por exemplo, uma das diretrizes da Política de Mudan-
ças Climáticas do Estado de São Paulo se refere à prevenção e
adaptação aos impactos das mudanças climáticas e ao desenvol-
vimento de planos adequados e integrados para a gestão das
áreas costeiras e metropolitanas (Seção V, artigo 6 – São Paulo,
2010). É o caso das Regiões Metropolitanas da Baixada Santista,
Campinas, Sorocaba e Vale do Paraíba e Litoral Norte, que fa-
zem parte da Macrometrópole Paulista. Entretanto, esses pla-
nos ainda não foram elaborados.
Finalmente, a adaptação é enquadrada mais como gerencia-
mento de desastres do que como gerenciamento de riscos de mu-
danças climáticas pelas cidades brasileiras. Há uma diferença nes-
se enquadramento. Os planos de adaptação que não consideram
as projeções futuras de mudanças climáticas estão mais relaciona-
dos ao gerenciamento de desastres. Abordar as projeções climáti-
cas futuras, sempre que disponíveis, é uma condição fundamental
para gerenciar os riscos das mudanças climáticas. Por exemplo, o
aumento do nível do mar é um grande problema em um país com
cerca de 8.000 quilômetros de costa, como é o caso do Brasil, com
a maioria da população do país vivendo nessas áreas vulneráveis.
Portanto, os planos de adaptação para as cidades costeiras devem
considerar como lidar com as projeções de aumento do nível do
mar em suas estratégias.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Oportunidades para adaptação climática em


cidades brasileiras
As experiências analisadas mostraram algumas oportunida-
des em relação à adaptação climática nas cidades brasileiras. Pelo
menos 75 cidades estão planejando estratégias de adaptação por
meio do Pacto Global de Prefeitos. Existem outras iniciativas de
adaptação climática em andamento envolvendo cidades brasilei-
ras. A AdaptaClima é uma plataforma que fornece conteúdo de
adaptação, como parte do Plano Nacional de Adaptação, publica-
do em 2017. A rede Resilient Cities possui algumas cidades bra-
sileiras como membros, e algumas cidades também fazem parte
da Campanha das Nações Unidas “Tornando Cidades Resilientes”
(“Making Cities Resilient”). Santos e Porto Alegre aprovaram seus
planos de adaptação em 2016 e, em 2019, e pelo menos cinco ci-
dades estão elaborando seus planos: Belo Horizonte, Fortaleza,
Recife, Salvador e São José dos Campos. Esse crescente número
de iniciativas mostra que a agenda de adaptação e resiliência está
gradualmente sendo internalizada pelos governos locais.
Na maioria dos casos, as cidades brasileiras estão agindo com
o apoio de iniciativas internacionais, como as redes transnacionais
de municípios. Ainda são poucas as cidades brasileiras que adotam
ações com recursos próprios. Isso é algo que as cidades podem
explorar.
Ainda, há um potencial de aprendizagem social a partir das
experiências das cidades que possuem políticas climáticas: outras
cidades brasileiras podem aprender sobre o que fazer, o que não
fazer, como as ações podem ser replicadas, e assim por diante.
Por fim, são necessárias mais pesquisas sobre o papel dos
agentes não governamentais na governança do clima nas cidades
brasileiras. Embora os governos locais, juntamente com as redes
transnacionais de municípios tenham mostrado uma direção inte-
ressante para responder ao desafio das mudanças climáticas, tra-
ta-se de um problema complexo, multinível e multidimensional.
Por isso, o envolvimento de outros níveis de governo, organizações
não governamentais, setor privado, universidades e instituições de
pesquisa é fundamental para a produção de respostas eficientes e
bem-sucedidas para o problema. Nesse sentido, a agenda futura

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

nessa área aponta para análises da governança climática multia-


gente e multinível.

Referências
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Climate Governance in Multi-level Systems. In: Competitive Cities and Climate
Change OECD Conference. Milan, Italy. OECD, 2008.
BARBI, F.; FERREIRA, L. C. Governing Climate Change Risks: Subnational
Climate Policies in Brazil. Chinese Political Science Review, 2(2), p. 237-252, 2017.
BARBI, F.; MACEDO, L. V. Transnational municipal networks and cities in
climate governance: experiments in Brazil. In: HEIJDEN, J.; BULKELEY, H.;
CERTOMÀ, C. (Eds.) The politics of urban climate futures: increasing agency and
contested empowerment. Cambridge University Press, 2019.
BULKELEY, H.; BETSILL, M. M. Revisiting the urban politics of climate chan-
ge. Environmental Politics, 22(1), p. 136-154, 2013.
BULKELEY, H.; EDWARDS, G.; FULLER, S. Contesting climate justice in the
city: examining politics and practice in urban climate change experiments. In:
Global Environmental Change, 25(1), p. 31-40, 2014.
CARTER, J. G. et al. Climate change and the city: Building capacity for urban
adaptation. Progress in Planning, 95(1) p. 1-66, 2015.
IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change. Managing the Risks of Ex-
treme Events and Disasters to Advance Climate Change Adaptation. A Special
Report of Working Groups I and II of the Intergovernmental Panel on Climate
Change [Field, C. B.; V. Barros; T. F. Stocker; D. Qin; D. J. Dokken; K. L. Ebi;
M. D. Mastrandrea; K. J. Mach; G. -K. Plattner; S. K. Allen; M. Tignor; and P. M.
Midgley (Eds.)]. Cambridge University Press, Cambridge, UK, and New York,
NY, USA, 582 pp., 2012.
UN-HABITAT (United Nations Human Settlements Programme). Cities and cli-
mate change: global report on human settlements. Earthscan, 2011.

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C a p í t u l o 10

Ciência e política: desafios e


oportunidades para gestão do território
macrometropolitano
Luciana Yokoyama Xavier1 e
Leandra Regina Gonçalves1

Palavras-chave: Interface ciência-gestão, aplicação


do conhecimento, papel da ciência

Introdução

R ecentes levantamentos sobre a importância da biodi-


versidade e dos serviços ecossistêmicos têm trazido à
tona três pontos sob os quais há grande consenso: (1) depen-
demos dos ecossistemas naturais, dos múltiplos serviços e be-
nefícios derivados deles; (2) ações humanas vêm degradando e
prejudicando a capacidade desses ecossistemas de prestar múl-
tiplos serviços; (3) novos sistemas de governança ambiental são
necessários para garantir a gestão sustentável desses ecossiste-
mas (BPBES, 2018).
Dentre os pontos acima, o que mais interessa na condução des-
te capítulo é a construção de novos sistemas de governança. Nesse
sentido a questão das mudanças climáticas (MC) figura como um
dos mais críticos desafios. Apesar das MC terem alcance global, a
distribuição de seus drivers e efeitos é desigual e se manifesta em
nível local. Os principais tipos de resposta às MC distinguem-se
em ações de mitigação – controle dos drivers, como das emissões
de gases estufa – e adaptação – promoção da resiliência dos siste-
mas socioecológicos para prevenir, responder e se recuperar de
possíveis impactos. Enquanto as ações de mitigação recaem sobre

1
Instituto Oceanográfico da Universidade de Sâo Paulo (IOUSP). FAPESP
2017/21797-5 (LYX). FAPESP 2018/00462-8 (LRG).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

países e setores com maiores taxas de emissão de gases estufa,


como países em desenvolvimento, as ações de adaptação são neces-
sárias em regiões e comunidades mais vulneráveis, que já sofrem
impactos derivados das MC.
A complexidade que cerca as discussões sobre as MC e seus
impactos é compartilhada por outros problemas ambientais mo-
dernos. Esses problemas são cercados por incertezas e demandam
sistemas de gestão igualmente complexos, que sejam multiníveis,
transetoriais e híbridos, com a participação de atores e organiza-
ções governamentais e da sociedade (LEMOS; AGRAWAL, 2006).
Nesses sistemas, informação de qualidade é fundamental para in-
dicar as práticas e soluções mais adequadas e efetivas. Por exem-
plo, uma das melhores ferramentas para se desenvolver respostas
à MC é a elaboração de estudos que envolvam análises de risco,
vulnerabilidades e impactos associados a cenários atuais e proje-
ções de eventos extremos (PBMC, 2016). Assim, o papel da ciência
como fonte de informação e uma maior interação entre ciência e
política são fundamentais.

Interface entre a ciência e política: onde estamos?


O papel da ciência, em geral, é produzir um conjunto de co-
nhecimento sobre um determinado tema. Já a política pode ser
entendida em um sentido abstrato como um princípio, norma ou
diretriz para a ação em um contexto específico (para uma série de
definições, ver CLARK, 2002, p. 6). Ciência e política represen-
tam, dessa forma, dois universos cujos princípios e práticas são
distintos. Apesar disso, a solução de problemas ambientais exige
uma aproximação entre ciência e política, de forma que o conhe-
cimento produzido possa ser usado para entender causas, efeitos e
mitigação de problemas ambientais, e embasar a tomada de deci-
são em busca de respostas mais sustentáveis.
Tradicionalmente, a interface entre ciência e política é vis-
ta como um processo linear de “transferência” de conhecimento
entre os dois universos (VOGEL et al., 2007). Tal interpretação
leva à simplificação da relação entre ambos e evidencia falhas
no processo, como dificuldade de acesso, diferenças de lingua-
gem ou tempo de produção. Essas são barreiras que devem ser

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

transpostas na interação ciência/política, mas mesmo em casos


onde elas não existem é possível observar um descompasso entre
a informação científica e a decisão política. Para além dessa sim-
plificação, novos estudos demonstram que esse é um processo
de múltiplas vias, uma rede de interações e trocas de conheci-
mento entre os diversos atores – cientistas, políticos e popula-
ção em geral (VOGEL et al., 2007). Trata-se, dessa forma, de um
aprimoramento das arenas de discussão política e de produção
de conhecimento para que passem a interagir e atuar de forma
integrada e colaborativa, que passa por práticas que envolvem o
desenho das instituições e das políticas assim como a construção
do próprio conhecimento.
Apesar da concordância sobre a importância da ciência
para a formulação de políticas públicas, existem percepções
divergentes de como, quando e em que condições a ciência in-
fluencia as políticas e, consequentemente, sobre a forma como
a interação entre ciência e política deve ser melhor organizada
(LIDSKOG; SUNDQVIST, 2015). Nesse contexto, o estabeleci-
mento de “comunidades epistêmicas” pode ser um canal pelo
qual o conhecimento consensual sobre entendimentos causais
é aplicado à coordenação de políticas e pelo qual os governos
podem aprender (HAAS, 1992). O conceito de “comunidades
epistêmicas” é aplicado por estudiosos construtivistas da ciên-
cia política para analisar o processo pelo qual Estados e outros
atores políticos formulam seus interesses e reconciliam diferen-
ças de interesse (HAAS, 1992).
A aplicação dessa abordagem considera que as comunidades
epistêmicas fornecem melhores recomendações científicas do que
outros modos de orientação política, uma vez que é provável que
um parecer especializado tenha embasamento mais racional. Ao
contrário de outros grupos de interesse organizados e ativos na
formulação de políticas públicas, comunidades epistêmicas têm
crenças internas que as tornam mais propensas a fornecer infor-
mações que são politicamente inalteradas e, portanto, com maiores
chances de que essas informações serão enquadradas e seguidas
por autoridades políticas dada sua imparcialidade e o potencial
aprendizado social (HAAS, 2015).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

A comunidade epistêmica, dessa forma, é a base do “cintu-


rão de transmissão” (HAAS, 1992) que conecta ciência e polí-
tica. Nessa interação, processos de troca de conhecimento2 são
essenciais para a construção de relações de confiança, significa-
dos e soluções coletivas para os problemas ambientais. Promover
maior integração ciência-política por meio de processos de troca
de conhecimento implica em envolver os cientistas em diferentes
momentos do processo de tomada de decisão (ver Figura 1) e
adicionalmente explorar diversos papéis (ver Tabela 1), de forma
combinada e contínua.

Figura 1
Possíveis contribuições da ciência em vários estágios
do processo de tomada de decisão (traduzido e adaptado
de VOGEL et al., 2007).

2
Neste capítulo adotamos a definição de Reed et al. 2014 para “troca de conhecimento”,
que compreende o processo pelo qual o conhecimento é produzido, compartilhado com
e entre os interessados em utilizá-lo, traduzido e/ou transformado conforme é compar-
tilhado, e também o contexto social no qual as pessoas adquirem novo conhecimento.

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Tabela 1
Possíveis papéis que os cientistas/pesquisadores podem desempenhar
em processos de tomada de decisão sobre questões ambientais3.
Papel Descrição
Provedores Provêm informação científica sob demanda. Quando envolvidos
de informa- em processos participativos de tomada de decisão atuam como
ção/conhe- consultores que respondem a questões específicas sobre as quais
ci-mento desenvolvem as pesquisas (envolvimento limitado).
Conse- Em adição a prover informação, fazem recomendações aos toma-
lheiros na dores de decisão quanto à decisão a ser tomada, sob demanda, sem
tomada de se envolver, ou envolvendo-se de forma limitada, com o processo
decisão participativo de tomada de decisão.
Intermedia- Facilitam o diálogo entre diferentes atores/grupos/instituições.
dores do co- Participam do processo participativo de tomada de decisão, mas
nhecimento não necessariamente como um stakeholder, atuando com um tradu-
(knowledge tor de informação ou uma ponte entre diferentes atores/grupos/
brokers) instituições.
Tradutores Atuam como tradutores da informação científica, contextualizan-
de informa- do e interpretando a informação e os dados para não cientistas.
ção Podem participar do processo participativo de tomada de decisão,
mas não necessariamente como um stakeholder.
Mobilizado- Identificam e divulgam problemas ambientais, chamando a aten-
res ção para a necessidade de serem discutidos.
Facilitado- Facilitam e mediam processos participativos, estando diretamente en-
res volvidos no processo como um ator isento e não como um stakeholder.
Coproduto- Participam do processo participativo de tomada de decisão como
res de co- um stakeholder, defendendo interesses específicos, compartilhan-
nhecimento do conhecimento/informação, percepções e entendimentos com
igual valor ao dos demais participantes e atuam na produção de
novo e coletivo conhecimento.

Integrando conhecimento e política para a


governança ambiental da macrometrópole
O grau de aplicação da informação científica em políticas e
práticas depende da relevância, legitimidade e credibilidade da in-
formação. Essas, por sua vez, dependem de como o conhecimento
é produzido, compartilhado e traduzido/transformado em um con-
texto social que promova aprendizado. Ou seja, depende de como
o processo de troca de conhecimento é organizado. A Macrometró-
pole Paulista (MMP), além dos problemas relacionados com as MC,
3
Mais do que uma revisão profunda do tema, a tabela busca demonstrar os princi-
pais papéis reportados na literatura e que estão alinhados com os objetivos do proje-
to temático MacroAmb/FAPESP 2015/03804-9.

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traz uma gama de desafios ambientais, como a gestão costeira, ges-


tão da água, combate às desigualdades etc., que podem se beneficiar
de maior integração ciência-gestão.
Reed e colaboradores (2014) elencaram cinco princípios (com
ações vinculadas) que podem aprimorar a troca de conhecimento
em um processo de tomada de decisão para gestão ambiental e ser
os norteadores do processo dentro da MMP:
l Princípio 1: saiba o que se deseja alcançar com a troca de
conhecimento/informação e planeje o processo de intera-
ção desde o princípio do projeto de pesquisa:
m estabelecer metas para a troca de conhecimento do

princípio;
m conceber uma estratégia para troca de informação e

comunicação;
m basear a estratégia em um processo adaptativo que pos-

sa responder à mudanças da necessidade e prioridades


dos envolvidos;
m atribuir pessoal capacitado e recursos financeiros para

as atividades de troca de conhecimento.


l Princípio 2: aborde problemas e prioridades de gestão no
projeto de pesquisa de forma sistemática:
m identificar possíveis usuários da pesquisa e outros

stakeholders relevantes de forma sistemática;


m envolver stakeholders-chave na pesquisa;

m considerar as implicações éticas do envolvimento com

diferentes stakeholders.
l Princípio 3: construa relações de confiança de longa du-
ração, com base em diálogo de via dupla entre pesquisa-
dores e outros stakeholders e promova a co-construção de
novo conhecimento sobre gestão ambiental:
m engajar-se em diálogos de via dupla como um igual com

os possíveis usuários da pesquisa;


m construir relação de longa duração com os possíveis

usuários da pesquisa;
m trabalhar com intermediadores;

m contratar um profissional para facilitar workshops com

usuários da pesquisa;

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m entender o que pode motivar os usuários da pesquisa a


se envolver com ela;
m criar oportunidades para interação informal e aprendi-

zado entre pesquisadores e stakeholders;


m trabalhar com stakeholders para interpretar as implica-

ções da pesquisa para a política e prática e coproduzir


material de comunicação.
l Princípio 4: enfoque em divulgar resultados que sejam de
interesse dos stakeholders o quanto antes:
m identificar momentos oportunos nos quais a informa-

ção possa ser apresentada tão cedo quanto possível ao


longo do processo de pesquisa, de forma a recompen-
sar e manter o interesse dos usuários da pesquisa em
participar do processo;
m alinhar o tempo da pesquisa com as necessidades de

gestão.
l Princípio 5: monitore e avalie o processo de troca de co-
nhecimento/informação, de forma a melhorá-lo e garan-
tir que o processo possa perdurar além do tempo de finan-
ciamento do projeto:
m refletir periodicamente com a equipe de pesquisa e

stakeholders-chave sobre a efetividade da troca de conhe-


cimento/informação;
m aprender com seus pares;

m compartilhar boas práticas;

m identificar que tipo de troca de conhecimento deve con-

tinuar após o tempo de financiamento do projeto e con-


siderar como manter essa troca pelo período necessário.

Considerações finais
O reconhecimento da necessidade de um novo relaciona-
mento entre ciência e política reforça a necessidade da promoção
de diferentes papéis dos cientistas em diferentes momentos dos
processos de tomada de decisão. Para exercitar esses papéis é
preciso criar e fortalecer arranjos institucionais dentro de um
sistema de governança ambiental que considere o papel da ciên-

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cia, seja multinível, transetorial e híbrido, com a participação de


atores e organizações governamentais e da sociedade de todo o
território macrometropolitano. Nesses arranjos, a promoção da
troca de conhecimento como prática de fortalecimento da rela-
ção entre os cientistas e tomadores de decisão (em nível estadual,
macrometropolitano, regional e local) deve ser pautada em pro-
cessos transparentes, dialógicos, que valorizem diversas fontes de
conhecimento e promovam aprendizado social.

Referências
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da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos. Carlos A.
Joly; Fabio R. Scarano; Mercedes Bustamante; Tatiana Gadda; Jean Paul Metz-
ger; Cristiana S. Seixas; Jean-Pierre Ometto; Aliny P. F. Pires; Andrea Larissa
Boesing; Francisco Diogo Rocha Sousa; José Maurício Quintão; Leandra Gon-
çalves; Maíra Padgurschi; Michely Ferreira Santos de Aquino; Paula Drummond
de Castro, Isabela de Lima Santos. Campinas, SP: 24 páginas, 2018.
CLARK, T. W. The Policy Process: A Practical Guide for Natural Resource Profes-
sionals. Yale University Press, New Haven and London, 2002.
HAAS, P. M. Introduction: Epistemic communities and international-policy coordi-
nation-introduction. International Organization 46(1). Special Edition. 1-35pp. 1992.
HAAS, P. M. Epistemic communities, constructivism, and international environmental
politics. Routledge, 2015.
LIDSKOG, Rolf; SUNDQVIST, Göran. When does science matter? Internatio-
nal relations meets science and technology studies. Global Environmental Politics,
v. 15, n. 1, p. 1-20, 2015.
PBMC, 2016: Impacto, vulnerabilidade e adaptação das cidades costeiras brasi-
leiras às mudanças climáticas: Relatório Especial do Painel Brasileiro de Mudan-
ças Climáticas [Marengo, J.A.; Scarano, F.R. (Eds.)]. PBMC, COPPE/UFRJ. Rio
de Janeiro, Brasil, 2016, 184 p. ISBN: 978-85-285-0345-6.
REED, M. S.; STRINGER, L. C.; FAZEY, I.; EVELY, A. C.; KRUIJSEN, J. H. J.
Five principles for the practice of knowledge exchange in environmental mana-
gement. Journal of Environmental Management, v. 146, p. 337–345, 2014. Disponí-
vel em: <http://dx.doi.org/10.1016/j.jenvman.2014.07.021>.
VOGEL, C.; MOSER, S. C.; KASPERSON, R. E.; DABELKO, G. D. Linking vul-
nerability, adaptation, and resilience science to practice: pathways, players, and
partnerships. Global Environmental Change, v. 17, n. 3-4, p. 349-364, 2007.

Agradecimentos
Esta pesquisa foi realizada no âmbito do Projeto Temático “Gover-
nança Ambiental da Macrometrópole Paulista” da FAPESP (Número
2015/03804-9), e com as bolsas de pós-doutorado (LRG: 2018/00462-8;
LYX: 2017/21797-5).

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C a p í t u l o 11

A Macrometrópole Paulista
e os desafios para o planejamento
e gestão territorial
Silvana Zioni1, Luciana Travassos1,
Sandra Momm1 e Ana Lia Leonel1

Palavras-chave: Macrometrópole Paulista. Planeja-


mento Territorial. Região.

Introdução

Oprocesso de produção do espaço contemporâneo


apresenta um fenômeno de urbanização extensiva, he-
terogênea e multicêntrica sob a hegemonia de um modelo de
desenvolvimento flexível, pós-keynesiano e neoliberal. Em um
primeiro momento, vários conceitos foram utilizados para defi-
nir o processo de expansão urbana para além dos núcleos ori-
ginais das cidades – metrópole, conurbação, megalópole – que
originam uma nova forma de organização territorial – a cidade
região global (SASSEN, 1998; SCOTT e STORPER, 2001). Mais
recentemente, respondendo às mudanças observadas, prenun-
ciando o processo de urbanização regional que, segundo Soja
(2013) faria a transição da urbanização metropolitana, surge
a concepção de uma megacidade região2, que analisa espaços
separados em termos institucionais e mesmo em termos das re-
lações funcionais mais cotidianas, mas que possuem, entre si,
grande fluxo de pessoas e informações (HALL, PAIN, 2006,
apud XU-YEH, 2012, p. 2).
1
Universidade Federal do ABC (UFABC).
2
Fenômeno global, segundo dados do World Urbanization Prospects (Nações Unidas,
2018), para 2030 estima-se que o mundo abrigue 43 megacidades – com mais de 10
milhões de habitantes –, sendo a maior parte delas nas regiões em desenvolvimento.
https://www.un.org/development/desa/publications/2018-revision-of-world-urbani-
zation-prospects.htm. Acesso em: outubro de 2018.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Nesse contexto, reacende-se o papel da região, mas que


requer um novo regionalismo, outrora caracterizado por uma
agenda desenvolvimentista ou de equilíbrio regional, esse re-
gionalismo se vê diante de um dilema de planejamento e gover-
nança. De um lado tentando institucionalizar o padrão dessa
urbanização e de outro sendo cooptado pela agenda de inves-
timentos e infraestrutura (que caminham juntos) de setores,
corporações e municipalidades. Friedmann, analisando essa
mudança da cultura do planejamento nas cidades europeias,
refere-se a um planejamento à la carte: um planejamento com
características multifacetadas, flexíveis e localizadas, onde os
planejadores teriam novos papéis, como facilitadores, mediado-
res e, inclusive, como espectadores dos processos socioeconômi-
cos globais (FRIEDMANN, 2012).
Soma-se à complexidade espacial, resultante da diversida-
de de agentes e escalas em diferentes estratégias e agendas po-
líticas (KLINK, 2013), a precariedade e a informalidade que
se movimentam juntamente com os fluxos de capital e inves-
timento em uma busca por brechas, ou buracos locacionais,
para moradia e geração de renda. Soma-se também a com-
plexidade espacial resultante, os impactos, atuais e previstos,
das rápidas transformações nos sistemas naturais, como é o
caso da variabilidade climática e seus impactos nos sistemas
produtores de água.
No Brasil, a emergência de uma nova forma de urbanização
metropolitana – a Macrometrópole Paulista (MMP) – assume
as características e a complexidade de uma cidade-região (ver
Figura 1). Mesmo sem que tenha sido efetivada uma escala de
planejamento e governança regional, a MMP se configura como
um conjunto de regiões metropolitanas e aglomerações urba-
nas cuja institucionalidade ainda não se consolidou plenamen-
te. Embora alguns autores afirmam ser possível considerá-la
como uma plataforma de planejamento e integração de políti-
cas públicas setoriais (EMPLASA, 2014; CASTRO, SANTOS-
JUNIOR, 2017; TAVARES, 2018), persiste o debate sobre os
desafios do planejamento regional diante dessa nova unidade
territorial.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Figura 1
Os diversos territórios da MMP.

Fonte: IBGE, DAEE.


Elaboração: Ana Lia Leonel (UFABC/PGT/FAPESP), 2018.

A Macrometrópole Paulista, de fato territorial a


nova escala de governança
A figura de uma metrópole expandida havia sido cogitada
há décadas frente às demandas da infraestrutura de transportes
e do saneamento. A proposição do governo do Estado de São Pau-
lo em institucionalizar essa nova escala, apresentada em 2011, já
trazia uma contestação ao processo de regionalização do estado,
visto que alertava que as “...políticas públicas, no Estado, em ge-
ral, desconsideram a dimensão territorial do desenvolvimento, ou,
quando muito, consideram-na apenas de maneira lateral” (SÃO
PAULO, 2011, p. 18).
Entretanto, a compreensão da complexidade de se ter o terri-
tório da MMP como uma plataforma de integração de políticas e
ações de governo já se revelava frágil e incerta. Por um lado, a baixa
implementação de ações, práticas e gestão de desenvolvimento sus-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

tentável, ainda que a regulação normativa venha sendo incorpora-


da na agenda pública, indica essa fragilidade; e por outro

...a prática do planejamento e gestão do processo de desenvol-


vimento não está centrada na ideia-força de redução dos dese-
quilíbrios regionais, os quais ainda hoje compõem o contexto
de desenvolvimento do Estado de São Paulo, a ele se associan-
do estruturalmente, uma vez que a adoção de políticas públi-
cas integradas e de estratégias e metas, implícitas ou explí-
citas, concretamente voltadas para sua redução constitui um
processo ciclotímico no âmbito da política de desenvolvimento
(SÃO PAULO, 2011, p. 18).

O alcance dos arranjos institucionais federativos que respon-


dem às demandas de interesse comum, animadas por espírito cola-
borativo e associativo, parecem não superar os traumas da centra-
lização, por mais que garantida a institucionalização dos diferentes
agenciamentos, arranjos e estruturas regionais de caráter metropo-
litano (MENCIO, ZIONI, 2017). Aliás, até mesmo a Lei nº 13.683, de
2018, que alterou o também recente Estatuto da Metrópole (Lei Fe-
deral nº 13.089/2015), aumentando o risco da proliferação de figu-
ras regionais ditas metropolitanas, sem que apresentem as devidas
características ou capacidades de exercer as funções públicas de co-
mum interesse, entende que a governança interfederativa implica o

...compartilhamento de responsabilidades e ações entre entes


da Federação em termos de organização, planejamento e exe-
cução de funções públicas de interesse comum, mediante a
execução de um sistema integrado e articulado de planejamen-
to, de projetos, de estruturação financeira, de implantação, de
operação e de gestão (Lei nº 13.683, de 2018, art. 2º, IX).

Apesar disso, no âmbito do Estado de São Paulo, que já de-


clara como metropolitana mais de 70% da sua população, as RMs
vêm sendo estabelecidas sem apresentarem grande desempenho
de gestão, capacidade de resposta às demandas, interesse compar-
tilhado (GOMES, 2017) e até mesmo de se constituírem como ter-
ritórios de expressão política (LEFÈBVRE, 2009).
Há quem atribua à autonomia municipal, conquistada com
a Constituição de 1988, o aparente (e intransponível) obstáculo

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ao compartilhamento de formas de governança metropolitana,


para tratar de questões essencialmente multiescalares, como tam-
bém nos alerta Brandão (2017). E há também, como apontado por
Souza (2003, p. 148), que RMs requerem “a mudança de escala
territorial do planejamento e da gestão do território”, que corres-
ponderia à da cidade-região. Entretanto, essa escala cidade-região
estaria relacionada a um nível estratégico e político de administra-
ção, correspondente ao que Klink (2013) define como relacionada
ao cenário da reestruturação e reescalonamento para acolher uma
nova forma de organização social e econômica, mas que não neces-
sariamente está representada na delimitação da MMP.
É importante, então, observar que o debate sobre regionaliza-
ção e reescalonamento do Estado é extenso e complexo, e vai além
da formação do espaço em si. Segundo Brenner (2018, p.108), está
relacionando com “construção/transformação espacial do poder
do Estado”, em um processo de articulação e desarticulação, que
não é fixo nem homogêneo, e resulta em processos descontínuos
de desenvolvimento.
Os processos de globalização econômica, nas décadas de 1970
e 1980, pressionaram por uma diminuição do papel dos governos
nacionais na ação e regulação do desenvolvimento enfatizando a
proeminência da escala local, em particular das cidades, como as
unidades de integração dos mercados globais. No final do século
passado, do debate em torno das qualidades substantivas daquelas
cidades, ditas globais, emerge o entendimento de que a unidade
territorial da globalização é a região (HAESBAERT, 2010).
Tal região abriga uma série de características que conformam
o conceito de cidade-região, entendida “como a área metropolitana
mais concisa somada de seu entorno imediato, incluindo uma sé-
rie de centralidades de pequeno e médio porte no alcance dos pro-
cessos de metropolização” (MAGALHÃES, 2008, p. 9). No mesmo
sentido, Xu e Yeh, (2010, p. 1), citando o trabalho de Hall e Pain
(2006), entendem que uma cidade-região se configura como um
cluster de cidades e regiões metropolitanas contíguas, separadas
do ponto de vista administrativo, intensamente conectadas entre
si, mas principalmente nucleadas por uma grande cidade central.
Para Negreiros et al. (2015, p.127), “nesse território, coexistem
diferentes morfologias urbanas, compondo uma rede de cidades

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com elevado nível de integração funcional, e interagem metrópo-


les de caráter mundial, nacional e regional, aglomerações urbanas
e centros urbanos com significativos papéis de centros regionais”.
A conformação dos fluxos espaciais vai produzir um território
que é, ao mesmo tempo, muito articulado e muito desigual, pro-
vocando a homogeneização da identidade e a heterogeneização do
espaço, aquilo que Allen et. al. (2002) chamam de região com bura-
cos. Na região de fato e na matriz discursiva (HAESBAERT, 2010)
os atores e as disputas na região pressionam o Estado à instituciona-
lização de uma nova escala de planejamento e governança, mas não
necessariamente com perímetros fixos como aqueles dos entes ad-
ministrativos originais. Nesse caso, um perímetro “frouxo”, estabe-
lecido caso a caso, possibilita que a região seja acessada e governada
conforme diferentes interesses (SWYNGEDOUW, 2018), interesses
esses de diversas ordens econômicas, e que poderão revelar novas
territorialidades, conforme seus marcos regulatórios.
Assim, desde a logística industrial e da agropecuária, dos siste-
mas de transportes e de mobilidade, aos investimentos em inovação
e ao acesso a recursos naturais, vão se estabelecendo desenhos di-
versos de “cidade-região”, conduzindo ações, investimentos e deman-
dando regulação estatal. Autores como Offner & Pumain (1996),
Brandão (2018) e Pires do Rio (2017) ressaltam a importância do
Estado como agente econômico responsável pelo fortalecimento das
funções de regulação. Essa função se dá não apenas na proporção
das dinâmicas econômicas das regiões, mas na relação das redes de
infraestrutura e seus territórios de regulação, que não necessaria-
mente se adequam às malhas e figuras territoriais institucionaliza-
das. Da mesma forma como também não é automática ou pacífica a
articulação desses aos territórios naturais ou a “marcos regulatórios
específicos como os das unidades de conservação, os espaços de cir-
culação e aqueles demarcados para permitir o acesso a recursos na-
turais” (PIRES DO RIO, 2017, p. 3-4). O argumento de Swyngedouw
(2001) nessa direção é ainda mais forte, argumentando que a associa-
ção intrínseca da urbanização à disponibilidade e acesso à água tor-
na a cidade um objeto de gestão híbrido, questionando o alcance das
estruturas institucionais na configuração de determinadas regiões.
A ideia de perímetros “frouxos”, como comentado anterior-
mente, torna-se então conveniente aos diversos interesses e agen-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

tes, seja frente aos desafios de instituição da nova figura regional


macrometropolitana, seja como resposta à integração de projetos
e promoção do desenvolvimento regional, seguindo mais uma vez
Scott e Storper (2003). O mesmo pode-se supor no caso da MMP,
cujo processo de institucionalização, iniciando-se sob a pressão das
dinâmicas setoriais dos transportes e do saneamento, vem sendo
fortemente influenciado pela centralização no âmbito do Estado
de São Paulo. Essa institucionalização estadual possui fortes carac-
terísticas de sobreposição e fragmentação de órgãos setoriais, sem
efetivar uma proposta integradora.
Assim posto, e não sendo poucos os motivos para o descré-
dito em relação ao êxito da governança da metrópole – instância
regional não acolhida no sistema federativo brasileiro – no geral,
o que se pode esperar sobre essa nova escala ou figura regional,
a macrometrópole? No particular, o que se pode esperar sobre a
MMP como escala de planejamento e governança? Esse fato terri-
torial, que se delineia em tantas peculiaridades, tecidos, e tensões,
certamente implicará, para além de uma agenda mais complexa
de planejamento territorial e de integração de políticas públicas
setoriais, uma estratégia de gestão e governança que acolha essa
nova formação social e econômica.
No mais completo e recente estudo sobre a regionalização do
Estado de São Paulo, a MMP foi definida como “um complexo
sistema de cidades com rede de intensas articulações funcionais
e forte expressão no espaço dos fluxos”, e alçada à categoria de
“Unidade de Planejamento”, exigente de novas formas de gestão
(ESTADO DE SÃO PAULO, 2011, p. 108 e 121). Fato esse que pa-
recia corresponder à criação imediata de uma secretaria específica
para tratar das políticas públicas da MMP – a Secretaria de Desen-
volvimento Metropolitano (Decreto nº 56.635 / 2011). Contudo, já
em 2013, o curso da Secretaria de Desenvolvimento Metropolitano
é alterado, sob alegação de redução de custos, e as atribuições da
secretaria foram transferidas para a Casa Civil, abrigadas numa
subsecretaria de Assuntos Metropolitanos (FARIA, 2018).
Desde essa data, a MMP mereceu alguns estudos e um conjun-
to de diretrizes consolidadas no “Plano de Ação da Macrometrópo-
le Paulista – 2013-2040” (PAM). Em formato de plano estratégico,
apresentou-se como “uma carteira de projetos” priorizados e hie-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

rarquizados, conforme vetores de intervenção territoriais – corres-


pondentes às RMs que conformam a MMP–, e vetores sistêmicos
– relativos aos Recursos Hídricos e Saneamento; Desenvolvimento
Ambiental; Sistema de Energia; Inovação Tecnológica, Qualificação
da Mão de Obra e Gestão Fiscal; e Desenvolvimento Habitacional.
Tais projetos, segundo o PAM, poderiam “apoiar a transformação
das diferenças regionais em vantagens para a consolidação de um
processo de desenvolvimento macrorregional sustentável” (EMPLA-
SA, 2014, V. 2, p. 226). O êxito do PAM pode ser avaliado quando
suas diretrizes passaram a constar no documento do Plano Pluria-
nual de investimentos do Estado de São Paulo para o período de
2016 a 2019 (Lei nº 16.082 / 2015), destinando recursos públicos
para a MMP, ainda que tenham sido privilegiados apenas alguns se-
tores – transportes e recursos hídricos, aqueles que historicamente
foram associados à formação da MMP (TAVARES, 2018).
A experiência da MMP, que se pretende como uma nova uni-
dade territorial de planejamento e integração de políticas públicas
setoriais, parece ter encontrado até aqui os mesmos impasses da
gestão metropolitana no cenário federativo brasileiro. Da mesma
forma, pode representar os limites da ação do Estado e do planeja-
mento, tal como conhecemos, como mediadores da ação extensiva
de fluxos e capitais na atualidade, especialmente em países como
o Brasil, considerando seu padrão de dependência de trajetória.
Para o planejamento, enquanto um campo de conhecimento e
de práticas, a contemporaneidade representa um desafio a partir de
um cenário de redução do papel do Estado e do seu protagonismo,
até então, como mediador e agente nas ações desse campo. Ações
anticíclicas, ou de forma a equilibrar um ciclo de concentração es-
pacial e econômica vigente, por exemplo, poderiam estar limitadas
nesse cenário. Porém, existe “a crítica da crítica” na medida em que,
como aponta Schöenwandt (2008), somente as discussões e a crítica
estrutural ao modelo hegemônico sem a devida reflexão sobre como
os planejadores podem atuar, em uma visão prospectiva, pode in-
duzir ao imobilismo e à descrença nas ações futuras. Para autores
como Reimer (2013), Friedmann (2005), Sanyal et al. (2012), Limo-
nad (2016), para citar alguns, é preciso repensar o planejamento na
atualidade, como aliás tem sido sempre o desafio nesse campo.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Agradecimento
Apoio da Fapesp, processo 2018/12245-1

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

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Capítu lo 12

Transportes e mobilidade urbana: desafios


da adaptação às mudanças climáticas na
Macrometrópole Paulista
Silvana Zioni1

Palavras-chave: Transportes. Macrometrópole


Paulista. Mobilidade Urbana. Mudanças Climáticas.

A
s primeiras décadas deste século testemunharam inova-
ções importantes no setor de transporte no Brasil. Cidades
e regiões passaram a contar com sistemas operacionais e de gestão
de maior eficiência técnica, a implementar melhorias tecnológicas e
de organização setorial, ao mesmo tempo em que se ampliava a abor-
dagem da questão do transporte de pessoas e bens, introduzindo no
seu planejamento o conceito de mobilidade urbana, ou seja a conside-
ração de que as condições de deslocamento das pessoas ou dos bens
e mercadorias não dependem exclusivamente dos sistemas e modos
de transportes, mas de condições ambientais e socioterritoriais (GO-
MIDE, GALINDO, 2013).
Tais inovações foram promovidas especialmente a partir da
iniciativa do governo federal ao criar uma Secretaria Nacional
de Transporte e Mobilidade Urbana no Ministério das Cidades,
e instituir novas bases político-programáticas para o setor, mes-
mo antes de ser aprovada a Política Nacional de Mobilidade Ur-
bana (PNMU), pela Lei nº 12.578, em 2012. A orientação política
da mobilidade urbana, que passou a pautar planos, programas e
projetos, replicados nos municípios e metrópoles brasileiras, tinha
diretrizes compatíveis com os compromissos que o país já vinha
firmando sobre o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável,
e que foram confirmados na Política Nacional sobre Mudança do
Clima (PNMC), Lei nº 12.187/2009.

1
Universidade Federal do ABC (UFABC),.

100
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Pode-se dizer, então, que há uma década bons ventos sopra-


vam da criação dos marcos legais, institucionais e financeiros do
planejamento de transportes, como também a favor da estratégia
brasileira de mitigação e adaptação à mudança do clima para o
setor de transportes e mobilidade urbana. Porém, esse clima fa-
vorável mudaria sob os efeitos do crítico quadro político-ins-
titucional que se formou, em meados dessa década, no país, do
qual episódios como as jornadas de protestos em junho de 2013
ou a reação à greve dos caminhoneiros em 2018 são exemplares
para compreender que demandas mais imediatas ganhariam
maior destaque, comprometendo os acúmulos e a efetividade das
políticas, apesar da importância da incorporação da questão da
mudança do clima no planejamento de transporte.
Este texto busca situar como, no contexto das políticas de
transportes, logística e mobilidade urbana, se deu a inserção da
questão ambiental e das mudanças do clima, e como, enquanto
um tema transversal, colaborou para renovar a cultura e a institu-
cionalização do planejamento de transporte e mobilidade urbana
sustentável. O texto ainda aponta questões sobre o desafio de in-
corporação de estratégias de mitigação e adaptação no planeja-
mento de transportes e mobilidade urbana no âmbito da Macro-
metrópole Paulista. A partir de breve contextualização do setor
de transportes, logística e mobilidade urbana no Brasil, o texto
apresenta o processo de formação de dois importantes marcos
legais do setor de transportes à luz da política ambiental, para,
numa parte seguinte, buscar quais influências e repercussões des-
sas políticas estão presentes no âmbito da MMP, e encerrar com
considerações finais.

O planejamento dos transportes e da mobilidade


urbana no Brasil
O setor de transporte no Brasil é caracterizado pela
predominância de sistemas de transporte rodoviário, apesar das
dimensões continentais do país, e nas áreas urbanas, apesar do
porte das cidades brasileiras, dependente do modo ônibus e da
crescente frota de carros e motos. Ou seja, um setor extremamente
vulnerável, seja por sua matriz modal e energética desbalancea-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

das2, seja pela qualidade de sua infraestrutura e tecnologia de seus


sistemas. Resultado de nosso padrão de desenvolvimento, investi-
mentos insuficientes em infraestrutura legaram para nossas cida-
des um quadro de precariedade ambiental e de vulnerabilidade
dos sistemas urbanos frente a eventos climáticos extremos, cada
vez mais frequentes, devido em parte ao próprio padrão de consu-
mo de energia e de emissão de gases do efeito estufa. Do mesmo
modo, os cenários de mudança do clima acentuam a vulnerabili-
dade da infraestrutura de transporte de carga, especialmente o sis-
tema rodoviário, sujeito a impactos diretos e indiretos, tais como
enchentes, deslizamentos.
Crítica também é a condição de governança à qual o setor está
exposto, visto que a partir da Constituição de 1988 ocorreu um
processo de descentralização das atividades públicas executivas,
passando o transporte urbano a ser uma atribuição das instâncias
administrativas municipais; mantendo no âmbito da regulação,
das normas e políticas gerais, a competência dos entes União e
estados, inclusive as competências concorrentes em aspectos das
aglomerações urbanas, para defesa do meio ambiente. Enquanto
que a dimensão regional dos transportes, logística e mobilidade
urbana, especialmente importante para o desenvolvimento dos
territórios, aglomerados urbanos e metrópoles, só seria explicita-
mente regulamentada pelo Estatuto da Metrópole (Lei Federal nº
13.089) em 2015.
Sendo assim, a gestão dos sistemas de transportes urbanos já
enfrentava, desde as décadas de passagem do século, um impasse
com sérios agravos ambientais: o aumento da taxa de motoriza-
ção e dos deslocamentos individuais; em resposta aos congestiona-
mentos crônicos e a tendência de espraiamento das áreas urbanas,
fazia com que também se ampliassem os custos e tempos de via-
gem; que eram acompanhados pela ampliação dos custos de pro-

2
A distribuição modal da matriz de transportes regionais de cargas indica a predo-
minância do modo rodoviário, respondendo por cerca de 52% da carga total trans-
portada, seguida pelo modo ferroviário (30%), navegação de cabotagem (8%), hi-
droviário (5%) e dutoviário (5%) (PNLT, 2012). Nas cidades, a matriz se divide entre
os modos sobre pneus – transporte individual (31%) e coletivo (28%) e o transporte
ativo (41%) – deslocamentos a pé e por bicicleta, havendo parcela inferior a 4% dos
sistemas sobre trilhos, incluídos entre os sistemas coletivos, presentes apenas em
algumas capitais (ANTP, 2014).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

dução do transporte coletivo, cujas tarifas também aumentavam,


expulsando os passageiros para os sistemas informais oferecidos
em veículos pouco eficientes e inseguros, colaborando com a dete-
rioração dos sistemas em seu conjunto, que tinha como corolário
a redução da capacidade de investimento e da gestão pública (ZIO-
NI, 1999; GOMIDE, GALINDO, 2013).
E, em relação aos transportes regionais e logística, que tam-
bém demandavam investimentos, o ajuste fiscal dos anos de 1990,
e reformas orientadas para o mercado, acenaram a privatização
de ferrovias e a concessão de rodovias como a alternativa para o
rápido e amplo crescimento da infraestrutura, direcionada inclu-
sive a novos vetores definidos pelo agronegócio, reespacialização
industrial e configuração das metrópoles e da cidade-região me-
tropolitana paulista (DINIZ, CAMPOLINA, 2007; ZIONI, 2014). A
ampla desestatização do setor de transporte de carga ferroviário –
federal e estadual –, a abertura dos portos para usuários privados,
por meio de concessão e exploração de portos, terminais de carga,
e a concessão para a iniciativa privada da manutenção de rodovias
via cobrança de pedágio com maior viabilidade econômica, ocor-
reu dentro das expectativas, sem porém enfrentar o desafio de
ampliação e adequação da infraestrutura a uma matriz mais efi-
ciente e sustentável. Nesse sentido, o Plano Nacional de Logística e
Transporte (PNLT), instrumento de caráter estratégico, resultado
da parceria entre o Ministério dos Transportes e o Ministério da
Defesa, definiria, a partir de 2007, um programa de investimento
em infraestrutura de transportes que, em médio e longo prazos,
viria a alterar a matriz energética dos transportes e a orientar in-
vestimentos privados em infraestrutura de transportes e logística.
Cenários potenciais de mitigação de emissões de GEE foram
considerados na seleção do PNLT (2007-2031): mais de 100 proje-
tos prioritários devido à maior viabilidade econômica, outros 200
projetos com menor viabilidade econômica, mas de valor e interes-
se sociopolítico, ambiental, tecnológico ou para o desenvolvimen-
to regional, além de 200 projetos do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) (Ministério dos Transportes & Mi-
nistério da DEFESA, 2007). Mas, só em relatórios posteriores
(2009 e 2012) é que a recomendação de diversificação da matriz
modal de transporte e de iniciativas de Mecanismos de Desenvolvi-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

mento Limpo (MDL) na implementação dos projetos denota algu-


ma influência da PNMC sobre o PNLT (ZIONI, FREITAS, 2015).
Enquanto isso, no âmbito do Ministério das Cidades, a PNMU
trazia o desafio da mitigação e adaptação dos transportes urbanos
frente à mudança climática, ou estava, ao menos, implícito. A PNMU
(2012) expressava princípios gerais de desenvolvimento sustentável
atrelados aos objetivos de ampliação ou adequação da infraestrutu-
ra de transporte urbano e de cargas, com a implementação de novos
sistemas e modos com maior eficiência energética. Especialmente
para a mobilidade urbana, propunha-se uma estratégica de adapta-
ção, com a inversão de prioridade, favorável aos modos ativos, não
motorizados, e ao incremento dos mais eficientes sistemas de trans-
porte público de passageiros. A política de investimento e valoriza-
ção de sistemas de transporte público de passageiros respondia, as-
sim, não apenas a déficits históricos da infraestrutura urbana, mas
se contrapunham ao aumento expressivo e contínuo das taxas de
motorização individual nas grandes e médias cidades brasileiras,
aquecido pelos incentivos fiscais que a indústria automobilística re-
cebeu, especialmente após a crise econômica de 2008. Pode-se ad-
mitir, assim, que os objetivos de mitigação e adaptação à mudança
do clima seriam implicitamente atendidos3.
A disputa pelos espaços de circulação nas cidades, entre mo-
dos de transporte individual e coletivo, repercutiu no avanço de
estratégias de gestão e políticas de transporte urbano mais susten-
táveis e eficientes. Como exemplo disso, destaca-se a implantação
de corredores exclusivos e faixas prioritárias para ônibus, de polí-
ticas tarifárias integradas por meio de bilhetagem eletrônica, que
melhoraram a qualidade do serviço de transporte urbano, sem, no
entanto, combater ou mitigar os efeitos dos congestionamentos,
poluição do ar e acidentes, decorrentes do trânsito urbano. Outras
3
Seja com a inversão de recursos federais na modernização de transportes urbanos
sobre trilhos, seja a partir de 2007, com o Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC), maiores recursos passaram a ser destinados a grandes obras de infraestrutura
social, urbana, logística e energética, e é quando os sistemas de transporte urbano de
passageiros ganham maior destaque. Investimentos em modernos e eficientes corre-
dores de ônibus (BRT) e Veículos Leve sobre Trilhos (VLT) foram prometidos para
as 12 capitais, sedes da Copa Mundial de Futebol de 2014. Além desse, mais dois pro-
gramas de investimentos em infraestrutura de transporte urbano sustentável foram
lançados: o PAC Mobilidade Urbana Grandes Cidades, em 2011, e Médias Cidades,
em 2012 (GOMIDE, GALINDO, 2013).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

estratégias de adaptação, apoiadas por iniciativas patrocinadas


pelo mercado de serviços e startups, ajudam a disseminar o uso de
bicicletas, patinetes, entregas urbanas em modos não motorizados
que vêm se ampliando nas cidades brasileiras.

O Plano Setorial de Transporte e de Mobilidade


Urbana para Mitigação e Adaptação à Mudança do
Clima (PSTM)
O compromisso voluntário do governo brasileiro, que fora as-
sumido em 2009, para reduzir as emissões (de 36,1% a 38,9% com
referência ao cenário de 2020), por meio de ações mitigadoras e de
adaptação aos efeitos da mudança do clima, visava principalmente
estratégias de Mudança do Uso da Terra e Florestas, e os setores
de Energia e Agropecuária. A Política Nacional sobre Mudança
do Clima (PNMC), Lei nº 12.187/ 2009, havia definido como ins-
trumentos para sua implementação os inventários de emissões, os
mecanismos de financiamento e os Planos Setoriais de Mitigação
e Adaptação à Mudança do Clima. Através da elaboração dos, até
então inéditos, inventários de emissões4 os sistemas de Transporte
Público Urbano e Sistemas Modais de Transporte Interestadual de Cargas
e Passageiros foram também considerados responsáveis nas emis-
sões antrópicas e, portanto, junto com os setores da saúde, indús-
tria e mineração, poderiam contribuir com a redução adicional de
emissões. Assim, foi previsto que até 2020 poderiam ser reduzidos
mais 21,8 milhões de tCO2eq, cifra inferior a 2% do compromis-
so inicial5 (Ministério dos Transportes & Ministério
das Cidades, 2013, p. 17). Apesar da modesta contribuição na
redução das emissões, o Plano Setorial de Transporte e de Mobili-
dade Urbana para Mitigação da Mudança do Clima (PSTM, 2013)
representava um reforço para as diretrizes políticas do setor.

4
O 1º Inventário Nacional de Emissões Atmosféricas por Veículos Automotores Ro-
doviários foi realizado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2011 e o 1º Inventário
Nacional de Emissões Atmosféricas do Transporte Ferroviário de Cargas, em 2013,
pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
5
Compromisso inicial assumido era de reduzir 1,168 bilhões tCO2eq até 2020.
CO2eq (dióxido de carbono equivalente) é uma métrica de conversão aplicada aos
gases de efeito estufa (Ministério dos Transportes & Ministério das
Cidades, 2013, p. 13).

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O PSTM (2013) foi elaborado com a participação de repre-


sentantes dos setores produtivos e da sociedade civil e submetido
à consulta pública, sob a coordenação dos Ministérios dos Trans-
portes e das Cidades. De fato, frente aos desafios que as mudanças
climáticas representavam para a mobilidade de pessoas e merca-
dorias, nas cidades e nas estradas, a articulação do setor, até então
inédita, se fazia necessária, ou, no mínimo, indicava que os trans-
portes urbano e de carga começavam a reconhecer e a apostar
que, por meio das estratégias ambientais, novas oportunidades de
implementação de políticas de transferência modal e de implan-
tação de infraestruturas poderiam surgir e ser concretizadas com
mais facilidade, visto a difícil governança que caracteriza o setor.
Para o PSTM a PNMU era uma aliada importante, e uma
possibilidade de sinergias positivas para as políticas climáticas
(Ministério dos Transportes & Ministério das Ci-
dades, 2013, p. 22). Mas igualmente positivos seriam os desdo-
bramentos da articulação dessas políticas nas instâncias locais, na
medida em que a PSTM permite combinar os instrumentos de pro-
moção da acessibilidade à cidade com os investimentos em modos
de transporte mais eficientes energeticamente. Segundo (LINKE
et al., 2016, p. 2) o PSTM ajudou a “promover a harmonização
em nível federal dos planos, políticas e financiamentos voltados à
mobilidade urbana com um planejamento que possibilita a incor-
poração de ações para a adaptação e resiliência”.
O desdobramento do PSTM vem sendo feito principalmente
por meio do apoio da comunidade técnica e científica sobre o cli-
ma, articulada internacionalmente, que entende ser crescente o
papel das cidades no agravamento do aquecimento global, pressio-
nando as políticas públicas para incorporar as temáticas medidas
de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, e tem se empe-
nhado nas revisões necessárias do PSTM, visto que, como afirma
Linke et al. (2016), mesmo com os avanços conquistados, e apesar
de trazer no título o compromisso da estratégia da adaptação, a
primeira versão do PSTM (2013) não foi muito além de medidas
de mitigação de impactos dos transportes sobre o meio ambiente.
O Relatório de Monitoramento 2016/2017 do Plano Nacio-
nal de Adaptação à Mudança do Clima (Ministério do MEIO
AMBIENTE, 2018) afirma que “foi garantido, no Ministério das

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Cidades, um ambiente institucional favorável à implementação das


diretrizes pactuadas, apesar das mudanças estruturais que impli-
caram na reorganização de equipes”, apresentando um conjunto
de ações já em andamento que contribuíam ao cumprimento dos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e ao fortalecimento de
planos e políticas nacionais. De fato, o Ministério das Cidades
vinha se esforçando em acompanhar as revisões do PSTM, e de
promover programas e projetos para disseminar informações e
parâmetros para a prática da mitigação e adaptação das cidades a
mudanças do clima, como o documento “Indicadores para moni-
toramento e avaliação da efetividade da Política Nacional de Mo-
bilidade Urbana6, publicado em novembro de 2018. Entretanto,
a recente mudança do clima político e institucional, que resultou
na extinção do ministério, pode frustrar as expectativas de ampla
disseminação dessas diretrizes.

Transporte e mobilidade urbana na


Macrometrópole Paulista
Os desafios dos transportes e mobilidade urbana, como evi-
denciados para o conjunto de regiões e cidades brasileiras, ga-
nham maior intensidade e complexidade quando focados para
a Macrometrópole Paulista, não por se tratar de uma escala am-
pliada de problemas, mas de se configurar, simultaneamente, em
inúmeras escalas de diferentes estratégias e agendas políticas que
caracterizam esse território peculiar (ver capítulo ZIONI, MOMM,
TRAVASSOS, 2019). Em qualquer dessas hipóteses, os transportes
e mobilidade urbana vão acrescentar a essa complexidade as am-
biguidades das lógicas das redes e sistemas regulados imperfeita-
mente por políticas setoriais.
Por mais que já estejam avançados os marcos institucionais
dos transportes e da mobilidade urbana, eles permanecem num
contexto de competências concorrentes, sistemas e serviços sobre-
postos, apesar de a diversidade de modos de transporte sugira e

6
Elaborado pela Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana (SEMOB )do Ministé-
rio das Cidades, com o apoio técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA), do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), e do Instituto de Políticas
de Transporte e Desenvolvimento (ITDP).

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recomende a integração multimodal, seja para os transportes de


carga ou de pessoas. A PNMU passou a considerar o transporte
de cargas como um integrante da gestão do sistema de transporte
urbano, o que corresponde a evidências de que a reorganização
espacial da produção se apoia na rede urbana, mas especialmente
na metrópole, pois o sistema logístico busca também as vantagens
locacionais da inovação tecnológica e dos mercados metropolita-
nos (ZIONI, 2014). Apesar de disso, seja no nível federal, seja no
âmbito do Estado de São Paulo, a estrutura setorial dos transpor-
tes distingue os sistemas logísticos e de transporte regional dos
transportes metropolitanos, que por sua vez se sobrepõem às ins-
tâncias municipais de transportes. Essa concorrência de compe-
tências entre os gestores do transporte e mobilidade urbana vai
encontrar seu auge e sua maior concentração espacial na MMP,
onde também as institucionalidades das partes que as define – as
regiões metropolitanas – em si, são questionadas, ou quando não,
casos de frágeis governanças.
A Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC) foi ins-
tituída pela Lei Estadual nº 13.798, de 2009, em sintonia com a
Convenção do Clima da ONU e com a PNMC. Antecipando-se ao
PSTM, a PEMC buscou, entre outras diretrizes7, elaborar o Plano
de Transporte Sustentável para, no âmbito do Estado de São Paulo
“priorizar investimentos que alterassem a matriz modal de transpor-
te e energia, aumentando a participação de transportes ferroviário,
hidroviário, cicloviário e dutoviário em relação ao transporte rodo-
viário” (Lei Estadual nº 13.798 / 2009, artigo 40).
A PEMC estabeleceu assim o compromisso do estado frente
ao desafio das mudanças climáticas do setor de transportes e mo-
bilidade urbana8, mesmo admitindo que a contribuição do setor
de transportes e mobilidade seria modesta. Talvez por isso os cená-
rios ambientais para o horizonte 2020 foram bastante otimistas. O
volume de carga pelo modal rodoviário representaria, no máximo,

7
Ver Programa Estadual de Mudanças Climáticas, www.ambiente.sp.gov.br/pemc/.
8
Para tanto, o ESP apoiou-se na sólida experiência da Companhia Ambiental do
Estado de São Paulo (CETESB) no controle da poluição veicular, em estudos sobre
Ligações Ferroviárias Regionais desenvolvidos pela Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos (CPTM), chegando até a explorar o potencial de mitigação de emis-
sões e adaptação por meio da redução de deslocamentos favorecidos por atividades
remotas (Decreto 62.648 / 2017).

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75% do total transportado no Estado de São Paulo, e o transpor-


te coletivo na Região Metropolitana de São Paulo viria a respon-
der por mais de 65% das viagens motorizadas, contra menos de
35% do transporte individual (SÃO PAULO, 2009). É importante
lembrar que, segundo a mais recente Pesquisa Origem Destino,
realizada em 2017, na RMSP a participação dos transportes cole-
tivos corresponde a 54,1% das viagens motorizadas. Sendo que a
cifra da participação do transporte individual pretendida, como
cenário ambiental 2020 assumido pelo governo do Estado de São
Paulo, corresponderia àquela verificada em 1967, antes da implan-
tação do Metrô em São Paulo.
O Plano de Transporte Sustentável, como previsto na PEMC,
pode ser conhecido através de seus dois relatórios – “Caracteri-
zação do Problema, Diretrizes e Orientação para Programas de
Ação” (SÃO PAULO, 2010) e “Inventário de Emissões, Diretrizes
e Orientação para o Programa de Ações” (SÃO PAULO, 2013).
Os dois documentos pautam-se pela indicação de projetos e ações
que visam à mudança modal, no sentido de modos mais eficientes
energeticamente e proporcionalmente menos emissores de CO2,
como o uso do etanol. O volume meta do setor de transportes para
2020 seria de 31,8 MtCO2, correspondentes a 80% daquelas do
ano-base – 2005 –, no diagnóstico de 2010, e de 39,8 MtCO2, como
foi estimado em 2013.
O diagnóstico de 2010 deteve-se especialmente nas condi-
ções das emissões dos modos sobre pneus, responsáveis por 81%
das emissões do setor. Daí, valorizaram-se as estratégias de subs-
tituição de combustíveis fósseis por renováveis ou de tecnologias
avançadas para o aprimoramento da eficiência dos veículos e
da sua operação; além de políticas de incentivo à melhoria da
eficiência veicular e ampliação de frota flexível quanto ao uso
de combustíveis (SÃO PAULO, 2013, p. 7), visando matrizes de
transporte de cargas e passageiros mais equilibradas, privilegian-
do os modos energeticamente mais eficientes. O melhoramen-
to do planejamento e gestão nos transportes e a implementação
dos planos de transportes metropolitanos e regionais no Estado
de São Paulo foi outro objetivo assumido, fazendo referência ao
Plano Diretor de Desenvolvimento dos Transportes (PDDT) e ao
Plano Integrado de Transporte Urbano (PITU). Tais estratégias

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foram confirmadas pelo relatório de 2013, que recomendou, po-


rém, que como a PEMC estabelecia, as estratégias para os trans-
porte urbano e de cargas deveriam priorizar “os modos menos
poluidores (isto é, com menor emissão relativa) e não, diretamen-
te, à redução absoluta da emissão por veículo dentro de um mes-
mo modo” (SÃO PAULO, 2013, p. 9). Entretanto, foi possível ajus-
tar os cenários de emissões, considerando os abatimentos que se
viabilizariam por avanços nas políticas adotadas para o uso de
combustíveis renováveis, melhoria da gestão dos transportes de
carga, e nas políticas municipais de substituição de combustíveis
fósseis nas frotas de ônibus coletivo (a exemplo do que propunha
o Município de São Paulo) que poderiam impactar especialmen-
te as regiões metropolitanas. Desse modo, apenas as estratégias
possíveis nas áreas metropolitanas – renovação integral da frota
de ônibus urbanos da capital e das Regiões Metropolitanas de
Campinas e Santos, e a extensão de rede de trilhos na Região
Metropolitana de São Paulo (cujos cronogramas sistematicamen-
te são descumpridos) – responderiam por 36 % do abatimento
adicional de 12,1 MtCO2 que o Estado de São Paulo pretendia
realizar até 2020.
Este é o recorte que a PEMC fará para as metrópoles, sem
qualquer referência ao grau de vulnerabilidade ao qual essas re-
giões estão sujeitas, especialmente por já estar em processo a for-
mação de uma macroaglomeração metropolitana, que concentra a
maior parte dos fluxos de pessoas e bens do Estado de São Paulo.
Ao mesmo tempo em que o PSTM era publicado, o governo do
Estado de São Paulo dava publicidade a sua Política de Desenvol-
vimento da Macrometrópole Paulista (PAM), como uma estratégia
de promoção do desenvolvimento territorial integrado e susten-
tável e se apresentando como referência básica para a integração
das políticas públicas e dos investimentos na MMP (SÃO PAULO,
2014). Alguns estudos, porém, têm indicado que nem sempre essas
referências embasam as ações de governo ou de fato orientam a
gestão dos sistemas de transporte e mobilidade urbana na MMP
(FARIA, 2018; GOMES, 2017).
A coesão territorial e urbanização inclusiva constitui um dos
eixos estratégicos do plano de ação (PAM), que entre suas diretri-
zes busca “contribuir para que os projetos metropolitanos atendam

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às metas da Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC)”


(SÃO PAULO, 2014, p. 11). De modo um tanto vago, acrescentou
uma diretriz de incentivo à “adoção de requisitos de sustentabili-
dade ambiental” e, sem fazer menção ao Plano de Transporte Sus-
tentável (que se antecipara até ao PSTM), propõe também definir
estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas (SÃO
PAULO, 2014). Apesar disso, o PAM, no eixo estratégico de gover-
nança metropolitana, reconhece existir uma desarticulação entre
políticas setoriais e carência de integração dos diferentes níveis de
governo com relação aos projetos metropolitanos (idem).
Finalmente, quando trata de projetos/ações estruturantes
relativas ao Desenvolvimento Ambiental, o PAM aponta uma últi-
ma diretriz apoiando a implementação das ações previstas no Pla-
no de Transportes Sustentáveis para o território da MMP. Repro-
duz a meta de redução das emissões de CO2 da PEMC através da
“...substituição de combustíveis fósseis por renováveis; equilíbrio
da matriz de transporte de cargas e passageiros, com expansão do
transporte sobre trilhos; melhoria do planejamento e da gestão
dos transportes” (SÃO PAULO, 2014, p. 79), sobre a qual não há
qualquer contestação.

Considerações finais
O consenso a respeito da vulnerabilidade dos sistemas de
transportes de carga e de pessoas e das precárias condições de
mobilidade urbana no Brasil parece ser tão absoluto que dispensa
a sua afirmação por alguns instrumentos políticos. Na busca pe-
las influências e articulações virtuosas entre os documentos que
objetivavam promover a redução dessa vulnerabilidade frente à
mudança do clima (PNMC e PSTM) e os instrumentos que mais
avançaram nas políticas de transportes e da mobilidade urbana
neste século, percebemos algumas lagunas.
Apesar disso, cabe destacar que foram muitos e rápidos os
avanços que permitiram incorporar a questão ambiental no setor
dos transportes, num ambiente de colaboração e participação de
diversos segmentos sociais e de articulação entre os entes federati-
vos bastante harmônico. Porém, que implicava adaptações no pró-
prio setor de transportes, onde os debates sobre as perspectivas de

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transição dos modelos de urbanização dependente da motorização


são recentes, e onde a melhoria das infraestruturas e sistemas leva,
em geral, a impasses de dimensões física, energética, econômica e
ambiental.
Observando especialmente o contexto da grande metrópole
brasileiras, que polariza a MMP, entendemos ser ainda maior o
desafio de articulação de políticas de desenvolvimento da infraes-
trutura às de estratégias de mitigação e adaptação às mudanças
climáticas. Não por serem incompatíveis: os documentos chegam a
mostrar compromissos viáveis em prazos razoáveis. Mas porque es-
ses compromissos nunca foram realizados, pois implicam enfren-
tar um modelo de institucionalidade e governança sustentável dos
transportes e da mobilidade urbana nunca ainda experimentado.

Referências
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turação, reespacialização e novas funções. Revista Eure, vol. XXXIII, n. 98, p.
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FARIA, M. M. B. Transporte de passageiros sobre trilhos na Macrometrópole Paulista.
Implicações na gestão estadual do Planejamento Urbano e de Transportes. Dissertação
(Mestrado) Universidade Federal do ABC, Programa de Pós-Graduação em Pla-
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GOMES, T. V. Z. Macrometrópole Paulista: formação de uma agenda seletiva de venda
de uma região – caso dos projetos de transporte. Dissertação (Mestrado), Universida-
de Federal do ABC, Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão do
Território, São Bernardo do Campo, 2017.
GOMIDE, A. A.; GALINDO, E. P. A mobilidade urbana: uma agenda inconclusa
ou o retorno daquilo que não foi. Estudos Avançados, v. 27 (79), 2013.
LINKE, C.; OBERLING, D.; ROCHA, J. P. M. Mobilidade urbana e mudanças
climáticas: orientações para medidas adaptativas. Anais: II IPTMU – Encontro
sobre Impactos Potenciais de Desastres Naturais em Infraestruturas de Trans-
porte e Mobilidade Urbana. São José dos Campos: UNESP / CEMADEN, 2016.
Ministério das Cidades / ITDP Brasil – Instituto de Política de Transpor-
te e Desenvolvimento. Subsídios para a Formulação do Plano Setorial de Mobi-
lidade Urbana para Adaptação às Mudanças Climáticas. Brasília: Ministério das
Cidades, 2016.
Ministério das Cidades. Indicadores para monitoramento e avaliação da efe-
tividade da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU). Brasília: Ministério
das Cidades, 2018.
Ministério do MEIO AMBIENTE. Relatório de Monitoramento 2016/2017.
Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima. Brasília: Ministério do Meio
Ambiente, 2018.
Ministério dos Transportes & Ministério das Cidades. Plano Se-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

torial de Transporte e de Mobilidade Urbana para Mitigação e Adaptação à Mudança do


Clima (PSTM). Brasília: Ministério dos Transportes, Ministério das Cidades, 2013.
Ministério dos Transportes & Ministério da DEFESA. Plano Na-
cional de Logística & Transportes: Relatório Executivo. Brasília: Ministério dos
Transportes, Ministério da Defesa, 2007.
Ministério dos Transportes & Ministério da DEFESA. Plano Na-
cional de Logística & Transportes: Relatório Executivo. Brasília: Ministério dos
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Ministério dos Transportes. Plano Nacional de Logística e Transportes.
Projeto de Reavaliação de Estimativas e Metas do PNLT. Relatório Final. Brasília:
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São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente / Coordenadoria de Plane-
jamento Ambiental. Projeto Ambiental Estratégico. Cenários Ambientais 2020. São
Paulo: SMA/CPLA, 2009.
São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Política Estadual de Mu-
danças Climáticas / Plano Participativo de Adaptação às Mudanças Climáticas –
Versão Zero para Consulta Pública. São Paulo: SMA / CETESB, 2011.
São Paulo (Estado). Comitê Gestor Grupo de Trabalho de Transportes. Polí-
tica Estadual de Mudanças Climáticas / Plano de Transportes – Relatório Carac-
terização do Problema, Diretrizes e Orientação para Programas de Ação. São Paulo:
2010.
São Paulo (Estado). Secretaria de Logística e Transportes / Grupo de Traba-
lho de Transportes Sustentáveis. Plano de Transportes Sustentáveis – Relatório:
Inventário de Emissões, Diretrizes e Orientação para o Programa de Ações. São Paulo:
SLT, 2013.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Casa Civil e Empresa Paulista de Planeja-
mento Metropolitano S.A. Plano de Ação da Macrometrópole Paulista. 2013-2040:
política de desenvolvimento da macrometrópole. Vol. 1 a 4. São Paulo: Empresa
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ZIONI, S. Mobilidade da produção na metrópole. Revista USP, v. 102, p. 33-44, 2014.
ZIONI, S.; FREITAS, S. R. Aspectos ambientais no Plano Nacional de Logística e
Transporte do Brasil. Desenvolvimento e Meio Ambiente (UFPR), v. 35, p. 195-209, 2015.

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C apít u lo 13

Breve levantamento de eventos


climáticos extremos na
Macrometrópole Paulista
Beatriz Milz1 e
Ana Carolina Campos2

Palavras-chave: Mudanças climáticas. Desastres


naturais. Linha do tempo.

Introdução

AMacrometrópole Paulista (MMP) é considerada a maior


e mais importante aglomeração urbana do Brasil, abran-
gendo as Regiões Metropolitanas de São Paulo (RMSP), Campi-
nas, Baixada Santista, Vale do Paraíba e Litoral Norte, Sorocaba,
as aglomerações urbanas de Jundiaí e Piracicaba, e as microrre-
giões de Bragantina e São Roque (EMPLASA, 2017). Essa região
apresenta grande importância econômica, e segundo a Empresa
Paulista de Planejamento Metropolitano (EMPLASA), é composta
por 174 municípios e em 2017 concentrava uma população de 33,6
milhões de habitantes (EMPLASA, 2017).
Por ser uma das regiões onde se concentra grande parte da
população, existe alta demanda por recursos (como água, ener-
gia), assim como infraestrutura (moradia, redes de abastecimento,
energia, estradas). Ademais, a dimensão e a complexidade dessa
aglomeração a torna vulnerável a eventos naturais – principalmen-
te os considerados extremos.

1
Doutoranda do Programa de Ciência Ambiental (PROCAM), no Instituto de Ener-
gia e Ambiente (IEE), da Universidade de São Paulo (USP). Bolsista FAPESP, Proces-
so 2018/23771-6.
2
Jornalista científica FAPESP, Processo 2018/09713-3, vinculada ao Projeto Temá-
tico 2015/03804-9. Instituto de Energia e Ambiente (IEE), da Universidade de São
Paulo (USP).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Quando um evento climático ocorre em uma área não habi-


tada, seus impactos são muito menores. No entanto, ao atingir a
população – causando “perturbação do funcionamento de uma
comunidade, envolvendo perdas de vidas, perdas materiais, eco-
nômicas ou ambientais de grande extensão” (AMARAL e GUT-
JAHR, 2011) –, o mesmo evento pode ser considerado um aciden-
te ou desastre. De acordo com o posicionamento geográfico e as
características climáticas da região, na MMP os eventos extre-
mos mais recorrentes estão relacionados à atividade atmosférica
(como chuvas e ventos) e às condições de relevo (muitas áreas
com alta declividade). As principais ocorrências consistem em:
inundações (enchentes), deslizamento de encostas, elevação do
mar, tornados e secas.

Nas últimas décadas, o número de registro de desastres natu-


rais em várias partes do mundo vem aumentando consideravel-
mente. Isto se deve, principalmente, ao aumento da população,
à ocupação desordenada e ao intenso processo de urbanização
e industrialização. Dentre os principais fatores que contribuem
para desencadear estes desastres nas áreas urbanas destacam-
se a impermeabilização do solo, o adensamento das constru-
ções, a conservação de calor e a poluição do ar. Enquanto que
nas áreas rurais, destaca-se a compactação dos solos, o assorea-
mento dos rios, os desmatamentos e as queimadas (KOBIYA-
MA, 2006, p. 1).

Além desses fatores, somam-se ao aumento do número de desas-


tres as consequências advindas das mudanças climáticas. Embora o
clima apresente variações ao longo de diversas escalas de tempo, as
ações humanas a partir da Revolução Industrial têm aumentado mui-
to a concentração de gases causadores do efeito estufa na atmosfera.
Segundo o 5° Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudan-
ças Climáticas (IPCC), de 2014, estima-se que o aumento de tempe-
ratura média global seja superior a 0,85°C. Essa elevação ainda pode
chegar de 1,5ºC a 2°C nos próximos anos.
O aumento da temperatura média global não apenas eleva a
temperatura nas localidades, mas pode tornar os eventos climá-
ticos mais extremos – verões mais quentes, invernos mais frios,
períodos de seca e chuvas mais concentrados e intensos – assim

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

como suas consequências. Considerando esse cenário, é impor-


tante conhecer os eventos extremos que ocorreram na MMP nos
últimos anos para que seja possível nos prevenirmos em caso de
futuros eventos. Portanto, este capítulo se propõe a apresentar
uma breve história dos eventos extremos mais recentes que acon-
teceram na MMP.

Eventos climáticos extremos entre 2005 e 2018 na


MMP
Foi realizado um levantamento nos principais meios de co-
municação de algumas das mais relevantes notícias veiculadas
relacionadas a eventos extremos no Estado de São Paulo, sendo
selecionados os que ocorreram no território da MMP. A partir des-
se levantamento, foi elaborada a linha do tempo (Figura 1) apre-
sentando os eventos extremos mais emblemáticos ocorridos nos
últimos anos neste território.
Dentre os eventos extremos ocorridos nas últimas décadas na
MMP, destaca-se a ocorrência de tornados em Itu em 1991, em
Indaiatuba em 2005 e em Limeira no ano de 2013. O fenômeno
ocorrido em Itu em 1991 foi caracterizado por causar mais danos,
pois além de destruir casas e prédios industriais, também causou
15 mortes e deixou 176 feridos (G1, 2012). O fenômeno ocorrido
em Indaiatuba em 2005, além de causar destruição de imóveis,
também afetou os serviços de distribuição de energia e abasteci-
mento de água (G1, 2012).
Outro evento extremo que recentemente atingiu a MMP foi a
seca entre os anos de 2014 e 2016. A operadora de abastecimento
público da região – a Companhia de Saneamento Básico do Estado
de São Paulo (SABESP) – apontou que essa crise hídrica foi conse-
quência do baixo nível de chuvas, resultado de um evento climá-
tico sem precedentes (SABESP, 2015). Entretanto, pesquisadores
apontam que essa crise hídrica foi uma consequência da falta de
planejamento estratégico que afeta o sistema de abastecimento da
RMSP (CÔRTES et al., 2015).

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Figura 2
Linha do tempo de eventos extremos ocorridos na MMP
nos últimos anos.

Fonte: elaborado pelas autoras utilizando o software Office Timeline, 2018.

O Sistema Cantareira é o principal sistema de abastecimento da


Região Metropolitana de São Paulo, sendo que, segundo a SABESP,
no dia 11 de julho de 2014 o sistema atingiu 0% de volume opera-
cional, sendo necessário utilizar a reserva técnica, conhecida como
“volume morto” (SABESP, 2018). Muitos moradores foram afetados
por essa crise hídrica, enfrentando desabastecimento de água.
Por outro lado, foram encontradas diversas ocorrências de
eventos extremos relacionados com as chuvas, principalmente nos
meses de verão. As principais consequências encontradas relacio-
nadas com as chuvas foram a ocorrência de enchentes, inunda-
ções, deslizamentos de terra – ocasionando mortes, desabamento
de casas, queda de árvores, entre outros. Um exemplo desse tipo
de evento extremo foi o caso das fortes chuvas que ocorreram em
março de 2016, atingindo diversos municípios pertencentes à Re-
gião Metropolitana de São Paulo. Dentre as consequências estão
pessoas feridas e mortes, além de trânsito lento, lentidão e parali-
sação na operação dos trens da CPTM, transbordamento dos rios
Pinheiros e Tietê e o fechamento do aeroporto de Guarulhos por
algumas horas (EL PAÍS, 2016).
Em junho de 2016 ocorreram na região de Campinas fortes
chuvas e o fenômeno de microexplosão, causando ferimento em
pessoas, queda de árvores e muitos danos em residências e edi-

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fícios. Esse acontecimento chegou a causar dúvidas sobre ser um


tornado, devido às similaridades desses fenômenos e também de-
vido à devastação causada aos bairros atingidos. A microexplosão
é uma nuvem carregada de ar, água, granizo e acompanhada de
ventos intensos que atingem até 120 km/h.
O território da MMP apresenta diversas cidades costeiras,
portanto é importante considerar o aumento do nível do mar e
seus possíveis efeitos adversos para esses municípios. Um evento
que pode acontecer é o caso de ressaca, como ocorrido no mu-
nicípio de Santos, em novembro de 2016. Nessa ocasião, a ressa-
ca causou o avanço das ondas nas ruas e avenidas do município,
provocando alagamentos, inundação, queda de árvores e muitos
prejuízos econômicos.

Conclusão
Apesar de não constituir um levantamento exaustivo, é pos-
sível observar através da linha do tempo que tanto a quantidade
como a intensidade de eventos extremos têm aumentado nos últi-
mos anos. Em um cenário de intensificação das mudanças climá-
ticas, os instrumentos de planejamento territorial se mostram de
extrema importância para a mitigação de suas consequências. O
planejamento urbano já possui regras quanto à ocupação humana
em localidades com declividade acentuada e risco de alagamento,
assim como margens de cursos d’água. No entanto, as políticas
públicas (como as de acesso à moradia, por exemplo) ainda são
insuficientes para evitar as situações de risco nas quais se encontra
a parcela mais vulnerável da população.
É importante relembrar que apesar de as mudanças climá-
ticas atingirem principalmente a população em situação de vul-
nerabilidade, elas impactam as cidades como um todo, causando
danos materiais e perdas econômicas, causando especial prejuízo
às infraestruturas coletivas (estradas, aeroportos, portos).
Não apenas as zonas urbanas sofrem com os impactos das al-
terações climáticas, como as zonas rurais também são afetadas. A
irregularidade nos regimes de chuva, por exemplo, impacta a pro-
dução agrícola, podendo trazer perdas de safra – que afetam tanto
a renda dos agricultores, quanto o fornecimento de alimentos às

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cidades. As zonas rurais também são importantes produtoras de


água e auxiliam na regulação do clima das cidades. A fragilidade
desse espaço se dá pelo constante conflito à expansão urbana.
Segundo o CEMADEN (2014) “não podemos evitar que amea-
ças naturais (chuva, tempestades e outros) aconteçam, mas pode-
mos minimizar seus impactos se entendermos melhor por que elas
acontecem”. No atual cenário de mudanças climáticas os desafios in-
tensificam-se, fazendo-nos repensar nossas formas de ocupação, de
utilização dos recursos naturais e interação com o meio ambiente.

Referências
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www.cemaden.gov.br/ameacas-naturais-no-brasil>. Acesso em: 9 jan. 2019.
CÔRTES, P. L. et al. Crise de abastecimento de água em São Paulo e falta de
planejamento estratégico. Estudos Avançados, v. 29, n. 84, p. 7-26, ago. 2015.
EL PAÍS (São Paulo). “Chuvas em São Paulo deixam mortos e cidades debaixo
d’água: ao menos 19 pessoas morreram no Estado, a maioria vítima de soterra-
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<https://brasil.elpais.com/brasil/2016/03/11/politica/1457725121_489376.
html>. Acesso em: 8 jan. 2019.
EMPLASA. Macrometrópole Paulista. 2017. Disponível em: <https://www.empla-
sa.sp.gov.br/MMP>. Acesso em: 9 jan. 2019.
G1 (Campinas e Região). “Região de Campinas está na rota de tornados no Bra-
sil, diz Unicamp: Estudo da universidade aponta que estado de SP lidera ranking
de registros. Em maio de 2005, ventos atingiram velocidade de 250 km/h em
Indaiatuba”. 2012. Disponível em: <http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/
noticia/2012/09/regiao-de-campinas-esta-na-rota-de-de-tornados-no-brasil-diz
-unicamp.html>. Acesso em: 9 jan. 2019.
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nópolis (SC): Editora Organic Trading, 2006.
SABESP. CHESS – Crise Hídrica, Estratégia e Soluções da SABESP para a Região
Metropolitana de São Paulo. São Paulo, SP: SABESP, 2015. Disponível em: <http://
site.sabesp.com.br/site/uploads/file/crisehidrica/chess_crise_hidrica.pdf>.
Acesso em: 8 jan. 2019.
SABESP. Situação dos mananciais: Resumo: armazenamento e pluviometria. 2018.
Disponível em: <http://mananciais.sabesp.com.br/Home>. Acesso em: 8 jan. 2019.

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C a p í t u l o 14

Apontamentos sobre urbanização,


adaptação e vulnerabilidades na MMP
Luciana Travassos1, Sandra Momm2 e Pedro Torres2

Palavras-chave: Urbanização. Adaptação. Vulnera-


bilidade. Macrometrópole Paulista. Mudanças cli-
máticas.

A
s ações de adaptação às mudanças climáticas, nas cida-
des de países em desenvolvimento, devem estar relacio-
nadas às vulnerabilidades resultantes da produção extremamente
desigual do espaço. Nessas cidades, em termos de investimento
do Estado e da qualidade da infraestrutura, a desigualdade se
configura na expressiva colocalização da população mais pobre e
das áreas com maior suscetibilidade à inundação, movimentos de
massa, bem como piores condições de atendimento de equipamen-
tos sociais, redes de infraestrutura, ou seja, mais desprovidas de
proteção institucional, como é o caso da atuação da Defesa Civil.
O artigo faz uma breve discussão conceitual sobre adaptação e vul-
nerabilidade relacionadas às cidades e aos processos de urbaniza-
ção, para, em seguida, apresentar algumas questões concernentes
a esse tema na Macrometrópole Paulista.
Para Bulkeley (2013, p. 144) adaptação é um “conceito en-
ganosamente simples” (PELLING, 2011 apud BULKELEY, 2013)
e que adquire definições especiais dentro do léxico de termos
usados para descrever e analisar o fenômeno das mudanças cli-
máticas. No quinto relatório do Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas (IPCC), adaptação é definida como um

1
Universidade Federal do ABC (UFABC). Coordenadoras do Grupo 2 “Territoria-
lidades, espacialidades e inovação na governança ambiental” no Projeto Temático
FAPESP “Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face à variabilidade
climática”, Processo 2015/03804-9.
2
Instituto de Energia e Ambiente (IEE), Universidade de São Paulo (USP), bolsista
FAPESP, Processo 2018/06685-9.

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processo de ajuste ao clima real ou esperado e os seus efeitos,


e que visa moderar ou evitar danos ou ainda explorar oportu-
nidades benéficas (IPCC, 2014b, p. 5). Alguns conceitos asso-
ciados são definidos no glossário do relatório, a saber: déficit
de adaptação, limites de adaptação (hard e soft) e capacidade
adaptativa. O primeiro conceito é definido como uma distân-
cia entre o estado atual de um sistema e um estado em que
se minimizem os efeitos adversos da variabilidade climática. O
limite da adaptação está entre nenhuma adaptação é tolerável à
condição de que algumas ações não são possíveis. A capacidade
de adaptação é a habilidade de sistemas, instituições, pessoas e
outros organismos para ajustar o potencial de dano, alavancar
oportunidades ou responder às consequências das mudanças
climáticas (IPCC, 2014a).
Nas cidades, a partir dos conceitos do IPCC e de outros auto-
res, Bulkeley (2013, p.146) considera crítica a capacidade e o déficit
de adaptação quando existe uma insuficiência de infraestrutura
básica de provisão. Sistemas de infraestrutura como água, esgoto,
moradia, energia, transporte são atributos essenciais no acesso aos
serviços básicos, oportunidades de trabalho, saúde e outras condi-
ções necessárias para reduzir a vulnerabilidade.
Na mesma direção crítica, Barton (2012), em seu trabalho so-
bre adaptação e instrumentos de planejamento em áreas metropo-
litanas no Chile, argumenta que são as desigualdades sociais que
definem a paisagem da vulnerabilidade. A vulnerabilidade, nes-
se caso, possui um sentido amplo, incluindo: acesso ao trabalho
e renda, bens e serviços; localização, qualidade da moradia e do
entorno; aspectos da segurança pessoal e do trabalho; qualidade
de saúde e educação para o desenvolvimento pessoal; e a vulnera-
bilidade associada com os impactos com as mudanças climáticas.
Essa abordagem de vulnerabilidade está relacionada com a justiça
ambiental, ou questões estruturais que precisam ser enfrentadas
pelo planejamento e pelas políticas de longo termo, sejam elas de
desenvolvimento, de planejamento territorial ou setoriais. Assim,
para esse autor, a adaptação não seria um sprint, mas sim uma ma-
ratona, considerando ainda a complexidade em termos de enten-
der o fenômeno das mudanças climáticas e as suas repercussões
sistêmicas.

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Em que pesem as divergências sobre o montante, a cidades


abrigam grande contingente populacional; atualmente cerca de
metade da população mundial vive em áreas urbanas. No Brasil,
cerca de 78% da população vive em áreas consideradas de ocupa-
ção densa (IBGE, 2017). As cidades estão ainda em um primeiro
plano quando se trata tanto das políticas de mitigação, uma vez
que são responsáveis por parte importante da emissão de GEEs,
quanto de adaptação. É no espaço urbano que a população está
mais exposta aos efeitos das mudanças climáticas, mas é também
nas cidades que está a possibilidade de se criar políticas eficientes
em ambas as dimensões (ROSENZWEIG et. al., 2011).
Além disso, é necessário enfatizar que a parcela da população
mais exposta aos riscos das mudanças climáticas é também a par-
cela já mais vulnerável da população urbana, sendo os mais pobres,
as crianças e os idosos os primeiros afetados pelas consequências
desses processos. Assim, adaptar-se nas cidades, e em especial nas
cidades profundamente desiguais dos países em desenvolvimento,
significa relacionar com passivos históricos de produção do espaço
e de atendimento às diferentes demandas de grupos populacionais
específicos, na direção da justiça ambiental. E também significa es-
tabelecer, tanto em ação, quanto em regulação, políticas que visem
à redução do risco, considerado como o encontro entre vulnerabili-
dade e exposição aos efeitos das mudanças climáticas. As mudanças
climáticas apresentam impactos em diversos serviços públicos, já
desigualmente distribuídos, como o fornecimento de água potável
e energia elétrica, saúde pública, cujo planejamento e ação também
deverão considerá-los.
No entanto, conforme coloca Barton (2012), as mudanças cli-
máticas e o aumento de vulnerabilidade relacionada a elas têm
sido insuficientemente tratadas no processo de planejamento, mui-
to mais focado em projetos e ações de curto prazo, que, muitas
vezes, enraizadas em suas dependências de caminho, ao invés de
inovação, provocam uma aceleração do status quo (MOMM et. al.,
2017). Dessa forma, além da produção de dados e pesquisas que
tratem da relação entre as mudanças climáticas e a adaptação nas
cidades, é também necessário compreender o caminho que levará
tal debate ao sistema de planejamento.
Nas cidades os principais efeitos das mudanças climáticas são

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os extremos de temperatura, ventos e precipitação, que levam a


alterações e impactos como as inundações, secas, qualidade da
água e do ar, bem como a distribuição de vetores de doença. Tais
determinantes, em conjunto com as características urbanas – den-
sidade, localização, morfologia, presença de serviços urbanos, in-
fraestrutura e sistema de governança – têm como consequência a
perda de bens materiais e de vidas, bem como o aumento de doen-
ças respiratórias, cardíacas, transmitidas por inseto, entre outras
(ROSENZWEIG et. al., 2011).
O Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (MMA,
2016) estabelece alguns pontos estratégicos para as cidades, tendo
como premissa o protagonismo do município para a implementa-
ção das ações de adaptação, com apoio dos governos estaduais e
federal nas situações de maior complexidade. Enfatiza a necessida-
de de integração dos vários instrumentos de planejamento – em
suas diversas escalas –, planos diretores, planos de bacia, plano de
habitação, mobilidade, entre outros.
Com relação à vulnerabilidade, as estratégias apontam para a
necessidade de se garantir, nos projetos de urbanização de assen-
tamentos precários e de provisão da habitação de interesse social,
ações integradas de infraestrutura urbana, produção e melhoria
de domicílios e recuperação ambiental que levem em consideração
a exposição aos efeitos das mudanças do clima, visando à redução
do risco. Também estabelece a necessidade de implementação de
ações a partir dos Planos Municipais de Redução de Risco e de
Planos de Drenagem Urbana Sustentável.
Ressalta-se, então, que as ações de adaptação às mudanças
climáticas vêm se somar às demandas existentes de requalificação
de assentamentos precários, ou seja, independentemente do recru-
descimento dos eventos extremos e dos riscos, já existe um pas-
sivo a ser gerido. Soma-se, ainda, a demanda pela elaboração de
instrumentos de planejamento que não estão na pauta em grande
maioria dos municípios brasileiros.
Na Macrometrópole Paulista, a vulnerabilidade urbana se con-
centra principalmente nas periferias metropolitanas de São Paulo,
Campinas e Santos, que concentram 98% dos quase 2 milhões e
700 mil habitantes em setores subnormais (IBGE, 2010), conforme
pode ser visto na Figura 1. Muitos deles estão expostos a riscos de

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inundação, movimentos de massa e sofrendo influência das marés,


ao ocupar várzeas, encostas de morros, canais marinhos (CEM,
2013). Nessas três regiões metropolitanas, um estudo do Centro
de Estudos da Metrópole ao analisar a precariedade de forma mais
abrangente que a metodologia utilizada pelo IBGE, constatou que
ela é quase 30% maior (CEM, 2013).

Figura 1
Aglomerado subnormal sobre mancha urbana na
Macrometrópole Paulista.

Fonte: IBGE, Emplasa, DAEE. Elaboração: Ana Lia Leonel.

No que se refere aos riscos relacionados à seca, embora a


(quase) universalização dos serviços de abastecimento de água nas
áreas urbanas pudesse indicar que esse evento extremo seria mais
“democrático”, distribuindo o risco de forma mais igualitária entre
os setores urbanos, um olhar mais detalhado sobre a infraestrutura
refuta tal afirmação.
Silva (2000) e Moreira (2008) mostram como a implantação
das redes de abastecimento de água apresentam heterogeneida-
des, relacionadas tanto com a lógica das formas de implantação
e extensão desses sistemas – que, no caso da RMSP, vai produzir

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uma estrutura híbrida: aberta e fechada, setorizada e não setori-


zada –, quanto com a sua provisão em áreas precárias, resultando
em desigualdades na qualidade, quantidade e regularidade dos
serviços, ainda que parte dos assentamentos precários não se en-
quadre totalmente nessa situação, por sua localização. Nesse senti-
do, é possível inferir que as áreas em que tanto os sistemas quanto
as ocupações são mais precários apresentam maior risco.
Os efeitos das mudanças climáticas sobre os riscos preexisten-
tes de escassez de água, tornarão sua solução ainda mais complexa
e custosa. Em estudo sobre os efeitos das secas no Brasil, o Minis-
tério do Meio Ambiente, em conjunto com a World Wide Fund
(WWF), estabeleceu um indicador de vulnerabilidade (o que, se-
gundo os conceitos utilizados neste artigo poderia ser entendido
como um indicador de risco) que reúne exposição (mudanças nos
componentes do clima) e sensibilidade (efeito bioquímico da mu-
dança do clima, que inclui o que é aqui conceituado como vulne-
rabilidade), para determinar os potenciais impactos, e capacidade
adaptativa (que são as respostas do sistema frente às alterações),
para o âmbito dos municípios brasileiros (MMA; WWF, 2017). Na
Macrometrópole Paulista, os municípios que apresentam maiores
riscos de seca são aqueles localizados na Região Metropolitana de
São Paulo, que oscilam entre riscos moderados e moderadamente
altos, em diversos cenários estudados.
Assim, se é possível inferir que as mudanças climáticas com-
plexificam a solução dos riscos preexistentes na Macrometrópole
Paulista, também é notável que somente um direcionamento de
políticas territoriais para a solução desses riscos, o que significa
priorizar as comunidades mais vulneráveis, pode responder às
demandas de adaptação. Nesse sentido, internalizar no sistema de
planejamento as mudanças climáticas pode ser considerado tam-
bém como uma oportunidade de romper com a dependência de
caminho em programas e intervenções, inovando não somente do
ponto de vista tecnológico, mas também alterando prioridades de
localização dessas inovações.

Agradecimento
Apoio da Fapesp, processo 2018/12245-1.

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Referências
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le´s Metropolitan Areas: The Role of Spatial Planning Instruments. BOONE,
C. G.; FRAGKIAS, M. Urbanization and Sustainability: Linking Urban Ecology,
Environmental Justice and Global Environmental Change. [S.l.]: Springer Ne-
therlands, 2012. p.137-158
BULKELEY, H. Cities and Climate Change. (Routledge Critical Introductions to
Urbanism and the City). [S.l.]: Taylor & Francis, 2013.
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nos municípios da Macrometrópole Paulista. Primeiro e segundo relatórios. São
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IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Classificação e caracteri-
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Resumo para Decisores. Disponível em: <http://www.ipcc.ch/pdf/reports-no-
nUN- translations/portuguese/ar5_wg2_spm.pdf>.
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Campos; C. Dubeux; Y. Nojiri; L. Olsson; B. Osman-Elasha; M. Pelling; M. J. Pra-
ther; M. G. Rivera-Ferre; O. C. Ruppel; A. Sallenger; K. R. Smith; A. L. St. Clair;
K. J. Mach; M. D. Mastrandrea; and T. E. Bilir (Eds.)] Disponível em <https://
www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/syr/AR5_SYR_FINAL_Glossary.pdf>
MMA – Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança do
Clima. Brasília: MMA, 2016. Disponível em: //www.mma.gov.br/clima/adapta-
cao/plano-nacional-de-adaptacao
MMA – Ministério do Meio Ambiente; World Wildlife Foundation (WWF). Índice
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Mudança do Clima (IVDNS). Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Integra-
ção Nacional, WWF-Brasil. Brasília (DF): MMA, 2017.
MOMM-SCHULT, S. I.; TRAVASSOS, L. R. F. C.; GRISA, G. F.; FALCAO, K.
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climáticas. In: Encontro Nacional da ANPUR: desenvolvimento, 2017.
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sentada à FAUUSP, 2008.
ROSENZWEIG, Cynthia; SOLECKI, William D.; HAMMER, Stephen A.;
MEHROTRA, Shagun. Climate Change and Cities. First Assessment Report of
the Urban Climate Change Research Network. Urban Climate Change Research
Network (UCCRN), Center for Climate Systems Research, Earth Institute, Co-
lumbia University 2011.
SILVA, R. T. The Connectivity of Infrastructure Networks and the Urban Space
of São Paulo in the 1990s. International Journal of Urban and Regional Research,
volume 24.1, 2000.

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Capítu lo 15

A Macrometrópole Paulista e o desafio de


adaptar-se à dinâmica da vulnerabilidade
Andrea Ferraz Young1

Palavras-chave: Estruturas urbanas. Sistemas dinâ-


micos. Fluxos. Redução de risco de desastres. Ener-
gias renováveis.

Introdução

N o século XX, a concepção de modernidade associada à


concentração de pessoas em áreas urbanas e a consolida-
ção da indústria automobilística incentivou um processo acelerado
de expansão e desenvolvimento e gerou condições propícias para
o predomínio e o avanço de uma estrutura territorial pautada na
metropolização.
As metrópoles em si já constituem objetos de estudos comple-
xos, pois se configuram como sistemas definidos a partir de um
híbrido de escalas (da região e o do lugar), de formas e conteúdos,
de referências fixas e fluxos, da inércia à dinâmica, de espaços pro-
duzidos e produtivos. Situar e contextualizar o processo de adap-
tação e vulnerabilidade a partir desses sistemas metropolitanos
dinâmicos, que se interconectam e se configuram para constituir
o que se denomina como a Macrometrópole Paulista, é sem dúvida
algo desafiador.
O conceito de vulnerabilidade, por definição, não é simples e
engloba múltiplos aspectos (políticos, sociais, econômicos, ambien-
tais, culturais) que se transformam constantemente. Por exemplo,
quando se pensa na ideia de macrometrópole e sistemas metropo-
litanos interligados, poderia se presumir que o que vem primeira-
mente à mente seriam fluxos de pessoas e produtos que se deslo-
cam por eixos estruturais importantes.
1
Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Fluxos esses que, em alguns momentos fluem de forma mais


lenta, mas em geral, mais rapidamente do que podem ser percebi-
dos. Logo, metodologicamente, não poderíamos presumir ser capa-
zes de capturar um “estado de vulnerabilidade” com indicadores es-
táticos, visto que, mesmo o risco, ou a probabilidade de deflagração
de um evento adverso, apresenta um caráter dinâmico.
Argumenta-se que nos estudos sobre vulnerabilidade é neces-
sário realizar uma diversidade de aproximações para que seja pos-
sível compreender a complexidade do conceito e das abordagens,
que em grande medida são complementares.
Assim, dentro desse contexto, os conceitos de adaptação e vul-
nerabilidade serão discutidos sob a premissa de sistemas dinâmi-
cos, ou seja, de fluxos que se constituíram a partir de estruturas
urbanas desenvolvidas para tornar cada vez mais poderosa a habi-
lidade de transformar recursos naturais em energias não renová-
veis e que, portanto, devem ser repensados sob a ótica de matrizes
urbanas renovadas, alicerçadas em fontes de energias renováveis.

Vulnerabilidade: uma abordagem integrada em


sistemas dinâmicos
Ao tratar desse tema, a maior dificuldade parece estar na ten-
tativa de compreender o conceito dentro do respectivo contexto
e, principalmente fazer uma clara distinção entre risco e vulnera-
bilidade. O conceito de vulnerabilidade às mudanças ambientais
globais parece estar sempre se equilibrando em uma linha tênue,
entre ser alvo de questões econômicas, sociais e políticas e, ao
mesmo tempo, salientar as condições que levam a grandes perdas
populacionais, à deterioração de vastas paisagens e importantes
ecossistemas.
Nesse sentido, a primeira questão que se coloca seria: existiria,
de fato, uma diferença real entre ser vulnerável e estar sob risco,
ou simplesmente é uma questão de semântica? A vulnerabilidade
seria um estado? Desde as considerações de Pelling (2003) sobre a
vulnerabilidade em áreas urbanas até as questões apontadas por
Adger (2006), imaginar a possibilidade de ambientes habitáveis
em equilíbrio, onde a possibilidade de um evento adverso provo-
car um desastre possa ser minimizada, sem dúvida nenhuma, tem

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impulsionado o debate sobre o destino de grandes metrópoles.


Um aspecto fundamental é que o risco não pode ser dissocia-
do da ideia de probabilidade, aplicável em dois sentidos comple-
mentares. A primeira é a probabilidade de que um evento prejudi-
cial ocorra, como por exemplo, uma inundação, um deslizamento
de terra ou seca. A segunda é a probabilidade de que um determi-
nado indivíduo (ou grupo de indivíduos) seja afetado pelo even-
to prejudicial adverso. Logo, uma maneira de verificar isso seria
dizer que a vulnerabilidade é o que transformaria um fenômeno
potencialmente perigoso em um desastre.
Nesse sentido, o conceito de vulnerabilidade, ou o termo
“vulnerável”, não poderia realmente ser utilizado como um termo
inespecífico. É sempre necessário que se questione: vulnerável a
quê? Nessa direção, a vulnerabilidade não poderia estar dissocia-
da das variáveis tempo e espaço. Portanto, o procedimento mais
comum seria a identificação de fatores que conduzem à existência
de vulnerabilidades.
O primeiro aspecto a se destacar seria o lugar, ou seja, a lo-
calização de determinadas atividades e, por conseguinte, a popu-
lação. Para tal situação, os aspectos do meio físico são relevantes
e passam a determinar a probabilidade de que um determinado
evento ocorra. Na sequência, são considerados aspectos relativos à
ausência de meios materiais, de infraestrutura de apoio, ou ainda,
questões relativas à pobreza e exclusão social, entre outros, que
poderão revelar a escala ou a gravidade dos impactos.
Para muitos cientistas isso pode parecer lógico e até ser pon-
to repetitivo, mas, na verdade, uma das grandes dificuldades em
tentar considerar a vulnerabilidade como um tema comum a todos
é que, inevitavelmente, o conceito pode apresentar significados di-
ferentes para grupos sociais distintos, em contextos e momentos
distintos. Isso pode provocar desencontros e, até mesmo, falhas
nos procedimentos necessários para minimização dos impactos,
pois o consenso é um fator importante quando se define a vulne-
rabilidade de regiões.
Para que as populações, instituições ou organizações envol-
vidas possam lidar com os impactos, o conceito de vulnerabili-
dade pode se tornar um critério fundamental para o estabeleci-
mento de prioridades. Por exemplo, se durante um evento não for

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possível auxiliar a todos igualmente, quem deve ser priorizado? A


vulnerabilidade seria mais que um simples critério de escolha ou
definição? O que, é claro, nos leva diretamente à outra questão:
quem é vulnerável?
À medida que a “vulnerabilidade” emergiu como um
conceito praticamente autônomo para repensar como intervir e
minimizar os impactos ou danos causados por desastres, situações
inesperadas não eram igualmente incorporadas. Segundo as
divisões UNISDR, UN-Habitat, & Eupopean Comission (2018),
o fato de se preestabelecer determinado grupo como sendo o
mais vulnerável pode conduzir outros grupos a situações de
vulnerabilidade inesperadas, pois em circunstâncias normais
esses não estariam classificados nos grupos dos mais vulneráveis.
É verdade que, na maioria das situações, determinados
grupos são mais vulneráveis, pois a vulnerabilidade é geralmente
considerada a partir de um fenômeno físico-social associado a uma
localidade, quase sempre representada por coordenadas estáticas.
Entretanto, é extremamente necessário considerar que o efeito
de composição possa diferenciar a classificação dos grupos mais
ou menos vulneráveis, fruto da coexistência de áreas mais desen-
volvidas economicamente (Regiões Metropolitanas de Campinas,
Baixada Santista, ABC Paulista) com outras áreas que estão em
processo de expansão.
Nesse sentido, existem fatores importantíssimos, como os
fluxos de deslocamento sustentados pelas estruturas espaciais
urbanas da macrometrópole que influenciam diretamente a com-
posição. Sabe-se que todos os anos os fluxos populacionais entre
regiões aumentam consideravelmente.
Um estudo recente (De MARIA & BAENINGER, 2017) de-
monstrou que os fluxos migratórios direcionados ao Estado de
São Paulo são considerados heterogêneos, devido ao grau de de-
senvolvimento do estado e às oportunidades de trabalho e estudo
oferecidas. Além disso, uma parte significativa das idas e vindas da
população brasileira passa pelo estado, que serve como receptor
de imigrantes, bem como de passagem para outros destinos, inclu-
sive o exterior. Há quem se destine ao interior e quem se dirija à
metrópole, assim como os que deixam o estado e são oriundos da
capital ou do entorno metropolitano, ou ainda do interior.

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Diante desse quadro heterogêneo e complexo, poderíamos su-


por, por exemplo, que epidemias podem ser mapeadas à medida
que se espalham por rotas de caminhões, transportes públicos e
privados (incluindo aéreos). O mapeamento dos fluxos muito pro-
vavelmente revelaria que a vulnerabilidade é variável à medida que
se propaga para outras localidades.
Do mesmo modo, no passado, a escassez de água que atin-
giu a região Sudeste na seca de 2013-2014 não limitou os fluxos
constantes entre regiões metropolitanas, apesar das pressões sobre
a capital paulistana e da necessidade de economizar os recursos
ainda disponíveis para as populações locais.
O oposto, ou seja, situações inversas também podem ocorrer.
Pessoas localizadas em áreas potencialmente vulneráveis, residen-
tes em regiões desprovidas de infraestrutura, classificadas como
áreas de risco, se deslocam diariamente e passam longos períodos
em regiões consideradas pouco vulneráveis.
Assim, seria possível supor que a vulnerabilidade não se apre-
senta como uma componente estática. Alguns poderiam dizer que
a exposição ao risco torna-se cada vez mais dinâmica e os grupos
de maior risco alternam-se à medida que se deslocam.
Seguindo essa lógica, conclui-se que a vulnerabilidade tam-
bém pode variar segundo sua abrangência, podendo se configu-
rar como individual ou coletiva. Assim, pouquíssimas pessoas, se é
que existem, poderiam, em algum momento de suas vidas, torna-
rem-se vulneráveis.
Isso se confirma, pois estamos lidando constantemente com
fluxos e circunstâncias distintas. Como se observou, se os fluxos
populacionais são dinâmicos, consequentemente os arranjos espa-
ciais e estruturais também. Principalmente em se tratando de ma-
crometrópoles, onde a aproximação espacial entre as metrópoles é
articulada através de grandes eixos estruturais.
Dentro dessa construção espacial, bairros inteiros podem apa-
recer da noite para o dia, configurando-se como uma das soluções
encontradas pelas famílias de baixa renda, visando à produção de
espaços de moradia, reflexo de um processo de parcelamentos ir-
regulares em terras geralmente públicas; ou ainda, luxuosos con-
domínios podem surgir em virtude da facilidade produzida pelos
eixos estruturais de circulação.

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Nesse caso, ao considerar regiões muito extensas como ma-


crometrópoles, o que é importante salientar é o fato de que a vul-
nerabilidade é variável e é dependente da probabilidade de altera-
ções nos fluxos e em sua estrutura, ou seja, onde ocorrem, como
ocorrem e com que frequência.
Sem dúvida é um grande desafio, pois antecipar quando ocor-
rerá uma mudança no modo dinâmico é mais difícil. É necessário
entender como se estrutura a rede de metrópoles, incorporando
talvez a perspectiva de sistemas vulneráveis que exigiriam progra-
mas interconectados de redução de risco de desastres.

Adaptação em rede: a necessidade de um enfoque


abrangente
Pensando em termos de fluxos, praticamente nos últimos 200
anos, toda a rede de estruturas urbanas que veio a se consolidar
como a macrometrópole de São Paulo foi construída em cima de
uma base legal (códigos, regras, normas, convenções, políticas pú-
blicas) que guiou as especificações técnicas de sistemas produtivos
(agricultura, indústria e tecnologia) e infraestruturas disponíveis
(rodovias, sistemas de abastecimento de água, combustível, sanea-
mento, sistemas de distribuição de energia, entre outros) e que,
sobretudo, foram desenvolvidas para tornar cada vez mais podero-
sa a habilidade de transformar recursos naturais em energia não
renovável.
Essas estruturas urbanas se moldaram a partir dessa base legal
complexa, que operava em muitas escalas, por exemplo, sistemas
bancários que davam suporte à exploração de petróleo em regiões
litorâneas e no interior paulista, com a instalação de indústrias pe-
troquímicas (ex. Campinas, Cubatão, São José dos Campos, Mauá
e Santo André no ABC Paulista), ou ainda, a expansão de merca-
dos imobiliários que ocupavam áreas apenas com critérios especu-
lativos de “desenvolvimento”, seguindo a implantação de grandes
empreendimentos, portos e aeroportos, muitos dos quais frutos de
acordos internacionais que previam regras comerciais de exporta-
ção e importação de produtos.
Do ponto de vista da adaptação, fundamentalmente o concei-
to não pode ser encarado como uma perspectiva de acomodação.

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É necessário que uma transformação estrutural significativa ocor-


ra e que a base legal se modernize, mudando muitos dos aspectos
relacionados ao regime regulatório, às prioridades e aos tipos de
investimentos em infraestrutura, revertendo o quadro e transfor-
mando a energia limpa na principal habilidade das cidades em
rede. Assim sendo, quantificar a atual dependência da estrutura
fóssil também constitui um passo fundamental para a contabilida-
de dos processos de transformação.
Essa mudança pode ser liderada pela macrometrópole de São
Paulo e pode conduzir a uma mudança nas fontes de energia e
fluxos de material dentro das cidades, o que naturalmente atingirá
as áreas rurais. Em outras palavras, o entendimento das relações
entre fluxos de energia e matéria será fundamental para a implan-
tação e o gerenciamento de infraestruturas mais modernas.
Outra questão chave e fundamental diz respeito às densi-
dades dos setores produtivos e de serviços, e consequentemente,
populacionais das regiões metropolitanas. Quanto mais densas e
pressionadas estiverem as estruturas metropolitanas, maior será
a dificuldade de adaptação e transformação, principalmente da
malha urbana. Consequentemente, os custos de investimentos se-
rão respectivamente maiores. Portanto, entender a relação entre
concentração espacial e fluxos de pessoas, matéria e energia é fun-
damental para a contabilidade.
Os meios de transporte, o comércio e a distribuição de mer-
cadorias representam exemplos de fluxos materiais. E essa gama
de produtos possui, de fato, materialidade e volume. Nessa lógi-
ca, supõem que os suportes estruturais que dão fluidez ao espaço
geográfico não são os únicos incorporados ao território de uma
macrometrópole.
Na verdade, ao analisar as dinâmicas desses fluxos, chegamos
à conclusão de que há uma interdependência total entre inúmeros
sistemas. A base material de grande parte do sistema produtivo
não funcionaria sem os sistemas que dão suporte para que as ma-
croestruturas se materializem no espaço e transformem radical-
mente as paisagens.
Como exemplo, podemos assegurar que uma parcela consi-
derável da logística dos sistemas de transporte e distribuição de
mercadorias está intimamente ligada a uma rede de conexões que

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viabiliza a distribuição de bens, interligando os mais diferentes


sistemas de produção e distribuição. Dessa forma, é possível afir-
mar que os fluxos materiais e populacionais ligam-se à mesma teia,
formando uma grande rede relacional, que viabiliza uma enorme
variedade de transações, que se transformam o tempo todo à me-
dida que a tecnologia imprime agilidade ao processo.
Um exemplo claro dessa transformação é a expansão da soja
sobre a produção de cana-de-açúcar como opção para a renovação
das áreas de plantio (SILVA, 2018). A cultura da soja superou a
marca de 1 milhão de hectares no estado. O município de Itapeva,
na Região Administrativa de Jundiaí, está entre as áreas agrícolas
que destinam mais de 430 mil hectares para o plantio da cultura
de soja no estado, juntamente com Assis e Ourinhos (IEA, 2019).
Portanto, o entendimento dessas diferenças e como se inter-re-
lacionam pode expandir uma verdadeira rede de oportunidades vi-
sando uma mudança crucial e criando alternativas para que toda
uma estrutura complexa de metrópoles deixe de ser dependente de
fluxos e sistemas apoiados em fontes não renováveis.

Considerações finais
Sem dúvida alguma, o sistema urbano contemporâneo alcan-
çou um nível de complexidade incompatível com as exigências de
acordos globais a respeito das questões climáticas. Entretanto, em
escalas macrometropolitanas é praticamente impossível não afir-
mar que as cidades devem e irão se transformar. Muito provavel-
mente as cidades do período modernista serão reconstruídas para
que possam ser capazes de responder às emergentes questões do
século XXI e superar as crises impostas pelas estruturas criadas
no século XX.
Basicamente, isso sugere que o modo para identificar as rela-
ções entre configurações espaciais, paisagens e morfologias urba-
nas, assim como infraestruturas disponíveis, que operam em múl-
tiplas escalas, deve ser repensado a partir de fluxos de matérias e
pessoas.
Obviamente, quando refletimos sobre a vulnerabilidade em
macrometrópoles, não existem sistemas independentes e, nesse
sentido, parece existir uma espécie de percurso que restringe ou

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inicialmente se configura como um obstáculo intransponível a fu-


turas opções. Grande parte dos obstáculos, sem dúvida alguma,
advindos do caráter inovador das tecnologias propostas e da com-
plexidade de interesses científicos, econômicos, políticos, entre ou-
tros, envolvidos na questão.
Desfazer a dependência de energias não renováveis e alterar a
rede de infraestruturas sustentada nessa base energética poluente,
que culminou em áreas urbanas completamente insalubres, parece
inevitável, pois, por mais que existam interesses, todos competem
na arena do debate climático contemporâneo, um debate, sobre-
tudo global.
Os problemas metropolitanos advêm justamente da contradi-
ção entre manutenção da estrutura social contemporânea e redu-
ção de riscos ambientais. No entanto, é importante entender que
risco e vulnerabilidade assumem dimensões estruturais e passam
a constituir unidades analíticas para a compreensão da sociedade
contemporânea. E isso se traduz claramente a partir do 4º Rela-
tório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da
Organização das Nações Unidas (IPCC, 2007), documento que as-
segura serem antrópicas as causas do aumento da temperatura no
planeta registradas nos últimos 150 anos.
Por conseguinte, colocando em termos interrogativos, se a
macrometrópole é pluricontextual e os estados operam como o
centro da hegemonia local e global, influenciando diversas áreas,
especialmente em termos políticos, econômicos e culturais, esta-
ríamos sem possibilidade de controle das ameaças do aquecimen-
to global? Sem controle dos riscos de desastres? Completamente
vulneráveis?
Em grande parte, tal sentimento de impotência diante do ris-
co e da vulnerabilidade advém dos esforços necessários para mi-
tigar o que foi colocado como certo, ou seja, que o planeta está
aquecendo e vai aquecer mais nas próximas décadas (IPCC, 2018).
Isso tem exigido muito esforço econômico, cultural, jurídico, cien-
tífico, ou seja, mudanças conceituais e estruturais em diversos sis-
temas concomitantemente. E, mais ainda, tal esforço deveria ser
articulado regionalmente e globalmente, o que tem esbarrado em
questões políticas ainda insolúveis.
Assim, porque vivemos em uma sociedade que deve toda a

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sua dinâmica à disponibilidade de fontes energéticas poluentes,


na ausência dessas fontes teríamos sérios problemas logísticos que
afetariam o consumo, a produção, a distribuição de produtos agrí-
colas, a segurança, os sistemas de transporte, saúde, entre outros.
Em outras palavras, o padrão de disponibilidade de energias não
renováveis na sociedade moderna interfere na velocidade e no des-
locamento espacial de indivíduos e produtos, e como consequên-
cia afeta a vulnerabilidade de indivíduos.
Portanto, não é pouco o que está em jogo nas metrópoles que
compõem a macrometrópole de São Paulo. Trata-se de assegurar
uma mudança radical nos padrões de fluxos de produção e con-
sumo (de energia, matéria prima e produtos), baseado na difu-
são de tecnologias inovadoras apoiadas em fontes renováveis, e
no aprimoramento da mão de obra local para inseri-la em novos
contextos de trabalho. Nada menos que uma revolução logística,
tecnológica e social.
Porém, assim como no final do século XIX, a mudança para
um novo sistema pós Revolução Industrial era considerada algo
inimaginável e exigiu grande esforço científico, político e tecno-
lógico para redefinir regras e códigos adequados àquele período,
criar novas formas para reverter os riscos e diminuir a vulnerabi-
lidade das populações no mundo contemporâneo também parece
uma alternativa impensável.
Contudo, novas abordagens científicas estão emergindo e po-
dem prover melhores insights sobre como entender os impactos
em áreas urbanas. As redes de cidades, em constante processo de
transformação, constituem organismos vivos e, por isso adicionam
ao longo do tempo novos códigos e normas de conduta que irão se
materializar em lugares e contextos distintos.

Agradecimentos
Este trabalho contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo, da FAPESP - 2015 / 24099-1 - Jovem Pesquisador.

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Referências
ADGER, W. N. Vulnerability. Global Environmental Change, v. 16, p. 268-281,
2006.
DE MARIA, P. F.; BAENINGER, R. Imigração em São Paulo: perfis segundo
pobreza e ocupação no século XXI. Geografias artigos científicos Belo Horizonte.
Edição Especial - Dossiê Migrações, 2017.
IEA – INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Previsões e Estimativas das
Safras Agrícolas do Estado de São Paulo. Ano Agrícola 2018/19. V. 14, n. 4, abril
2019.IPCC. Contribution of Working Group II to the Fourth Assessment Report
of the Intergovernmental Panel on Climate Change [M. L. Parry; O. F. Canziani;
J. P. Palutikof; P. J. van der Linden; and C. E. Hanson (Eds.)] Cambridge: Cam-
bridge University Press, United Kingdom and New York, NY, USA. 2007.
IPCC. SR1.5 – Global Warming of 1.5 °C – IPCC special report on the impac-
ts of global warming of 1.5 °C above pre-industrial levels and related global
greenhouse gas emission pathways, in the context of strengthening the global
response to the threat of climate change, sustainable development, and efforts
to eradicate poverty. Coordinating Lead Authors: Myles Allen, Heleen de Conin-
ck, Opha Pauline Dube, Ove Hoegh-Guldberg, Daniela Jacob, Kejun Jiang, Aro-
mar Revi, Joeri Rogelj, Joyashree Roy, Drew Shindell, William Solecki, Michael
Taylor, Petra Tschakert, Henri Waisman. 2018.
PELLING, M. The vulnerability of cities: natural disasters and social resilience.
Earthscan, London. 2003.
SILVA, E. “Em parceria com cana, área de soja poderia dobrar em São Paulo. A
projeção do pesquisador Denizart Bolonhesi do Instituto Agronômico de Cam-
pinas – apresentada no 8º Congresso Brasileiro da Soja”. Globo Rural-Jornalismo.
2018.
UNISDR, UN-Habitat, & Eupopean Comission. Progress on the Making Cities Sus-
tainable and Resilient Action. Europe: UN Habitat and UNISDR. 2018.

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C a p í t u l o 16

Desafios para a adoção de medidas


adaptativas em municípios de
pequeno porte: experiências no
Vale Histórico Paulista
Sílvia Helena Zanirato1

Palavras-chave: Vale histórico paulista. Adaptação.


Mudanças Climáticas. Vulnerabilidade.

Apresentação

As mudanças climáticas globais são os maiores desafios que


se apresentam à sociedade. Seu enfrentamento pede ações
para diminuir as causas antrópicas que as motivam, assim como
meios preventivos e adaptativos para enfrentar os efeitos delas de-
correntes. Ambas as ações têm inúmeras dificuldades em função do
modelo econômico predominante e dos valores em concorrência,
que levam a considerar o padrão de desenvolvimento como único
possível e necessário, e as mudanças como algo distante da realidade.
No entanto, pesquisas estão a mostrar que já são sentidos
os impactos das alterações climáticas e que elas tendem a se am-
pliar mais e mais. Os efeitos se veem em todos os lugares, mas
tendem a ser mais incisivos em países pobres, que contam com
menos recursos para promover adaptações. Essa situação pode
levar à exacerbação e à criação de novos focos de pobreza, uma
vez que os riscos “se amplificam para as pessoas que carecem
de infraestruturas e serviços essenciais, ou vivem em moradias
de má qualidade e em zonas expostas” (IPCC, 2014, p. 18). O
desafio aos países pobres e aos em desenvolvimento é ampliado

1
Professora doutora em Gestão Ambiental EACH, USP e dos Programas de Pós-
Graduação em Ciência Ambiental e em Mudança Social e Participação Política, da
Universidade de São Paulo.

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ainda mais quando referido aos municípios de pequeno porte e


que têm menos condições de adotar medidas adaptativas.
Tais conexões norteiam este texto, que objetiva tratar de de-
safios para a adoção de medidas de adaptação na dimensão local e
no espaço urbano, a partir de pesquisas desenvolvidas nos peque-
nos municípios situados no nordeste do Estado de São Paulo, na
região denominada Vale Histórico Paulista. São duas experiências
de pesquisa: uma de avaliação da vulnerabilidade da região e de
seu conjunto urbano e outra de comunicação de risco aos formula-
dores de políticas públicas nos municípios analisados.

A vulnerabilidade no Vale Histórico Paulista


As ameaças foram identificadas na pesquisa “Patrimônio
Cultural do Vale Histórico Paulista: análise da vulnerabilidade às
mudanças climáticas”, desenvolvida entre 2012 e 2014 e financia-
da pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(FAPESP) – 2011/51016-9 –, em convênio com a Secretaria de Cul-
tura do Estado de São Paulo/Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT).
O Vale compreende um conjunto de municípios (Arapeí,
Areias, Bananal, Queluz, São José do Barreiro e Silveiras) situados
na Serra da Bocaina, numa faixa de morros entre as serras da
Mantiqueira e do Mar, na macrorregião administrativa do Vale do
Paraíba e Litoral Norte. São lugares com população pequena, al-
guns com 3.000 e outros ao redor de 10.000 habitantes, todos com
recursos humanos e financeiros limitados e reduzida capacidade
de se adequarem, legalmente, aos dispositivos jurídicos de gestão
urbana. São municípios classificados no Índice Paulista de Vulne-
rabilidade Social como da mais alta vulnerabilidade social do esta-
do (SEADE, 2010) e estão no Índice Paulista de Responsabilidade
Social com os níveis de escolaridade, longevidade e riqueza mais
inferiores de todo o estado (SEADE, 2014).
A pobreza acompanhou a história desses munícipios ao lon-
go de todo o século XX e início do XXI. Mas há edificações do
final do século XIX que atestam tempos de prosperidade, quando
todos se valiam da riqueza gerada pela produção do café. As casas
térreas e assobradadas, edifícios públicos e religiosos que se situam

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ao longo da atual Rodovia dos Tropeiros estão a marcar a história


desses tempos. Sua permanência se explica diante da pouca
renovação urbana que todos experimentaram. São edificações
que empregam madeira e argila em sua construção; algumas são
simples, outras suntuosas, ocupadas como moradias ou lugares de
serviço e comércio e que chegam a representar, em alguns dos
municípios, mais de 30% do total de edificações. A maioria das
construções acompanha os corpos d´água que cortam os centros
urbanos, uma condição natural para a lavagem do café e o abaste-
cimento no decorrer do século XIX.
A região é considerada de alta vulnerabilidade (exposição e
susceptibilidade) às mudanças climáticas em face de maiores mé-
dias de precipitação (e, portanto, de umidade relativa do ar) e de
maior intensidade de raios (ALVES e OJIMA, 2008). Os índices
pluviométricos se situam em torno de 1.350 mm/ano (AB’SABER,
2003). Os núcleos urbanos se encontram em zonas escarpadas e
com declividade elevada, o que favorece a ocorrência de movimen-
tos de massa, que têm na chuva um dos principais vetores. Também
são lugares propensos a cheias e inundações. A maioria dos municí-
pios registra histórico de escorregamento de massa e/ou inundação
(KAWASAKI et al., 2012; CEIVAP, 2013; ZANIRATO, 2017).
A vulnerabilidade em relação às condições geológicas da área,
à geodinâmica dos solos e à topografia pode ser agravada confor-
me a conservação das construções seculares, das técnicas construti-
vas e do material utilizado. Não está longe a lembrança do desastre
ocorrido em São Luís do Paraitinga, em outra vertente da Serra da
Bocaina, que teve grande parte de seu centro histórico destruído
em janeiro de 2010, pois as construções em taipa de pilão (barro
compactado e misturado com cal ou fibras vegetais), após intensas
chuvas e elevação do rio Paraitinga, absorveram água e perderam
firmeza (KAWASAKI et al., 2012).
Com base nisso, no âmbito do Projeto Fapesp/Condephaat
referido, foram elaborados cenários climáticos para a região, pelo
Laboratório do Grupo de Estudos Climáticos do DCA-IAG-USP.
A análise contou com duas abordagens: uma observacional, com
dados meteorológicos coletados de estações em torno do Vale, e
uma numérica, fundada em simulações com o modelo regional
climático RegCM3, com condições iniciais e de fronteira dadas

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pelos modelos globais HadCM3 e ECHAM5. Os modelos simu-


laram para o futuro (2070-2100) um aumento médio de 3ºC nas
temperaturas máxima e mínima e uma leve diminuição da umida-
de relativa, bem como um aumento da precipitação nos períodos
de primavera, e incertezas em relação aos períodos em que podem
ocorrer chuvas intensas (RELATÓRIO FAPESP – 2011/51016-9).
Esse cenário preocupante pode ser mais ou menos intenso, depen-
dendo dos usos do solo na região.
Outrora Mata Atlântica, a região serrana onde se encontram os
municípios do Vale teve suas florestas devastadas para o cultivo da
cana, depois para o café e, mais recentemente, para a pecuária leitei-
ra. Isso resultou em morros descobertos, em ausência de barreiras
naturais de contenção das encostas, o que é agravado pelos cortes
de talude e pelos caminhos feitos pelo pisoteio do gado, o que leva a
escorregamentos de massa de tempos em tempos, alguns atingindo
o espaço construído. Essa situação também contribui para o asso-
reamento dos cursos d’água e seu transbordamento.
Aos cenários futuros e aos usos do solo se somam ainda o
estado atual das edificações. Para verificar essa condição foi efe-
tuado um inventário dos imóveis quanto à localização, ao tipo de
ocupação, à tipologia construtiva, aos materiais e métodos empre-
gados e ao estado de conservação. Foi constatado que predomina
o uso residencial, seguido do comércio e serviços; parte significati-
va das edificações está em planícies de inundação, circundada por
morros. São casas térreas e assobradadas, feitas no alinhamento
das ruas, com técnicas construtivas que usam argila e madeira e
que empregam adobe ou taipa de pilão nas paredes externas e pau
a pique nas internas. A cobertura é com telhas de barro cozido,
distribuídas em telhados de uma ou duas águas, alguns contínuos
a dois ou mais imóveis. As aberturas são sempre em madeira, com
portas e janelas voltadas para as ruas.
A maioria dos imóveis tem infestação de cupins no madeira-
mento, em particular nos barrotes, pisos, tetos e aberturas; há pare-
des úmidas, com rachaduras e perda de reboco por escorregamen-
to de telhas e gotejamento; algumas expõem as estruturas de pau
a pique, decorrentes de queda da alvenaria. O casario edificado
lado a lado dificulta o combate ao cupim e o controle do escorrega-
mento de telhas. A situação piora quando há imóveis abandonados

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nesse conjunto, que acabam por espalhar os perigos para os edifí-


cios contíguos. Há imóveis muito próximos a morros onde se veem
cortes de talude e inclinação em torno de 30º a 40º graus, e outros
nas zonas de espraiamento dos corpos de água e que são, de tem-
pos em tempos, afetados pelo transbordamento das águas. A falta
de rede de drenagem (micro e macro) ou a descontinuidade dessas,
quando existente, agrava o quadro.
A condição não é diferente na zona rural, as casas de fazenda
estão sempre às margens de cursos d’água, sofrem com cupim,
com destelhamento e perda de reboco das paredes. Há casos de de-
sabamento, como a sede da Fazenda Guanabara, em Bananal que
desabou em 2010, e a sede da Fazenda Santa Carlota, em Areias,
que corre o risco de ver desabados o forro e toda a estrutura da
cobertura pela disseminação do cupim por todo o madeiramento.
O risco de invasão por águas dos rios também se apresenta, como
é o caso da sede da Fazenda Santa Rita, em Areias, que já foi mais
de uma vez inundada pela subida das águas de um dos afluentes
do Ribeirão Vermelho.
Como parte expressiva das edificações é ocupada por mora-
dores de baixo poder aquisitivo, são pequenas as possibilidades
de que realizem, por sua própria conta, ações de reparos. É o que
se vê no Hotel Brasil, no Solar Aguiar Valim e em outros imóveis
na praça principal de Bananal, assim como nas ruas centrais de
Queluz, Areias e São José do Barreiro. Os proprietários convivem
com os danos e chegam e habitar imóveis em processo de arruina-
mento, como é o caso do antigo Hotel Brasil.
O estado já ruim de conservação dos imóveis pode se agravar
pelas mudanças da temperatura, que levam ao aumento das colô-
nias de insetos xilófagos, bem como contribuir para o maior resse-
camento dos materiais empregados nas construções e resultar em
danos físicos que favorecem a penetração de água pelos telhados,
paredes e pelo solo. Somado a isso, o aumento da precipitação pode
levar a infiltração de água pelas paredes e pelo solo, contribuindo
para a perda do reboco e exposição das estruturas à umidade. A
umidade também pode favorecer o transporte de sais para a argila
das paredes e acarretar erosão. O aumento da precipitação também
pode intensificar os escorregamentos de encostas e as cheias e trans-
bordamento de rios e córregos que cortam os centros urbanos.

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A vulnerabilidade está posta; os cenários são preocupantes


e indicam a necessidade de ações para reduzir as ameaças iden-
tificadas uma vez que os municípios de pequeno porte “sofrerão
com a ausência de infraestrutura e de capacidade de articulação,
de sistemas de alerta e de estruturas institucionais capazes de dar
resposta aos desastres naturais e impactos ambientais” (NOBRE e
YOUNG, 2011, p. 21).
Os resultados obtidos na pesquisa motivaram o passo seguin-
te, de proceder à comunicação dos riscos aos gestores locais, na
expectativa da adoção de medidas adaptativas.

Comunicação dos riscos e a formulação de um


plano de contingência
A pesquisa “Gestão de riscos de bens com função patrimonial às
mudanças climáticas: medidas para a formulação de políticas públi-
cas” tratou da comunicação de riscos e ocorreu no âmbito do projeto
CNPq (444344/2015-2), desenvolvido entre 2016 a 2017. Partiu-se do
princípio de que cabe ao poder público a formulação e a implantação
de ações adaptativas, mas para isso ele precisa ser incitado (MAR-
TINS e FERREIRA, 2010). Isso implica em arranjos institucionais
que devem ser pensados nos limites das possibilidades e pautados na
realidade de escassez de recursos dos municípios. Com base nessas
considerações o plano de comunicação, com eixos distintos, incluiu:

a) o tema das Mudanças Climáticas Globais;


b) o registro histórico de desastres da região: inundações,
deslizamentos, desmoronamentos;
c) as vulnerabilidades atuais dos imóveis do período cafeeiro;
d) os cenários projetados para o futuro;
e) a situação socioeconômica dos municípios do Vale;
f) as políticas incidentes sobre as ameaças identificadas e as
diferentes escalas de níveis de responsabilidade: local, es-
tadual, nacional;
g) a elaboração de uma agenda política de ações de adapta-
ção em face das vulnerabilidades encontradas e dos cená-
rios projetados.

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A preocupação com ações para a adaptação levou a focar nos


perigos já existentes e nos cenários futuros e a “buscar no pró-
prio devir e no pacto social urbano, as respostas para cada caso”
(OJIMA e MARANDOLA, 2010, p. 23). Com esse propósito foram
planejadas oficinas que consideraram a multidimensionalidade de
fatores para a concepção e implantação de uma agenda de interes-
ses coletivos, quais sejam:

a) a apreensão dos riscos pela comunidade local;


b) a capacidade organizativa da população, ciente de que ela,
melhor do que ninguém é quem pode proteger seus bens;
c) a especificidade da urbanização local, a pouca capacidade
de arrecadação financeira dos municípios do Vale e as di-
ficuldades de investimento em ações contingenciais;
d) as ações e responsabilidades que podem ser compartilha-
das nas escalas de governo local, estadual e federal.

A pesquisa-ação foi o método escolhido (THIOLLENT,


2004; MAY, 2004), uma vez que nele o pesquisador não apenas
descreve o que está observando, mas tenta modificar seu cam-
po de estudo. As oficinas foram concebidas como estratégias fa-
cilitadoras da troca dialógica e da construção de sentidos e se-
guiram as experiências de comunicação de riscos tratadas por
Bostrom, Morgan, Fischhoff e Read (1994); O’Connor, Bord e
Fisher (1999); Spink (2003) e Leiserowitz, (2005) e contemplaram
as seguintes temáticas:

1. avaliação empírica do que as pessoas já conhecem como


mudanças climáticas e fornecimento de novas informa-
ções numa perspectiva mais crítica;
2. identificação de ameaças aos imóveis oriundos do período
cafeeiro;
3. formulação de diretrizes e de objetivos para reduzir as
ameaças identificadas;
4. formulação de um plano de ação com estratégias, compro-
missos e prazos para a resolução de problemas que estão
na escala local, e identificação, responsabilização e enca-

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minhamento dos problemas aos responsáveis por ações de


outras escalas (estadual e federal).

Foram convidados os gestores e equipes técnicas de Secreta-


rias Municipais nas áreas relacionadas com a habitação, cultura,
turismo, meio ambiente e desenvolvimento econômico e o convite
se estendeu aos proprietários de imóveis analisados, aos represen-
tantes do Ministério Público e dos governos estadual e federal que
atuam na região, e aos integrantes de instituições de ensino e re-
ligiosas.
As oficinas ocorreram em dois municípios: Areias e Bana-
nal. Em média 23 pessoas participaram ao longo de cinco dias, a
maioria ligada à gestão local (prefeitos, vereadores, secretários de
governo, conselheiros). Em Areias foram reunidos representantes
dali e de Queluz, Silveiras e São José do Barreiro e, em Bananal,
dos municípios de Arapeí e de Bananal.
No primeiro dia foi apresentada a equipe do projeto, os convi-
dados presentes e formados os grupos de discussão.
No segundo dia a ênfase foi em relação à compreensão do
significado das mudanças climáticas e de seus efeitos no Brasil e
na região em análise. Para tanto foram apresentadas as perguntas:
o que sabem sobre mudanças climáticas? Como isso pode afetar o
Brasil? Como pode afetar a cidade de vocês?
As respostas foram variadas, desde o buraco na camada de
ozônio a mudanças no regime de chuvas, aumento do calor e eleva-
ção do nível do mar. Em relação ao Brasil ser afetado, as respostas
consideraram a perda da fauna e flora, o comprometimento da
agricultura e o surgimento de doenças. Especificamente para os
municípios do Vale Histórico foram indicados problemas de oferta
de água, crise na agricultura e disseminação de doenças. Essas res-
postas corroboram a afirmação de Oltra et al. (2009, p. 7) de que
não é incomum que a sociedade mais ampla associe as mudanças
climáticas com fenômenos distantes de sua realidade local, como
o degelo, o aumento do nível do mar e de que poucas vezes o tema
apareça associado à vida cotidiana.
Sobre as ações de contingência para evitar tragédias, o enten-
dimento foi de que não cabe ao município qualquer medida nessa
direção, o que uma vez mais vem ao encontro do exposto por Oltra

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et al. (2009, p. 5-6) de que “as atitudes dos indivíduos em face às


mudanças climáticas são de sentimento de incapacidade pessoal”.
Feita a síntese das respostas dos participantes, na sequência
foi discutido o que já há confirmado sobre as mudanças climáticas,
explicado o Modelo Climático Brasileiro (AMBRIZZI, T. e ARAÚ-
JO, M. 2013), e os cenários futuros projetados para a região pelo
IAG-USP. Associado a esse aspecto foram destacadas a importân-
cia de ações locais.
No terceiro dia o objetivo foi discutir a relevância dos imóveis
do período cafeeiro. A metodologia empregada foi a do Mapa Fa-
lante (TOLEDO e PILICIONE, 2011), na qual os participantes re-
presentaram imageticamente o que viam como representativo desse
período. Predominou a visão do monumental (igreja, solares, man-
sões, sedes de fazenda), o entendimento de que os bens expressam
a história, a cultura local, e a pouca associação de que os imóveis
são também moradia, comércio, escolas, espaços de serviço; ou seja,
locais onde se desenrola a vida cotidiana. Finalizada essa parte, foi
apresentado o inventário realizado em 2012-2014, que teve como
enfoque o conjunto edificado. Os imóveis georreferenciados e plo-
tados em mapas ampliaram a compreensão da abrangência do con-
junto como um todo e sua distribuição pelos municípios.
No quarto dia buscou-se discutir as ameaças que os imóveis es-
tão sujeitos hoje e como essas ameaças podem se intensificar diante
dos cenários climáticos projetados para a região. Com essa preocu-
pação foi apresentada a pergunta: o que pode estar a ameaçar os
imóveis do período cafeeiro hoje? E num futuro próximo?
As anotações foram levadas a uma árvore de problemas (VER-
DEJO, 2006) e indicaram ameaças decorrentes de cheias e poluição
dos rios, incêndio, proliferação de insetos, infiltração e rachadura
decorrentes da trepidação por trânsito de veículos pesados nas ruas
de paralelepípedo e por som alto, dificuldades de manutenção, des-
leixo, falta de fiscalização e de políticas públicas de conscientização.
Na sequência foi apresentado o que a pesquisa de 2014 identificou
como ameaças, entre as quais: de deslizamento de encostas por per-
da da vegetação e por cortes de talude, de cheias e transbordamento
dos corpos d’água pela ausência de mata ciliar e por falta de micro
e macrodrenagem, do comprometimento de estruturas de madei-
ra em decorrência da ação de insetos como o cupim, de perda de

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telhado por ação de ventos e tempo de existência da cobertura, do


surgimento de gotejamento e infiltração por esse mesmo motivo,
do comprometimento de estruturas por umidade e trepidações etc.
Também foi feita a explanação de como essa situação pode se agra-
var em decorrência dos cenários climáticos.
O quinto dia teve como objetivo formular diretrizes para a
elaboração de um plano de contenção às ameaças constatadas. As
ações foram direcionadas para as responsabilidades das esferas de
atuação: individual, municipal, estadual, federal. Com essa inten-
ção foram apresentadas as seguintes perguntas: o que pode ser
feito para conter as ameaças percebidas nos imóveis do período
cafeeiro do município? De quem é a responsabilidade de ação? O
que deve ser prioritário?
A metodologia foi a de construção de uma matriz participa-
tiva da qual constaram os problemas identificados, as soluções, as
responsabilidades, as incumbências diferenciadas em relação aos
imóveis, o tempo desejável de execução e as prioridades. Para tan-
to, trabalhou-se simultaneamente com a árvore de problemas e
uma nova árvore, de propostas de solução.
As medidas foram pensadas para curto, médio e longo prazo,
bem como definidas prioridades. A agenda considerou a responsabi-
lidade para a gestão local e em curto prazo, de nomeação de um con-
selho gestor consultivo para os imóveis reconhecidos pelos órgãos
de proteção como patrimônio cultural; o deslocamento de festas
ruidosas que levam à trepidação de paredes; o desvio do trânsito de
veículos pesados das vias onde se encontram a maioria dos imóveis;
o combate ao cupim; a recomposição da cobertura dos morros e da
mata ciliar. As prioridades foram a nomeação do conselho, o comba-
te ao cupim e a recomposição da cobertura dos topos de morro e da
mata ciliar. Para médio prazo foram apontados o desvio do trânsito
pesado e o enfrentamento dos problemas de drenagem urbana.
Em nível regional foi pensada a constituição de um conselho
gestor regional do patrimônio cultural e a pressão desse junto aos
órgãos do patrimônio para flexibilização das normas de restauro,
que viabilizem intervenções em imóveis que pedem reparos em
sua composição.
Não houve referência a ações e responsabilidades que possam
ser compartilhadas com o governo federal.

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Considerações finais
Pode-se dizer que o processo comunicativo foi produtivo, com
a elaboração de uma agenda de medidas para conter as ameaças
percebidas e com prazos para atuação. No entanto, não se pode
ignorar que é difícil lidar com as dinâmicas próprias de pequenas
cidades, nas quais se percebem os interesses políticos, os jogos de
poder, a vontade de agradar os responsáveis pela aplicação das
oficinas, e que pode, não necessariamente, incorrer em ações no
sentido de fazer valer o agendado.
Não foram poucos os entraves, como a falta de comprometi-
mento dos gestores em considerar o assunto com a devida seriedade,
posto que ainda permaneçam entendimentos de que as mudanças
climáticas não se relacionam com o local. Isso se expressou na rari-
dade da permanência dos prefeitos nas oficinas; na difícil assiduida-
de dos secretários e vereadores, que intercalavam dias de presença
e de ausência; no entendimento de que a responsabilidade para o
cumprimento da agenda local deve ficar restrita à Secretaria de Cul-
tura, já que veem os imóveis associados ao patrimônio cultural, e
de que nada cabe ao proprietário em relação à situação das edifi-
cações, ou aos usos da terra, em particular aquelas que favorecem
aos deslizamentos. Outros problemas percebidos se assemelham aos
indicados por Martins e Ferreira (2010) entre os quais a tendência a
não priorizar ações por olhar custos em curto prazo, como a da ur-
gência na drenagem urbana, que exige grande investimento inicial,
associada ainda à ideia de que como os mandatos são curtos, há que
priorizar obras de grande visibilidade e apelo popular.
Pôde ser percebido que, ainda que tenha havido a identifica-
ção das responsabilidades do governo local, prevaleceu o enten-
dimento de que as ações de maior envergadura cabem aos órgãos
de proteção do patrimônio, considerados ausentes e inflexíveis em
suas determinações sobre o que pode ou não se fazer com imóveis
tombados como patrimônio. De fato, isso se passa, pois a respon-
sabilidade do CONDEPHAAT está posta em relação aos imóveis
(mais de 90) no centro histórico em Bananal, mas se restringe a
quatro imóveis em Areias, um em São José do Barreiro, um em
Queluz, nenhum em Arapeí e Silveiras. A ênfase ao órgão de pro-
teção do patrimônio indica a desresponsabilização do governo lo-

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cal para medidas de sua competência, em particular as de uso e


ocupação do solo urbano.
Temos claro que há ações que não podem ser postergadas,
como o investimento na macro e microdrenagem, uma necessi-
dade efetiva, pois são cidades erguidas em vales encaixados en-
tre morros, com altas declividades e sujeitas a escorregamento de
massa das encostas. Também são constituídas em volta de rios e
ribeirões, que sofrem inundações deflagradas por chuvas fortes e
rápidas e /ou chuvas de longa duração. A não existência de dre-
nagem urbana ou a precariedade desta, quando existente, é um
condicionante desses processos. A execução das estruturas de dre-
nagem já foi considerada nos Planos de Saneamento Básico dos
municípios do Vale (PLANSAN, 2013 e 2015) e, ainda que custosa,
implica em escolha e prioridade política.
As medidas de competência de flexibilização das exigências
para intervenções mais urgentes nos imóveis tombados, como re-
paros nos telhados, nas paredes, no piso, nas aberturas são tam-
bém possíveis, mas implicam em autorizações do CONDEPHAAT,
que sustenta o emprego de técnicas de restauro e o emprego de
materiais condizentes aos originais, o que encarece e até mesmo
inviabiliza reparos. Mas, isso se coloca tão e somente em Bananal,
que tem o maior conjunto de imóveis tombados como patrimônio.
Há ações que foram discutidas nas oficinas, mas que não foram
consideradas na agenda e que pedem articulação da escala local com
a estadual e federal, como a disposição de condições especiais de fi-
nanciamento para imóveis históricos e privados, uma prerrogativa
que o CONDEPHAAT poderia buscar; bem como ações para a desa-
propriação dos imóveis vazios, que não cumprem função social, me-
diante aplicação de instrumentos urbanísticos definidos pelo Estatuto
da Cidade. Esses imóveis poderiam ser disponibilizados como habi-
tação de interesse social aos moradores que não têm casa própria no
município, além de que, ocupado, geraria menos danos do que vazio.
Enfim, longe de oferecer uma resposta para a vulnerabilidade
constatada nos pequenos municípios do Vale, as pesquisas expres-
saram desafios para a adaptação, à luz da realidade local. O cum-
primento da agenda implica na efetividade do envolvimento dos
gestores e instituições para enfrentar os riscos já detectados e os
que estão por vir.

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C a p í t u l o 17

Risco, Desastre e Adaptação na MMP


Samia Nascimento Sulaiman1, Katia Canil1,
Fernando Rocha Nogueira1 e Pedro Roberto Jacobi2

Palavras-chave: risco, adaptação, gestão integrada,


políticas regionais.

Introdução

A
radicalidade dos eventos extremos e os cenários de risco
de desastre na Macrometrópole Paulista (MMP) colocam
a urgência de estratégias de adaptação às Mudanças Climáticas.
Para tanto, faz-se necessária uma revisão profunda da estrutura e
gestão urbana com foco na governança e na visão sistêmica sobre
os fluxos e nexos territoriais da macrometrópole, ao mesmo tempo
que exige um olhar pormenorizado da vulnerabilidade municipal
e os impactos das intervenções humanas em cada bacia hidrográfi-
ca, tanto pelo excesso de água (inundações e deslizamentos), quan-
to pela crise hídrica, e aumento e legitimidade da participação
social na tomada de decisão.
No atual quadro urbano brasileiro, é inquestionável a necessi-
dade de implementar políticas públicas orientadas para tornar as
cidades social e ambientalmente sustentáveis, como uma forma de
se contrapor ao quadro de deterioração crescente das condições
de vida. Os números de perdas humanas no verão de 2011 trouxe-
ram à tona o custo social das tragédias relacionadas com catástro-
fes naturais. A forma desordenada como as cidades cresceram nos
últimos 50 anos tem sido a principal causa das tragédias.
Dessa forma, para se abordar risco, desastre a adaptação na
MMP, faz-se necessário entender o processo histórico de (des)orga-
nização socioespacial e dinâmica da MMP, cujos recursos naturais,
1
Universidade Federal do ABC (UFABC).
2
Instituto de Energia e Ambiente (IEE) e Instituto de Estudos Avançados (IEA),
Universidade de São Paulo (USP). Pesquisador Responsável do Projeto Temático
FAPESP 2015/03804-9.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

infraestrutura, serviços e problemas ultrapassam os limites admi-


nistrativos de um único município, por meio de uma governança
interfederativa. Há o desafio da integração intergovernamental e o
aperfeiçoamento da governança municipal, com gestores qualifica-
dos apoiados por uma administração que desenvolva planejamen-
to estratégico dos municípios, para que eles possam ter uma visão
sistêmica, de longo prazo e democrática.
Caminhamos nesse sentido. São inegáveis os avanços políticos
em nível nacional como a Política Nacional de Proteção e Defesa
Civil (PNPDEC), Lei 12.608/2012; o Plano Nacional de Adaptação à
Mudança do Clima (PNAMC), 2015; e o Estatuto da Metrópole (Lei
13.089/2015), e em nível regional o Fórum Metropolitano de Mu-
danças Climáticas, o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado
da Região Metropolitana de São Paulo, e as contribuições da Câma-
ra Temática Metropolitana para Gestão dos Riscos Ambientais da
Região Metropolitana de São Paulo, o que analisaremos a seguir.

O contexto urbano e o aumento da vulnerabilidade


frente aos eventos extremos
A maioria das cidades brasileiras, em função da sua história de
urbanização, das características do meio físico e sua modificação
pelo uso e ocupação do solo, apresenta uma grande diversidade de
situações de riscos ambientais urbanos. São “disfunções” ou “peri-
gos” do ambiente urbano, com potencialidade de gerar processos
que podem causar, e têm causado, perdas e danos às pessoas, bens
e infraestrutura do entorno. Quase sempre, a causalidade dos riscos
pode ser explicada pelo processo de uso e ocupação do solo e pela
apropriação dos recursos naturais e, portanto, pode ser interpreta-
da como resultado da gestão insustentável do ambiente urbano.
Nas megametrópoles, essa construção social dos riscos é mui-
to mais acentuada em função da quase absoluta impermeabiliza-
ção do solo, da enorme concentração demográfica e densidade das
edificações, pela segregação socioespacial que reserva, às popula-
ções mais pobres, os fundos de vale, as várzeas alagáveis e as encos-
tas mais íngremes. As ocupações irregulares em áreas de manan-
ciais e encostas refletem a falta de opções para os pobres urbanos.
Em virtude da sobreposição dos interesses privados às demandas

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

sociais na distribuição de terras nas grandes cidades, sem recursos


para construir ou comprar imóveis em terrenos seguros e mais
próximos do centro, a população pobre se vê obrigada a habitar
regiões de difícil acesso, sem estrutura urbana consolidada e, mui-
tas vezes, em áreas de potencial risco (MARICATO et al., 2010).
Os Planos Diretores das cidades preveem instrumentos para
evitar esse problema, como a criação de Zonas Especiais de Interes-
se Social (ZEIS) – voltadas exclusivamente para residências popula-
res – e o imposto progressivo aos imóveis desocupados ou subutili-
zados, que não cumprem seu papel social e obrigam a população
carente a buscar alternativas de moradia nas periferias. Entretanto,
a pressão do setor imobiliário provoca desvirtuamentos constantes,
e os governos, na sua maioria, cedem aos interesses econômicos para
manterem apoio político, e deixam de aplicar as regras existentes,
e permanece a lógica de continuidade de um processo que estimula
e reforça a ocupação desordenada do solo. O que se pode observar
é que mais do que uma grande catástrofe natural, configuram-se
“tragédias anunciadas”, como consequência de décadas de descaso
do poder público com o planejamento urbano, a regulação pública,
os planos diretores, as leis de uso e ocupação do solo urbano, os có-
digos de construção e de posturas e a política habitacional.
Há, no entanto, um componente novo nesse “sistema dos ris-
cos”. Os estudos técnico-científicos identificam, com mais segurança
a cada ano, as tendências e os impactos das mudanças do clima so-
bre as cidades brasileiras e, em especial, sobre as grandes concentra-
ções urbanas, como é o caso da Macrometrópole Paulista. Episódios
extremos de temperatura e de pluviosidade, grande concentração
de poluentes por má dispersão do ar e maior incidência de doenças
infecciosas afetariam muito significativamente a saúde e qualidade
de vida da população. Do lado dos processos hidro e geodinâmicos,
já podemos notar em nossas cidades, associados a chuvas torrenciais
e concentradas, grandes inundações e alagamentos, enxurradas
com alto poder de arraste, deslizamentos em encostas e taludes. Nas
cidades da Baixada Santista, recorrência de ressacas e aceleração de
processos erosivos costeiros. E, em contrapartida, longos períodos
de escassez hídrica, afetando o abastecimento de água para a popu-
lação e as atividades econômicas (NOBRE et al., 2010; MARENGO,
SCARANO, 2016; RIBEIRO, SANTOS, 2016).

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O Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima


(PNAMC) (BRASIL, 2015a) considera que as principais vulnerabi-
lidades das metrópoles frente a tais processos estão relacionadas à
enorme desigualdade social que as marca e os problemas de habi-
tação e de saneamento decorrentes da pobreza, além de problemas
de drenagem de águas pluviais associados à intensa impermeabi-
lização do solo. Dentre as diretrizes prioritárias do PNAMC para
a promoção da adaptação às mudanças climáticas, estão: a) for-
talecer e aperfeiçoar os processos e modelos de planejamento da
expansão urbana, somados a ações de Drenagem Urbana Sustentá-
vel e revisão de normas técnicas e regulamentação de parâmetros
edilícios e urbanísticos, com a perspectiva de prevenção à ocorrên-
cia de desastres naturais e o surgimento de riscos; e b) considerar
a adaptação à mudança do clima na reabilitação de áreas urbanas
consolidadas, degradadas e com infraestrutura instalada, na pro-
moção da urbanização de assentamentos precários e na produção
de habitação social em escala. E, nas diretrizes específicas para a
gestão de riscos e desastres (BRASIL, 2015b), aponta: a) a Regula-
mentação da Lei 12.608/2012, cumprimento das ações previstas e
elaboração do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil; b) incen-
tivo a pesquisas focadas na compreensão do risco aos desastres; e
c) consolidação de um Sistema de Alertas Precoces.
Objetivamente, contamos com a identificação bastante clara e
presente de uma ameaça, de um perigo, e algumas intenções genéri-
cas. Já é um começo. Sua continuidade e materialidade, no entanto,
demandam processos de planejamento e gestão baseados em uma
visão de longo prazo e em prevenção mais do que na ação emergen-
cial e curativa, o que não presenciamos durante a crise hídrica na
Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) no período entre 2014
e 2016. A diminuição dos volumes de água nos reservatórios foi tra-
tada principalmente como um problema climático, decorrente da
falta de chuvas, sem qualquer interação com o aumento populacio-
nal da região ou com o uso e ocupação do solo, excluindo a comple-
xidade de uma grande metrópole como São Paulo e demonstrando
a inação dos representantes governamentais.
Em que pese o fato de que amplas parcelas dos bairros perifé-
ricos da RMSP tiveram problemas com o abastecimento regular de
água, o governo do Estado de São Paulo buscou criar uma narrativa

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que negava a crise no sistema e a necessidade de racionamento, narra-


tiva sustentada pelos grandes meios de comunicação que noticiaram
a crise de maneira a desresponsabilizar o sistema de governança da
água no estado. Deixou-se assim de dar visibilidade aos impactos em
diferentes níveis, desde municípios com interrupção do abastecimen-
to de água, até impactos negativos sobre os ecossistemas aquáticos
dos reservatórios e rios. O cenário de escassez hídrica, reforçado pe-
las alterações climáticas, tornou-se preocupante e foi agravado pela
incapacidade de comunicação e diálogo por parte do governo do Es-
tado de São Paulo sobre a gravidade da situação. A falta de propostas
e de informações que contribuíssem para uma discussão profunda
entre os diferentes usuários da água do Sistema Cantareira tem leva-
do ao esgotamento da água do principal reservatório da RMSP.
Mas apesar de que o problema maior fosse a falta de chuvas, a
escassa ou nula capacidade do governo do estado de articular ações
preventivas e adaptativas, expõe que, na prática, a tomada de deci-
são não considera a integração entre as diferentes políticas públicas
socioambientais. Com um discurso absolutamente técnico e centra-
lizador, o Estado de São Paulo afastou qualquer integração com a
população, dificultando o envolvimento da sociedade na discussão,
tanto da causa da crise como também das possíveis soluções para o
enfrentamento do problema, ampliando a vulnerabilidade hídrica
da RMSP bem como a vulnerabilidade institucional em fazer frente
às mudanças climáticas e aos riscos a ela associados.

Avanços políticos na governança regional para


gestão de risco e adaptação
A Lei 13.089/2015, que institui o Estatuto da Metrópole, esta-
belece diretrizes gerais para o planejamento, a gestão e a execução
das funções públicas de interesse comum em regiões metropoli-
tanas e em aglomerações urbanas instituídas pelos estados, bem
como normas gerais sobre o plano de desenvolvimento urbano
integrado e outros instrumentos de governança interfederativa
(BRASIL, 2015). De caráter inovador, o estatuto tem como pressu-
posto fomentar o desenvolvimento metropolitano de unidades ter-
ritoriais em macroescala a partir do reconhecimento dos proces-
sos de metropolização das cidades brasileiras para o planejamento

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urbano das Regiões Metropolitanas e Aglomerações Urbanas. O


propósito é estruturar uma política nacional de desenvolvimento
metropolitano articulada com diversas políticas voltadas em linhas
gerais aos setores de habitação, saneamento e mobilidade.
A metrópole resulta de um processo histórico, uma (des)orga-
nização socioespacial e dinâmica própria, caracterizado por seus
recursos naturais, infraestrutura, serviços e problemas que ultra-
passam os limites administrativos de um único município. Assim,
a proposta de uma governança interfederativa tem como objetivo
propor ações para melhor utilização desse território garantindo
suas funções com qualidade, cumprindo as exigências legais e
atendendo ao desenvolvimento a partir da sustentabilidade am-
biental, econômica, cultural e sociopolítica (SANTOS, 2018).
Com base nesses princípios, o Plano de Desenvolvimento Ur-
bano Integrado (PDUI) trata de um processo permanente de pla-
nejamento, que estabelece as diretrizes quanto à articulação dos
municípios no parcelamento, uso e ocupação do solo, o que pres-
supõe o estudo e mapeamento da área metropolitana e a visão in-
tegrada do território, promovendo o desenvolvimento urbano da
região metropolitana ou da aglomeração urbana. A isso se agrega
a tarefa de delimitar as áreas com restrições à urbanização em ra-
zão da proteção ao patrimônio ambiental ou cultural, assim como
as áreas sujeitas ao controle especial pelo risco de desastres natu-
rais. Isso pressupõe a articulação com os órgãos ambientais e de
patrimônio histórico existentes, e com fóruns de discussão como
os Comitês de Bacias Hidrográficas (BRASIL, 2015).
No caso do processo de elaboração do PDUI da Região Metro-
politana de São Paulo, coordenado pela Empresa Paulista de Plane-
jamento Metropolitano (Emplasa), o tema Gestão de Riscos foi con-
siderado como uma das estratégias para a Ação Metropolitana. Os
trabalhos da Câmara Temática Metropolitana para Gestão dos Ris-
cos Ambientais3 foram fundamentais para que esse tema fosse trata-
do de forma integrada com os outros aspectos abordados na questão
do desenvolvimento urbano metropolitano (EMPLASA, 2018).
3
A Câmara Temática, formada na 8ª RO do Conselho de Desenvolvimento da RMSP,
realizada em 25/11/2014, tem como finalidade articular os atores, tanto do poder públi-
co como da sociedade civil, promover e garantir o processo de articulação para gestão
de riscos ambientais urbanos (geológicos, hidrológicos, meteorológicos, climatológicos e
tecnológicos), alinhado às diretrizes e estratégias da PNPDEC (Lei Federal nº 12.608/12).

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Tomando a experiência do Grupo de Trabalho da Defesa Ci-


vil do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC e entendendo a
necessidade de uma articulação metropolitana para a Gestão dos
Riscos Ambientais Urbanos, reforçada pela alta vulnerabilidade
aos riscos e pelo grande contingente populacional, iniciou-se uma
mobilização entre os atores que atuam nessa temática a fim de
criar uma governança metropolitana a respeito do tema. Houve
uma força-tarefa que concluiu com a finalização do Caderno de
Propostas do PDUI aprovado pelos membros dos conselhos que
participaram e acompanharam o desenvolvimento do PDUI.
A principal proposta está centrada em um Plano Metropolita-
no de Gestão de Riscos Ambientais Urbanos que consiste no ins-
trumento que dará materialidade às diretrizes e estratégias para a
Gestão de Riscos Ambientais Urbanos na RMSP, e está organizado
em quatro programas: Programa 1, Produção de conhecimento e
identificação de riscos ambientais na RMSP; Programa 2, Preven-
ção e Mitigação de Riscos na RMSP; Programa 3, Atendimento a
Emergências e Manejo de Desastres na RMSP; e Programa 4, Co-
municação e Educação de Risco. Todos os programas dialogam de
alguma maneira com as estratégias de ação do PDUI que tratam
dos sistemas de áreas verdes e áreas protegidas; e do enfrentamen-
to da precariedade urbana e habitacional.

Proposições para uma gestão integrada e


participativa
Considerando que a Macrometrópole Paulista é um dos maio-
res aglomerados urbanos do Hemisfério Sul, trabalhar as questões
de governança nesse recorte territorial considerando os riscos am-
bientais urbanos consiste em grande desafio posto no Projeto Te-
mático Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face à
variabilidade climática. Acompanhar a elaboração, aprovação (por
lei) e implementação dos PDUIs de São Paulo, Campinas, Soro-
caba, Piracicaba, Santos, Jundiaí no que diz respeito às ações e
propostas que tratam dos riscos ambientais demonstra o fortaleci-
mento da construção de um processo da governança.
Porém, cabe ainda discutir a participação pública nos processos
de tomada de decisão para garantir a transparência e o acesso das

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informações para que os atores interessados possam se apropriar da


problemática e então se engajar e cooperar em direção às ações de
mitigação e/ou adaptação. Por isso, é fundamental a adoção de uma
nova estratégia de gestão integrada e participativa, que considere a
sociedade como protagonista tanto na tomada de decisão como no
controle social das decisões que serão implementadas. Isso demanda
um modelo de governança que permita a cooperação e a correspon-
sabilização para garantir o acesso a recursos comuns, como é a água.
A gestão integral dos riscos ambientais urbanos frente às mu-
danças do clima pode se apoiar numa gestão institucional e numa
governança organizadas em três eixos fundamentais: (I) a produ-
ção do conhecimento do risco, tendo como foco, para a MMP, a
água e seus fluxos e as microbacias como unidade de análise, para
aprofundar e consolidar um diagnóstico da vulnerabilidade hídri-
ca regional a partir de uma visão ecossistêmica dos aquíferos que
nos abastecem; (II) a implementação de medidas e estratégias para
a redução de riscos, o que compreende intervenções preventivas
ou prospectivas destinadas a evitar a instalação de situações de
risco (Prevenção), medidas e intervenções corretivas de situações
de riscos já instaladas (Mitigação), bem como a criação de meca-
nismos para o suporte legal das ações (Normas Técnicas e Legais)
e de instrumentos financeiros (fundos e seguros) para garantir
recursos para as emergências (Adaptação) e para a recuperação
pós-desastres (Transferência do Risco); e (III) o gerenciamento de
desastres e emergências, articulando atribuições dos organismos
de proteção e defesa civil, de saúde e de proteção social, com o en-
volvimento da população por meio de ações educativas e de gestão
do conhecimento dos riscos, para o aumento do seu protagonismo
nas emergências e da sua resiliência frente a desastres.
As iniciativas em curso buscam ampliar o diálogo sobre a cri-
se hídrica, a vulnerabilidade e as incertezas inerentes ao mode-
lo insustentável de sociedade que estamos construindo, e trazem
para a discussão dois pontos que merecem destaque: a possibili-
dade de atuação da sociedade por meio de ações organizadas e a
fragilidade do processo de governança atual. Quanto a isso, são
necessárias Plataformas de Redução de Riscos em todos os níveis,
ou seja, fóruns de debate e decisão que agreguem os principais
atores e instituições públicas, privadas e comunitárias no processo

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em discussão. Dada a fragilidade de grande parte dos municípios


brasileiros, recomenda-se a criação de fóruns regionais, nos Con-
sórcios Intermunicipais, nos Comitês de Bacias ou outras estrutu-
ras, que se organizem por cada um dos eixos fundamentais e que
se integrem em fóruns temáticos, como os de Habitação, Mudan-
ças Climáticas, Infraestrutura, Recursos Hídricos e outros.

Referências
BRASIL, 2012. Lei nº 12.608, de 10 de abril de 2012. Institui a Política Nacional de
Proteção e Defesa Civil (PNPDEC); dispõe sobre o Sistema Nacional de Prote-
ção e Defesa Civil (SINPDEC) e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil
(CONPDEC); autoriza a criação de sistema de informações e monitoramento de
desastres; altera as Leis nºs. 12.340, de 1º de dezembro de 2010, 10.257, de 10 de
julho de 2001, 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.239, de 4 de outubro de 1991,
e 9.394, de 20 de dezembro de 1996; e dá outras providências.
BRASIL, 2015 Lei 13.089/15, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da Me-
trópole, altera a Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras providências.
BRASIL, MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015a. Plano Nacional de Adap-
tação à Mudança do Clima. Vol. 1. Estratégia geral. Brasília: Grupo Executivo do
Comitê Interministerial de Mudança do Clima – GEx-CIM. 67p.
BRASIL, MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015b. Plano Nacional de Adaptação
à Mudança do Clima. Volume II: Estratégias Setoriais e Temáticas. Brasília: Grupo
Executivo do Comitê Interministerial de Mudança do Clima – GEx-CIM. 329p.
EMPLASA, 2018. Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado – Região Metropoli-
tana de São Paulo. Acesso em: 18 de outubro de 2018. https://www.pdui.sp.gov.
br/rmsp/?page_id=271
MARENGO, J.A.; SCARANO, F. R. (Eds.) Impacto, vulnerabilidade e adaptação
das cidades costeiras brasileiras às mudanças climáticas: Relat. Esp. do Painel Brasi-
leiro de Mudanças Climáticas. RJ: PBMC, COPPE/UFRJ, 184 p., 2016.
MARICATO et al. Crise urbana, produção do habitat e doença. In: SALDIVA, P.
et al. Meio ambiente e saúde: o desafio das metrópoles. São Paulo: Instituto Saúde
e Sustentabilidade, 2010.
NOBRE, C.; YOUNG, A. F.; SALDIVA, P. H. N.; MARENGO, J. A.; NOBRE, A.
D.; ALVES JR., S.; MOREIRA DA SILVA, G. C.; LOMBARDO, M. Vulnerabili-
dades das megacidades brasileiras às mudanças climáticas: Região Metropolitana de
São Paulo. São Paulo: INPE, NEPPO-UNICAMP, FMUSP, IPT, UNESP. Sumário
Executivo, 32 p. 2010.
RIBEIRO, S. K.; SANTOS, A. S. (Eds.) Mudanças climáticas e cidades. Relat. Esp.
do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. RJ: PBMC, COPPE-UFRJ, 2016.
SANTOS, M. O. 2018. Interpretando o Estatuto da Metrópole: Comentários so-
bre a Lei 13.089/2015. In: INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLI-
CADA. Brasil metropolitano em foco: desafios à implementação do Estatuto da
Metrópole. – Brasília: Ipea, 2018. Disponível em: < https://goo.gl/M8tnwA>.
Acesso em: 18/10/2018.

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C a p í t u l o 18

Reflexões sobre a adaptação


às mudanças climáticas na Zona
Costeira no contexto da
Macrometrópole Paulista
Leandra Regina Gonçalves1, Luciana Yokoyama Xavier1,
Marina Ribeiro Corrêa2 e Alexander Turra1

Palavras-chave: Gestão baseada em ecossistemas,


Impactos costeiros, governança costeira integrada

Introdução

A s mudanças climáticas (MC) equivalem a diversas alte-


rações ambientais que afetam variados processos so-
cioecológicos, em diferentes escalas espaciais e temporais e com
diferentes magnitudes. A Zona Costeira (ZC) destaca-se pela sua
importância na provisão de benefícios para o ser humano, mas
também por sua especial vulnerabilidade às MC dada sua sinergia
com os efeitos das atividades antrópicas em áreas marinhas e ter-
restres, tanto em nível local como regional.
Os principais efeitos das MC na ZC correspondem à eleva-
ção do nível relativo do mar (NRM), alterações nos regimes de
vento e de ondas, aumento na frequência dos extremos climáti-
cos de chuva e temperatura e diminuição do aporte sedimentar
das bacias hidrográficas. Eles podem resultar em riscos para o
bem-estar social, principalmente devido ao aumento da
erosão costeira, perda de propriedades e vidas, perda de biodi-
versidade, salinização de lençóis freáticos e aumento da vulne-
rabilidade socioeconômica.

1
Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP). FAPESP
2017/21797-5(LYX). FAPESP 2018/00462-8 (LRG).
2
Mestranda do Programa de Ciência Ambiental (PROCAM), Instituto de Energia e
Ambiente (IEE), Universidade de São Paulo (USP). FAPESP 2018/13238-9.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Esses riscos são amplificados pelos padrões de uso e ocupação


do território terrestre e marinho e já afetam comunidades costei-
ras, tendo previsão de intensificação nas próximas décadas (TUR-
RA; MAIA, 2015). Dessa forma, é necessário considerá-los em um
contexto de planejamento estratégico do desenvolvimento territo-
rial, promovendo medidas de adaptação que visem à diminuição
da vulnerabilidade socioecológica, sem comprometer a sustenta-
bilidade e resiliência dos ecossistemas e os múltiplos benefícios
derivados deles (TURRA; MAIA, 2015).
A Abordagem Ecossistêmica, ou Gestão Baseada em Ecos-
sistemas (GBE), propõe o planejamento de longo prazo, levando
em conta as conexões e interrelações entre as dimensões ecológi-
cas e sociais de um sistema socioecológico e como essas conexões
afetam o próprio sistema e os benefícios derivados dele (LESLIE;
McLEOD, 2007). Essa abordagem reconhece a dimensão política
do processo de planejamento em múltiplas escalas espaciais, de-
corrente dos valores humanos contemporâneos e interesses dos
diferentes grupos sociais, necessitando, portanto, dialogar com ou
aprimorar o sistema de governança vigente em dada região (CHA-
PIN III et al., 2010).
Este capítulo objetiva discutir, em especial, a promoção da
GBE na ZC, no recorte territorial da Macrometrópole Paulista
(MMP). Para tanto, apresentaremos a ZC da MMP e como ela vem
sendo impactada pelas MC, bem como as políticas e planos já exis-
tentes para lidar com o problema. Com base nesse cenário será fei-
ta uma reflexão visando orientar o processo de tomada de decisão
para desenvolver estratégias de adaptação da ZC da MMP às MC.

A Zona Costeira da Macrometrópole Paulista –


características, limites e definições
A ZC da MMP compreende o Litoral Norte Paulista (LNP) e
a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS) (Figura 1).
Ambas as regiões são afetadas pelos fluxos e pressões da Região
Metropolitana de São Paulo (RMSP) e demais aglomerados urba-
nos da MMP, que introduzem ou induzem atividades conflitantes
com a vocação natural da ZC paulista, provocando impactos locais
significativos (SANTOS; TURRA, 2017).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

A dualidade da ZC macrometropolitana expressa-se em sua


importância ambiental e econômica. Essa região abrange uma
ampla diversidade de ecossistemas, muitos dos quais inseridos em
Unidades de Conservação da Natureza (UCs), em conjunto com
ampla infraestrutura voltada à atividade turística, portuária, pe-
trolífera e industrial, com funções de destaque em nível nacional e
internacional.
Atualmente, os principais vetores de pressão sobre a ZC paulis-
ta estão relacionados à exploração e produção de petróleo e gás na
Bacia de Santos e à ampliação da demanda por setores industriais e
de serviços e obras relacionadas à expansão costeira. Essas pressões
influenciam diretamente os fluxos migratórios para a ZC, aumen-
tando a taxa anual de crescimento populacional na região, superior
à média estadual. Esse crescimento, associado a um modelo de tu-
rismo sazonal e degradador e a um ineficiente planejamento urba-
no, tem como principal consequência o agravamento de problemas
recorrentes, como ocupação irregular e precariedade na oferta de
serviços públicos principalmente associados ao saneamento, com-
batidos de forma pouco coordenada e ineficaz pelo poder público.

Figura 1
Recorte territorial da Macrometrópole Paulista (MMP),
com destaque para a Zona Costeira.

Fonte: Elaborado por Guilherme Leria (MACROAMB/FAPESP), 2018.

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Em um cenário de MC tais problemas tendem a ser amplifi-


cados e a aumentar a vulnerabilidade da ZC macrometropolitana
(Figura 2) (PBMC, 2016). Para a RMBS, por exemplo, há registro
de aumento da frequência e magnitude de ventos e ressacas, da al-
tura das ondas que atingem a costa, e da altura relativa do nível do
mar em uma média de 1,2 mm.ano -1 (PBMC, 2016). Com as MC,
os perigos naturais irão se intensificar, afetando estruturas como
portos e marinas, moradias, equipamentos turísticos e reduzindo/
ameaçando a provisão de bem-estar social provido pelos ecossiste-
mas costeiros para a ZC e toda a MMP.
Nesse contexto, o desafio é propor estratégias de adaptação
visando à sustentabilidade desse recorte territorial da MMP e não
de forma isolada dentro de suas partes.

Figura 2
Vulnerabilidade da costa paulista às mudanças climáticas,
considerando riscos naturais, sociais e tecnológicos, com detalhe
para a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS),
onde os maiores índices são registrados (Adaptado de NICOLODI;
PETERMANN, 2010).

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Políticas e planos para a adaptação climática


costeira no Brasil
A adaptação às MC é uma agenda em implementação no
Brasil e um grande desafio dada a extensão de sua ZC, o número
de cidades em situação de alta ou muito alta vulnerabilidade, as
desigualdades regionais e a limitada capacidade de adaptação
(PBMC, 2016). Todos os 17 estados costeiros brasileiros sofrem
com perigos naturais que podem ser ampliados com as MC, no
entanto poucas regiões iniciaram ações efetivas e estruturantes
para combatê-las.
Em nível nacional, as discussões e ações de adaptação às MC
para a ZC estão amparadas pelo Plano Nacional de Adaptação à
Mudança do Clima (PNA) 3. O PNA (Portaria MMA 150/2016) é
um instrumento elaborado pelo governo federal em colaboração
com a sociedade civil, setor privado e governos estaduais visando
promover a redução da vulnerabilidade nacional às mudanças do
clima e realizar uma gestão do risco associado. O PNA tem um ca-
pítulo setorial específico que busca identificar a exposição atual da
ZC brasileira à mudança do clima, inclusive os principais impactos
e vulnerabilidades relacionados, indicando diretrizes e ações ne-
cessárias à promoção de sua resiliência climática.
Algumas diretrizes do PNA relacionadas à ZC são, por sua
vez, materializadas por meio do Programa Nacional para a Con-
servação da Linha de Costa (Procosta), um programa permanente
de planejamento territorial e gestão da ZC (Portaria Nº 76/2018)
que tem como objetivo gerar dados em escala nacional e com-
preender a atual situação na ZC com relação aos impactos das MC,
visando propor possíveis alternativas de mitigação e adaptação
para dar subsídios a estratégias locais. Do mesmo modo, o Guia
de Diretrizes de Prevenção e Proteção à Erosão Costeira auxiliará as
estratégias locais ao evidenciar as diferenças entre alternativas e
obras para a proteção costeira, descrevendo desde o processo para
escolha até os ritos de processo de licenciamento e regularização.
Esse guia tem como premissa a utilização de intervenções mais sus-
tentáveis, demonstrando que as obras na linha de costa, tanto as

3
http://www.mma.gov.br/clima/adaptacao/plano-nacional-de-adaptacao. Acessado
em: fevereiro, 2019.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

mais simples quanto as de maior magnitude, devem ser precedidas


de protocolos que garantam efetividade, longevidade e viabilidade
ambiental.
Em nível do Estado de São Paulo, a Política Estadual de
Mudanças Climáticas estabelecem o Zoneamento Ecológico-E-
conômico (ZEE) como o principal instrumento de ordenamento
territorial, que busca, com base em modelos locais de desen-
volvimento sustentável, disciplinar as atividades produtivas, a
racional utilização de recursos naturais e o uso e ocupação do
solo paulista. Considerando-se a MMP como uma nova unidade
de planejamento, faz-se necessário um detalhamento do ZEE
para a MMP, que considere toda a dinamicidade do território,
integrando suas orientações às diferentes escalas, municipal,
regional e macrometropolitana. Deve-se ressaltar ainda que o
planejamento do território costeiro deverá considerar o Projeto
Orla, que tem como objetivo compatibilizar, na gestão integra-
da da orla, as políticas ambientais, urbanas e do patrimônio da
União.
Ainda é imperativo considerar as diferentes políticas setoriais
que combatem as ameaças/estressores adicionais às MC, como
saneamento, resíduos sólidos, e outras que devem ser incluídas no
contexto da mitigação e adaptação às MC. Por exemplo, ambientes
menos impactados por estressores adicionais teriam, a princípio,
maiores condições de ter mais sucesso em lidar com as alterações
causadas pelas MC. Isso vale, inclusive, para UCs, de forma que o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação e a criação de UCs
efetivas podem ter um enorme papel como medida de mitigação e
adaptação às MC.

Reflexões sobre a adaptação às mudanças climáticas


na Zona Costeira da Macrometrópole Paulista
A adaptação às MC na MMP demanda inovações de governan-
ça, como a aplicação da GBE para a promoção de ações integradas
para a gestão costeira (Figura 3).
Antes de iniciar o processo é preciso identificar e engajar os
diferentes tipos de atores relacionados ao tema (Passo 0), buscan-
do criar o sistema de governança dentro do qual o planejamento

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

irá ocorrer. O risco é uma construção social, assim, para que a


necessidade de adaptação seja percebida é preciso despertar as
pessoas a ela, envolvendo-as no processo de planejamento. No caso
da MMP, é necessário envolver atores que não têm por base pensar
a ZC, considerando tanto seu efeito sobre ela quanto o efeito dela
sobre suas atividades.
O Passo 1 contempla um diagnóstico da situação, uma ava-
liação da vulnerabilidade costeira e análise de como os impac-
tos irão afetar suas comunidades, a provisão de bem-estar so-
cial pelos ecossistemas da região e a infraestrutura construída,
considerando seus efeitos nos benefícios gerados na MMP. A
avaliação da vulnerabilidade para as MC em regiões costeiras,
em geral, considera três fatores: a natureza e magnitude da va-
riabilidade e da mudança do clima, os recursos huanos e o ca-
pital natural que serão expostos e impactados pelas MC, e a
capacidade atual de adaptação das comunidades e ecossistemas
costeiros. Essa avaliação fornece as informações base para o
planejamento, devendo ser embasada no melhor conhecimento
disponível.
No Passo 2, a seleção de um curso de ação para tratar da vul-
nerabilidade climática envolve a identificação de metas de adapta-
ção e avaliação das mesmas. As áreas costeiras podem estar sujei-
tas a uma variedade de impactos climáticos e apresentam graus de
vulnerabilidade diferentes, sendo assim é imperativo priorizar as
ações. As principais categorias de ação comuns aos programas de
adaptação nas áreas costeiras incluem:

1) manter ecossistemas costeiros funcionais e saudáveis;


2) reduzir a exposição e a vulnerabilidade do ambiente;
3) fortalecer as estruturas de governança para a adaptação
costeira;
4) manter oportunidades de subsistência e diversificar
opções;
5) reduzir os riscos para a saúde e a segurança humana.

167
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Figura 3
Passo a passo para estabelecer estratégias de adaptação às mudanças
climáticas na ZC da MMP. Na primeira linha estão as orientações da
abordagem, na segunda linha uma explicação genérica e na terceira
linha sugestão de aplicação ao território da MMP (Adaptada de
USAID, 2009).

Um dos principais passos da abordagem é promover a integra-


ção de políticas e instrumentos para pensar a gestão da ZC e ma-
rinha (Passo 3). Diante das MC e do aumento de eventos extremos
nas cidades costeiras, o mapeamento de riscos e vulnerabilidades
precisa ser urgentemente inserido no planejamento e no orçamen-
to da União, estados e municípios. As estratégias de adaptação de-
vem ser entendidas como um desafio fundamental para a gestão
dos usos dos recursos costeiros e devem ser “integradas” às políticas
costeiras e setoriais em todos os níveis, bem como, no caso da MMP,
às políticas metropolitanas e estaduais, a fim de aumentar sua eficá-
cia (BRASIL, 2016). Algumas formas de promover essa integração
consistem em buscar: 1) políticas públicas em nível nacional ou re-
gional, 2) investimentos e projetos setoriais, e 3) iniciativas subnacio-
nais. No contexto da MMP, é imperativo que as discussões sobre Pla-
nejamento Espacial Marinho, criação de áreas marinhas protegidas,
bem como as metas estabelecidas no Plano de Ação Federal para a
ZC, e as iniciativas desenvolvidas no âmbitos dos comitês federal,
estaduais e municipais de gestão costeira e de bacias hidrográficas,
como o ZEE Costeiro, o Projeto Orla e os Planos de Bacia, incluam
medidas de adaptação às MC.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

O Passo 4 são os desafios de implementar as ações propostas,


que são variados e incluem lidar com as fragilidades político-institu-
cionais do sistema de gestão. Muitos desses desafios podem ser ante-
cipados e tratados nas etapas anteriores à implementação, à medida
que se tornem evidentes. As ações recomendadas incluem revisões
periódicas nos níveis nacional ou local para garantir que agências
governamentais e comunidades estejam cientes dos sucessos e fra-
cassos. Ao final, no Passo 5, é realizada a avaliação das medidas
propostas e implementadas. É o processo de revisar e analisar todos
os dados e informações relevantes para determinar se as ações pro-
postas estão atendendo às expectativas da sociedade e contribuindo
com a adaptação. É nessa fase que podem ser propostos ajustes ao
curso das ações, e que novos atores podem e devem ser envolvidos
no processo. Essa abordagem funciona como um ciclo adaptativo
aos fenômenos climáticos na ZC, que deve ser contínuo e dinâmico.

Recomendações para a tomada de decisão


É indispensável que o desenvolvimento da ZC seja pautado
pelo conhecimento científico e tecnológico, criando um planeja-
mento estratégico e integrado voltado a medidas de adaptação
frente às MC. O tema não é novo e já vem sendo discutido em
diversos fóruns internacionais desde a Rio-92, com a aprovação
da Convenção das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas4.
Uma forma de promover a adaptação às MC na ZC da MMP
passa por um processo de mudança de paradigma, no qual as po-
líticas devem ser integradas, os atores sociais apropriados envol-
vidos na tomada de decisão e a GBE incorporada. Para propor
estratégias de adaptação aos impactos das MC na MMP, tais como
inundações e erosão, é necessário identificar e envolver diferen-
tes instituições governamentais (municipais, estaduais e federais)
e não governamentais, pois os problemas são complexos e sobre-
põem competências legais dos órgãos públicos que atuam na linha
de costa ao longo das etapas de planejamento, implementação,
avaliação e monitoramento. Portanto, novos desafios em novas
4
UNFCCC Art 4 (e): “Cooperate in preparing for adaptation to the impacts of climate
change; develop and elaborate appropriate and integrated plans for coastal zone mana-
gement, water resources and agriculture, and for the protection and rehabilitation of
areas, particularly in Africa, affected by drought and desertification, as well as floods”.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

bases territoriais demandam arranjos de governança inovadores


que ainda necessitam ser desenhados e implementados no âmbito
da MMP que contemplem, entre outras mudanças, a aproximação
entre ciência e gestão.

Agradecimentos
Esta pesquisa foi realizada no âmbito do Projeto Temático “Gover-
nança Ambiental da Macrometrópole Paulista” da FAPESP (Número
2015/03804-9), e com as bolsas de pós-doutorado (LRG: 2018/00462-8;
LYX: 2017/217975), bolsa de mestrado (MC: 2018/132389) e a bolsa de
produtividade CNPq (AT: 309697/2015-8).

Referências
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USAID. Adapting to coastal climate change: a guidebook for development planners.
US Agency for International Development, Washington, DC., 2009.

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C a p í t u l o 19

O Nexo Água–Energia–Alimento
e os desafios da governança ambiental
da Macrometrópole Paulista
Vanessa Empinotti1, Leandro Giatti2 ,
Paulo A. A. Sinisgalli3 e Célio Bermann4

Palavras-chave: Intersetorialidade. Território.


Nexo. Governança ambiental.

Introdução

D esde 2009, promovido inicialmente nas reuniões do


Fórum Econômico Mundial e depois por organiza-
ções multilaterais como as Nações Unidas, o conceito do Nexo
Água–Energia–Alimento é apresentado como uma nova manei-
ra de promover a sustentabilidade (ARTIOLI, et al., 2017). Tal
proposta surge em decorrência do entendimento sobre as dinâ-
micas que definem o contexto global contemporâneo: a escassez
dos recursos hídricos é consequência da combinação de diver-
sos fatores, que influencia e é influenciada pela relação entre as
cadeias de provimento de alimento e energia. A ocorrência de
eventos extremos, como secas e inundações passíveis de relação
com as mudanças climáticas globais, altera a disponibilidade
dos recursos hídricos no espaço e no tempo e leva ao aumento
dos preços dos alimentos e da energia. Ao mesmo tempo, o cres-
cimento populacional e a melhoria da qualidade de vida levam
a um aumento de consumo de água, energia e alimentos, sendo
que o provimento desses recursos também deve ser considerado
como um desafio para a inclusão social de bilhões de pessoas

1
Universidade Federal do ABC (UFABC).
2
Faculdade de Saúde Pública (FSP)/Universidade de São Paulo (USP).
3
Instituto de Energia e Ambiente (IEE)/ Escola de Artes, Ciências e Humanidades
da Universidade de São Paulo (EACH/USP).
4
Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

que vivem em condições de escassez e vulnerabilidade (HOFF,


2011; AL-SAIDI et al., 2017).
Frente a essa realidade, o conceito do Nexo, além de conside-
rar as relações entre a sociedade, a economia e o ambiente ao lon-
go do tempo, chama a atenção para as interações entre uma área e
seu impacto direto em outras, na forma de compensações e contin-
gências – trade-offs (HOFF, 2011). Por exemplo, ações para garan-
tir a segurança hídrica também devem considerar seus impactos
sobre a demanda e produção de energia, assim como as pressões
similares nas cadeias de produção de alimentos, sobretudo dentro
um contexto de mudanças climáticas. Nesse sentido, o Nexo pro-
cura proporcionar uma análise interligada das interdependências
entre água, energia e alimentos, identificando relações intrínsecas
e possibilitando o reconhecimento de necessárias medidas volta-
das à superação de modelos de gestão tradicionalmente setoriais.
Assim, o conceito do Nexo também se corresponde com inter-
dependências entre políticas intra-setoriais e multiescalares com
o objetivo de reduzir os obstáculos no processo de tomada de de-
cisão, aumentar as sinergias e promover a segurança dos recursos
(ARTIOLI et al., 2017). No entendimento do Nexo, defendido pe-
los seus criadores, as ações responsáveis para atingir a sustentabi-
lidade estão baseadas principalmente em ferramentas econômicas
de mercado e na valoração da natureza. Essa abordagem vai ao en-
contro da ideia central de internalizar externalidades promoven-
do eficiência de mercado e garantindo o melhor uso dos recursos
naturais. Dessa forma, tendo como objetivo promover uma nova
estrutura para o desenvolvimento de políticas e ações com foco
na sustentabilidade. Nesse sentido, o investimento na sustentabili-
dade dos serviços ecossistêmicos levará à melhoria da qualidade e
disponibilidade dos recursos naturais, assim como o aumento na
eficiência do uso dos recursos naturais por meio de tecnologias,
inovações e regulações e, por fim, a integração dos mais pobres na
economia (HOFF, 2011). Mais uma vez, repete-se o olhar questio-
nável sobre a eficiência dos mercados como o paradigma da sus-
tentabilidade, associando aos serviços ecossistêmicos de provisão,
como água e alimento.
Tais características nos levam a uma reflexão dos problemas e
oportunidades que o conceito do Nexo nos oferece.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Uma reflexão crítica sobre o Nexo


Quando nos propomos a apresentar novos conceitos que le-
vem à sustentabilidade é importante reconhecer os desafios desse
objetivo. Ao mesmo tempo que o Nexo evidencia a associação no
trato da governança ambiental, impondo um diálogo entre setores
distintos como água, energia e alimento, há a manutenção de um
paradigma já conhecido. Tal reflexão torna-se componente-chave
para orientar as práticas de “boa governança”, na forma de instru-
mentos de mercado, infraestrutura e crescimento econômico para
combater a pobreza, assim perpetuando a cartilha neoliberal que
orienta as práticas de desenvolvimento predominante (GIATTI et
al., 2016).
Além de perpetuar a prática neoliberal de gestão dos recur-
sos naturais e de produção, o Nexo, como apresentado, não re-
conhece as desigualdades de acesso à água, energia e alimento
como componentes-chave a serem considerados na construção de
caminhos no sentido da sustentabilidade (BENSON et al., 2015).
Também observamos que o Nexo pode promover o retorno de
soluções abandonadas há mais de 20 anos, como a construção de
reservatórios de água de grande porte, visando à regulação pluria-
nual da disponibilidade hídrica, com foco na produção garantida
de energia (GALVÃO et al., 2015). Nesse contexto, há que se res-
saltar a recorrente dificuldade no reconhecimento dos múltiplos
usos da água para o abastecimento e irrigação, além dos impactos
a jusante decorrentes das restrições hídricas impostas por políti-
cas setoriais como a geração de energia (BOSSHARD, 2013; SCH-
NEIDER, 2013). Ou seja, uma política voltada para as soluções de
engenharia e infraestrutura cinza como uma tendência prevalente
desde décadas passadas.
Contudo, essas posturas desconsideram novamente os im-
pactos sociais e ambientais de obras desse porte e podem ocultar
dimensões de vulnerabilidade que se constituem justamente na in-
terdependência entre as cadeias de provimento de água, energia
e alimentos. Ou seja, há um risco de o Nexo ser aplicado apenas
em um sentido, considerando as componentes-chave da promoção
do desenvolvimento calcado no crescimento econômico, focando
em insumos de produção, que privilegiam o modelo tecnocrata e

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tecnológico como solução e desconsidera assimetrias de poder e


iniquidades.
Por fim, o conceito do Nexo não explica como a governança
intersetorial e multiescalar deve ocorrer e nem como aplicar essa
perspectiva de ação em escalas que vão além da macro e regional
(BENSON et al., 2015; ARTIOLI, et al., 2017). Além disso, mantém
um caráter voltado para as demandas de consumo e necessida-
des humanas, desconsiderando as pressões sobre os ecossistemas
e seus serviços e colocando em risco a preservação da biodiversi-
dade, posicionando assim a questão ambiental em segundo plano.

O Nexo como oportunidade


Por outro lado, o Nexo pode ser um conceito importante para
se pensar outras abordagens em associação com políticas públicas,
participação de atores sociais e sustentabilidade como elementos-
chave. Esses pontos são imprescindíveis se estamos tratando de
um processo de adaptação. Assim, o conceito norteador do Nexo
em si pode contribuir de forma positiva ao evidenciar e valorizar
as relações e processos que interligam ações de distintos setores,
em vez de dar atenção unicamente a resultados isolados. O reco-
nhecimento dessas interligações e suas consequências provoca um
rompimento com as perspectivas setoriais que prevalecem nos es-
paços de decisão e negociação. Ou seja, mais que ações isoladas, a
questão crítica é como as consequências de tais ações repercutem
sobre a disponibilidade e o acesso de diferentes recursos para di-
ferentes grupos sociais. Somos assim levados ao entendimento de
que a concepção do Nexo deve ser realmente capaz de suplantar
abordagens técnicas convencionais focadas apenas na escassez dos
recursos. Vale, portanto, sobrelevar as questões sociais implicadas
e a dimensão política do Nexo (CAIRNS & KRZYWOSZYNSKA,
2016; ARTIOLI et al., 2017).
Assim, se incluirmos nessa abordagem as dinâmicas sociais e
políticas, contribuindo para a reflexão sobre a tomada de decisão,
o conceito do Nexo pode dialogar com a prática do planejamento
territorial que tem por princípio o reconhecimento e promoção
das inter-relações e interconecções que definem um território.
Além disso, esse conceito torna-se emblemático para se pensar e

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planejar além do recorte setorial, promovendo novos arranjos que


levem a uma diversificação das atividades econômicas e que, ao
mesmo tempo, reconheça as especificidades de cada território e
suas heterogeneidades.
Nessas características de interação e territorialidades do
Nexo Água–Energia–Alimento há um fator relevante decorrente
das modificações das dinâmicas climáticas, que é a necessidade
de incluir o processo de adaptação. Se ampliarmos a resiliência
do Nexo através de processos de adaptação baseada em ecossis-
tema, as relações podem se tornar mais intensas, mas ao mesmo
tempo menos dependentes. A título de exemplo, se ampliarmos a
capacidade de produzir alimento que mantenha as funções ecos-
sistêmicas, poderemos proporcionar uma melhoria da regulação
hidrológica e, consequentemente, uma produção mais constante
de hidroeletricidade.
Tal reflexão nos leva a dar atenção à diversidade das dinâmi-
cas e arranjos que constituem os territórios, moldados por relações
que refletem as estratégias de garantia de acesso e controle sobre
bens, espaços e lugares (HAESBAERT, 2004). A reflexão a partir
do Nexo chama atenção para como tais relações também têm um
componente de ação e causa, onde escolhas, mesmo que setoriais
ou individuais, terão repercussão sobre outros e outras.

Os desafios de sua aplicação na escala da


macrometrópole
Dentro de um sistema urbano complexo e de dimensões co-
lossais como a Macrometrópole Paulista a aplicação da abordagem
do Nexo é desafiadora, porém, pode contribuir com uma transi-
ção paradigmática ao remeter a diferentes tipos de decisão contex-
tualizadas, tais como:

• compreender as cidades componentes e seus territórios na


perspectiva de ilhas de recursos, capazes de prover local-
mente algumas de suas necessidades em termos de recursos
inerentes ao Nexo (PERRONE et al., 2011);
• assimilar que as cadeias de interdependência entre água,
energia e alimentos transcendem escalas temporais e espa-

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ciais, mas que, todavia, podem encontrar possibilidade de


diálogo e gestão intersetorial nas escalas urbana, metropo-
litana ou macrometropolitana (GIATTI et al., 2016);
• reconhecer a perspectiva de vulnerabilidades inerentes às
compensações e contingências transetoriais do Nexo e, as-
sim, avaliar as chances de impactos intrínsecos nas cadeias
de água, energia e alimentos (HOWARTH et al. 2016);
• compreender a necessidade de contextualizar territorial-
mente e mediante aos fluxos de recursos o quanto qualquer
solução tida como “ótima” pode não ser necessariamente a
melhor para cada caso (WALKER et al., 2014).
• reconhecer as alterações nas dinâmicas climáticas que afe-
tam diretamente a disponibilidade de água e, consequente-
mente, o Nexo;
• promover processos adaptativos onde as interações entre o
Nexo sejam consideradas, em uma condição de alterações
das dinâmicas climáticas.

Assim, a análise da abordagem do Nexo Água–Energia–Ali-


mento, estruturada a partir da visão do Banco Mundial e desenvol-
vida na perspectiva das iniquidades e das ciências sociais (HOFF,
2011; ARTIOLI et al., 2017), proporciona uma possibilidade de
reflexão e de inclusão de outros elementos dessas interações para
pensarmos na governança ambiental de forma mais ampla. Ou
seja, funcionar como um mecanismo de promoção do manejo e
gestão de recursos capaz de abarcar a reflexão de diferentes atores
sociais, setores convencionalmente isolados, perspectivas e abor-
dagens, além da atuação do Estado.
Nesse sentido, partindo da análise do Nexo, cabe discutir quais
seriam os elementos capazes de responder a essas inter-relações e
dinâmicas que se reproduzem no território da Macrometrópole
Paulista, sob um olhar mais amplo do que água, energia e alimen-
tos meramente compartimentalizados. As práticas de governança
nesse sentido devem ser capazes de capturar e responder a essas
características e desafios, bem como promover um direcionamen-
to no sentido de adaptação às novas condicionantes ambientais.

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Capítulo 20

Mudanças climáticas, alterações


potenciais e estratégias de mitigação de
seus efeitos na biodiversidade
da Macrometrópole Paulista
Tiago S. Vasconcelos1

Palavras-chave: Biologia da conservação. Diversi-


dade biológica. Mata Atlântica. Modelagem de dis-
tribuição de espécies. Priorização de conservação
espacial.

Introdução: mudanças climáticas e biodiversidade

E m termos gerais, as chamadas mudanças climáticas glo-


bais atuais são caracterizadas pelo aumento médio na
temperatura da superfície do planeta de aproximadamente 0,85º
C em relação há 100 anos (IPCC, 2014). Essas mudanças climáti-
cas, junto com outros fatores de ameaça atual à diversidade bio-
lógica (e.g., conversão de habitats naturais, poluição e introdução
de espécies exóticas), são considerados os principais fatores que
têm levado à atual crise da biodiversidade, onde as taxas de perda
da biodiversidade e degradação dos ecossistemas ocorreram
mais rapidamente nos últimos 50 anos do que em qualquer
outro momento da história da vida na Terra (MILLENNIUM
ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005). Apesar de existir projeções
de aumento médio na temperatura global de mais 1,5º C a 2º C
até 2100 (IPCC, 2014), mesmo que a emissão de gases do efeito
estufa responsáveis pelo aumento da temperatura parassem hoje,
ainda assim observaríamos seus efeitos sobre a diversidade bioló-
gica devido à inércia do sistema climático (PECL et al., 2017), o

1
Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências, Departamento
de Ciências Biológicas, campus de Bauru, SP

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que torna urgente o estabelecimento de ações efetivas de conser-


vação para a proteção da biodiversidade em um mundo dinâmico
de mudanças climáticas.
Os organismos biológicos podem responder diferentemente às
mudanças climáticas. Isso ocorre porque os regimes climáticos têm
fator determinante sobre onde os organismos devem ocorrer. Em ou-
tras palavras, se o clima mudar para diferentes condições, os organis-
mos deverão exibir respostas adaptativas ou, se não forem capazes de
exibir essa resposta, tenderão a se extinguirem localmente. Dentre
essas diferentes respostas adaptativas, destaco o reconhecimento de
três categorias (BELLARD et al., 2012): a) fisiológica/comportamen-
tal; b) temporal; e c) espacial. A resposta fisiológica/comportamen-
tal envolve alterações metabólicas dentro das adaptações fisiológicas
que os organismos já têm e/ou modificações comportamentais, tal
como a alteração de dieta ou de picos de atividade diária. A resposta
temporal geralmente envolve alterações fenológicas ao longo do ano
em eventos vitais do ciclo de vida. Assim, alterações fenológicas po-
dem envolver períodos de florescimento, frutificação (em plantas) ou
migrações sazonais (em animais) para os períodos do ano com clima
mais favorável para os organismos de uma determinada espécie. Fi-
nalmente, a resposta espacial está relacionada com a capacidade de
os organismos se locomoverem no espaço para procurar, rastrear e
seguir por áreas climaticamente favoráveis para suas existências. As-
sim, existem amplos relatos e tendências de deslocamentos geográ-
ficos morro acima ou em direção aos polos para uma variedade de
animais e plantas como resposta às mudanças climáticas já existentes
(PECL et al., 2017 e referências internas).
Dessa maneira, se as populações não conseguirem exibir ne-
nhuma dessas três respostas potenciais para lidar com novas con-
dições climáticas, populações ou espécies irão se extinguir local-
mente ou globalmente (BELLARD et al. 2012). Dentro das três
categorias de respostas explicitadas, existe uma grande variedade
de respostas individuais e/ou conjuntas para ajudar os organismos
a lidar com as mudanças climáticas. No entanto, a velocidade e
magnitude das mudanças climáticas atuais estão ocorrendo relati-
vamente rápida, considerando a capacidade da resposta das espé-
cies, além do fato de existirem outras múltiplas ameaças adicionais
aos organismos que podem atuar em sinergia com as mudanças

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climáticas (BELLARD et al. 2012). Dessa maneira, estudos de base


relacionados com história natural e detalhamento da ocorrência
geográfica das espécies, associados a suas aplicações na biogeogra-
fia da conservação, se tornam urgentes para mitigar os potenciais
impactos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade.

Ferramentas para mitigar e minimizar os efeitos


climáticos sobre a biodiversidade
Minimizar os efeitos climáticos sobre a biodiversidade envol-
ve basicamente a execução de duas ações a serem tomadas pelos
indivíduos e/ou setores públicos: a) estimular atitudes de práticas
sustentáveis (e.g., reutilizar, reciclar e reduzir a exploração de re-
cursos naturais) que, em última instância, resultarão na redução
de emissão de gases do efeito estufa na atmosfera e, consequente-
mente, evitarão um aumento ainda maior da temperatura global
média para as próximas décadas; e b) entender como a biodiversi-
dade estará presumivelmente redistribuída em cenários de clima
futuros, e estabelecer decisões dinâmicas de conservação biológi-
ca considerando os diferentes cenários de clima. Irei focar basica-
mente sobre essa segunda alternativa, já que a primeira está rela-
cionada com ações sociais de mitigação que são mais detalhadas
nos outros capítulos deste livro.
Com o intuito de prever como os organismos devem estar
redistribuídos em cenários futuros de mudanças climáticas, os
pesquisadores fazem uso de ferramentas preditivas comumente
chamadas de “modelagem de distribuição de espécies” (ARAÚ-
JO; PETERSON, 2012). Essa metodologia geralmente estima as
preferências climáticas de uma dada espécie baseada nos seus
pontos de ocorrência conhecidos. Posteriormente, este chamado
nicho climático é então projetado em um envelope bioclimático
de interesse, tal como cenários futuros de mudanças climáticas.
No final, os pesquisadores terão um mapa com a predição de
áreas climaticamente favoráveis para a ocorrência de uma dada
espécie no cenário de clima de interesse (e.g., VASCONCELOS;
NASCIMENTO; PRADO, 2018). Aplicando essa metodologia
para espécies-específicas de apelo conservacionista ou para gru-
pos biológicos inteiros dentro de uma área de interesse, conser-

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vacionistas terão em mãos importantes informações sobre onde a


biodiversidade estará presumivelmente distribuída em diferentes
cenários de clima. Assim, localidades com alta ou baixa diversi-
dade biológica podem ser localizadas para diferentes períodos
futuros, sendo que localidades atualmente abrigando uma alta
diversidade biológica podem, não necessariamente, abrigar uma
diversidade tão alta assim no futuro (e.g., LEMES; LOYOLA,
2013). Dessa maneira, esforços de conservação específicos e di-
ferenciados dentro do espaço geográfico podem ser agendados
para um determinado período no tempo de acordo com as predi-
ções dos modelos de distribuição de espécies, aumentando assim
a efetividade na conservação da diversidade biológica e mitiga-
ção dos efeitos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade
(ALAGADOR; CERDEIRA; ARAÚJO, 2014).

Efeitos potenciais das mudanças climáticas sobre a


biodiversidade da Macrometrópole Paulista (MMP)
A região englobada pela MMP está inserida no domínio mor-
foclimático da Mata Atlântica (IBGE, 2012), havendo o predomí-
nio da floresta ombrófila associada a toda região costeira, flores-
ta ombrófila mista associada às regiões de altitude elevada (e.g.,
tipicamente encontrada no município de Campos do Jordão) e
a floresta estacional semidecidual mais associada às regiões in-
terioranas (e.g. região de Campinas sentido interior). Inúmeros
relatos na literatura mostram um consenso que as florestas om-
brófilas (incluindo a formação mista, de altitude) abrigam uma
elevada diversidade biológica, desde plantas, animais invertebra-
dos e vertebrados. Em contrapartida, áreas de floresta estacional
semidecidual apresentam uma biodiversidade reduzida devido a
características mais sazonais de temperatura e precipitação que
se tornam mais proeminentes nessas áreas (IBGE, 2012). No
entanto, considerando toda a MMP comparada com regiões da
Mata Atlântica de outros estados e/ou mesmo outras formações
vegetais (e.g., vegetação savânica do Cerrado, mais interioranas
do Estado de SP), a MMP abriga uma enorme biodiversidade.
Esta biodiversidade não inclui somente o alto número de espécies
por si só, mas também uma alta diversidade filogenética (i.e., alto

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número de espécies com diferentes histórias evolutivas) e alta di-


versidade funcional (i.e., alto número de espécies com diferentes
funções ecológicas na natureza).
Essa alta diversidade biológica considerando diferentes mé-
tricas ecológicas faz com que diferentes estudos (e.g., com dife-
rentes grupos biológicos ou com diferentes enfoques biogeográ-
ficos) recorrentemente identifiquem a região costeira do Sudeste
brasileiro, e nela incluída a área da MMP, como áreas prioritárias
para a conservação biológica da Mata Atlântica (e.g., LEMES;
LOYOLA, 2013; ZWIENER et al., 2017). Apesar de estudos pre-
ditivos sobre a potencial redistribuição de espécies englobando
a MMP em cenários de mudanças climáticas serem recentes e
envolverem poucos grupos biológicos, esses estudos basicamente
relatam previsões de perdas generalizadas na riqueza de espécies
por toda a extensão da Mata Atlântica, principalmente em conse-
quência de predições de redução de áreas climaticamente favorá-
veis às espécies nos cenários de clima futuros (e.g., ver Figura 3
de VASCONCELOS; NASCIMENTO; PRADO, 2018, além de re-
ferências internas). No entanto, apesar dessas previsões de perda
de espécies, a região Sudeste do Brasil (em específico a área da
MMP) é também recorrentemente identificada como abrangendo
áreas biologicamente importantes para a conservação da biodi-
versidade em cenários de clima futuros. Ou seja, são áreas que no
contexto da conservação biogeográfica da Mata Atlântica ainda
assim irão presumivelmente abrigar uma biodiversidade única e
de relevância ambiental em cenários futuros de mudanças cli-
máticas (e.g., LEMES; LOYOLA, 2013; ZWIENER et al., 2017).
Essas áreas estão especificamente localizadas dentro da MMP em
regiões de altitude, como a faixa costeira da Serra do Mar e, mais
interiormente, a Serra da Mantiqueira.
Considerando essa importância biológica, tanto para o tem-
po presente quanto para as predições de distribuição futura das
espécies, esforços de conservação reforçados para as áreas de al-
titudes da MMP são de extrema importância para garantir o le-
gado histórico-evolutivo presente na diversidade biológica dessa
área. Comparado com a existência das Unidades de Conservação
(UC) ao longo do Estado de São Paulo, a região da MMP está ra-
zoavelmente bem protegida devido às UC do Parque Estadual da

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Serra do Mar e algumas outras ao longo da Serra da Mantiquei-


ra. Essa proteção ambiental é relativamente facilitada em virtude
da topografia acidentada predominante na MMP, o que por sua
vez dificulta a ocupação e estabelecimento da população humana.
No entanto, áreas topograficamente menos acidentadas, e onde a
população humana é mais aglomerada formando os centros urba-
nos, também necessitam de atenção e planejamento ambiental nas
atividades de conservação. Para tanto, a identificação e estabele-
cimento de áreas de corredores ecológicos (em áreas topografica-
mente menos acidentadas) entre áreas maiores de UCs (em áreas
predominantemente montanhosas) é de extrema importância para
proteger de maneira efetiva a diversidade biológica da MMP como
um todo e evitar a extinção de espécies ocasionadas pela fragmen-
tação e desmatamento de habitat (MILLENNIUM ECOSYSTEM
ASSESSMENT, 2005). Dessa maneira garante-se o funcionamento
dos ecossistemas e conservação da diversidade biológica da MMP
e, em última instância, minimiza-se o impacto das mudanças cli-
máticas sobre a biodiversidade, o que, por sua vez, garante melhor
qualidade de habitat tanto para a biodiversidade quanto para a
população humana da MMP.

Agradecimentos
Pesquisas do autor sobre a influência de mudanças climáticas sobre
a biodiversidade foram financiadas pela Fundação de Amparo à Pes-
quisa do Estado de São Paulo (FAPESP: 2011/18510-0) e fazem parte
do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais
(PFPMCG).

Referências
ALAGADOR, D.; CERDEIRA, J. O.; ARAÚJO, M. B. Shifting protected areas:
scheduling spatial priorities under climate change. Journal of Applied Ecology, v.
51, p. 703-713. Doi: 10.1111/1365-2664.12230, 2014.
ARAÚJO, M. B.; PETERSON, A. T. Uses and misuses of bioclimatic envelope
modeling. Ecology, v. 93, p. 1.527-1.539. Doi: 10.1890/11-1930.1, 2012.
BELLARD, C., et al. Impacts of climate change on the future of biodiversity.
Ecology Letters, v. 15, p. 365-377, doi: 10.1111/j.1461-0248.2011.01736.x 2012.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Manual técnico da vegeta-
ção brasileira. Rio de Janeiro: IBGE, Brasil, 275p. 2012.
IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change. Climate Change 2014: Syn-
thesis Report. Contribution of Working Groups I, II and III to the Fifth Assess-

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ment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Available at:


www.ipcc.ch/report/ar5/syr/. 2014.
LEMES, P.; LOYOLA, R. D. Accommodating species climate-forced dispersal
and uncertainties in spatial conservation planning. Plos One, v. 8, e54323, 2013.
MILLENIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT. Ecosystems and Human Well-being:
Biodiversity Synthesis. Washington: World Resources Institute. 2005.
PECL, G. T. et al. Biodiversity redistribution under climate change: impacts on
ecosystems and human well-being. Science, v. 355, eaai9214, doi: 10.1126/science.
aai9214, 2017.
VASCONCELOS, T. S.; NASCIMENTO, B. T. M.; PRADO, V. H. M. Expected
impacts of climate change threaten the anuran diversity in the Brazilian hotspo-
ts. Ecology and Evolution, v. 8, p. 7.894-7.906, doi: 10.1002/ece3.4357. 2018.
ZWIENER, V. P. et al. Planning for conservation and restoration under climate
and land use change in the Brazilian Atlantic Forest. Diversity and Distributions,
v. 23, p. 955-966, 2017.

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C a p í t u l o 21

Adaptação baseada em Ecossistemas


para a Macrometrópole Paulista
Paulo A. A. Sinisgalli 1, Alexandre Igari1,
Wilson Cabral de Sousa Jr.2 , Camila Espezio de Oliveira2 ,
Marianne Frederick3 e Alberto Medici3

Palavras-chave: Adaptação baseada em Ecossistemas.


Macrometrópole Paulista. Serviços Ecossistêmicos.

A s mudanças necessárias para conter a alta da tempera-


tura na superfície da Terra, em decorrência dos gases
de efeito estufa provenientes das atividades antrópicas, não foram
implementadas de forma efetiva até o presente momento. Ou seja,
não se chegou a um consenso sobre quais seriam as melhores es-
tratégias para atimgirem-se as medidas mitigadoras mais relevan-
tes para garantir a homeostase planetária, através da redução das
emissões de gases pelas atividades econômicas. Restou-nos adap-
tar às novas condições.
Há diversas proposições de medidas de adaptação às mu-
danças climáticas baseadas em soluções de engenharia ou de tec-
nologias ortodoxas, como represas, diques, piscinões, cisternas,
sistemas de irrigação, quebra-mares e barreiras de contenção de
sedimentos, denominadas de infraestruturas cinza.
A adaptação às mudanças climáticas baseada na construção
de infraestruturas cinza pode auxiliar na melhora de alguns aspec-
tos da regulação dos efeitos adversos, como, por exemplo, controle
da vazão de água, ou seja, é focado em um aspecto específico.
Por outro lado, a construção de infraestrutura cinza acaba por
1
Universidade de São Paulo (USP). Trabalho desenvolvido no âmbito do Grupo 3
“A abordagem dos serviços ecossistêmicos na dinâmica da governança ambiental” do
Projeto Temático FAPESP “Governança Ambiental na Macrometrópole Paulista face
à variabilidade climática” – Processo 2015/03804-9.
2
Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
3
Colaborador MacroAmb/FAPESP.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

impactar outros elementos do ambiente, afetando o fornecimen-


to de outros serviços ecossistêmicos provenientes desse ambiente,
tais como os serviços culturais (benefícios intangíveis obtidos dos
ecossistemas) e aqueles derivados da conservação e restauração do
Capital Natural, como a biodiversidade, essenciais para o bem-es-
tar da humanidade.
Por outro lado, há uma outra abordagem na proposição de
medidas de adaptação denominada de Adaptação baseada em
Ecossistemas (AbE), que deriva do entendimento que o próprio
ecossistema é capaz de oferecer serviços valiosos à adaptação às
mudanças climáticas. Essas medidas aumentam a resiliência do sis-
tema. A título de exemplo, essas ações podem ser descritas como
recomposição ou restauração da paisagem original, tais como as
florestas ripárias, manguezais, restingas, veredas, outras formas
de vegetação em áreas alagadas (wetlands), e ainda em áreas geolo-
gicamente mais vulneráveis, como encostas e topos de morro, que
melhoram as condições do sistema (ICLEI, 2014).
A Adaptação baseada em Ecossistemas (AbE) se apoia na im-
plementação ou ampliação da infraestrutura verde, também cha-
mada de “infraestrutura natural” ou “soluções baseadas na natu-
reza”. Elas são capazes de atenuar os efeitos de eventos climáticos
extremos, como tempestades e secas, e elevação da temperatura,
na medida em que contribuem para a regulação dos ciclos hidroló-
gicos, controlando a recarga de aquíferos, protegendo nascentes,
assim como áreas com alto potencial de erosão e escorregamentos
de terreno, como áreas costeiras, estuarinas, encostas e topos de
morros, e reduzindo a formação de ilhas de calor. Assim, a infraes-
trutura verde contribui para a segurança hídrica, e consequente-
mente para o nexo entre água, alimento e energia, assim como
para a redução de vulnerabilidade de populações localizadas em
áreas com alto potencial de erosão e escorregamentos de terrenos,
tanto em áreas costeiras quanto em terrenos mais declivosos.
Além desses efeitos locais, a AbE pode ter desdobramentos
em escala muito ampla. A evapotranspiração de grandes blocos de
florestas tropicais, como a Amazônia, contribui para o transporte
de massas de ar carregadas de umidade para as regiões central e
sul da América do Sul, que regulam a pluviosidade e disponibi-
lidade hídrica nessas regiões. A ausência da floresta Amazônica

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

reduziria a resiliência de regiões como o Centro-Oeste brasileiro


à intensificação dos eventos climáticos extremos (MACHADO e
PACHECO, 2010). No outro extremo do espectro da AbE, peque-
nas áreas verdes urbanas contribuem, por meio de sombreamento
e absorção de calor no processo de evapotranspiração, de evapo-
transpiração, para amenização das ilhas de calor urbanas, além de
contribuir para a melhora da qualidade do ar.
A AbE contribui ainda com outros serviços ecossistêmicos, de-
rivados da conservação e restauração do Capital Natural, como a
conservação da biodiversidade, ciclagem de nutrientes, formação
de solos, polinização, dispersão de propágulos e outros serviços
essenciais para o bem-estar da humanidade.
A abordagem da AbE tem suas origens associadas aos avanços
na Ecologia de Ecossistemas nos anos 1970, que fundamentaram,
na década de 1990, esforços na gestão ambiental baseada em ecos-
sistemas. A AbE ambiciona implementar processos e práticas par-
ticipativas de gestão, com base nos conhecimentos sobre as bases
físicas, químicas, biológicas, funções ecológicas, processos termo-
dinâmicos dos ecossistemas e suas interações com a sociedade e
processos produtivos. Em 2009, o conceito de AbE foi incorporado
no âmbito da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), e na 10ª
Conferência das Partes, em Nagoya (COP-10), a AbE foi proposta
como contribuição para a estratégia de adaptação das sociedades
aos efeitos adversos da mudança climática (CDB, 2009).
A CDB conceitua a AbE como “uso da biodiversidade e dos
serviços dos ecossistemas para auxiliar as pessoas a se adaptarem
aos efeitos adversos das mudanças climáticas” (CBD, 2009, p. 19).
O processo participativo de gestão e a multiplicidade de efeitos en-
volvidos na AbE representam tanto virtudes quanto desafios para
essa abordagem. Comparativamente com os processos ortodoxos
de adaptação, baseados na implementação de infraestruturas cin-
zas, as relações de causalidade entre os investimentos em AbE e
seus efeitos são muito menos evidentes, pois envolvem a contabi-
lização de uma ampla gama de serviços ecossistêmicos associados
que vão muito além do objetivo inicial de adaptação às mudanças
climáticas (ICLEI, 2014).
Enquanto as intervenções de infraestrutura cinza têm cla-
ramente definidas a abrangência territorial e temporal dos seus

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efeitos, assim como uma relação clara dos custos envolvidos com
os objetivos atingidos, a implementação da AbE transcende tanto
temporalmente quanto espacialmente a perspectiva de benefícios
ambientais trazidos à sociedade.
Dessa forma, tomando-se isoladamente um dado aspecto de
adaptação, como o controle de eventos de enchente em grandes
metrópoles, a implementação de infraestruturas cinzas, como
canalização de corpos hídricos e construção de piscinões, têm
custos e benefícios bastante previsíveis. Comparativamente com
empreendimentos baseados em infraestrutura verde – como re-
composição de matas ciliares, conservação de zonas úmidas e
redução da impermeabilização urbana –, a infraestrutura cinza
pode mostrar, em primeira análise, vantagem quanto à eficácia
no cumprimento do objetivo específico de redução de enchentes e
eficiência no custo de implementação. Entretanto, na medida em
que são incorporados outros objetivos e escopos ecossistêmicos, a
comparação de eficácia e eficiência tende em favor das infraestru-
turas verdes.
A contribuição da AbE na manutenção de serviços ecossistê-
micos derivados da conservação e restauração do Capital Natural
pode mostrar, mesmo que a longo prazo, que o valor desses servi-
ços ultrapassa aqueles derivados da infraestrutura cinza. A conti-
nuidade e expansão dos projetos de AbE e o incentivo à participa-
ção público-privada nas discussões é essencial para o aumento da
percepção de que preservar é melhor do que mitigar, logo, manter
e ampliar infraestrutura verde torna-se mais vantajoso do que in-
vestir em infraestrutura cinza.
Nessa avaliação comparativa de efetividade, o desafio é defi-
nir e ponderar os benefícios trazidos à sociedade a partir de cada
uma das abordagens. Essa definição e ponderação pode envolver
a valoração ambiental, não necessariamente somente em termos
monetários, mas dos ganhos individuais e principalmente coleti-
vos de cada empreendimento proposto. Os serviços ecossistêmicos
que emergem das infraestruturas verdes muitas vezes comportam-
se como bens públicos ou ao menos comuns, e sua valoração envol-
ve a compreensão dos sacrifícios e benefícios trazidos à sociedade
como um todo (FARLEY, 2010).
O ferramental microeconômico de valoração econômica am-

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biental traz uma ampla gama de possibilidades para estimar os va-


lores monetários individuais e agregados dos serviços ecossistêmi-
cos e do Capital Natural (TURNER et al., 1994). Apesar do apelo
que a valoração monetária tem para a sensibilização da sociedade
e para o pragmatismo da tomada de decisão, ela implica em redu-
cionismo empírico à expressão monetária de valor e principalmen-
te em reducionismo moral e intelectual, ao conceber que é preciso
traduzir todos os serviços ecossistêmicos proporcionados pelo Ca-
pital Natural associados aos anseios da sociedade em efeitos mone-
tários para que se possa tomar decisões racionais de gestão.
Dessa forma, a justa comparação entre efetividade das in-
fraestruturas cinza e verde depende do claro estabelecimento
das expectativas sociais e ambientais sobre os objetivos a serem
alcançados.
O outro desafio crítico à AbE é a participação social nas de-
cisões. A gestão participativa evidencia as assimetrias de poder,
conflitos de interesses e disputas entre os atores sociais envolvi-
dos. A implementação de infraestruturas cinzas representa um
campo consolidado composto por atores públicos e privados.
Neste último grupo destacam-se as coalizões dominantes de
corporações dotadas de expressivo poder econômico e capital
social, que disputam a contratação de empreendimentos para
adaptação às mudanças climáticas junto ao poder público. Essas
coalizões permeiam suas disputas e influências sobre muitas ou-
tras contratações públicas, e esse subcampo da infraestrutura
cinza representa somente uma faceta dessas disputas. Assim, a
hegemonia dessas coalizões e seu capital social sobre o poder
público deixa pouco espaço para coalizões desafiantes emergen-
tes que advoguem pela infraestrutura verde.
A AbE enfrenta então desafios técnicos de estabelecer parâ-
metros consistentes de mensuração e comparação de seu de-
sempenho socioambiental com relação à infraestrutura cinza, e
também desafios políticos, de formar coalizões robustas o bas-
tante para romper o isomorfismo coercitivo e mimético (DIMA-
GGIO e POWELL, 1983) que a infraestrutura cinza impõem às
contratações públicas.
O isomorfismo, nesse caso, representa a tendência de que as
soluções encontradas para gestão e tomada de decisão fiquem cada

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vez mais semelhantes, tendendo em favor da infraestrutura cinza.


A coerção, resultante da assimetria de poder entre os atores sociais
é um vetor recorrente de isomorfismo nos campos sociais. Além
disso, em situações de incerteza, é mais recorrente reproduzir mi-
meticamente as soluções já dominantes no campo (DIMAGGIO
e POWELL, 1983). Nessa perspectiva, a AbE enfrenta condições
desfavoráveis quanto à coerção no campo e quanto à pretensa in-
certeza em relação as suas soluções para adaptação às mudanças
climáticas.
A Macrometrópole Paulista (MMP) possui muitas áreas vulne-
ráveis que necessitam de adaptação às mudanças climáticas princi-
palmente em suas porções urbanizadas. Tomando a vulnerabilida-
de das áreas sujeitas a inundações, temos que a maior parte delas
está na bacia do alto e médio Tietê. Mas há também as que estão
na bacia do Paraíba do Sul e dentre elas podemos citar o evento
que levou à destruição do centro histórico de São Luiz do Paraitin-
ga na estação chuvosa de 2009/2010.
Se tomarmos a vulnerabilidade da escassez hídrica, temos
que a maior parte da população urbana depende para seu abas-
tecimento de alguns grandes reservatórios que têm permanecido
com pouca disponibilidade de água nos últimos anos, o que tem
direcionado soluções de infraestrutura cinza para transposição
de águas de regiões cada vez mais distantes. O caso da Região
Metropolitana de São Paulo (RMSP) é emblemático: seu abaste-
cimento depende hoje, principalmente, de transposição de águas
das bacias do Piracicaba, Capivari e Jundiaí e também do reser-
vatório do Jaguari, na bacia do rio Paraíba do Sul. Esta última
abastece também, por meio de transposição, a Região Metropo-
litana do Rio de Janeiro. Há projeto para a expansão do sistema
a partir de importação de água da bacia do Ribeira do Iguape.
Por outro lado, não há investimentos proporcionais para amplia-
ção da infraestrutura verde que promovessem a manutenção dos
mananciais hídricos em períodos de estiagem, o que daria maior
resiliência ao sistema como um todo, além de gerar diversos ou-
tros serviços ecossistêmicos e benefícios socioambientais.
Outra vertente desta análise está relacionada ao nexo água-e-
nergia, como explorado por Souza Junior (2018), uma vez que há
uma coincidência da sobreposição de eventos de estiagem sobre

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reservatórios com múltiplos usos, envolvendo dentre estes o abas-


tecimento público de água e o provimento de energia elétrica. Nes-
sa relação há, inclusive, fatores de causa e efeito retroalimentados,
como é o caso do uso de energia elétrica pelo setor de saneamento
(energo intensivo), energia cuja geração pode sofrer restrições em
períodos críticos justamente pela demanda premente, e priorizada
por lei, do provimento de água.
Em suma, a AbE proporciona um direcionamento importan-
te no sentido de minimizar os efeitos das mudanças climáticas,
principalmente no tocante à Macrometrópole Paulista, que possui
grandes demandas por serviços ecossistêmicos e necessida ampliar
a sua resiliência.

Referências
CBD – Convention on Biological Diversity. Connecting biodiversity and clima-
te change mitigation and adaptation. Report of the Second Ad HocTechnical
Expert Group on Biodiversity and Climate Change under the Convention on
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191
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Capítulo 22

Agricultura, ruralidades e
adaptação na MMP
Arilson Favareto1 e Vanessa Empinotti1

Palavras-chave: Ruralidades. Macrometrópole


Paulista. Adaptação. Planejamento e Gestão.

Introdução

Mudanças climáticas são caracterizadas pela ocorrência,


em maior frequência e intensidade, de eventos extremos
como secas prolongadas e inundações. Tais fenômenos são conse-
quência das ações humanas, decorrentes principalmente das ati-
vidades produtivas e formas de geração de energia que elevam as
emissões de gases de efeito estufa. As fontes dessas emissões estão
presentes tanto em áreas urbanas como rurais e a sua produção res-
ponde ao sistema econômico e social planetário mantido por meio
de fluxos de pessoas, bens, capitais e a consequente exploração dos
recursos naturais. Medidas de adaptação às mudanças climáticas se
tornaram uma das principais estratégias apresentadas por organiza-
ções como as Nações Unidas para responder a essa nova realidade.
Por adaptação às mudanças climáticas entende-se um conjunto de
respostas aos impactos atuais e possíveis da mudança do clima, com
o objetivo de minimizar prováveis danos e, ao mesmo tempo, apro-
veitar oportunidades potenciais que surgem nesse contexto.
Uma vez que a problemática das mudanças climáticas é global
e consequência das ações desencadeadas pelos vários setores da so-
ciedade, é chave considerar medidas integradas e intersetoriais no
desenvolvimento de novas arquiteturas institucionais que possam
nortear práticas produtivas, modelos organizacionais e formas de
ação coletiva em direção diferente do modelo atual. Muito tem sido
dito na direção de criar vetores voltados a setores específicos como
1
Universidade Federal do ABC (UFABC).

192
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a geração de energia, o agronegócio, ou os transportes. Estas pági-


nas exploram um outro aspecto, complementar aos demais: aquele
que envolve as áreas rurais da macrometrópole, compreendendo-o
para além da mais tradicional perspectiva setorial, na qual ele é en-
tendido como espaço de realização de atividades agropecuárias ou
extrativas. Aqui se busca pensar o rural na macrometrópole como
espaço privilegiado de estratégias de adaptação às mudanças cli-
máticas justamente por sua multifuncionalidade, como espaço de
produção, mas também de vida, de conservação e de moradia. Isto
implica em tomá-lo não como oposto nem como extensão do urba-
no, mas como polo interdependente e relacional.
Nesse registro, é preciso reconhecer, de partida, que a adapta-
ção às mudanças climáticas nas áreas rurais das macrometrópoles
enfrenta três ordens de dificuldades. A primeira delas é de nature-
za cultural ou cognitiva: está relacionada às controvérsias em tor-
no das definições sobre o que, afinal, pode ser considerado rural,
que conteúdos o definem e, a partir disso, que políticas devem ser
a ele direcionadas e com qual ênfase. A segunda envolve aspectos
de economia política da dinâmica territorial desses espaços rurais:
quem são os agentes e interesses a serem mobilizados nas formas
de governança territorial. E a terceira diz respeito à dimensão ins-
titucional: os marcos legais que restringem a ação governamental
e as formas de incentivo e coordenação a eles associadas.
Com relação ao primeiro obstáculo, no senso comum, e mes-
mo em parte da literatura especializada, os espaços rurais são defi-
nidos a partir de apenas uma, ou no máximo duas de suas funções:
a produção agropecuária ou a conservação ambiental. No entanto,
ao longo das últimas décadas há novos fenômenos e uma crescente
importância de outras funções que tornam a gestão do rural no
interior ou nas bordas das metrópoles um problema ainda mais
complexo (FAVARETO, 2007; VEIGA, 2004). Entre elas pode-se
mencionar seu caráter de patrimônio cultural e paisagístico. Ou os
deslocamentos pendulares, tanto de agricultores que passam a re-
sidir em áreas urbanas e mantêm seus sítios nas áreas rurais, como
também, e inversamente, de populações que se deslocam dos cen-
tros mais populosos para residir mais próximo das amenidades na-
turais, em ambos os casos borrando as fronteiras clássicas desses
dois mundos, antes mais claramente apartados. Planejar ações de

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adaptação implica em criar iniciativas capazes de incidir sobre esse


conjunto de usos e funções, e não sobre apenas parte delas.
A segunda dificuldade, relativa a agentes e interesses que pre-
cisariam ser mobilizados na pactuação de formas de gestão e uso
dos espaços rurais, consiste no fato de que, coerente com a visão
mais tradicional apontada acima, os atores principais dos proces-
sos sociais rurais sempre foram os agricultores, suas famílias, suas
organizações. No rural metropolitano eles ainda são agentes im-
portantes, mas, é preciso reconhecer, são também cada vez menos
numerosos. Junto deles, há os planejadores urbanos e ambienta-
listas, que interpõem a pauta conservacionista. Há os agentes do
mercado imobiliário, pressionando pela conversão do solo rural
em solo urbano, diante de expectativas de valorização patrimonial
com a expansão da mancha urbana. Para além deles, há ainda ou-
tro grupo crucial: num contexto de mudanças climáticas, como
mobilizar a atenção e os interesses dos cidadãos dos grandes cen-
tros para o que se passa no seu entorno? 2
Episódios recentes, como a crise hídrica na maior região metro-
politana do Brasil, São Paulo, são exemplares de como esse diálogo
é mal feito. Naquela ocasião, os níveis alarmantes dos reservatórios
despertaram um intenso debate público que, no entanto, se restrin-
giu a aspectos técnicos, como a sazonalidade ou não da variação dos
índices pluviométricos ou a inexistência de obras de infraestrutura
capazes de interligar bacias ou aumentar captação (BUCKERIDGE
e RIBEIRO, 2018). Pouco foi dito sobre mudanças nos padrões de
uso e ocupação do solo ou, principalmente, sobre o aparato regu-
latório que incide sobre as áreas rurais do entorno da metrópole. É
como se o planejamento territorial – incluindo aí as relações entre
as manchas urbanas e seu entorno de características rurais – não
afetasse a disponibilidade hídrica. Fenômenos como esse tendem
a se tornar cada vez mais frequentes, intensos e, por isso mesmo,
dramáticos. Mobilizar esses interesses e negociar os conflitos ine-
rentes às perspectivas desse conjunto variado de atores será cada vez
mais importante na adaptação às mudanças climáticas.
A terceira dificuldade, como dito, é de natureza institucional.

2
A tese de doutorado de Galvão (2017) traz uma caracterização do rural no contexto
da Macrometrópole Paulista que permite visualizar, ao menos em parte, a heteroge-
neidade espacial que enseja essa dinâmica de atores e interesses aqui mencionada.

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Nosso marco jurídico – em especial a forma de definir o que é rural


e o que é urbano, e a atribuição de competências aos entes fede-
rativos – tornou-se profundamente obsoleto perante as mudanças
mencionadas acima. Ao longo do tempo as funções do rural para
o conjunto da sociedade mudaram do provimento de alimentos e
da liberação de mão de obra para as cidades, para aquilo que se
convencionou chamar de multifuncionalidade da agricultura e do
espaço rural. Isto é, em muitos casos, e esse é especialmente o caso
de áreas metropolitanas e suas adjacências, as principais funções
dos espaços rurais não estariam mais na produção agropecuária, e
sim na oferta de outros bens e serviços tão necessários ao mundo
urbano como o sequestro e estocagem de carbono, a paisagem mar-
cada pela rusticidade em oposição ao ambiente artificializado das
metrópoles, a sua função como área de mananciais cruciais para o
abastecimento de água. Estes aspectos deveriam ser evidentes para
formadores de opinião e tomadores de decisão. Infelizmente, não
é o que acontece. Esse movimento de mudança dos significados e
funções do rural não se fez acompanhar de correspondentes atua-
lizações nos marcos cognitivos e institucionais de ordenamento do
território. O momento atual é marcado por ambiguidades, como a
crescente percepção dos problemas ambientais em contraste com a
inércia e rigidez institucional. Daí a necessidade de problematizar e
buscar experimentações e ajustes no planejamento e gestão dos ter-
ritórios, de forma condizente com as características disto que a lite-
ratura vem chamando de “nova ruralidade” (WANDERLEY, 2000).
As próximas páginas buscam levantar questões que precisam
ser tomadas em conta nesse tipo de reflexão. A ideia central que se
pretende apresentar reside justamente aí, nessas ambiguidades e
contradições: é preciso passar do reconhecimento dos problemas
ambientais para um novo contrato social que reconheça essas no-
vas funções do rural. Isto exige uma mudança de paradigmas na
forma de conceber o que são os espaços rurais e quais são suas in-
terdependências com os espaços urbanos, de um lado; e de outro, a
tradução dessa nova visão em mudanças institucionais relacionadas
tanto à forma de classificação dessas áreas como, sobretudo, em
uma revisão dos instrumentos de planejamento a elas destinadas.
Para isso são abordados três tópicos principais. Primeiro, há
uma introdução breve sobre a complexidade e disfunção institu-

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cional que cerca a regulação dos espaços rurais no Brasil e uma


identificação de onde estão seus principais pontos obsoletos. Se-
gundo, é apresentada uma crítica às visões predominantes, entre
gestores públicos e entre a comunidade dos especialistas, tanto do
planejamento urbano como rural. Terceiro, por fim, são tecidas
algumas considerações em torno de uma agenda para tornar mais
efetivas as ações de adaptação às mudanças climáticas nas áreas
rurais da metrópole e seu entorno.

As velhas e as novas funções dos espaços rurais e a


obsolescência do nosso marco jurídico
Para entender a estrutura do problema que limita a capaci-
dade de se planejar e gerir de melhor forma as áreas rurais no
interior ou nas bordas das metrópoles é preciso começar pelo en-
tendimento do enquadramento jurídico desses territórios: como
eles são delimitados e quem pode fazer o que nessas áreas. Entre
as principais referências nos marcos legais, é importante desta-
car três instrumentos: o Estatuto da Terra, o Código Tributário, a
Constituição Federal.
A primeira delas tem nada menos do que meio século de exis-
tência – o Estatuto da Terra, promulgado em 1964 por meio da Lei
Federal nº 4.505/1964. Ali, em seu artigo 4º se afirma que imóvel
rural é o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua
localização, e que se destine à exploração extrativa, agrícola, pecuá-
ria ou agroindustrial, seja através de planos públicos ou de iniciativa
privada. Em artigo destinado a apresentar esse marco legal, Mariana
Mencio (2013) destaca que essa definição foi complementada pelo De-
creto 55.891/1965, que regulamentou o Estatuto da Terra e instituiu
em seu artigo 5º um acréscimo, reforçando que, no que diz respeito
à localização, não importa se tratar de imóveis situados “em períme-
tros urbanos, suburbanos ou rurais dos municípios”. Dois aspectos
chamam a atenção: a destinação do uso do solo (função da proprieda-
de) foi originalmente considerada mais importante que a localização;
mas entre os usos possíveis só se previa um tipo como justificativa
suficiente para ser considerado rural: o uso produtivo por meio de
atividades primárias, como a produção agropecuária ou extrativa.
A segunda referência legal é o Código Tributário Nacional, no

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qual, inversamente, se passa a adotar uma delimitação apoiada no


critério de localização. Ali se considera como urbano o imóvel lo-
calizado em zona urbana, e rural o imóvel localizado fora da zona
urbana, nos termos do artigo 32 do referido código. Uma exceção
foi introduzida com o Decreto-Lei 57/1966, definindo como
imóvel rural inclusive aquele localizado na zona urbana, desde que,
comprovadamente, fosse utilizado em exploração extrativa vegetal,
agrícola, pecuária ou agroindustrial. Sobre imóveis urbanos incide
o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), de arrecadação e
destinação municipal. Sobre os imóveis rurais, incide o Imposto
Territorial Rural (ITR), de arrecadação federal. Confirmando
esse critério, para fins de cobrança do ITR, a Lei 5.868/1972
determinou como imóvel rural aquele que se destinasse à produção
primária independente de sua localização, com área superior a um
hectare. Finalmente, A Lei 9.393,/1996 adotou como fato gerador
da tributação o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza,
localizado fora da zona urbana do município. Ali se consagrou o
princípio da localização como critério definidor, pois se considera
imóvel rural a área contínua, formada de uma ou mais parcelas
de terras, localizada na zona rural do município. Algo distinto,
portanto, do que vigora no Estatuto da Terra (MENCIO, 2013).
As definições anteriores se combinam no terceiro marco legal
– a Constituição de 1988. Ali, por sua vez, há dois componentes
que se precisa tomar em conta. Inicialmente, há uma definição
de urbano e rural, cuja formulação original vem dos anos 1930.
José Ei da Veiga (2002), mais de 15 anos atrás começou a chamar
a atenção para o fato de que a definição de rural ali existente é
meramente residual, atendo-se àquilo que não é considerado ur-
bano. E o urbano, por sua vez, é delimitado a partir de critérios
originalmente cunhados nos anos 1930 do século passado (De-
creto Lei 311/38), portanto oito décadas atrás. Na sua essência,
segundo essa definição, o rural é aquele espaço que não dispõe
de infraestrutura urbana como arruamento, acesso à energia elé-
trica e outros serviços e equipamentos antes só encontrados nas
cidades. Na Constituição de 1988 há outro dispositivo importan-
te: os regimes de propriedade fundiária reconhecidos. Eles são
de três tipos: as terras de direito privado, passíveis de destinação
à produção, porém subordinadas ao cumprimento de sua função

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social; as terras étnicas (indígenas e quilombolas), e as terras de


recursos ambientais contínuos. Todas os três regimes sob jurisdi-
ção da União. Aqui há definição de função social no uso da terra,
que deveria prevalecer ante o interesse privado na delimitação
dos direitos de propriedade. Porém, isso conflita com outra pas-
sagem na qual a Constituição garante o direito absoluto à pro-
priedade privada. Contradição nunca resolvida.
Quais são os problemas? Para começar, a realidade é mais
complexa do que essas formas de classificação acerca do que deve
ser considerado rural ou urbano. Os imperativos ambientais não
são mais restritos às áreas contínuas de interesse ambiental – re-
gime previsto na Constituição. Nas terras privadas e parceladas
de uso predominantemente produtivo há condicionantes que
precisam ser observados, como aliás, se reconhece em outros dis-
positivos legais como o Código Florestal3. Porém mesmo aí é de
se esperar que a União consiga garantir sua observância em um
contingente de mais de 4 milhões de estabelecimentos agrope-
cuários espalhados por todo o país, muitas vezes em locais de
difícil acesso? Ainda que em divisão de tarefas com os estados,
essa presença governamental ainda é frágil. Basta lembrar nos
efetivos das polícias ambientais, na presença quase insignificante
dos órgãos de assistência técnica e de extensão rural, ou na fra-
gilidade de processos de licenciamento ambiental e das ações –
algo dramaticamente exemplificado pelos episódios recentes de
Mariana e Brumadinho. Sem falar nos problemas relativos à au-
sência de instâncias de coordenação e de planejamento, restritas
aos raramente ativos Conselhos Municipais de Desenvolvimento
Rural e de Meio Ambiente, ou aos, aí sim mais ativos e de im-
portância efetiva variável, Comitês de Bacias Hidrográficas. Em
outras palavras, a responsabilização da União pelas áreas rurais e
o papel dos governos estaduais na gestão de políticas ambientais
trazem problemas quando se pensa nessa que é uma das funções

3
O Código Florestal, revisto em 2012, completa o arcabouço de regulação dos es-
paços rurais e, em certa medida, dialoga com parte dos problemas aqui apontados
quanto aos condicionantes ambientais no uso do solo rural. Mas ele nada diz sobre
as formas de classificação do que é rural e do que é urbano ou como se dão as com-
petências sobre o planejamento, gestão e uso desses espaços. Por essa razão não será
abordado aqui. Em função das mudanças recentes, há uma vasta literatura a respeito
que pode ser consultada pelos eventuais interessados.

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de importância crescente do mundo rural na sociedade contem-


porânea: a conservação ambiental.
Além desses aspectos, a maior mobilidade física e virtual,
as novas dinâmicas dos mercados de trabalho e imobiliário, e
a oferta de serviços e equipamentos sociais tornaram mais mo-
vediças e porosas as fronteiras entre o rural e o urbano. Como
mostram dados do Projeto Rurbano, dos anos 1990 (GRAZIA-
NO DA SILVA, 1999), em boa parte das unidades da federação
a maior parte das rendas de agricultores já não vinham mais
da atividade agropecuária e sim de atividades desenvolvidas in-
clusive em áreas urbanas. É crescente o número de membros
das famílias de agricultores que trabalham nas cidades e fa-
zem movimentos pendulares, muitas vezes diários. E também é
cada vez mais frequente o número de agricultores que moram
nos núcleos urbanos próximos e se dirigem diariamente para o
trabalho em suas lavouras. Essa população deveria ser classifi-
cada como urbana ou rural em tais circunstâncias? Na mesma
direção, uma vez que, nas áreas rurais das bordas das metró-
poles, a função de residência vinculada ao aproveitamento de
amenidades rurais é cada vez mais presente, faz sentido seguir
orientando os marcos legais e a ação pública dos municípios
pela separação hoje existente entre terras rurais para produção
primária e terras urbanas para moradia com provimento de in-
fraestrutura correspondente? A resposta é não. E quase todos
os lugares e sobretudo nas áreas metropolitanas, a estrutura, a
dinâmica e os fluxos de produção e de pessoas tornaram obso-
letos os instrumentos até aqui usados.
Não é por outra razão que o Brasil é um dos poucos países
que ainda seguem adotando uma divisão intramunicipal do que é
urbano e do que é rural. Na maior parte dos casos, na experiên-
cia internacional, as formas de classificação envolvem os campos
e as cidades com as quais estão em relação de interdependência.
Com algum atraso, o próprio IBGE começa a reconhecer isso e em
2018 disponibilizou uma classificação alternativa, mais condizente
com a literatura contemporânea e com a experiência internacional
(IBGE, 2017). Ajustes nas formas de classificação facilitariam
o processo de planejamento territorial, deixando a cargo de
autoridades locais a execução de instrumentos que incidem sobre

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um e outro polo, o rural e o urbano, a partir das necessidades e


interdependências recíprocas.

Quando o foco da polêmica está errado


A seção anterior sugere que as mudanças climáticas obrigam
a pensar o rural e o urbano por meio das suas inter-relações, e não
de separações estanques que não correspondem mais à realidade
demográfica, socioeconômica ou ambiental. Por exemplo, a neces-
sidade de produzir alimentos para abastecer os centros urbanos,
onde se concentra grande parte da população do país, pode inten-
sificar a abertura de novas áreas de plantio. Mudanças no uso do
solo e produção agropecuária estão entre os três maiores respon-
sáveis por emissões de gases estufa do país (OBSERVATÓRIO DO
CLIMA, 2019). O outro campeão de emissões de gases estufa no
Brasil, e com contribuição aumentando ano após ano, é o setor de
produção de energia. Os centros urbanos dependem da energia
gerada nas áreas rurais. O mesmo vale para a água, produzida e
armazenadas nas zonas rurais. Apesar disso, tais questões pouco
norteiam as reflexões e ações promovidas por planejadores e ges-
tores urbanos e rurais.
Na comunidade dos planejadores e gestores urbanos a proble-
mática da fronteira entre o rural e o urbano tem resultado numa
polêmica cujo foco está, em certa medida, equivocado. Tal discus-
são tem se concentrado, primordialmente, em torno do que deve
ser considerado solo urbano e quando, ou em que situações, deve
ser feita a regularização de áreas sob esse estatuto para, dessa for-
ma, passar a se tratar de um espaço sob jurisdição do poder pú-
blico municipal. Essa é uma visão desde o urbano, que traz para o
controle do poder público municipal as áreas anteriormente classi-
ficadas como rurais. Mas não é um enfoque relacional apoiado nas
interdependências entre os espaços rurais e urbanos, como seria
necessário para propiciar gestão mais integrada. Ao contrário, se
resolve o problema suprimindo um dos dois polos, o rural, artifi-
cialmente transformando-o em urbano.
Um episódio ocorrido em recente seminário que discutia esse
tema parece ser emblemático. Gestores públicos de uma grande ci-
dade estavam preocupados em como se comportar diante da contí-

200
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nua expansão da mancha urbana e, por conseguinte, com a supres-


são de áreas rurais que precisariam ser preservadas assim, de forma
a garantir algumas daquelas funções já mencionadas. Novas mora-
dias se instituíam nas franjas da mancha urbana, os moradores pas-
savam a reivindicar acesso à infraestrutura como energia elétrica,
saneamento, iluminação, asfalto. Ao prover esses serviços o poder
público alterava os atributos do espaço, conferindo-lhe característi-
cas que a legislação classifica como urbanas. Para prover tais servi-
ços, criava-se também a justificativa de estender o perímetro urbano
de forma a cobrar o IPTU que permita custear tais investimentos.
Resultado: diminuição da área rural e expansão da mancha urbana.
Qual a saída então? Questionado sobre como reagir diante desse
dilema, um urbanista teria dito: “Se não quer estimular a extensão
da mancha urbana, não expanda a infraestrutura a essas áreas”. No
dia seguinte, questionado sobre se essa seria uma solução razoável,
outro especialista, dessa vez da comunidade dos estudos rurais, res-
pondeu: “Poderia ser uma solução razoável para a preocupação de
conter a expansão da mancha urbana, mas seria condenável sob o
ângulo dos interesses da população que vive ali – para viver em
áreas rurais deve-se ser cidadão de segunda categoria, sem Internet,
iluminação pública, energia elétrica ou boas vias de acesso? No ru-
ral do século XXI isso não faz qualquer sentido”.
Por um lado, tem razão o urbanista, pois a simples extensão da
infraestrutura tipicamente urbana, que segue padrões de adensa-
mento e distribuição de equipamentos públicos específicos, cria in-
centivos para a valorização dos terrenos, especulação imobiliária e a
potencial conversão do espaço, mudando seus usos. Por outro, tem
razão o especialista em temas rurais, pois o maior incentivo para
que a população rural abandone suas áreas e venda seus terrenos
a especuladores é justamente a falta de infraestrutura. Em muitos
municípios interioranos a expansão da infraestrutura foi fator de
retenção da população rural original, e não o contrário.
Se esse viés acomete os planejadores urbanos, da parte dos
planejadores e gestores mais vinculados aos temas rurais também
há vieses, ainda que em sentido oposto. A agenda de pesquisas e
políticas públicas tem se concentrado em temas como a promoção
da agricultura urbana, sobretudo orgânica ou agroecológica, ou na
estruturação de circuitos curtos de comercialização que permitam

201
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gerar menos deslocamentos no transporte de alimentos e menor


artificialização nas formas de processamento, do produtor até seu
destino final, com tudo o que isso implica para a saúde humana e
o meio ambiente. Em recente evento realizado em Porto Alegre, a
III Conferência Internacional sobre Agricultura e Alimentação em
uma Sociedade Urbanizada, muita ênfase foi dada a esses temas,
mas quase nada se falou a respeito dos grandes mercados ou das
formas de regulação territorial. O resultado é que nunca tivemos
tanta produção orgânica, tantas iniciativas “do produtor à mesa”,
mas a emissão de gases estufa do setor agroalimentar continua
respondendo por praticamente a metade das emissões totais no
mundo, a produção convencional de commodities avança, o desma-
tamento idem. As mudanças climáticas não respeitam fronteiras.
Em síntese, pode-se dizer que não há uma “visão territorial” e
apoiada nas interdependências entre o rural e o urbano sendo posta
em funcionamento no campo do planejamento e da gestão urbana
e metropolitana, nem tampouco do planejamento e gestão do de-
senvolvimento rural. Há agendas urbanas com alguma preocupação
ambiental. Há agendas agrícolas com alguma preocupação alimen-
tar e ambiental. Mas tudo isso é pouco para engendrar formas de
gestão e uso do espaço coerentes com os necessários esforços na
direção da adaptação às mudanças climáticas.
Onde está a chave, então? De partida, em reconhecer que não há
“balas de prata”, soluções únicas que colocarão o problema em bons
termos, como muitas vezes se espera da regularização fundiária, por
parte dos planejadores urbanos, ou da agroecologia, por parte dos
planejadores rurais. É preciso admitir que para problemas complexos
são necessárias respostas igualmente complexas. A última seção, a
seguir, esboça um pequeno conjunto de temas que, longe de esgotar
as ações possíveis ou necessárias, traz sobretudo exemplos, cujo prin-
cipal intuito é sinalizar um sentido geral para uma agenda capaz de
fazer frente aos conflitos e contradições aqui apontadas.

Caminhos da adaptação às mudanças climáticas nas


macropetrópoles
Diz um ditado popular que o ótimo é inimigo do bom. Óti-
mo, nesse caso, seria uma revisão de aspectos do pacto federati-

202
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

vo, em especial naquilo que diz respeito às formas de definição


do que é rural e do que é urbano e às atribuições dos entes fe-
derativos. Ou, mais ainda, em atribuir outro estatuto às áreas
metropolitanas, com marcos específicos para seu planejamento
e gestão. Nos tempos atuais, algo nessa direção seria impensável.
Daí a necessidade de pensar em como minimizar as dificuldades
trazidas com a obsolescência do marco regulatório atual. Cinco
tópicos podem ser mencionados aqui como uma primeira aproxi-
mação a essa agenda.
Da agricultura urbana/periurbana e dos circuitos curtos
a uma agenda multitemática, envolvendo também as formas de
abastecimento dos centros urbanos e a conversão no uso do solo
rural – No caso de regiões metropolitanas, por mais bem sucedi-
das que sejam as formas de agricultura urbana e periurbana e a
estrutura dos circuitos curtos de comercialização, essas formas de
abastecimento ainda tenderão por muito tempo a serem minori-
tárias em função do grande contingente populacional. Valorizar
essas formas locais de produção e comercialização é fundamental,
tanto pela eficiência ambiental e energética como pela valorização
do patrimônio cultural e natural representado por boa parte das
áreas rurais do interior e do entorno das metrópoles. Junto disso,
é preciso estabelecer um planejamento logístico que torne mais
eficiente a infraestrutura de distribuição aos centros e estabele-
cimentos comerciais. Igualmente, os usos das áreas rurais para a
instalação e provimento de fontes renováveis de energia poderiam
e deveriam ser estimuladas por políticas públicas municipais, evi-
tando a conversão do uso do solo à simples habitação em moldes
urbanos, com alta densidade populacional e maior artificialização
do espaço, nos moldes dos grandes condomínios que vão se ex-
pandindo nas proximidades das principais rodovias que ligam os
maiores centros às áreas interioranas. Na experiência internacio-
nal é muito alto o grau de restrição e de regulação do uso do solo
no interior das áreas metropolitanas e em suas adjacências. Na Ma-
crometrópole Paulista um tema crucial diz respeito à conversão do
uso do solo rural. Extensas áreas, sobretudo no eixo leste, do Vale
do Paraíba, concentram pastagens degradadas e subutilizadas.
Elas poderiam ser objeto de conversão para uso florestal ou
para novas modalidades de uso e ocupação, produtiva, habitacio-

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nal ou conservacionista. No passado recente houve forte cresci-


mento de florestas plantadas voltadas ao provimento da indústria
de celulose, o que muitas vezes agravou problemas ambientais em
função do caráter de monocultura e da intensidade no consumo
de água subterrânea. Incidir sobre esses vetores é fundamental
numa perspectiva de não agravamento dos problemas ambientais
e de melhor gestão territorial.
Da regularização fundiária a instrumentos mais robustos de
planejamento e gestão – A regularização fundiária é fundamen-
tal. Mas ela é insuficiente para garantir o uso adequado dos espa-
ços rurais. Ainda prevalece uma visão inspirada no planejamen-
to modernista ou top down segundo a qual a normatização seria
suficiente para orientar o comportamento dos agentes a respeito
do que pode ou não pode, do que deve ou não ser feito. Tão ou
mais importante do que isso é se moldar uma estrutura de incen-
tivos e constrangimentos à ação dos agentes capazes de orientar
o comportamento individual na direção desejada. Por exemplo,
formas de zoneamento como a definição de Zonas de Interesse
Ambiental, com restrições de uso e incentivos a certas práticas de
conservação do meio ambiente e da paisagem, pode ser um instru-
mento útil. Mas o zoneamento tem que ser ponto de partida, e não
de chegada. A questão é definir, a partir dele, que instrumentos
complementares podem garantir a consecução dos usos desejados
para esse tipo de espaço – produção agrícola ou não e sob que
condições para não intensificar ainda mais o uso de recursos como
solo, água e florestas?; manutenção de cobertura vegetal original
ou sua recuperação e em que condições para favorecer os usos e
funções múltiplas do rural metropolitano?; moradia com infraes-
trutura adequada ou não e em que condições de forma a fazer com
que a habitação dos espaços rurais auxilie na conservação ambien-
tal? É preciso imaginar cenários de 20 a 30 anos e, a partir deles,
levar a sociedade local a contratualizar marcos legais e formas de
incentivo capazes de levar aos cenários desejados. Nessa questão,
o reconhecimento dos múltiplos usos que o rural oferece é chave
na elaboração de novas ferramentas de planejamento que mediam
os diferentes usos do solo.
Mais e melhores formas de coordenação – Um dos grandes
problemas das regiões metropolitanas é a ausência de formas efi-

204
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cazes de coordenação, tanto entre níveis de governo como entre


as prefeituras dos municípios que as compõem. Iniciativas que já
foram referências nacionais, como o Consórcio do Grande ABC,
passam por dificuldades. Instrumentos que precisariam ser forta-
lecidos e revigorados, como a Empresa de Planejamento Metro-
politano, estão sendo extintos ou desestruturados. Os Comitês de
Bacias Hidrográficas ainda são espaços dos mais promissores para
esse tipo de concertação. Nos últimos anos sua efetividade tem se
revelado muito variável e dependente da vitalidade das organiza-
ções que deles participam, ou da permeabilidade do poder Exe-
cutivo às decisões tomadas nessa instância. A arquitetura desses
fóruns participativos foi muito inovadora quando desenhada qua-
se três décadas atrás, mas também poderia ser objeto de aprimora-
mento. Entre as reflexões necessárias, é importante que os agentes
do Estado reconheçam os comitês de bacia como parte do seu ar-
ranjo institucional e que as suas decisões não sejam consideradas
como consultivas e sim deliberativas ou com poder de veto. Além
disso, as decisões na escala das bacias devem considerar não ape-
nas a gestão dos rios e reservatórios, mas também do uso do solo
que impacta diretamente a disponibilidade hídrica dessas áreas.
Por fim, é necessário melhorar a capacidade de enforcement das de-
cisões e as representações setoriais e de Estado, de forma a refor-
çar sua capacidade de contratualizar ações e uma visão de médio e
longo prazo das áreas metropolitanas, com especial atenção para
as interdependências entre os usos urbanos e rurais do espaço re-
gional. Aqui, reconstituir a capacidade de planejar e de pactuar
compromissos e contratos em médio prazo é o fundamental.
Inovar nos instrumentos de gestão e incentivo ao compor-
tamento cidadão e empresarial – Uma das faces mais sensíveis
das mudanças climáticas ao cidadão urbano se manifesta por meio
dos riscos aos eventos extremos como secas e inundações. Não por
acaso, o tema da crise hídrica tem resultado em inovações em polí-
ticas municipais voltadas à “produção de água”. Vários são os casos
que começam a surgir de iniciativas de reflorestamento ou paga-
mento por serviços ambientais em escala municipal, tendo em sua
base a recuperação de nascentes e a garantia de recarga das bacias
que abastecem os grandes centros urbanos. Essa prática tende a
crescer e é apenas um exemplo de como os municípios podem in-

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centivar práticas de consumidores e empresas que levem a sério as


articulações entre formas de geração de renda e conservação am-
biental. Dessa maneira, se fortalece a gestão e ação do município
em relação as suas áreas rurais, postura ainda incipiente no país.
Reforçar as capacidades estatais – Por último, mas não me-
nos importante, num momento em que as instituições voltadas à
conservação ambiental estão sendo acusadas de serem excessiva-
mente restritivas à atividade econômica, é preciso atuar na direção
contrária, fortalecendo e investindo pesadamente na formação de
capacidades estatais de fazer prevalecer o interesse comum e a ga-
rantia de bens públicos ante interesses de grupos sociais específi-
cos e mais influentes. Há uma vasta literatura sobre a inadequação
ou insuficiência de se utilizar somente instrumentos de mercado
para a gestão de recursos naturais e sobre o perigo de se tratar a
natureza como mercadoria. Ao mesmo tempo, é necessário trazer
a atenção para a necessidade de se produzir alimentos de uma
maneira que contribua para a conservação da água e do solo e
limite as emissões de gases estufa. Nesse contexto, a diversificação
da propriedade rural e o incentivo à transformação do rural em
um lugar de vida e moradia têm papel chave. Se hoje a tendência
é a mercantilização crescente dos recursos, é tarefa daqueles que
sabem e conhecem as consequências da degradação ambiental e
social denunciar e convencer a população a respeito dos efeitos e
dos custos de longo prazo desse tipo de escolhas.
Os cinco pontos anteriores não representam, isoladamente,
grande novidade. A Nova Agenda Urbana, pactuada na III Habi-
tat, realizada em Quito dois anos atrás já falava na necessidade de
harmonizar instrumentos e normas envolvendo a complementari-
dade entre o urbano e o rural. Mas fazia isso por meio de oito men-
ções no documento síntese ao “continuum rural-urbano”. É preciso
atenção: mais do que um continuum, há também descontinuida-
des e diferenças que precisam ser reconhecidas nos dois espaços,
sob pena de se pensar um deles como mera extensão do outro. O
Estatuto da Cidade também cita a necessidade de harmonizar o
planejamento urbano e o rural, mas só desenha instrumentos e
procedimentos para aquilo que diz respeito à cidade e ao urbano.
Agora é a Agenda 2030 e os Objetivos do Desenvolvimento Susten-
tável (ODS) que representam uma nova oportunidade para ir além

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das dicotomias que sempre marcaram o planejamento urbano e


o planejamento rural. Por detrás dos 17 ODS, mais do que um
apanhado de metas em um conjunto de dimensões isoladas, está
um convite a se pensar uma nova narrativa sobre como equacio-
nar dilemas inseparavelmente ambientais, econômicos, sociais e
institucionais. Apesar da reticência de muitos chefes de governo
em diferentes escalas, várias lideranças e organizações da socie-
dade civil, do setor empresarial, ou da burocracia governamental
têm se engajado na busca de soluções que permitam perseguir os
objetivos traçados nos Acordos de Paris. Quem sabe esta não é
uma oportunidade para se buscar compromissos de médio prazo
e, sobretudo, envolver as principais forças sociais, para além de cli-
vagens setoriais ou de mandatos do poder Executivo, desenhando
cenários e plataformas de iniciativas que possam levar a sua con-
cretização, ou ao menos a algo nessa direção. Há tempos em que
o mero ato de acreditar e de envidar esforços na direção de certas
utopias já possui um potencial transformador.

Referências
BUCKERIDGE, M.; RIBEIRO, W. C. Livro branco da água. A crise hídrica na
Região Metropolitana de São Paulo em 2013-2015. Origens, impactos e soluções.
São Paulo: Instituto de Estudos Avançados, 2018.
FAVARETO, A. Paradigmas do desenvolvimento rural em questão. São Paulo: Iglu/
Fapesp, 2007.
GALVÃO, R. F. P. O rural na urbanização paulista em contexto macrometropolitano.
Tese de doutorado. São Paulo: USP, 2017.
IBGE. Classificação e características dos espaços rurais e urbanos no Brasil – uma
primeira aproximação. Rio de Janeiro: IBGE, 2017.
GRAZIANO DA SILVA, J. O novo rural brasileiro. Campinas: IE/Unicamp, 1999.
MENCIO, M. Interfaces entre zona rural e urbana e o exercício da competência
municipal no âmbito da disciplina do uso e ocupação do solo urbano. BDM –
Boletim de Direito Municipal, p. 434-461, julho de 2013.
OBSERVATÓRIO DO CLIMA. http://www.observatoriodoclima.eco.br/ori-
gem-dos-gases-de-efeito-estufa-no-brasil/. Consulta em: 23/01/2019.
VEIGA, J. E. Cidades imaginárias – o Brasil é bem menos urbano do que se cal-
cula. Campinas: Ed. Autores Associados, 2002.
VEIGA, J. E. Destinos da ruralidade no processo de globalização. Estudos Avan-
çados, vol. 18, n. 51. São Paulo, 2004.
WANDERLEY, M.N.B. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades
avançadas – o rural como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e
Agricultura, 15, p. 87-145, 2000.

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Capítulo 23

Informação e formação: como a mídia


percebe e relata os eventos climáticos
severos na Macrometrópole Paulista
Pedro Luiz Côrtes1

Palavras-chave: Eventos Severos. Macrometrópole


Paulista. Mídia. Percepção.

Introdução

O papel da mídia na cobertura de problemas nas áreas ur-


banas, especialmente aquelas em desenvolvimento, vem
sendo objeto de estudo há um longo tempo. Schramm (1964) já
discutia o papel da mídia e a importância do acesso à informação
em países em desenvolvimento. Na década de 1970, Markham
e Mishra (1971) estudaram a comunicação de massa em favelas
urbanas e o papel da mídia nesse contexto. Ainda nessa década,
Barney (1973) discutia a importância da comunicação de mas-
sa na educação, complementando os processos de literacia por
meio de jornais, rádios, revistas e emissoras de televisão, além de
outros meios de comunicação. Esse papel seria referendado por
estudos posteriores de Wete (1988) e Corson (1995) e, mais recen-
temente, de Boykoff e Boykoff (2007), dentre outros.
O uso de novas formas e meios de comunicação e seu papel so-
cial foram estudados, ainda na década de 1970, por Golding (1974),
que reiterava a importância dos estudos sobre o papel da mídia –
tanto tradicional quanto daquelas então denominadas de novas mí-
dias – no desenvolvimento nacional. Gilboa (1979), em uma abor-
dagem similar, avaliava que os meios de comunicação de massa já
desempenhavam papéis importantes nos processos políticos. A par-

1
Escola de Comunicações e Artes (ECA). Instituto de Energia e Ambiente (IEE).
Universidade de São Paulo (USP).

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tir da década de 1980 os estudos focaram questões mais específicas,


como no trabalho de Strodthoff, Hawkins e Schoenfeld (1985) que
analisava o papel da mídia nos movimentos ambientalistas.
Ainda na década de 1980, Cathcart e Gumpert (1986) já ante-
cipavam um fenômeno cada vez mais atual de pessoas comuns com
uma câmera, que formam um novo paradigma de comunicação de
fatos. Ungar (1999), analisando a cobertura jornalística de eventos
climáticos nos EUA, revela que a intensidade de cobertura varia
conforme o tipo de fenômeno. Por exemplo, os episódios de secas
obtêm maior cobertura do que eventos relacionados ao aumento
de temperatura. Segundo o autor, apesar de os eventos extremos
terem obtido maior cobertura na TV americana, isso não se veri-
ficou na mídia estrangeira, reforçando uma cobertura mais local
desses eventos (UNGAR, 1999).
A partir deste século, a cobertura se intensifica e inclui algum
ceticismo em relação a determinados temas. Esse é o caso das mu-
danças climáticas na mídia americana, segundo estudo empreen-
dido por Antilla (2005). Conforme estudo de Boykoff e Boykoff
(2007), parte desse ceticismo advém do uso de uma linguagem mais
cautelosa em relação a temas ambientais, considerando probabi-
lidades que não levam a declarações inequívocas e precisas que a
imprensa tanto prioriza. Ainda nessa perspectiva, é fundamental
considerar a necessidade de traduzir os termos técnicos em uma
linguagem mais coloquial que seja compreensível para as pessoas
que não estão na área acadêmica (BOYKOFF e BOYKOFF, 2007).
Dentro das coberturas efetuadas neste século, começam a sur-
gir conotações políticas associadas. Esse é o caso da Índia, confor-
me estudo empreendido por Billett (2010), que cita o discurso do
“colonialismo de carbono” internacional. Esse discurso levaria a
uma redução do crescimento indiano e promoveria a criação de
uma “narrativa nacionalista” naquele país.

Comunicação, público, finalidade e linguagem


Para melhor entendimento da atuação da mídia na cobertura
de eventos severos, algumas questões sobre comunicação precisam
ser consideradas. Em primeiro lugar: “Quem é o consumidor final
do processo de comunicação de eventos severos?”. Não há nada

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mais genérico e potencialmente perigoso do que falar com o pú-


blico em geral. Dependendo do veículo de comunicação utilizado,
pessoas de diferentes regiões, níveis de renda e tempo de estu-
do estarão consumindo o que foi produzido. Haverá, certamente,
especialistas no assunto e outras pessoas que são completamente
leigas. Será possível encontrar pessoas com diferentes expectativas
em relação ao assunto (desde aqueles diretamente afetados até ou-
tros que estão totalmente alheios ao que acontece).
A segunda questão é: “Qual a finalidade da comunicação que
será emprendida?”. Em geral, a mídia tem um papel informati-
vo, mas sua atuação não se resume a isso. Análises, ponderações
e questionamentos podem ser feitos para ajudar o leitor/espec-
tador/ouvinte a formar sua opinião. A informação, nesses casos,
ganha mais estrutura e passa a constituir-se potencialmente em
conhecimento sobre determinado assunto. Há, também, o papel
de questionar o poder público a respeito do que tem sido feito para
solucionar determinado problema. Em casos como esse, o veículo
funciona como uma espécie de porta-voz da população. Depen-
dendo do fato, essas possibilidades se misturam.
Esse grau de estruturação e elaboração – não facilmente men-
surável – é que vai definir o nível de conhecimento que se pode
infundir no público. Exemplificando rapidamente, fornecer a evo-
lução do nível de um reservatório ao longo de um mês é uma in-
formação simples. Considerar essa mesma evolução dentro de uma
perspectiva histórica (o mesmo mês nos anos anteriores) permite
gerar um conhecimento que poderá indicar se estamos enfrentan-
do um problema. Contrapor isso com a palavra de um especialista
ajuda a referendar – ou contestar – a análise simples dos dados.
Cobrar do poder público o que vem sendo feito para evitar pro-
blemas no abastecimento dará voz às expectativas da população.
Prospectados o público e a finalidade, há uma terceira per-
gunta a ser efetuada: “Qual a melhor linguagem a ser emprega-
da?”. E isso pode ser um problema quando se trata de questões
mais técnicas muitas vezes associadas a eventos severos, como uma
seca prolongada ou uma enchente, por exemplo. É necessário tra-
duzir os jargões técnicos ou científicos para que o público em geral
possa compreender o que está sendo dito. Isso pode levar, entre-
tanto, a simplificações que podem desagradar os especialistas que

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compõem o público em geral. O conteúdo mais técnico ou cientí-


fico transmitido, especialmente quando de cunho mais analítico,
não irá agradar a todos aqueles versados no assunto, pois apresen-
tará simplificações que, embora facilitem o entendimento geral,
podem incorrer em erros e imprecisões.
O uso de analogias com situações mais usuais pode ser uma
estratégia a ser empreendida quando se busca explicar questões
técnicas ou científicas. O uso de imagens ou artes também é um
recurso importante. Isso poderá ajudar na formulação de um re-
sumo. Mas, há que ser sucinto e objetivo, entretanto. O espaço (ou
tempo) disponível é geralmente escasso. Há outras matérias dispu-
tando aquele mesmo espaço (ou tempo). Há termos que, uma vez
utilizados, passam a ser uma espécie de jargão para o público em
geral e ajudam muito no entendimento, apesar de alguma impre-
cisão em seu emprego. É importante lembrar que a imprensa em
geral não é um veículo científico ou técnico. Simplificações são,
por vezes, inevitáveis.
Tomando como exemplo a Crise Hídrica entre 2014 e 2016,
como explicar o que é Volume Morto? A analogia com o cheque espe-
cial gerou “cheque especial da água”, o que facilitou o entendimento
do público em geral, mas incorreu em uma imprecisão. Do ponto de
vista bancário, cheque especial é um recurso que pode ser utilizado,
embora isso não seja recomendável. O Volume Morto não foi previsto
como uma espécie de reserva técnica, como pretendeu o governo.
Ele se constitui, originalmente, em uma porção abaixo do ponto de
captação e destinada à acumulação de sedimentos. Isso permite que a
captação, efetuada acima do Volume Morto, seja de águas com menor
quantidade de sedimentos e mais facilmente tratáveis.

Questões multidisciplinares: a dificuldade de


percepção
As questões tratadas no tópico anterior mostram os desafios
para transmitir informações técnicas ou científicas para o público
em geral. Para a divulgação de assuntos ambientais (em que os
eventos severos se inserem), há complicadores que podem dificul-
tar não apenas a confecção da matéria, mas o seu entendimento.
Os temas ambientais são notoriamente multidisciplinares e trans-

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disciplinares, com um nível de relacionamento entre diferentes


áreas do conhecimento que pode tornar o entendimento – e a pro-
posta de soluções – algo complexo.
Há uma dificuldade natural de as pessoas perceberem os pro-
blemas ambientais na sua integralidade ou complexidade. Isso pode
levar a uma certa indiferença (sempre foi assim) ou a um reducionis-
mo (o problema não é tão importante). Não significa que as pessoas
tenham má vontade para com os problemas ambientais, mas diante
da falta de uma melhor compreensão, essas questões perdem rele-
vância e as questões cotidianas assumem o controle do dia a dia.
Essa dificuldade tem relação com a forma como o ensino fun-
damental (em sua segunda fase) e o ensino médio são ministrados.
Antes, porém, é necessário avisar que não se trata de um problema
exclusivamente nacional, mas provavelmente ocidental. Os alunos
acostumaram-se a encarar as diversas áreas do conhecimento como
caixas estanques e praticamente sem nenhuma comunicação entre si.
Mesmo quando essa comunicação poderia ser natural – e há diversas
situações para que isso ocorra – as diversas áreas do conhecimento
(traduzidas em disciplinas específicas) são tratadas como feudos. Não
há, no cotidiano da sala de aula, uma visão transdisciplinar.
Exemplificando, a Física raramente conversa com a Química.
Química poderia ajudar no entendimento de processos na Biolo-
gia, mas isso pouco ocorre. A Biologia até conversa com a Geo-
grafia, mas sempre de maneira comedida. Geografia e História
têm manifestado um maior inter-relacionamento, mas longe de ser
pleno. Português, valendo-se da História e Geografia, poderia aju-
dar a compreender – por meio das diferenças de linguagem nas
diversas regiões – os fluxos migratórios que forjaram a nossa cul-
tura e identidade. A Matemática, por meio de modelagens – não
necessariamente complexas – colaboraria para um entendimento
pleno dessas diferentes áreas. Infelizmente, pouco disso acontece
com as diversas disciplinas. Cada qual fica na sua gaveta.
Após anos de estudo em um modelo como esse, não há como
esperar que as pessoas – o público em geral – compreendam fa-
cilmente que as questões ambientais permeiam o nosso dia a dia.
Fica difícil entender que a construção de uma nova avenida (ou
sua ampliação) poderá levar as empresas para mais longe, até para
outra região. Isso ampliará a necessidade de deslocamento, o tem-

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po gasto no trânsito (reduzindo a qualidade de vida), levará a um


aumento das emissões (ampliando a poluição e gerando mais pro-
blemas de saúde), repercutindo no custo dos serviços públicos de
saúde (há uma correlação notória entre poluição do ar e número
de internações – SALDIVA, 2018). Essas correlações são pouco evi-
dentes, mesmo nas redações dos veículos de comunicação.
Quando se fala em mudanças climáticas, há uma repercussão
imediata, mas pouco explorada. O custo da energia elétrica vem su-
bindo por conta da seca prolongada em determinados reservatórios,
reduzindo a geração hidroelétrica. Para suprir a demanda, a gera-
ção termoelétrica tem sido utilizada mais intensamente. E essa é uma
energia mais cara, além de aumentar as emissões. A repercussão eco-
nômica das mudanças climáticas, diretamente no bolso do consumi-
dor, é algo muito pouco explorado. Mas, ela ajuda a dar a dimensão
do inter-relacionamento que essas questões podem atingir.

A dificuldade de pautar temas ambientais


Sensibilizar as redações para que os eventos severos sejam pau-
tados, não apenas factualmente, mas preventivamente, não é tarefa
fácil. Além da dificuldade natural de entendimento de como eventos
ambientais estão relacionados e apresentam um efeito disseminador
e multiplicador, há uma visão de que o discurso ambiental é aborre-
cido (ecochato). Isso está relacionado com a forma de comunicação
adotada, em algum momento, por ambientalistas. Há uma diferença
importante quando se fala para uma militância (seja ela política, am-
biental, religiosa etc.) e quando se quer atingir os não iniciados.
Os militantes comungam de princípios e ideias similares, tor-
nando a comunicação mais simples e objetiva. Não há a necessi-
dade de convencer alguém a aderir a uma causa. Pode haver a
necessidade de reforçar alguns princípios ou práticas, mas isso é
feito a partir de um patamar comum. Por outro lado, quando se
pretende despertar o interesse de uma pessoa não iniciada para
uma causa, não é possível utilizar o mesmo discurso empregado
com a militância. Isso não vai funcionar pela inexistência de uma
base comum entre os interlocutores.
Quando as pessoas insistem em utilizar o discurso militante
para o não militante, logo percebem que isso não funciona. O erro

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comum, nesses casos, é exagerar na argumentação. Friedrich He-


gel dizia “quem exagera o argumento, prejudica a causa”. Cria-se
uma urgência no discurso que não se verifica na prática. O discur-
so cai no vazio e o não militante não adere à causa. Na temática
ambiental tem-se o discurso ecochato.
Diante da dificuldade de entender a complexidade, o inter-re-
lacionamento e a extensão das causas ambientais, e diante de um
discurso ecochato, fica difícil sensibilizar as redações. Verifica-se,
então, um fenômeno frequente: veiculam-se os problemas apenas
quando eles são mais evidentes ou mais urgentes, não se trata do
assunto de maneira preventiva.
Um exemplo poderá ajudar a explicitar essa situação. Antes, é
necessária uma explicação sobre o clima. Em 2017, por conta da fase
La Niña do fenômeno ENSO (El Niño – Southern Oscillation), a pri-
mavera e o verão foram mais secos e frios na região da Macrometró-
pole Paulista. Essa situação perdurou até meados de 2018, quando o
La Niña cessou e durante alguns meses predominou a chamada fase
neutra do fenômeno ENSO. Nesse período já se prognosticava que a
fase El Niño ocorreria (PLUMMER, et al., 2017).
Com a fase neutra e com o El Niño já se previam uma prima-
vera e um verão mais quentes e com mais chuvas (embora irregu-
larmente distribuídas) do que em 2017-2018. Isso criaria mais con-
dições para maior proliferação do aedes aegypti, vetor de doenças
como dengue, zika e chikungunya. No final de setembro, foi emi-
tido um boletim de alerta a dezenas de jornalistas, mas não houve
repercussão. Uma jornalista comentou que, infelizmente, não seria
possível – naquele momento – preparar uma matéria sobre isso,
pois estavam focados nas eleições.
Encerrada a segunda fase do período eleitoral, essa mesma
jornalista preparou uma matéria importante e que evidenciava um
aumento dos casos de dengue e chikungunya no país. Isso foi no
início de novembro. Ficam algumas questões pendentes. Caso a
matéria fosse elaborada um mês antes, vários casos não poderiam
ser evitados? Medidas preventivas não poderiam ter sido tomadas
– ou intensificadas – com a devida antecedência? Em um telejor-
nal, uma matéria dessas consumiria apenas cinco minutos, mas
poderia ser de grande ajuda.

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A estratégia de comunicação
Sobre o pensamento ambiental é possível traçar, de uma ma-
neira simplificada, uma linha que liga dois pontos opostos. Em uma
ponta situa-se o pensamento ecológico que assume que a natureza
tem, intrinsecamente, um valor que justifica e referenda a sua pre-
servação. É o chamado pensamento ecocêntrico. Na outra ponta
dessa mesma reta encontra-se a visão de que a natureza existe sim-
plesmente para servir à humanidade, que teria, portanto, direito de
dispor desses recursos para a satisfação de suas necessidades e dese-
jos. É o chamado pensamento egocêntrico (AMÉRIGO, GARCÍA e
CÔRTES, 2017; CÔRTES, DIAS, et al., 2016).
No meio dessa linha encontra-se o pensamento utilitário,
em que a preservação da natureza se justifica pela necessidade de
preservar recursos para o futuro, evitando sua depleção. Esses re-
cursos devem ser entendidos de uma maneira mais ampla e não
relacionados somente aos processos produtivos. Pode-se entender
que uma área deve ser preservada, pois ela é utilizada para fins de
lazer. O plantio de árvores em uma cidade pode ser incentivado,
de acordo com esse pensamento, pois elas fornecem serviços am-
bientais.
Por situar-se no meio caminho entre o pensamento ecocêntri-
co e o pensamento egocêntrico, a visão utilitária é a predominan-
te e mais facilmente aceita. Diante da dificuldade de pautar temas
ambientais nas redações, uma possível estratégia é amarrar essas
questões às repercussões econômicas. Embora isso nem sempre
seja possível, em alguns casos pode ser bastante útil. A perspectiva
é iniciar a abordagem de um problema ambiental pelas suas con-
sequências, em geral, econômicas.
Por exemplo, as alterações climáticas causam grande preocu-
pação entre os pesquisadores, assim como a necessidade de pre-
servação dos recursos hídricos, dos mananciais e do entorno dos
grandes reservatórios. Para aqueles que têm uma visão mais eco-
cêntrica, essa preocupação carece de justificativas. Mas, diante de
uma visão mais utilitária ou mesmo egocêntrica, as repercussões
econômicas ganham relevância.
Falar sobre as consequências, especialmente aquelas mais
afeitas ao dia a dia das pessoas, ou em aspectos econômicos que

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atingem a todos parece estratégia mais factível. Conta-se a história


do fim para o começo. Antes de falar sobre a necessidade de maior
arborização, aumento das áreas permeáveis, preservação dos rios e
cursos d’água, cuidados com a limpeza de ruas, é preferível iniciar
com as consequências que a falta disso (árvores, áreas permeáveis,
preservação de rios e limpeza urbana) pode causar: alagamentos
e enchentes, preferencialmente com dados numéricos sobre o que
ocorreu nos últimos anos.
Evidencia-se, por meio de dados numéricos, que o problema
persiste em várias regiões de cidades que compõem a Macrometró-
pole Paulista (é claro que isso também se aplica a outras regiões que
sofrem do mesmo problema). Procura-se mostrar, havendo dados
disponíveis, as consequências econômicas e sociais: danos causados,
investimentos realizados (mas que não surtiram efeito), número de
pessoas afetadas. A partir do final da história (as consequências)
discorre-se sobre as soluções que poderiam ser desenvolvidas.
Isso é possível mesmo antes que esses eventos aconteçam.
Com a proximidade da primavera e do verão, período chuvoso
na Macrometrópole Paulista, alertas podem ser divulgados para
a imprensa. Recomenda-se que isso seja feito no início da prima-
vera para que haja algum tempo para medidas preventivas (como
limpeza de galerias de águas pluviais e desobstrução de córregos
e rios). O incentivo a campanhas educativas que priorizem uma
gestão adequada de resíduos e a discussão de políticas públicas
podem ser temas que peguem carona nesses alertas.
Analisar as previsões climáticas para os próximos meses e
acompanhar a evolução dos mananciais que abastecem uma deter-
minada cidade ou região é sempre útil e importante. Alertas so-
bre níveis anormalmente baixos poderão ser enviados às redações,
antecipando-se a possíveis crises (CÔRTES, TORRENTE, et al.,
2015). Isso ajudará na divulgação de temas que vão desde a neces-
sidade de preservação de mananciais, nascentes e matas adjacen-
tes até o uso racional da água, uso de água de reúso ou captação
de água da chuva.
Temas como alterações climáticas e aquecimento global estão
fartamente disponíveis em bases indexadoras de periódicos cientí-
ficos, que podem fornecer material de qualidade para fundamen-
tar determinadas explicações. A mídia tem se preocupado com isso

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

das mais diversas maneiras e abordagens (POBEREZHSKAYA,


2018; PAINTER, KRISTIANSEN e SCHÄFER, 2018; MOLONEY
et al., 2014; SCHMIDT, IVANOVA e SCHÄFER, 2013). Os rela-
tórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
constituem excelente material que pode ser utilizado para explicar
as consequências das mudanças climáticas.
É necessário persistência, e sempre que possível, constância
nesse tipo de divulgação. Não dá para acreditar que um simples
boletim – divulgado por uma ONG, uma instituição de pesquisa
ou um pesquisador isolado – vá gerar repercussão imediata. Isso é
raro acontecer, embora seja possível. Mas, com boletins frequentes
sendo divulgados para jornalistas e redações, é possível – ainda
que lentamente – conseguir alguma repercussão. Na medida em
que uma fonte é mencionada por um veículo de comunicação, ou-
tros tendem a repercutir a mesma fonte.
A persistência e a estratégia adequada poderão gerar um ci-
clo virtuoso de divulgação de informações ambientais, permitindo
que temas importantes sejam discutidos cotidianamente. É sempre
importante reforçar a necessidade de estratégia de comunicação e
manter a perseverança.

Referências
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climate change. Global Environmental Change , p. 338-352, 2005.
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

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C a p ít u lo 24

Panorama brasileiro sobre adaptação


às mudanças climáticas no contexto
de áreas urbanas
José A. Marengo1

Palavras-chave: Adaptação. Vulnerabilidade. Resi-


liência. Áreas urbanas.

Bases conceituais

O Quinto Relatório de Avaliação (AR5) do Painel Intergo-


vernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, da sigla
em inglês) (IPCC, 2013, 2014) concluiu que esse aumento de tem-
peratura é majoritariamente causado por ações humanas. O IPCC
reconhece que as pessoas pobres são as mais vulneráveis aos im-
pactos das mudanças climáticas. Efetivamente, uma das principais
conclusões do painel é que práticas que promovem o desenvolvi-
mento sustentável no presente – combinando justiça social, saúde
ambiental, e produtividade econômica – reduzem riscos futuros
impostos pelas mudanças climáticas e são, portanto, adaptativas.
Adaptação é o ajustamento nos sistemas naturais ou humanos
em resposta a estímulos climáticos ou reais ou os seus efeitos, o
que permite explorar oportunidades benéficas. Vulnerabilidade
é o grau em que um sistema é suscetível e incapaz de lidar com
os efeitos adversos da mudança do clima, inclusive variabilidade
climática e os extremos. A vulnerabilidade é uma função do
caráter, magnitude e taxa de mudança do clima e da variação
aos quais um sistema está exposto, sua sensibilidade e sua capa-
cidade de adaptação. Resiliência é a capacidade de indivíduos,
comunidades, empresas, instituições e cidades se adaptarem às
condições de mudança e manter ou recuperar a funcionalidade
e a vitalidade frente a estresses, choques e pressões crônicas, e
1
Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN).

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emergirem mais fortes. Capacidade de adaptação é a habilidade


de um sistema, instituição, pessoas e outros organismos de se ajus-
tar a um determinado dano, para aproveitar ou para responder
às consequências. Essas definições estabelecidas pelo IPCC foram
adotadas pelo Primeiro Relatório Nacional do Brasil sobre Mu-
danças Climáticas, publicadas pelo PBMC (2013) e no Relatório
Especial Mudanças Climáticas e Cidades (MARENGO et al., 2017).

Contexto de adaptação às mudanças climáticas


no Brasil
Há um reconhecimento crescente da importância das medi-
das de adaptação e sustentabilidade no nível local, pois é nessa
escala que se organizam vários arranjos institucionais, com vistas
ao enfrentamento dos perigos advindos das mudanças ambientais,
como aumento e melhoria de mecanismos fiscais voltados a esse
combate, e criação e/ou melhoria de estruturas que permitam
uma gestão coletiva e articulada em prol de um objetivo comum:
cidades mais resilientes com desenvolvimento sustentável.
O Brasil tem dado passos importantes nos últimos anos para
a formulação e implementação do Plano Nacional de Adaptação à
Mudança do Clima (PNA) (BRASIL, 2016a). O PNA foi publicado
em 2016 e tem por objetivo geral promover a gestão e diminuição
do risco climático no país frente aos efeitos adversos da mudan-
ça do clima, de forma a aproveitar as oportunidades emergentes,
evitar perdas e danos e construir instrumentos que permitam a
adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de in-
fraestrutura. Visa orientar iniciativas para a gestão e diminuição
do risco climático no longo prazo. O PNA está organizado em 11
estratégias de adaptação propostas para os setores e temas elenca-
dos como prioritários para o desenvolvimento sustentável do país:
Agricultura, Biodiversidade e Ecossistemas, Cidades, Desastres
Naturais, Indústria e Mineração, Infraestrutura (Energia, Trans-
portes e Mobilidade Urbana), Povos e Comunidades Vulneráveis,
Recursos Hídricos, Saúde, Segurança Alimentar e Nutricional, e
Zonas Costeiras. As estratégias discutem sobre as principais vul-
nerabilidades, lacunas de conhecimento, gestão de cada setor e
tema frente às mudanças do clima e apresentam as diretrizes para

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

a implementação de medidas adaptativas visando o incremento da


resiliência climática (BRASIL, 2016a).
No intuito de indicar medidas de adaptação respaldadas nas
estratégias do PNA e adequadas às necessidades e capacidades lo-
cais, faz-se necessário os ajustes da temporalidade desses estudos
ao horizonte temporal do Plano, 2040, e atualmente estão sendo
feitas as análises e estudos para atualizar esse plano.
O projeto denominado “BRASIL 2040: cenários e alternativas
de adaptação à mudança do clima” (BRASIL, 2016b) teve como
objetivo estimar como as mudanças climáticas afetariam os seto-
res econômicos em diferentes horizontes e sugerir estratégias de
prevenção e adaptação dos diferentes sistemas que poderiam ser
afetados. Os estudos foram desenvolvidos para subsidiar processos
relevantes no âmbito do PNA. Uma das etapas do estudo consistiu
na identificação de algumas medidas de adaptação ao cenário as-
sociado às projeções. Tais medidas envolvem estruturas caras (por
exemplo: barragens para armazenar água ou construção de diques
em zonas costeiras), mas contemplam também medidas mais sim-
ples como, por exemplo, sistemas de alerta de riscos, mudanças de
práticas agrícolas ou organização de grupos sociais.
A Plataforma AdaptaClima, sob coordenação e gestão do Mi-
nistério do Meio Ambiente (adaptaclima.mma.gov.br), foi lançada
em dezembro de 2017, e contribui para o alcance de um dos objeti-
vos principais do PNA: ampliação e disseminação do conhecimento
científico, técnico e tradicional; produção, gestão e disseminação
de informação sobre o risco climático e para melhorar a capacida-
de adaptativa do Brasil face à mudança do clima. Representa uma
plataforma de conhecimento em adaptação à mudança do clima,
e está desenhado para construir e disponibilizar informação siste-
matizada em áreas temáticas prioritárias relacionadas à adaptação
à mudança do clima e promover comunicação e articulação entre
quem produz e quem utiliza o conhecimento.

Experiências sobre adaptação no Brasil


De forma geral, há consenso de que as cidades que apresen-
tam processo de planejamento urbano participativo, que garante
a gestão democrática, a moradia adequada, os serviços de sanea-

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mento básico (abastecimento de água potável, esgotamento sani-


tário, limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos urbanos, drena-
gem e manejo das águas pluviais urbanas), além de um sistema
viário de qualidade e serviços de proteção e defesa civil, são ine-
rentemente mais resilientes à maioria dos impactos da mudança
do clima, segundo consta no PNA (BRASIL, 2016).
O Centro Clima/COPPE/UFRJ (2016) propõe a Estratégia de
Adaptação às Mudanças Climáticas da Cidade do Rio de Janeiro apre-
sentando um mapa de caminhos para reforçar a gestão do risco climá-
tico, aliado à geração de oportunidades. Esse relatório compreende
um conjunto de iniciativas orientadas para reduzir a potencial expo-
sição e a sensibilidade da cidade de Rio de Janeiro frente aos perigos
climáticos e fortalecer a capacidade institucional e de pessoas.
O Plano Municipal de Mudanças do Clima de Santos (PREFEI-
TURA DE SANTOS, 2016) é mais do que um conjunto de regras:
representa uma mensagem, uma clara sinalização de como uma so-
ciedade pode assumir compromissos com o futuro, principalmente
quando esse futuro nos coloca diante de um desafio como são as
mudanças climáticas. Ainda são poucas as experiências de gover-
nança local com maior participação dos munícipes, especialmente
aquelas focadas na discussão das formas de adaptação às mudanças
climáticas. Mas a cidade de Santos, no Estado de São Paulo, se ante-
cipa, ao reconhecer essa demanda e colocá-la como uma prioridade
na gestão municipal, assegurando o envolvimento dos diferentes
segmentos da sociedade na estrutura formal e deliberativa, o que
apenas existe em uma sociedade ativa, moderna e consciente.
O Relatório Especial Mudanças Climáticas e Cidades (PBMC,
2017) discute a adaptação das regiões costeiras no Brasil. De acordo
com o PBMC, diversas áreas costeiras do país apresentam alta ou
muito alta vulnerabilidade, com destaque para as regiões metropo-
litanas de Belém, capitais dos estados da região Nordeste, Rio de
Janeiro e as cidades portuárias de Santos e Itajaí. Altos níveis de
vulnerabilidade, combinados com exposição a condições meteoro-
lógicas e extremos climáticos mais graves, podem pôr em risco a
habitabilidade de cada uma região, já que a sociedade constrói o
risco a partir de sua interação com o mundo físico, transformando o
evento natural em perigos de diferentes intensidades e magnitudes.
A cidade de Santos, localizada na Região Metropolitana da

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Baixada Santista e detentora do maior porto da América Latina,


tem visto o aumento do nível do mar em uma média de 1,2 mm
ano -1 desde a década de 1940 (PBMC 2017). Santos é vulnerável à
elevação do nível médio do mar e às inundações, sendo crítica a
vulnerabilidade infraestrutural. Num estudo pioneiro sobre impac-
tos econômicos da adaptação, o projeto internacional sobre vulne-
rabilidade costeira, o projeto METROPOLE, foi desenvolvido em
Santos, onde foram avaliadas a vulnerabilidade costeira a inunda-
ções devido a ressacas, tempestades intensas e elevação do nível
médio do mar na região noroeste e na Ponta da Praia (sudeste).
Foi usado um modelo de impactos para avaliar o custo das perdas
no setor imobiliário com e sem medidas de adaptação. As estraté-
gias de adaptação foram definidas pela população, que participou
em duas oficinas que contaram com a presença da sociedade civil,
cientistas, setores comercial e turístico e tomadores de decisões da
Prefeitura de Santos. Estes foram organizados para discutir possí-
veis medidas de adaptação ante vários cenários. Sem adaptação, o
prejuízo econômico para 2100, na região sudeste da cidade, num
cenário de baixa elevação do nível do mar (0-0,36m) para uma tem-
pestade de 1 em 100 anos chegaria a R$ 870.093.165, e para um
cenário de alta elevação do nível do mar (0,36-0,45m) pode chegar
a R$ 1.043.498.249 na mesma região sudeste de Santos.
As propostas de adaptação considerando esses cenários de im-
pactos na região sudeste da cidade de Santos foram mais voltadas
para a parte de infraestrutura. Para a região da Ponta da Praia, 66%
dos participantes escolheram fortificação como a principal medida
de adaptação, e 30% votaram pela acomodação. Na região noroeste
de Santos, 50% decidiram pela fortificação e 43% por acomodação.
Recolocação foi a menos votada, com 4% na Ponta da Praia e com
7% no noroeste de Santos. As medidas de adaptação propostas pela
população para as regiões noroeste e sudeste sugerem dragagem e
recuperação, e restauração de manguezais na zona noroeste, e engor-
damento da praia e restauração de dunas, e reforçamento de diques
já existentes na zona sudeste, todas elas medidas de fortificação.
Comunidades locais e tradicionais operam em uma relação
bastante próxima aos serviços providos por áreas naturais prote-
gidas, ou manejadas de forma sustentável por essas populações.
Reduzir a vulnerabilidade dessas comunidades locais às mudan-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

ças do clima, e seus impactos potenciais, requer uma combinação


de instrumentos de política pública relacionadas à conservação
da biodiversidade e serviços ecossistêmicos (ex. estabelecimento e
gestão efetiva de áreas protegidas, gestão comunitária de áreas na-
turais, restauração ecológica), e opções socioeconômicas visando
diversificar meios de vida, aumentar a geração de renda e reduzir
a pobreza. Chamamos esse tipo de ação de adaptação baseada nos
ecossistemas naturais AeB (SCARANO, 2017). Os ecossistemas na-
turais apresentam maior capacidade de resistência e recuperação
quando afetados por situações climáticas extremas, além de forne-
cer uma ampla gama de benefícios dos quais as pessoas dependem
– os serviços ecossistêmicos. Apesar desse papel preponderante,
estudos que relacionam alterações do clima e alternativas de AeB
no Brasil ainda são escassos (SCARANO, 2017).

Reflexões finais
Uma revisão do atual PNA mostra como barreiras à integração
com adaptação em cidades, entre outras coisas: que o planejamento
em adaptação é escasso ou de curto prazo, na maioria dos níveis de
governo; que há uma insuficiência de ações estruturantes governa-
mentais para implementação da agenda de adaptação nos municí-
pios; que há pouca integração das políticas de clima, especialmente
de adaptação, com instrumentos de planejamento, nos diferentes ní-
veis e setores; e que a agenda de adaptação não é considerada priori-
dade dos gestores no governo federal, estadual ou municipal.
As vulnerabilidades decorrem da fragilidade dos assentamentos
humanos em relação à fenômenos climáticos perigosos e está ligada a
circunstâncias tais como localização, área de influência e capacidade
de resistência – todos intrinsecamente ligados a diferentes condições
ambientais, sociais, econômicas e políticas. Mudanças exacerbadas no
ciclo hidrológico pelo aquecimento global tende a acentuar os riscos
de perigos existentes, tais como inundações, deslizamentos de terra,
ondas de calor e limitações de fornecimento de água potável.
A maioria das atividades humanas atualmente estão concentra-
das nas cidades, e consequentemente os centros urbanos têm um
papel fundamental no enfrentamento das mudanças climáticas. Os
governos locais enfrentam muitos desafios em seus esforços para

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

mitigar e se adaptar às mudanças climáticas. Nas cidades o aqueci-


mento global é apenas uma das diversas questões na agenda local.
Os governos também são confrontados entre as prioridades atuais e
os riscos em longo prazo, sendo essa situação agravada pelas incer-
tezas que podem envolver o cronograma e a gravidade dos impactos
relacionados com o clima em uma cidade.

Agradecimentos
Este estudo faz parte do projeto INCT-Mudanças Climáticas Fase 2
(CNPq 465501/2014-1, FAPESP 2014/50848-9 e CAPES 16/2014).

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225
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Capítulo 25

Caminhos para a agenda de adaptação no


Brasil: do plano nacional à escala municipal
Mariana Nicolletti1

Palavras-chave: Plano Nacional de Adaptação à


Mudança do Clima. Nível municipal. Governança.
Informação. Capacidades institucionais.

Adaptação à mudança do clima: do nível


internacional ao local

O tema adaptação à mudança do clima foi proposto, pela


primeira vez, em nível internacional no Segundo Rela-
tório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC na sigla em inglês), em 1995. O Terceiro Relató-
rio do mesmo painel apontou, em 2001, que as mudanças climá-
ticas já estavam o afetando os sistemas físicos (como os recursos
hídricos) e biológicos (a exemplo de ecossistemas e da saúde huma-
na), bem como sistemas humanos (afetados por secas ou enchen-
tes). Com o avanço da ciência do clima e diante das dificuldades
para a ratificação do Protocolo de Kyoto, a adaptação configurou-
se agenda política organizada em torno de iniciativas e medidas
para promover ajustes nos sistemas naturais e humanos frente aos
impactos atuais e esperados dos eventos climáticos, de modo a re-
duzir os danos e explorar oportunidades (IPCC, 2001).
Este capítulo dedica-se a discutir a importância da atuação em ní-
vel local (leia-se municipal ou regional) para que os sistemas socioam-
bientais possam efetivamente se tornar mais resilientes aos eventos
climáticos extremos (como tempestades e ondas de calor). O foco são
os desafios e caminhos para que a agenda nacional de adaptação seja
traduzida em ações locais consistentes em relação ao plano federal
e coordenadas às demais políticas locais (como de desenvolvimento

1
Fundação Getúlio Vargas (FGV).

226
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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

urbano, por exemplo). Tanto a importância da agenda local, quanto


os desafios e caminhos ancoram-se, nas próximas páginas, em ele-
mentos empíricos: políticas e ações públicas, experiências e aprendi-
zados de esforços de adaptação no país. Antes, importa destacar três
características centrais da agenda, que a tornam um novo domínio de
política pública e fazem do nível local seu palco principal:

– os sistemas socioambientais são afetados pelos eventos cli-


máticos em diferentes medidas de acordo com suas com-
posições biofísicas, sociais e econômicas e suas vulnerabi-
lidades (exposição e sensibilidade) aos eventos climáticos
derivam de problemas estruturais, já conhecidos, como
condições precárias de habitação;
– assim, os efeitos e impactos da mudança do clima se dão
localmente, de forma específica em cada território, sendo
esse entendido como o conjunto dos fluxos de recursos, in-
formações, pessoas e das relações que acontecem na vida
cotidiana e que transpassam as fronteiras geopolíticas; e
– trata-se de um tema multidisciplinar, que demanda conhe-
cimentos de diversos campos, e de uma agenda que requer
o envolvimento de diferentes atores e setores para que so-
luções viáveis e efetivas – capazes de reduzir impactos e
vulnerabilidades no curto, médio e longo prazos – possam
ser formuladas e implementadas.

Adaptação é, portanto, uma agenda complexa, multinível (os


três níveis da federação estão envolvidos) e multiescala (os vários
setores e atores sociais e econômicos são afetados e relevantes)
(CASH et al., 2006). Abordagens estritamente top-down (do nível
nacional para o local), bem como puramente bottom-up (do local
para o nacional) não são apropriadas para pensar as políticas pú-
blicas nessa agenda; é preciso que os dois sentidos sejam combina-
dos. Ainda, pela sua relação direta com inúmeras outras áreas de
políticas públicas, é necessária a transversalização da adaptação
aos diversos processos e instrumentos de políticas públicas (MAR-
GULIS, 2017), especialmente aos territoriais, como os planos dire-
tores e planos de desenvolvimento urbano integrado.

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A agenda de adaptação no Brasil


Política e instrumentos em nível federal
A Política Nacional de Mudança do Clima (PNMC) foi insti-
tuída em 2009 e estabeleceu princípios, objetivos e diretrizes para
adaptação. Entre os instrumentos da PNMC, encontra-se o Plano
Nacional de Mudanças Climáticas, que é composto por planos de
mitigação e adaptação. O Plano Nacional de Adaptação (PNA) foi
instituído em maio de 2016.
Coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), o
PNA dedica-se a promover a redução da vulnerabilidade nacional
à mudança do clima e realizar a gestão do risco associada a esse
fenômeno. Um de seus objetivos específicos volta-se à coordenação
e cooperação entre órgãos públicos e a sociedade civil. O PNA afir-
ma ser fundamental o protagonismo dos municípios, com ações
descentralizadas e articuladas, para a construção de resiliência no
país (MMA, 2016).
Apesar disso, o grupo de trabalho responsável pela elabora-
ção do PNA (GT Adaptação) foi composto por ministérios e ór-
gãos federais e os representantes de municípios não tiveram parti-
cipação direta na elaboração do plano, o que implica dificuldades
na fase de implementação. Quanto mais difícil e complexa é uma
política, mais importante será a sua legitimação junto aos atores
relevantes e interessados, o que necessariamente envolve o debate
de seus objetivos e a negociação de diferentes opiniões durante a
formulação (CROSBY, 1996).
A governança para a implementação do PNA está em cons-
trução. O próprio documento recomenda a criação de “um fórum
permanente para concertação com governos estaduais e represen-
tação de municípios, cujo papel será elaborar e propor diretrizes
e recomendações técnicas” (MMA, 2016, p. 38). A questão não é
apenas fazer com que as diretrizes do PNA cheguem aos estados e
municípios, mas fomentar o desenvolvimento de agendas locais de
adaptação, aderentes aos territórios, que considerem o Plano Na-
cional e, ao mesmo tempo, retroalimentem a agenda federal, em
um ciclo contínuo de implementação, monitoramento e revisão
das políticas, fortalecimento de capacidades e gestão compartilha-
da de recursos.

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Desafios ao avanço da agenda de adaptação em nível local


Em âmbito subnacional não há atualmente uma base atualiza-
da de dados e experiências sobre políticas de mudança do clima.
Estima-se que tenham sido sancionadas 16 leis estaduais e sabe-se
que alguns estados e municípios já desenvolveram programas e
planos de adaptação, como Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná,
Pernambuco e as cidades do Rio de Janeiro, Salvador e Santos
(ETHOS, 2016; MARGULIS, 2017).
Três categorias de desafios colocam-se à formulação e à imple-
mentação de políticas públicas municipais de adaptação: arranjos
de governança (o que envolve a clara definição de papéis e respon-
sabilidades de cada nível de governo); capacidades institucionais
(em especial competências e redes de apoio dentro e fora do gover-
no); e disponibilidade de recursos (entre os quais conhecimento
técnico, dados e informações).
Sobre os arranjos de governança, é preciso que sejam atribuí-
das ou criadas instâncias municipais para a avaliação de informa-
ções, planejamento, desenho de medidas adaptativas e monitora-
mento da implementação. O mais desafiador é que tais instâncias,
como comitês de mudança do clima, estejam conectadas vertical-
mente aos demais níveis de governo, horizontalmente às outras
agendas de políticas públicas e contem com a participação dos
demais setores e grupos sociais – como preconizado pelos PNMC
e PNA. Esse amplo movimento de articulação entre os entes da
federação e de participação social é necessário dada a diversida-
de de temas e agendas implicados (ex. infraestrutura, mobilidade,
habitação) e da abrangência dos impactos e vulnerabilidades (al-
cançando diferentes grupos e setores de forma distinta). Portanto,
políticas (estratégias, planos, programas) efetivas de adaptação de-
mandam que diversos pontos de vista estejam representados e que
inúmeras áreas e tipos de conhecimento sejam aplicados ao curso
do ciclo da política: desde a formulação até o monitoramento e
avaliação (ver Figura 1).
Por outro lado, de nada adianta uma estrutura de governança
que atenda toda essa complexidade se as instituições não dispuse-
rem de capacidades para desempenhar os papéis propostos. Opor-
tunidades de participação e de acesso a recursos podem ser frus-
tradas caso capacidades institucionais não sejam desenvolvidas.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Assim, essa segunda categoria de desafios impacta diretamente a


terceira, relacionada a recursos.

Figura 1
Ciclo de Adaptação à Mudança do Clima.

Fonte: plataforma adaptaClima2.

Além dos recursos financeiros, outro precioso para a cons-


trução de estratégias e medidas de adaptação é informação. Mais
especificamente, informação aplicável às diferentes dinâmicas se-
toriais e sociais, em linguagem e formato acessíveis. A gestão do
conhecimento, isso é, a sistematização e compartilhamento do que
se aprende e dos resultados das experiências de adaptação ao re-
dor do Brasil, é desafiadora dada a magnitude e as especificidades
dos territórios, e, ao mesmo tempo, crucial para que se possa oti-
mizar investimentos e articular e coordenar os esforços.
É evidente que os governos locais, seus órgãos, gestores e
equipes não poderão responder a esses desafios sozinhos, no
entanto têm papel central na liderança e condução do planejamento
para adaptação, engajamento de atores, fomento à gestão do
conhecimento e disseminação de informações entre os grupos e
organizações presentes no território (HALLEGATTE, LECOCQ e
PERTHUIS, 2011). Para tanto, os governos estaduais e federal têm
as funções de apoiar o desenvolvimento de capacidades nas insti-
tuições municipais, o alinhamento em relação às diretrizes e aos
princípios dos planos nacional e estaduais, quando houver, e a troca
de experiências e de conhecimento entre as iniciativas em curso ao
largo do país. Cabe ressaltar que tal distribuição e execução de fun-
ções orquestradas entre os níveis de governo dependem de uma es-
trutura de governança de clima a ser consolidada no Brasil, incluin-
do a definição dos papéis e atribuições na agenda de adaptação.
2
Disponível em: adaptaclima.mma.gov.br. Acesso em 24/10/2018.

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Caminhos e referências: o que nos contam três


experiências em curso
As experiências de três cidades são salutares para ilustrar
caminhos possíveis para avançar na agenda de adaptação em nível
municipal, partindo, por vezes, de soluções criativas e de baixo cus-
to. A força motriz de tais experiência é a combinação de vontade
política e liderança, mais do que recursos financeiros dedicados.
Ao mesmo tempo, o fato de esses dois elementos serem determi-
nantes denota certa fragilidade dessas iniciativas; as experiências
trazem em comum a luta pela institucionalização da agenda de
adaptação para que se torne menos suscetível aos ciclos políticos e
inclinações individuais.
Porto Alegre Resiliente é exemplo de como uma estratégia
de ampla participação pode funcionar na fase de planejamento,
criando a base social necessária para a implementação; Santos
configura a ponte entre conhecimentos científico e empírico; e
em Recife, a lente climática vem gradualmente sendo aplicada
aos instrumentos de planejamento e em políticas de outras pas-
tas de governo.

Mobilização e participação na Estratégia de Resiliência de


Porto Alegre
Porto Alegre lançou, em 2016, sua estratégia de resiliência ur-
bana para fazer frente a estresses e choques aos quais a cidade está
exposta, incluindo os derivados da mudança do clima. O processo
foi participativo desde o início, mas a participação foi ganhando
importância e aprofundando-se à medida que se mostrava essen-
cial para a mudança de comportamento e a implementação de
medidas. Da participação passou-se à cocriação da estratégia. Fo-
ram envolvidos mais de 500 representantes de diferentes setores,
organizados em comunidades de prática (grupos de trabalho com
objetivos compartilhados) por territórios e interesses comuns. Fo-
ram elementos fundamentais para o trabalho desses grupos e para
a coesão entre eles: a facilitação pela equipe técnica da prefeitura
e parceiros; o desenho e comunicação clara sobre os processos de
tomada de decisão; e uma plataforma online, como instrumento
para comunicação contínua e disseminação da informação entre

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

os envolvidos. Outro elemento importante foi a liderança do pre-


feito e o envolvimento de secretários e organizações influentes nos
territórios, o que conferiu legitimidade e poder de convocação à
iniciativa (POA RESILIENTE, 2016).

Transversalização e institucionalização da adaptação em


Recife
Um marco na agenda de adaptação em Recife é a Política de
Sustentabilidade e de Enfrentamento das Climáticas, de 2014. En-
tre suas finalidades consta a construção de uma cidade resiliente,
por meio de integração de atores da sociedade em torno dos es-
forços nesse sentido, priorizando as comunidades em situação de
vulnerabilidade (Lei Nº 18.011 /2014). A partir daí, três movimen-
tos relevantes para que o tema passasse a ser refletido no território
foram: a formação de Comitês de Clima com participação de dife-
rentes setores da sociedade; participação das lideranças políticas
e técnicas em redes nacionais e internacionais, como o CB27 e o
projeto Urbanet, com apoio do ICLEI; e incorporação do tema no
plano de governo, com objetivos e metas assumidos publicamente.
Adaptação e mitigação da mudança do clima (redução das emis-
sões de gases de efeito estufa) vêm sendo tratadas de forma inte-
grada e foi assim, compondo uma mesma agenda, que ganharam
espaço no Plano Diretor, Resiliente e de Baixo Carbono, em 2018.
Também, passaram a constar nas estratégias de ordenamento ter-
ritorial, como a Recife Cidade Parque, e a serem refletidas em ins-
trumentos urbanísticos.

Bases científicas apoiam o Plano Municipal de Mudança do


Clima de Santos
No ano de 2015, Santos foi assumido com um dos municípios
foco do projeto de pesquisa Metrópole, apoiado pelo Forum Bel-
mont e implementado no Brasil por Cemaden, INPE, FAPESP e
UNICAMP. A hipótese do estudo era de que o risco climático é as-
similado quando o conhecimento científico é produzido junto aos
setores da economia e sociedade. Partindo da base de dados his-
tórica sobre os níveis de maré, foram projetados cenários futuros
para o município e a percepção da sociedade civil sobre o tema foi

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acessada por meio de questionário. Foram promovidos workshops


para compartilhamento de informações e os atores locais indica-
ram possíveis medidas de adaptação, que depois passaram por
análises de viabilidade técnica-financeira quanto aos impactos a
ativos imobiliários.
A partir da pesquisa e, principalmente, da mobilização pro-
duzida, foi criada a Comissão Municipal de Adaptação à Mudança
do Clima (CMMC) em 2015 e elaborado o Plano Municipal de Mu-
dança do Clima de Santos (PMMCS), publicado em dezembro de
2016 (SANTOS, 2016). A aplicação de informações científicas aos
processos de política pública foi o eixo condutor da experiência
de Santos e uma Comissão Consultiva Acadêmica deve apoiar a
implementação do plano.

Referências
CASH, D. W.; ADGER, W.; BERKES, F.; GARDEN, P.; LEBEL, L.; OLSSON, P.;
et al. Scale and Cross-Scale Dynamics: Governance and Information in a Multi-
level World. In: Ecology and Society, 2006.
CROSBY, Benjamin L. Policy Implementation: The Organizational Challenge.
World Development, 24(9), p. 1.403-1.415, 1996.
ETHOS. Observatório de Políticas Públicas de Mudanças Climáticas do Fórum
Clima, 2016.
HALLEGATTE, S.; LECOCQ, F.; PERTHUIS, C. Designing Climate Change
Adaptation Policies – An Economic Framework. The World Bank, 2011.
IPCC. Climate Change 2001 – IPCC Third Assessment Report. Intergovernmen-
tal Panel on Climate Change: WMO; UNEP, 2001.
MARGULIS, S. Guia de adaptação às mudanças do clima para entes federativos.
WWF, 2017.
MMA (2016, 5 10). Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima. Retrie-
ved 5 18, 2017, from Ministério do Meio Ambiente: http://www.mma.gov.br/
clima/adaptacao/plano-nacional-de-adaptacao.
POA RESILIENTE (2016). Desafio Porto Alegre Resiliente. Disponível em:
http://www.portoalegreresiliente.org/downloads/estratgia_de_resilincia_de_
porto_alegre.pdf. Acesso em: 18/05/2018.
SANTOS (2016). Plano Municipal de Mudança do Clima de Santos. Prefeitura
de Santos.
Lei Nº 18.011 /2014. Diário Oficial. Prefeitura do Recife. Edição 46. Cadernos
do Poder Executivo. Disponível em: http://www2.recife.pe.gov.br/sites/default/
files/3._lei_no_18.011_2014.pdf. Acesso em: 20/10/2018.

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Capítulo 26

A Política de Mudanças Climáticas


no Estado de São Paulo
Jussara de Lima Carvalho1

Palavras-chave: Mudanças climáticas. Políticas de


mitigação e adaptação.

Introdução

A
inda que conseguíssemos limitar o aumento da tempera-
tura global, as mudanças climáticas estão aqui para ficar.
Comunidades já estão vivenciando secas e enchentes cada vez mais
extremas e frequentes, além de outros eventos climáticos. E estes
efeitos apenas serão intensificados. [...] Alguns argumentam que a
economia não poderá sustentar a adaptação. Mas, como as últimas
evidências têm demonstrado, atrasar ações apenas significa maio-
res custos depois. Se nós, realmente queremos construir um futu-
ro sustentável, próspero, e equitativo, não podemos nos dar o luxo
de esperar2 (STEINER, 2015).
Em 2019, o Fórum Mundial Econômico coloca em sua pau-
ta a preocupação com a falência dos acordos mundiais por parte
dos governos nacionais em torno do Acordo de Paris, e coloca as
mudanças climáticas, somadas ao aumento dos eventos extremos,
como uma das maiores preocupações mundiais (WORLD ECO-
NOMIC FORUM, 2019).
A vulnerabilidade das cidades às mudanças climáticas depende
de fatores como padrões de urbanização, desenvolvimento econômi-
1
Doutora em Governança da Água/PROCAM (USP). Assessora Internacional da Secre-
taria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SIMA).
2
Livre tradução do trecho “Even if we limit the rise in global temperatures, cli-
mate change is here to stay. Communities are already facing more extreme and
frequent droughts, floods, and other weather events. These consequences will only
intensify. [...]Some argue that the global economy cannot afford adaptation. But,
as the latest evidence shows, delaying action will mean higher costs later. If we truly
want to build a sustainable, prosperous, and equitable future, we cannot afford to
wait.” (STEINER, 2015).

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co, exposição física, planejamento urbano e preparação para desas-


tres (UN-HABITAT, 2016). A convergência entre urbanização e mu-
dança climática ameaça com impactos sem precedentes na economia,
na qualidade de vida e na estabilidade social (UN-HABITAT, 2011).
Por isso, a adaptação climática é fundamental para tornar as cida-
des e regiões mais resilientes aos frequentes eventos extremos. Mas,
para tanto, entre os fatores de maior importância estão a identi-
ficação das vulnerabilidades e um Plano de Ação. A cooperação
governamental multinível, com responsabilidades compartilhadas
entre os diferentes níveis de governo, pode trazer sinergias na bus-
ca de maior resiliência, sem esquecer da importância da participa-
ção dos demais atores, como o setor privado e a sociedade civil.
As políticas climáticas, endereçando adequadamente responsabi-
lidades em relação tanto à mitigação quanto à adaptação, e defi-
nindo instrumentos para sua operacionalização, se constituem em
grandes ferramentas para a construção de sociedades resilientes
(UN-HABITAT, 2011).

O Estado de São Paulo e a adaptação climática.


Criado em 2005, o Fórum Paulista de Mudanças Climáticas
e de Biodiversidade (FPMCB), órgão tripartite, visava conscien-
tizar e mobilizar a sociedade paulista para a discussão e tomada
de posição sobre o fenômeno das mudanças climáticas globais,
a necessidade da conservação da diversidade biológica do plane-
ta e a promoção da sinergia entre as duas temáticas. Entre seus
principais objetivos estava o de colaborar com a elaboração de
normas para a instituição de uma Política Estadual de Mudan-
ças Climáticas, em articulação com a Política Nacional de Mu-
danças Climáticas e com a Convenção sobre Mudança do Clima
(UNFCCC). A Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São
Paulo foi a responsável pelo apoio administrativo e os meios ne-
cessários à execução dos trabalhos do fórum, uma vez que há 10
anos já atuava em prol das mudanças climáticas com o Programa
Estadual de Mudanças Climáticas do Estado de São Paulo (PRO-
CLIMA), que teve sua implementação gradualmente assumida e
coordenada pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
(CETESB) (SÃO PAULO, 2005).

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Como resultado, foi elaborada e aprovada a Lei 13.798 de no-


vembro de 2009, a Política de Mudanças Climáticas do Estado de
São Paulo (PEMC) e, no ano seguinte, seu Decreto regulamenta-
dor, de número 55.947. Com essa lei o Estado de São Paulo se com-
prometeu com o combate às mudanças climáticas antes mesmo da
institucionalização da política climática nacional.
Como principal objetivo, a PEMC dispõe sobre as condições
para as adaptações necessárias aos impactos derivados das mudanças
climáticas, bem como contribui para reduzir ou estabilizar a concen-
tração dos GEE na atmosfera, estabelecendo uma meta de redução
do GEE de 20% até 2020, com base nas emissões de 2005.
A lei também estabelece ferramentas (instrumentos, estraté-
gias e medidas) para mitigação e adaptação que, para serem imple-
mentadas, necessitam que diferentes políticas setoriais (energia,
transportes, meio ambiente, recursos hídricos) sejam articuladas
(VARGAS, 2012).
Do ponto de vista da governança para a implementação da
lei, foram criados o Comitê Gestor da Política Estadual de Mudan-
ças Climáticas e o Conselho Estadual de Mudanças Climáticas.
O Comitê Gestor, a maior esfera decisória, sob a coordenação da
Casa Civil, tem a atribuição de acompanhar a elaboração e a im-
plementação dos planos e programas instituídos no decreto que re-
gulamenta a lei, além de fomentar e articular ações nos diferentes
níveis de governo e prestar assessoria técnica ao Conselho Estadual
de Mudanças Climáticas. Já o Conselho Estadual de Mudanças Cli-
máticas, de caráter consultivo, foi criado para acompanhar a im-
plantação e fiscalizar a execução da Política Estadual de Mudanças
Climáticas. Devido às suas atribuições e sua composição tripartite,
o Conselho Estadual de Mudanças Climáticas veio substituir o FPM-
CB. Desde 2014, porém, tanto o Comitê Gestor quanto o Conselho
Estadual de Mudanças Climáticas encontram-se sem atividades, tra-
zendo como consequência a paralização da articulação necessária
para trazer unidade para a gestão climática do Estado de São Paulo.

Instrumentos
Dentre os instrumentos relativos à adaptação, um dos mais
importantes é o Plano Participativo de Adaptação aos Efeitos das

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Mudanças Climáticas, que teve elaborada sua primeira versão em


2011 e se encontra disponibilizada no site da Secretaria de Estado
de Infraestrutura e Meio Ambiente (SMA) até os dias atuais para
consulta pública, não tendo sido, ainda, elaborada sua versão final
(SÃO PAULO, 2018). Vários instrumentos, no entanto, estão em
operação contínua, e vamos analisar alguns deles.
O Programa Remanescentes Florestais, um dos mais exitosos, é
composto pela maior parte dos projetos e programas da Subsecreta-
ria de Meio Ambiente do estado especialmente voltados à restaura-
ção florestal. Nesse sentido, cabe ressaltar, dentro desse programa,
o Programa Nascentes (SÃO PAULO (Estado), 2019), reinstalado
após a crise hídrica de 2015 na Região Metropolitana de São Paulo,
como o primeiro e único componente de adaptação baseada na
natureza relativo ao episódio de escassez hídrica, visando aumentar
a proteção e conservação dos recursos hídricos, da biodiversidade,
entre outros.
O inventário da vegetação nativa do Estado de São Pau-
lo – de responsabilidade do Instituto Florestal – configura-se
como outro importante instrumento da PEMC, para subsidiar
as ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, bem
como a manutenção e a restauração dos sistemas de unidades de
conservação e das demais áreas protegidas. 
O Zoneamento Ecologico Econômico (ZEE) para o Estado de
São Paulo – em fase final de elaboração – tem por objetivo preve-
nir e evitar a ocupação desordenada de áreas de vulnerabilidade
direta e indireta de todo o estado, tendo como uma de suas princi-
pais diretrizes a resiliência às mudanças climáticas para um estado
com baixa vulnerabilidade ambiental e social.
Os demais zoneamentos da região costeira, que são importan-
tes instrumentos diretamente relacionados à adaptação climática,
uma vez que por sua aplicação direta trazem atenuantes aos efei-
tos de desastres, previnem e reduzem impactos, especialmente em
áreas de maior vulnerabilidade, embora não façam alusão direta
às mudanças climáticas.
O mapeamento de áreas de risco, o Programa Estadual de
Prevenção de Desastres Naturais e de Redução de Riscos Geológi-
cos (PDB) (SÃO PAULO, 2011), o Plano Preventivo de Defesa Civil
(PPDC), que visam reduzir as vulnerabilidades, são instrumentos

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muito importantes, sendo que este último tem atualização anual, sen-
do o Instituto Geológico, o IPT e a Defesa Civil os responsáveis;
Em termos de incentivos econômicos, também previstos
na PEMC, o pagamento por serviços ambientais aos proprietá-
rios rurais conservacionistas, bem como incentivos econômicos,
como conversão de multas em serviços ambientais de restaura-
ção, também fazem parte do Programa Nascentes (SÃO PAULO
(Estado), 2019).
Sobre os fundos previstos na PEMC, há dois, especifica-
mente, o Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FEHIDRO) e o
Fundo Estadual de Controle e Prevenção da Poluição (FECOP),
onde a aplicação dos recursos passou a contemplar as mudan-
ças climáticas, especialmente na definição das áreas de maior
vulnerabilidade e as ações de prevenção, mitigação e adaptação.
Além desses, os Planos Setoriais, especialmente de Recursos Hí-
dricos, Saneamento e Agropecuária, foram inicialmente elabo-
rados no período de 2011 a 2013, com atualizações a cada qua-
tro anos, onde percebe-se a inclusão da dimensão climática dos
impactos sobre seus ativos, progressivamente, e a inserção, em
seus orçamentos, de recursos para adaptação aos impactos.

Considerações finais
Observa-se que vários instrumentos e iniciativas têm sido rea-
lizados, ainda que não consolidados em um Plano de Adaptação.
A paralização das atividades do Comitê Gestor e do CEMC
trouxe como consequência a falta da discussão e articulação
necessárias para garantir a presença transversal das mudanças
climáticas nas políticas setoriais do estado e, consequentemente,
nos discursos de governo, trazendo para a sociedade paulista
um olhar um pouco confuso, uma vez que por meio da PEMC
reconhece a importância das mudanças climáticas, mas ainda
coloca o clima como uma questão menor quando comparado a
outras agendas.
Destaque aos instrumentos de Planejamento Ambiental,
Urbanísticos e Zoneamentos Ecológicos e Econômicos, onde há
verdadeiras possibilidades de trabalho concatenado com a escala
local, onde devem se desenvolver as ações de adaptação. Devem

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ser adaptados às mudanças climáticas os projetos de infraestrutu-


ra, como drenagem, coleta e disposição de resíduos sólidos, coleta
e tratamento de esgotos, produção e distribuição de água para
abastecimento público e mobilidade urbana.
Em termos metodológicos é necessária uma quebra de para-
digma, é fundamental a incorporação dos cenários climáticos nos
estudos de vulnerabilidade e de viabilidade de projetos e ações
para aumento da resiliência. A simples utilização de séries históri-
cas de probabilidade de ocorrência não mais atende aos desafios
atuais.
Por sua vez, os institutos de pesquisa devem fazer um esfor-
ço para colocar à disposição dos gestores, cenários climáticos em
escala adequada e com elevado nível de segurança, para subsidiar
as tomadas de decisão.

Agradecimentos
A autora agradece aos colegas Maria Fernanda Pelizzon Garcia(*) e Mar-
ta Emerich(*), Oswaldo Lucon(**), Paul Dale(***) e Elaine Aparecida
Rodrigues(****) pela gentil colaboração.
(*) CETESB, (**) Assessoria de Mudanças Climáticas da SIMA, (***)
Fundação Florestal, (****) Instituto Florestal.

Referências
SÃO PAULO (Estado). Decreto no 49.369, de 11 de fevereiro de 2005. Institui o
Fórum Paulista de Mudanças Climáticas Globais e de Biodiversidade.
Disponível em: <https://www.al.sp.gov.br/norma/52623>. Acesso em 22 mar 2019
______. Decreto no 55.947, de 24 de junho de 2010. Regulamenta a Lei nº 13.798,
de 9 de novembro de 2009, que dispõe sobre a Política Estadual de Mudanças
Climáticas. Disponível em <https://www.al.sp.gov.br/norma/159791>. Acesso
em: 22 março 2019.
______. Decreto nº 57.512, de 11 de novembro de 2011. Institui o Programa Es-
tadual de Prevenção de Desastres Naturais e de Redução de Riscos Geológicos
e dá providências correlatas. Disponível em <https://cetesb.sp.gov.br/proclima/
wp-content/uploads/sites/36/2014/08/decreto_57512_111111.pdf>. Acesso em:
22 março 2019.
______. Lei nO 13.798, de 9 de novembro, de 2009. Institui a Política Estadual
de Mudanças Climáticas (PEMC). Disponível em <https://www.al.sp.gov.br/nor-
ma/158351>. Acesso em: 22 março 2019.
______. Secretaria de Estado de Infraestrutura e Meio Ambiente (SMA). Coor-
denadoria de Planejamento Ambiental. Relatório de Qualidade Ambiental 2017. 1.
ed. São Paulo: SMA, 2018.

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______. Secretaria de Estado de Infraestrutura e Meio Ambiente (SMA). Progra-


ma Nascentes. 2019. Disponível em <https://www.infraestruturameioambiente.
sp.gov.br/programanascentes>. Acesso em: 22 março 2019.
STEINER, A. “Why we need to focus on climate change adaptation?”. World
Economic Forum, 2015. Disponível em <https://www.weforum.org/agen-
da/2015/01/why-we-need-to-focus-on-climate-change-adaptation/>. Acesso em:
22 março 2019.
UNITED NATIONS HUMAN SETTLEMENTS PROGRAMME – HABITAT,
U.N. Las Ciudades y el Cambio Climático: Orientaciones Para Políticas – Informe
Mundial Sobre Asentamientos Humanos, 2011, 1. ed.; Nairobi: UN-Habitat, 2011.
______. Urbanization and development emerging futures. Nairobi: UN-Habitat,
2016.
VARGAS, M. C. Política Metropolitana do clima em São Paulo: dilemas de for-
mulação no conteúdo do federalismo brasileiro. 8º Encontro da Associação Bra-
sileira de Ciência Política. Gramado (RS), 2012.
WORLD ECONOMIC FORUM. “The Global Risks Report 2019”. 2019.
Disponível em <https://www.weforum.org/reports/the-global-risks-re-
port-2019>. Acesso em: 22 março 2019.

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Capítulo 27

Educação para a adaptação:


caminho para o protagonismo,
criatividade e corresponsabilização
Edson Grandisoli1

Palavras-chave: Educação. Adaptação. Ensino bási-


co. Projetos.

Introdução

A influência da atividade humana sobre o clima é comple-


xa e está relacionada, entre outros fatores, ao nosso con-
sumo, ao tipo de energia que produzimos e utilizamos e ao meio
de transporte que optamos diariamente etc. “O efeito das mudan-
ças climáticas dispara as migrações, destrói os meios de sustento,
altera as economias, debilita o desenvolvimento e exacerba as desi-
gualdades entre os sexos” (JACOBI et al., 2011).
As principais formas de enfrentamento dos impactos oriun-
dos das mudanças climáticas estão, grosso modo, divididas em gru-
pos com características complementares denominados medidas de
adaptação e de mitigação. Mitigar possui relação com estratégias
que visam reduzir a mudança climática em si, como, por exemplo,
medidas de redução das emissões dos gases de efeito estufa (GEE).
Adaptar, por sua vez, diz respeito aos esforços que visam ampliar
nossa resiliência, aumentando as chances de sobrevivência e a re-
dução de perdas graves frente a um evento extremo (SULAIMAN,
2018). Adaptar, portanto, não necessariamente busca solucionar as
causas desses impactos.
Apesar de toda a complexidade das mudanças climáticas e
seus desdobramentos socioambientais em escalas local, regional
e global, as soluções mais visíveis propostas em diferentes planos
incluindo o político, o econômico, o científico e o educacional

1
Instituto de Estudos Avançados (IEA)/USP.

241
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possuem ainda um foco que pode ser considerado reducionista e


comportamentalista, uma vez que propõem um conjunto de solu-
ções paliativas que não dão conta efetivamente da complexidade
do desafio (LIMA e LAYRARGUES, 2014).
Na contramão desse cenário de desmobilização e despolitiza-
ção, a educação possui papel central na formação de cidadãos que
saibam se organizar de forma coletiva e proativa na construção de
sociedades mais sustentáveis, uma vez que contribui tanto para um
melhor entendimento dos processos e desafios, quanto para uma
melhor mobilização (SULAIMAN, 2018).
Visando esses objetivos, um dos caminhos possíveis dentro
do processo educativo é o estímulo à criação de mecanismos de
adaptação aos impactos das mudanças climáticas, que envolve pes-
quisa e construção coletiva, valoriza o protagonismo de estudan-
tes, educadores e comunidade, e abre espaço para novas formas
de aprender, ensinar e se relacionar com o meio e com os outros.
Sendo assim, diferentes atores da comunidade tornam-se parcei-
ros propositivos na busca por soluções locais viáveis e criativas que
podem contribuir para a qualidade de vida de todos.
Considerando-se essas premissas, os próximos itens buscam
explorar um pouco desse olhar investigativo e de construção cole-
tiva tendo como centro a educação básica.

Educação como processo, adaptação como


resultado
A busca por medidas de adaptação deve se configurar como
um momento significativo dos pontos de vista de envolvimento,
diálogo, construção coletiva e do uso de estratégias pedagógicas
mais ativas de ensino-aprendizagem.
A chamada aprendizagem ativa envolve um conjunto de prá-
ticas pedagógicas que colocam o aprendiz como responsável pelo
seu próprio processo de aprendizado e de seus pares, ou seja, os
estudantes devem assumir uma postura mais ativa, na qual resol-
vem problemas, desenvolvem projetos e, com isso, criam oportu-
nidades para a construção de conhecimento (VALENTE, 2014).
Entre as diferentes estratégias relacionadas à aprendizagem ativa
destacam-se a aprendizagem baseada em projetos, a aprendizagem

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baseada em problemas e o design thinking. Nesses casos, o ensi-


no-aprendizado se dá a partir da busca por soluções a desafios e
situações reais (MORAN, 2015).
Vale destacar que a pedagogia baseada em projetos ou proble-
mas é um caminho que permite (adaptado de LIMA e LAYRAR-
GUES, 2014):

• articular a escola, o currículo e o território por meio da


busca por soluções a diferentes desafios socioambientais lo-
cais;
• exercitar a busca por informação de qualidade, a pesquisa
e, como resultado, a construção coletiva de novos conheci-
mentos mais contextualizados;
• permitir que o estudante seja sujeito da construção de seu
próprio conhecimento;
• estimular a autonomia e o pensamento sistêmico, crítico e
empático;
• reconhecer a transversalidade dos saberes.

Do ponto de vista da prática pedagógica, algumas etapas po-


dem ser consideradas centrais à criação de medidas de adaptação às
mudanças climáticas. O breve guia a seguir não possui intenção de
ser definitivo e, em especial, de engessar a criatividade de estudantes
e professores. É importante que os tempos de construção e amadu-
recimento de cada etapa sejam respeitados, havendo a possibilidade
de retornar a etapas anteriores para ajustes ou reestruturações.

Etapa 1: Investigação, contexto e objetivo.


Conhecer as principais características das mudanças climá-
ticas e seus impactos talvez seja o primeiro passo fundamental
que fomenta a compreensão das conexões entre local, regional e
global. O grande desafio é estabelecer conexões entre as opções
cotidianas e a emissão de gases de efeito estufa, o que tem levado
ao aumento gradual da temperatura média do planeta (JACOBI et
al., 2011). A questão local a ser trabalhada deve ser identificada,
idealmente, por meio do diálogo com diferentes atores da escola e
território. Esse processo participativo fomenta legitimidade e esta-

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belece reconhecimento entre as partes, pois parte de um contexto


comum a todos, aumentando as chances de envolvimento e apoio.
Há várias metodologias que facilitam a identificação de desafios
coletivos e estimulam a participação democrática por meio do diá-
logo. Para conhecer um pouco mais sobre elas, recomendo o texto
de Jacobi e Grandisoli (2018).
No final dessa etapa, e fruto desse processo, deve emergir a
identificação de um desafio principal comum a todos, havendo a
determinação de objetivos claros, assertivos e factíveis.

Etapa 2: Proposição e criatividade.


Desta etapa devem emergir ideias, sugestões e propostas de
adaptação concretas a serem testadas, mas sem perder de vista
o objetivo (ou objetivos) definido na etapa anterior. Educadores,
junto a seus estudantes e outros atores da comunidade, devem faci-
litar a realização de processos de “chuva de ideias” (brainstorming)
sem limitar possibilidades, desejos e visões de futuro, postura que
colabora para libertar o processo criativo de prototipagem de suas
amarras individuais e institucionais. A partir do levantamento de
diferentes propostas, entretanto, é vital que ocorra a escolha de,
no máximo, um ou dois protótipos viáveis a serem testados, os
quais devem considerar as possibilidades e limitações impostas
pela realidade.
Esse processo de criação coletiva, seleção de ideias e prototi-
pagem, seguido pela testagem é, de forma simplificada, o mode-
lo baseado no design thinking, metodologia que tem, entre outras
premissas a criação de soluções considerando o ser humano como
centro do processo, o foco na participação e colaboração, e na cul-
tura da prototipação.
Existem muitas referências que unem o design thinking a for-
mas inovadoras de aprender e ensinar. Para conhecer um pouco
mais, sugiro o sítio da Internet https://educador360.com/gestao/
design-thinking-na-educacao/.

Etapa 3: Testagem e monitoramento participativo.


A etapa final do processo de design thinking é a testagem e o
monitoramento participativo, os quais colocam à prova a eficiência
e efetividade do protótipo adaptativo criado.

244
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Os resultados da testagem indicam pontos de fortaleza e fra-


gilidade do protótipo criado, permitindo ajustes e readequações
nas etapas anteriores, tornando o processo de design cíclico, ca-
racterística fundamental do processo criativo e que visa adaptação
dinâmica. Em muitos casos, os resultados do protótipo podem le-
var a um reinício de todo processo criativo (Etapa 1), fato que não
deve ser encarado como uma falha de processo, mas uma necessi-
dade frente à realidade.

Etapa 4: Comunicação.
O processo participativo e democrático invariavelmente es-
barra em questões como falta de tempo, espaço, verba etc. Em
muitos casos, a participação simplesmente não ocorre porque nun-
ca foi considerada como parte de um processo educativo, fato que
contribui para a perpetuação da falta de cultura relacionada ao
cuidado e à corresponsabilização.
Um caminho que gradualmente colabora com o envolvi-
mento de diferentes atores, a fim de garantir da melhor forma
possível um processo de ensino-aprendizagem social, é estabe-
lecer canais de comunicação com a comunidade, divulgando
regularmente os resultados atingidos em cada etapa da criação,
e como eles podem colaborar com o processo adaptativo e me-
lhoria das condições de vida frente aos impactos das mudanças
climáticas.
Essa etapa de comunicação, apesar de essencial, não é nor-
malmente considerada nos modelos que trabalham com aprendi-
zagem baseada em problemas ou design thinking. Cartaz, blog, vlog,
jornal comunitário, mural de fotos, rádio comunitária são apenas
algumas das muitas estratégias de comunicação ligadas ao pro-
cesso educacional e de adaptação. Para explorar as questões de
educomunicação, sugiro o sítio http://www.futura.org.br/caleidos-
copio/educomunicacao-fluencia-de-comunicacao-na-escola/.
Além disso, recomenda-se o sítio do Centro Nacional de Moni-
toramento e Alertas de Desastres Naturais, que realiza diferentes
projetos que visam “contribuir para a geração de uma cultura da
percepção de riscos de desastres, no amplo contexto da educação
ambiental e da construção de sociedades sustentáveis e resilientes”.
Visite http://educacao.cemaden.gov.br/

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Para além das habilidades e competências.


A educação como caminho para estimular a investigação e a
criação coletiva de protótipos colabora diretamente com o aumen-
to do conhecimento e da “consciência” sobre as mudanças climáti-
cas e seus impactos, levando, de forma prática, lúdica e desafiado-
ra, a um aumento gradual da capacidade de adaptação da escola,
comunidade e território.
Essa trajetória criativa é responsável pelo ensino de diferen-
tes competências e habilidades associadas ao desenvolvimento do
pensamento sistêmico, crítico, reflexivo e complexo, bem como à
capacidade de previsão, por exemplo. Tal característica, ao mesmo
tempo individual e coletivo, vai ao encontro do preconizado pela
nova Base Nacional Comum Curricular do ensino básico. Nesse
âmbito, competência é definida como “a mobilização de conheci-
mentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cogniti-
vas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas
complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do
mundo do trabalho” (BRASIL, 2018; p. 8).
Entretanto, a construção coletiva de medidas de adaptação
e o ensino de competências demanda, em particular dos edu-
cadores, uma nova postura frente aos olhares, conhecimentos e
desejos trazidos por estudantes e outros atores da comunidade.
Ponto fundamental para o sucesso desse processo é a capacitação
dos educadores para que estes possam lidar de forma produtiva e
proativa com novos tipos de relação com o conhecimento e com
os estudantes, mais dinâmico, participativo e, consequentemente,
mais diverso. Isso implica saber trabalhar em grupos multi e inter-
disciplinares a fim de se compreender, e coletivamente resolver, os
desafios locais relacionados às mudanças climáticas (DAVIDSON
e LITH, 2012).
Apesar de fundamental, pouco ainda foi realizado nesse senti-
do, como indica o Anexo do Relatório de Monitoramento do Plano
Nacional de Mudança do Clima (2016-2017) (BRASIL, 2016). A
meta 2.1, que diz respeito à “Estratégia de capacitação em adap-
tação desenvolvida e implementada para públicos-alvo diversos”,
aponta o desenvolvimento de um único curso à distância denomi-
nado “Educação Ambiental e Mudança do Clima”, o que parece

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insuficiente considerando-se as complexas demandas ligas ao au-


mento da capacidade de adaptação das comunidades.
Para além do ensino de competências e desenvolvimento de
habilidades, o trabalho de busca por mecanismos de adaptação na
MMP, sempre em somatória com estratégias de mitigação, deve
ser responsável pelo estabelecimento de novas conexões entre di-
ferentes atores fundadas na visão de um bem coletivo maior, do
estabelecimento de relações de confiança e cumplicidade, e da
compreensão da importância da corresponsabilidade frente às in-
certezas do presente e do futuro.

Referências
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança
do Clima. Relatório de Monitoramento 2016-2017. Anexo. Portaria MMA nº 150
de 10 de maio de 2016 / Ministério do Meio Ambiente. Brasília: MMA, 2016.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Educação é
base. Ensino Médio. Brasília: MEC, 2018.
DAVIDSON, J.; LITH, A. Education for Climate Change Adaptation — Enhan-
cing the Contemporary Relevance of Planning Education for a Range of Wicked
Problems. Journal for Education in the Built Environment, v. 7, n. 2, p. 63-83, 2012.
GRANDISOLI, E. Projeto Educação para a Sustentabilidade. Transformando
espaços e pessoas. Uma experiência de sete anos no Ensino Médio. Tese de Dou-
torado. Orientador: Prof. Dr. Pedro Roberto Jacobi. Programa de Ciência Am-
biental - Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo. São
Paulo. 192 p., 2018.
JACOBI, P. R.; GRANDISOLI, E. Aprender junto: práticas colaborativas e
aprendizagem social. In: SULAIMAN, S. N.; JACOBI, P. R. (Orgs.) Melhor preve-
nir: olhares e saberes para a redução de risco de desastre [recurso eletrônico].
São Paulo: IEE-USP, 2018.
JACOBI, P. R.; GUERRA, A. F. S.; SULAIMAN, S. N.; NEPOMUCENO, T. Mu-
danças climáticas globais: a resposta da educação. Revista Brasileira de Educação,
v. 16, n. 46, jan.-abr., 2011.
LIMA, G. F. C.; LAYRARGUES, P. P. Mudanças climáticas, educação e meio
ambiente: para além do Conservadorismo Dinâmico. Educar em Revista, Edição
Especial n. 3, p. 73-88. Curitiba: Editora UFPR, 2014.
MORAN, J. Mudando a educação com metodologias ativas. In: SOUZA, C. A.;
MORALES, O. E. T. Convergências midiáticas, educação e cidadania: aproximações
jovens. Vol. II. Coleção Mídias Contemporâneas. PROEX/UEPG, 2015.
SULAIMAN, S. N. Ação e reflexão: educar para uma cultura preventiva. In:
SULAIMAN, S. N.; JACOBI, P. R. (Orgs.) Melhor prevenir: olhares e saberes para
a redução de risco de desastre [recurso eletrônico]. São Paulo: IEE-USP, 2018.
VALENTE, J. A. Aprendizagem ativa no ensino superior: a proposta da sala de aula
invertida. Depto. de Multimeios, Nied e GGTE, Unicamp & Ced – PUC-SP, 2014.

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Capítulo 28

Adaptar para quem e como?


Adaptação e justiça ambiental
na Macrometrópole Paulista
Pedro Torres1 e Ana Lia Leonel2

Palavras-chave: Justiça ambiental. Adaptação. Indi-


cadores. Planos de adaptação.

Introdução

No corrente debate sobre as mudanças climáticas, seja na


academia, governos ou sociedade civil, é comum, ou fre-
quente, o nexo entre adaptação, vulnerabilidade e risco, sobretudo
em países de maioria pobre e desigualdades sociais, como é a reali-
dade da maioria dos territórios do hoje chamado Sul Global, onde
situa-se a região da Macrometrópole Paulista (MMP). Mas vulnera-
bilidade e risco não possuem, necessariamente, raízes em constru-
ções e análises na demanda por reconhecimento, direitos e justiça.
Os presentes autores chamam a atenção, portanto, para a ne-
cessária interface entre a agenda dos direitos e da justiça e o deba-
te das mudanças climáticas, mais especificamente em relação ao
tema da adaptação que oferece a possibilidade, uma vez que trata-
se de planejar o território para variabilidades futuras, que sejam
investidos recursos – técnicos e financeiros – em novas formas de
se produzir cidades, com a redução das desigualdades, logo com a
redução das injustiças ambientais.
Nesse sentido é imperativo que seja levado em consideração
o componente da Justiça Ambiental na construção de Planos de
Adaptação (sejam eles municipais, estaduais ou federal) de regiões,
de bacias ou realizados pela sociedade civil, até como estratégia de
planejamento comunitário, insurgente e participativo.

1
Instituto de Energia e Ambiente (IEE). Universidade de São Paulo (USP).
2
Universidade Federal do ABC (UFABC).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Mas o que é, de fato, Justiça Ambiental? A noção de Justiça


Ambiental tem origem nos estudos do sociólogo Robert Bullard,
na década de 1980, que expôs, pela primeira vez, a conexão entre o
racismo nos Estados Unidos e as desigualdades ambientais, ou seja,
como existia uma relação entre raça e a exposição de rejeitos tóxi-
cos, impactos ambientais, poluentes etc. Para tanto, Bullard criou
um mapa da desigualdade ambiental utilizando como base empírica
as denúncias de movimentos de atingidos por esses agravos (AC-
SELRAD, 2009 e 2010). No Brasil a Justiça Ambiental ganha con-
tornos para além da questão racial, em que pese a questão de renda
dos grupos mais vulneráveis e atingidos por impactos ambientais.
Por aqui os movimentos começam a se associar à temática da
Justiça Ambiental a partir dos anos 2000, tendo o marco de criação
da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA) em 2001, servindo
como secretaria facilitadora de redes e movimentos sociais brasilei-
ros, além de pesquisadores da academia engajados na causa3. Para
Acselrad (2010), a noção de Justiça Ambiental reflete um movimento
de ressignificação da questão ambiental, resultante da apropriação da
temática por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente envolvidas
com a construção da justiça social.
A estratégia ancorada na noção de Justiça Ambiental, por
sua vez, identifica a desigual exposição ao risco como resultado
de uma lógica que faz com que a acumulação de riqueza se reali-
ze tendo por base a penalização ambiental dos mais despossuídos
(ACSELRAD, 2010).
Mas como estão as atuais diretrizes do governo federal, a par-
tir do Plano Nacional de Adaptação (PNA) instituído em 10 de maio
de 2016 por meio da Portaria nº 150? Como essa agenda aparece,
se aparece, na visão do Estado brasileiro sobre o assunto? Como os
gestores públicos, técnicos de secretarias, ministérios e autarquias,
assim como a sociedade civil e academia podem contribuir com esse
debate? Existem dados e indicadores que podem contribuir com
políticas públicas voltas para essas questões?
3
A RBJA tem hoje mais de 90 entidades filiadas, entre os quais a Rede Nacional
de Advogados e Advogadas Populares (RENAP), o Instituto Políticas Alternativas
para o Cone Sul (PACS), o Movimento Xingu Vivo para Sempre, o Movimento dos
Atingidos por Barragens (MAB), a Justiça Global, o Instituto de Estudos Socioeco-
nômicos (INESC), o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE),
a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), entre outras.

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Governo Federal/Plano Nacional de Adaptação


Na biblioteca de conteúdos da plataforma AdaptaClima4,
coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente do governo fede-
ral, não há uma única menção à palavra justiça na extensa lista de
conteúdos (biblioteca de conteúdos) – a plataforma foi lançada em
2017 visando alcançar o primeiro objetivo do Plano Nacional de
Adaptação, que prevê entre suas metas uma “plataforma online
de gestão do conhecimento em adaptação criada e disponível à
sociedade”.
O Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima foi pu-
blicado em 11 de maio de 2016, com o objetivo de promover uma
gestão para a redução do risco climático “de forma a aproveitar
as oportunidades emergentes, evitar perdas e danos e construir
instrumentos que permitam a adaptação dos sistemas naturais,
humanos, produtivos e de infraestrutura” (BRASIL, 2016a, p. 5).
A principal estratégia apresentada se vale da “inserção da gestão
do risco da mudança do clima nos planos e nas políticas públicas
setoriais e temáticas existentes, bem como nas estratégias de de-
senvolvimento nacional” (BRASIL, 2016a p. 5).
Há um reconhecimento nesse documento a respeito da vulne-
rabilidade das populações tradicionais (indígenas, quilombolas, ri-
beirinhas) em relação ao risco associado à mudança do clima, e que
devem existir abordagens com critérios raciais, étnicos e sensíveis ao
gênero (BRASIL, 2016b, p. 19). Dentre as estratégias setoriais apre-
sentadas pelo plano, uma delas concerne aos povos e populações
vulneráveis, visando à promoção de sua adaptação através de três
metas (BRASIL, 2016a, p. 11): a) “Diagnóstico da Vulnerabilidade
à Mudança do Clima das populações-alvo da Política Nacional de
Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI)” sob
responsabilidade da FUNAI; b) “Diagnóstico da Vulnerabilidade à
Mudança do Clima das populações-alvo do Plano Nacional de Segu-
rança Alimentar e Nutricional (Plansan)” sob responsabilidade do
Ministério do Desenvolvimento Social; c) “Diagnóstico elaborado
e redução da Vulnerabilidade à Mudança do Clima promovida em
populações vulneráveis e beneficiárias das políticas públicas agroe-
xtrativistas” sob responsabilidade do MMA.

4
Disponível em http://adaptaclima.mma.gov.br. Acessado em: janeiro 2019.

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Apesar de o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Cli-


ma considerar a população mais vulnerável, o termo “ justiça” não
aparece no sumário executivo nem no volume 1 – estratégia ge-
ral. Nesse segundo aparece o termo “ justa” dentre os princípios,
fazendo referência à “adaptação como uma estratégia de fomen-
to ao setor produtivo com transição justa para os trabalhadores e
de crescimento econômico, alinhada às estratégias de redução da
pobreza, das desigualdades socioeconômicas e regionais, inclusi-
ve considerando o princípio da prevenção e precaução” (BRASIL,
2016b, p. 19).
O segundo volume do Plano Nacional de Adaptação à Mu-
dança do Clima trata das estratégias setoriais e temáticas e em
seu escopo usa o termo “ justiça” quatro vezes, sendo uma delas
para explicar o escopo de outro plano (Plano Nacional para
a Promoção dos Produtos da Sociobiodiversidade), articulado
com PNA como uma diretriz para promoção da adaptação, atra-
vés da estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional (BRA-
SIL, 2016c, p. 233). No capítulo 3, intitulado Estratégia de Ci-
dades, o termo “ justiça” aparece com o mesmo teor discutido
nesse capítulo e embasado por Marengo (2009), onde “apesar
de todos serem afetados de alguma forma, os impactos da mu-
dança do clima atingem principalmente os mais pobres” (BRA-
SIL, 2016c, p. 65), principalmente devido à concentração em
áreas de alto risco e com acesso limitado a serviços e recursos
de uma população que já encara os efeitos de eventos extremos
sob o estresse da variabilidade climática. Nesse sentido o plano
se apresenta também como instrumento de articulação inter-
setorial e intergovernamental na elaboração da capacidade de
resposta.
No capítulo que explana sobre a estratégia de Povos e Po-
pulações Vulneráveis, especificamente na seção sobre os “povos
indígenas e mudança do clima: vulnerabilidade, adaptação e co-
nhecimentos tradicionais”, aparece o termo “Justiça Climática”
(BRASIL, 2016c, p. 159). A ideia desse termo é que aqueles que
são menos responsáveis pelos impactos que levam à mudança do
clima, como emissão de gases de efeito estufa, são os mais impac-
tados pelos efeitos dessa mudança. Por isso a necessidade apre-
sentada de se “tratar das dimensões éticas de direitos humanos

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das mudanças climáticas de forma a reduzir a vulnerabilidade de


grupos sociais desproporcionalmente afetados pelas mudanças do
clima” (BRASIL, 2016c, p. 159).
Além do plano em si, a Secretaria de Mudanças Climáticas
e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente produ-
ziu a Revista Adaptação (BRASIL, 2016d), na ocasião das consultas
públicas para a construção do PNA, voltada a técnicos, sociedade
civil, empresários e pesquisadores que trabalham com mudança
do clima. O objetivo da revista é de embasar o diálogo e reunir as
diferentes visões dos parceiros envolvidos no processo de elabora-
ção do plano. Analisando a revista, os termos “ justiça”, “ justa(s)”,
“ justo(s)” ou “direito” não aparecem nenhuma vez. Os termos
“ambiente / ambiental(ais)” somados se repetem 50 vezes, “desen-
volvimento” aparece 28 vezes, e “vulnerabilidade(s)” 27 vezes. O
termo “gestão” é usado 19 vezes, enquanto “governança” aparece
apenas três vezes (BRASIL, 2016d). Podemos dizer que isso não se
deve à falta de dados, indicadores ou produção científica, já que,
como discutido aqui, a relação entre vulnerabilidade social e am-
biental é crucial às políticas relacionadas à adaptação às mudanças
do clima.
Existem diversos indicadores, dados e mapeamento extenso
sobre desigualdades e vulnerabilidades no Brasil e no Estado de
São Paulo5 que podem ser utilizados na concepção e elaboração
de planos de adaptação às mudanças climáticas. Destacamos aqui
o Índice de Vulnerabilidade aos Desastres Naturais relacionados
às secas no contexto da mudança do clima (IVDNS) que considera
a seca meteorológica “o principal agente deflagrador dos desastres
de secas no Brasil” (BRASIL, 2017a, p. 8). Utilizando “variáveis
climáticas, físico-ambientais, socioeconômicas e de políticas pú-
blicas, que se relacionaram através dos subíndices de exposição,
sensibilidade e capacidade adaptativa” (BRASIL, 2017a, p. 12), é
possível “a identificação de localidades críticas aos desastres de
secas” (BRASIL, 2017a, p. 20).
A relevância de se olhar para esse índice é, de um lado, a im-
portância da problemática da escassez hídrica que aflinge cons-

5
Índice de Vulnerabilidade Social (IVS, IPEA), Índice Paulista de Vulnerabilidade
Social (IPVS), Índice de Vulnerabilidade Socioecológica (IVSE), Índice de Bem Estar
Urbano (IBEU), entre outros.

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tantemente, e cada vez com mais força, a Macrometrópole Paulis-


ta. E de outro lado pelo fato de ele ser construído por subíndices
que olham além dos modelos climáticos. O subíndice de sensi-
bilidade, por exemplo, “representa o contexto socioeconômico
e ambiental que contribui para ampliar ou reduzir os efeitos da
exposição à mudança do clima” (BRASIL, 2017a, p. 9) e é com-
posto pelas variáveis socioeconômicas de porcentagem da popu-
lação com renda abaixo de 25% do salário mínimo, mortalidade
infantil e densidade demográfica e, ainda, uso do solo e índice de
demanda e oferta de água (BRASIL, 2017b, p. 45). O subíndice
de capacidade adaptativa “representa a capacidade de resposta
e de reordenamento dos sistemas humanos frente às possíveis
mudanças do clima relacionadas às secas” (BRASIL, 2017a, p. 9)
a partir das variáveis de IDHm, GINI e analfabetismo (BRASIL,
2017b, p. 45).
Por sua vez, o subíndice de exposição “representa todas as
mudanças do clima relacionadas às componentes que causam a
seca meteorológica” e é construído com a média e variabilidade de
precipitação e a ocorrência de extremos climáticos de secas. Esse
subíndice é apresentado em quatro cenários e, consequentemente,
o IVDNS completo, ou seja, “conjugação dos Subíndices de Exposi-
ção com Sensibilidade, interagindo também com o de Capacidade
Adaptativa” (BRASIL, 2017b, p. 100) apresenta um certo grau de
incerteza e diferença de assertividade entre o modelo aplicado e
as condições reais.
A Figura 1 apresenta o Índice de Vulnerabilidade aos Desas-
tres Naturais relacionados às Secas no contexto das Mudanças Cli-
máticas nos dois cenários para os dois modelos climáticos para os
municípios da Macrometrópole Paulista (EMPLASA, 2018). “Os
valores do IVDNS são apresentados em uma escala que varia pra-
ticamente de 0.00 até 1.00, sendo que, quanto maior for este valor
maior é a vulnerabilidade de determinada localidade” (BRASIL,
2017a, p. 24), e na região da MMP não tem nenhum município
com índice muito alto de vulnerabilidade em nenhum cenário/
modelo. Nessa região, o município de Itaquaquecetuba é o que
apresenta os maiores valores do índice de Vulnerabilidade para
os quatro cenários (de 0,496 a 0,618) e, junto com Arujá, são os
únicos municípios com a classificação de vulnerabilidade Alta da

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tabela de IVDNS no modelo/cenário Eta-MIROC 4,5. Embu é o


município que apresenta o maior valor para o subíndice de Sen-
sibilidade e apresenta o IVDNS moderadamente alto nos quatro
casos, enquanto Natividade da Serra apresenta o menor valor para
o subíndice de CapacidadeAadaptativa e IVDNS Baixo nos quatro
modelos/cenários.

Figura 1
Mapas do IVDNS (composto pelos Subíndices: Exposição,
Sensibilidade e Capacidade Adaptativa), para o período de 2011-2041,
com recorte na Macrometrópole Paulista (MMP).

Fonte: MMA, 2017; Emplasa, 2018. Adaptado por Ana Lia Leonel, 2018.

Recomendações
Com a tendência de maior frequência dos fenomenos liga-
dos à variabilidade climática, sejam eles mais períodos de chuvas
ou mais períodos de secas, enchentes, deslizamentos de encostas
ou escassez hídrica, para citar alguns exemplos concretos que já
atingem a Macrometrópole Paulista, os municípios que integram
a região precisarão repensar a forma que vem sendo planejadas
as cidades. Nesse sentido, planos de adaptação deverão ser instru-
mentos que busquem maior resiliência em face de possíveis desas-
tres e alterações do território.
No Sudeste do país (com exceção do norte de MG), a gestão
do uso da água somada à forte degradação ambiental é um desafio
a ser enfretado, pois em diversos municípios já é possivel verificar

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

secas de seus mananciais e, consequentemente, alto índice de vulne-


rabilidade, de acordo com IVDNS. A oferta de água nessas localida-
des, inclusive, já não é sufuciente para atender toda a demanda com
segurança devido a vetores de pressão como aumento populacional
e crescimento econômico, assim como o enorme desperdício, po-
luição de rios e matas, desmatamento e não recuperação de matas
ciliares e nascentes (BRASIL, 2017a, p. 34).
No Brasil ainda são raros os planos específicos para adapta-
ção às mudanças climáticas. O que de um lado confirma que o
país tem direcionado suas ações nas últimas décadas mais para
a questão da mitigação do que de sua adaptação. Por outro lado,
abre a possibilidade, que deve ser aproveitada, para que os planos
de adaptação que venham a ser produzidos incorporem desde sua
concepção aspectos fundamentais de combate à pobreza e às de-
sigualdade sociais. Tais premissas não estão sendo consideradas
em diversos exemplos de planos de adaptação realizados mundo
afora, seja em cidades do Sul Global como Jakarta, Medellin, San-
tiago, ou do Norte, tais como Boston e New Orleans (ANGUELO-
VSKI et al., 2015).
Nesse sentido, é preciso atentar para algumas questões como,
se as intervenções propostas pelos planos e projetos de adaptação
afetam ou acarretam em remoção de populações mais pobres, e se,
ao mesmo tempo, privilegiam – sobretudo com alteração do custo
do solo e efeito desse processo na vinhança – populações mais
ricas. Para buscar a construção democrática e participativa dos
planos de adaptação é imperativo, portanto, que eles contenham
em sua construção inicial uma considerável representação da po-
pulação local, integrando a questão da Justiça Ambiental tanto na
concepção da infraestrutura e intervenções planejadas, como na
sua implementação (SHI et al., 2016).
Para o caso da Macrometrópole Paulista, são poucos os esfor-
ços em termos de políticas públicas para a implementação de pla-
nos, políticas e projeto para área de adaptação. Considerado o prin-
cipal documento de ações e planos futuros para a macrometrópole,
o Plano de Ação da Macrometrópole sequer aborda o tema de
maneira direta. Em relação às mudanças climáticas há apenas a
menção, no documento Visão da Macrometrópole (EMPLASA,
2014), de maneira genérica, sobre a implementação de programas

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

já existentes, como o “Programa de Remanescentes Florestais”, a


instituição da Política Estadual de Mudanças Climáticas, além da
menção para os projetos de Pagamentos por Serviços Ambientais
(PSA) a proprietários de áreas particulares que sejam objeto de
preservação ambiental.

Referências
ACSELRAD, Henri. Ambientalização das lutas sociais – o caso do movimento
por justiça ambiental. Estudos Avançados, São Paulo, v. 24, n. 68, p. 103-119, 2010.
ACSELRAD, H.; CAMPELLO, C.; BEZERRA, G. O que é Justiça Ambiental. 1. ed.
Rio de Janeiro: Garamond, 2009. 160p.
ANGUELOVSKI, I. et al. Equity impacts of urban land use planning for clima-
te adaptation: critical perspectives from the global north and south. Journal of
Planning Education and Research, 2016.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança
do Clima: sumário executivo. Brasília, DF: MMA, 2016a.
______. Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança
do Clima: volume 1 – estratégia geral. Brasília, DF: MMA, 2016b.
______. Ministério do Meio Ambiente. Plano Nacional de Adaptação à Mudança
do Clima: volume 2 – estratégias setoriais e temáticas. Brasília, DF: MMA, 2016c.
______. Ministério do Meio Ambiente. Revista Adaptação à Mudança do Clima.
v. 1, n. 1. Brasília: MMA, 2016.d Disponível em http://www.mma.gov.br/clima/
adaptacao/plano-nacional-de-adaptacao.
______. Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Integração Nacional, WW-
F-Brasil. Índice de vulnerabilidade aos desastres naturais relacionados às secas
no contexto da mudança do clima: sumário executivo. Brasília, DF: MMA, 2017a.
______. Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Integração Nacional, WW-
F-Brasil. Índice de vulnerabilidade aos desastres naturais relacionados às secas
no contexto da mudança do clima: estudo completo. Brasília, DF: MMA, 2017b.
EMPLASA. Plano de Ação da Macrometrópole Paulista. 2013-2040: uma visão da
macrometrópole. 1. ed., vol. 2. São Paulo: Empresa Paulista de Planejamento
Metropolitano s/a (Emplasa), 2015.
SHI, L. et al. Roadmap towards justice in urban climate adaptation research.
Nature Climate Change, vol. 6, 2016.

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Glossário 

AbE – Adaptação baseada em Ecossistema


ACB – Análise Custo-Benefício
ACE – Análise Custo-Efetividade
AMC – Análise Multicritério
ANA – Agência Nacional de Águas
ANTP – Associação Nacional de Transporte Públicos
ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres
AR7 – Seventh Assessment Report (Sétimo Relatório de Avaliação)
BPBES – Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistê-
micos
C40s – Cities Climate Leadership Group (Grupo de Liderança Climática
das Cidades)
CCP – Campanha Cidades pela Proteção do Clima
CDB – Convenção da Diversidade Biológica
CEIVAP – Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba
do Sul
CEM – Centro de Estudos da Metrópole
CEMADEN – Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres
Naturais
CETESB – Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
CIDH – Comissão Interamericana de Direitos Humanos
CIM – Comissão Interamericana de Mulheres
CMMC – Comissão Municipal de Adaptação à Mudança no Clima
CNPQ – Conselho Nacional de Pesquisa
CONDEPHAAT – Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Ar-
queológico, Artístico e Turístico
CONPDEC – Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil
COPPE – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa
de Engenharia
CPLA – Coordenadoria de Planejamento Ambiental
CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos
CQNUMC (UNFCCC) – United Nations Framework Convention on Cli-
mate Change (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mu-
danças Climáticas)
CVE – Centro de Vigilância Epidemiológica
DCA – Departamento de Ciências Atmosféricas
DRSAI – Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

EACH – Escola de Artes, Ciências e Humanidades


ECA – Escola de Comunicações e Artes
EMPLASA – Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S. A.
ENSO – El Niño-Southern Oscillation
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
FGV-CES – Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio
Vargas
FPMCB – Fórum Paulista de Mudanças Climáticas de Biodiversidade
FUNAI – Fundação Nacional do Índio
GBE – Gestão Baseada em Ecossistema
GEE – Gases do Efeito Estufa
GIRH – Gestão Integrada de Recursos Hídricos
IAG – Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas
IBASE – Instituto Brasileiro de Análise e Econômicas
IBEU – Índice de Bem Estar Urbano
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICLEI – International Council for Local Environmental Initiatives (Go-
vernos Locais pela Sustentabilidade).
IEA – Instituto de Estudos Avançados
IEE – Instituto de Energia e Ambiente da USP
IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente
INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos
INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
IO – Instituto Oceanográfico/USP
IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change (Painel Intergover-
namental sobre Mudança do Clima)
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
IPVS – Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica
ITDP – Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento
ITR – Imposto Territorial Rural
IVDNS – Índice de Vulnerabilidade aos Desastres Naturais de Seca
IVS - Índice de Vulnerabilidade Social
IVSE – Índice de Vulnerabilidade Socioecológica
LNP – Litoral Norte Paulista
MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens
MacroAmb – Projeto Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

MC – Mudanças Climáticas
MDL – Mecanismos de Desenvolvimento Limpo
MMA – Ministério do Meio Ambiente
MMP – Macrometrópole Paulista
MRF – Mary Robinson Foundation
NEPAM – Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais
NRM – Nível Relativo do Mar
ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
OEA – Organização dos Estados Americanos
OLNPP – One Less Nuclear Power Plant (Uma Usina Nuclear a Menos)
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PACS – Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
PAM – Plano de Ação da Macrometrópole Paulista
PBMC – Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas
PDDT – Plano Diretor de Desenvolvimento dos Transportes
PDE – Plano Diretor Estratégico 
PDUI – Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado
PEMC – Política Estadual de Mudanças Climáticas 
PGPP – Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas
PGT – Núcleo de Política e Gestão Tecnológica 
PGT – Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão de Ter-
ritório
PITU – Plano Integrado de Transporte Urbano
PlanMob – Plano Municipal de Mobilidade Urbana
PLANSAN – Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico
Plansan – Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
PMMA – Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlân-
tica
PMMCS – Plano Municipal de Mudança do Clima de Santos
PMVA – Programa Município Verde-Azul
PNA – Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNGATI – Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras
Indígenas
PNLT – Plano Nacional de Logística e Transporte
PNMC – Política Nacional sobre a Mudança do Clima
PNMU – Política Nacional de Mobilidade Urbana
PNPDEC – Política Nacional de Proteção e Defesa Civil
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente


PROCAM – Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental 
PROCLIMA – Programa Estadual de Mudanças Climáticas do Estado
de São Paulo
Procosta – Programa Nacional para a Conservação da Linha de Costa
PSTM – O Plano Setorial de Transporte e de Mobilidade Urbana para
Mitigação e Adaptação à Mudança do Clima
RBJA – Rede Brasileira de Justiça Ambiental
RENAP – Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares
RIO-92 – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (Eco-92 ou Cúpula da Terra)
RMBS – Região Metropolitana da Baixada Santista
RTMs – Redes Transnacionais de Municípios
SABESP – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo
SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
SEMOB – Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana
SMA – Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo
SMG – Seoul Metropolitan Government
UC’s – Unidades de Conservação
UFABC – Universidade Federal do ABC
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UN-HAbitat – Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Hu-
manos
UNESP – Universidade Estadual Paulista
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
UNISDR – UN Office for Disaster Risk Reduction (UNDRR) (Escritório
das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres)
USP – Universidade de São Paulo
WWF – World Wide Fund for Nature (antiga World Wildlife Foundation)
ZC – Zona Costeira
ZEE – Zoneamento Ecológico-Econômico
ZEEC – Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro
ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social

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Organizadores

Pedro Torres (IEE-USP) - Cientista social e planejador urbano, atualmente


é pós-doutorando no Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Uni-
versidade de São Paulo (USP), pesquisador no Projeto Temático “Go-
vernança ambiental na Macrometrópole Paulista face à variabilidade
climática”. É pesquisador do “Projeto LatinoAdapta - Fortaleciendo
vínculos entre la ciencia y gobiernos para el desarrollo de políticas
climáticas en América Latina da Red Regional de Cambio Climático
y Toma de Decisiones”, do INterdisciplinary CLimate INvestigation
cEnter (INCLINE/USP) e Research Fellow do Earth System Gover-
nance. É Visiting Scholar na Bren School of Environmental Science
& Management, University of California, Santa Barbara (UCSB)

Pedro R. Jacobi (IEE-USP) - Sociólogo, mestre em Planejamento Urbano,


doutor em Sociologia e livre docente em Educação. Professor titular
do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental/Instituto de
Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP). Mem-
bro da Divisão Cientifica de Gestão, Ciência e Tecnologia Ambiental
do IEE/USP. Pesquisador Responsável do Projeto Temático Fapesp
“Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face à variabi-
lidade Climática” (MacroAmb), IEE/USP. Editor da revista Ambiente
e Sociedade. Coordenador do Grupo de Estudos Meio Ambiente e So-
ciedade do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA).

Fabiana Barbi (Universidade Católica de Santos e NEPAM-UNICAMP)


- Pesquisadora colaboradora no Núcleo de Estudos e Pesquisas
Ambientais (Nepam/Unicamp) e pós-doutoranda na Universida-
de Católica de Santos. É socióloga, mestre em Ciência Ambiental
(Procam/USP), doutora em Ambiente e Sociedade (Unicamp). É
membro da rede de pesquisadores do Earth Sytem Governance
Project e autora do livro Mudanças Climáticas e Respostas Políticas
nas Cidades (Ed. Unicamp, 2015).

Leandra R. Gonçalves (IO-USP) - Pós-doutoranda no Instituto Oceanográ-


fico da Universidade de São Paulo e pesquisadora no Projeto Temá-
tico “Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face à va-
riabilidade climática”. É bióloga pela Pontifícia Universidade Católica
de Campinas (SP), mestre em Biologia pela Universidade Federal de
Juiz de Fora (MG) e doutora pelo Instituto de Relações Internacionais
da USP. Já trabalhou com diversas organizações não governamentais
como o Greenpeace, a Fundação SOS Mata Atlântica e outras. É parti-
cipante de algumas redes nacionais de pesquisa e conhecimento como
a Ouvidoria do Mar e o PainelMar, e internacionais como a Earth Sys-
tem Governance Project. É pesquisadora da Plataforma Brasileira so-
bre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Sobre os autores:
Alberto Medici - Possui graduação em Ciências Sociais pelo Centro Uni-
versitário Fundação Santo André, mestrado em Sociologia na FFL-
CH/USP e doutorado em Sociologia FFLCH/USP. Tem experiên-
cia na área de Ciências Sociais, com ênfase em Sociologia, atuando
a partir de 2010 principalmente nos seguintes temas: sustentabili-
dade e políticas públicas, sociedade e meio ambiente, restauração
de áreas degradadas e interesse público. É colaborador do Proje-
to Temático FAPESP “Governança Ambiental na Macrometrópole
Paulista face à variabilidade climática”.

Alexander Turra - Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universi-


dade Estadual de Campinas e mestrado e doutorado em Ecologia pela
Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é professor titular
do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP)
atuando nas áreas de Ecologia Marinha e Gerenciamento Costeiro,
nos seguintes temas: manejo integrado e conservação marinha; im-
pacto ambiental marinho; mudanças climáticas; lixo nos mares; e
ecologia de populações e comunidades marinhas. É coordenador do
Programa de Políticas Públicas do IOUSP, membro da Rede Clima,
participante do INCT para Mudanças Climáticas, representante da
academia junto ao Grupo de Integração do Gerenciamento Costeiro
no âmbito da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar,
relator de Ciências da Vida no Grupo de Avaliação Ambiental do
Programa Antártico Brasileiro e membro do Conselho do Projeto
de Áreas Marinhas e Costeiras Protegidas (Projeto GEF-Mar/MMA).

Alexandre Igari - É docente, pesquisador, orientador e vice-coordenador


no Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade da Escola de
Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (PPGS
- EACH-USP). Atua também como docente no curso de bacharelado
em Gestão Ambiental da EACH-USP, nas áreas de Administração
e Finanças aplicadas à Gestão Ambiental e de Economia Ecológica.
Possui doutorado em Ecologia pelo Instituto de Biociências da
Universidade de São Paulo (IB-USP), com estágio de doutorado
sanduíche concluído na Universidad de Alicante (Espanha).

Ana Carolina Campos - Jornalista científica FAPESP, Processo


2018/09713-3, vinculada ao Projeto Temático 2015/03804-9, Insti-
tuto de Energia e Ambiente (IEE), da Universidade de São Paulo
(USP). Graduada em Comunicação Social (com habilitação em Mi-
dialogia) em 2011, pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual
de Campinas (IA/UNICAMP) e meste em Divulgação Científica
e Cultural pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo
(LABJOR/UNICAMP) em 2015. Foi bolsista no projeto “Criação de

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

um Webdocumentário para Avaliação do Programa Minha Casa Mi-


nha Vida” (CTI ‘Renato Archer’/Ministério das Cidades) e no pro-
jeto “Policiamento e imaginários urbanos: novos formatos de segu-
rança em cidades ao sul” (convênio Brasil/Portugal, FAPESP/FCT).

Ana Lia Leonel - Bacharel em Ciências Sociais, mestre e doutoranda em


Planejamento e Gestão do Território na Universidade Federal do ABC
(UFABC). Atualmente é pesquisadora bolsista FAPESP de Treinamen-
to Técnico (2018/02464-8) no Projeto Temático “Governança ambien-
tal na Macrometrópole Paulista face à variabilidade climática”.

Andrea Ferraz Young - Jovem Pesquisador (FAPESP) no Centro Nacional


de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (CEMADEN). Pos-
sui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Pontifícia Universi-
dade Católica de Campinas, doutorado e mestrado em Engenharia
Agrícola pela Universidade Estadual de Campinas, especialização em
Gestão Ambiental pela Faculdade de Engenharia Mecânica da UNI-
CAMP. Desenvolveu pesquisa no CEPAGRI-UNICAMP no Projeto
AlcScens (2013-2015). Trabalhou como Visiting Researcher no King´s
College London (2012-2013), desenvolveu pesquisa de pós-doutorado
no Centro de Ciências do Sistema Terrestre (CCST-INPE) no projeto
Megacidades (2009-2011), e pós-doutorado no Núcleo de Estudos
de População (NEPO-UNICAMP) no Projeto Vulnerabilidade das
Metrópoles Paulistas (2006-2009).

Arilson Favareto - Sociólogo (pela Pontifícia Universidade Católica de


Campinas). Mestre em Sociologia (pela Universidade Estadual de
Campinas). Doutor em Ciência Ambiental (pela Universidade de
São Paulo). Realizou estágio de estudos na École des Hautes Études
en Sciences Sociales em Paris (França). É professor na Universida-
de Federal do ABC, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em
Planejamento e Gestão do Território. É também pesquisador cola-
borador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

Beatriz Milz - Doutoranda do Programa de Ciência Ambiental (PRO-


CAM), no Instituto de Energia e Ambiente (IEE), da Universidade
de São Paulo (USP). Bolsista FAPESP, Processo 2018/23771-6. Mes-
tre em Ciências (2018) pelo Programa de Pós-Graduação em Análise
Ambiental Integrada, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Bacharel em Gestão Ambiental (2015) pela Escola de Artes, Ciências
e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP).

Camila Espezio de Oliveira - Bacharela em Gestão Ambiental pela Esco-


la de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo
(2015). Mestra e doutoranda em Ciências pelo programa de Susten-
tabilidade da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Univer-
sidade de São Paulo.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Carla Gomes - Pesquisadora de pós-doutoramento no Instituto de Ciên-


cias Sociais da Universidade de Lisboa, onde tem colaborado em
diversos projectos de investigação sobre adaptação às mudanças cli-
máticas. Licenciada em Comunicação, mestre em Gestão e Políticas
Ambientais, e doutorada em Desenvolvimento Internacional (Uni-
versity of East Anglia), e em Sociologia do Ambiente e do Território
(Universidade de Lisboa).

Carlos Nobre - Graduação em Engenharia Eletrônica pelo Instituto Tecno-


lógico de Aeronáutica e doutorado em Meteorologia pelo Massachu-
setts Institute of Technology. Foi pesquisador do Instituto Nacional
de Pesquisas da Amazônia (INPA) e do Instituto Nacional de Pesqui-
sas Espaciais (INPE). Foi presidente da CAPES, diretor do Centro
Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMA-
DEN), secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvi-
mento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI); che-
fe do Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CCST-INPE) de 2008 a
2011 e coordenador geral do Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos (CPTEC-INPE) de 1991 a 2003. Presidiu o Conselho de
Diretores da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáti-
cas (Rede CLIMA). Foi coordenador do Programa FAPESP de Pes-
quisa em Mudanças Climáticas Globais (2008-2011). É coordenador
do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças
Climáticas. Foi membro do “High Level Scientific Advisory Panel on
Global Sustainability” do Secretariado Geral da ONU. Participou de
vários relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climá-
ticas (IPCC). Em particular, foi um dos autores do Quarto Relatório
de Avaliação do IPCC, agraciado com o Prêmio Nobel da Paz (2007).
Recebeu vários prêmios: Fundação Conrado Wessel, na área de Meio
Ambiente (2007); Von Humboldt Medal, da European Geophysical
Union (2009); condecoração da Classe Grã-Cruz da Ordem Nacional
do Mérito Científico da Presidência da República (2010); “Prêmio a
la Cooperación em Ciencia, Tecnologia y Innovación Dr. Luis Frede-
rico Leloir”, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação Produ-
tiva, da Argentina (2011); Volvo Environmental Prize, Suécia (2016).

Célio Bermann - Doutorado em Engenharia Mecânica, na área de Plane-


jamento de Sistemas Energéticos pela Faculdade de Engenharia Me-
cânica da Universidade Estadual de Campinas (FEM-UNICAMP).
Mestrado em Engenharia de Produção, na área de Planejamento
Urbano e Regional pela Coordenação de Programas de Pós-gradua-
ção em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CO-
PPE/UFRJ). Graduado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo (FAU/USP, 1975). Atualmente é pro-
fessor (livre docente) no Instituto de Energia e Ambiente (antigo
Instituto de Eletrotécnica e Energia) da Universidade de São Paulo.
É pesquisador principal, coordenador do Grupo 4, do Projeto Te-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

mático FAPESP “Governança Ambiental na Macrometrópole Pau-


lista face à variabilidade climática”.

Christovam Barcellos - Geógrafo, especialização em Saúde Pública e


doutor em Geociências. Atualmente é pesquisador do Instituto
de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde
(ICICT) da Fundação Oswaldo Cruz. Trabalhou como sanitarista
nas Secretarias de Saúde do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
É coordenador do Observatório de Clima e Saúde em cooperação
com a SVS do Ministério da Saúde.

Danielle Tega - Pós-doutoranda no Núcleo de Estudos de Gênero (Pagu/


Unicamp). Tem mestrado (Unesp) e doutorado (Unicamp) em So-
ciologia. É integrante do grupo de pesquisa “Teorias e Militâncias
Feministas” e autora do livro Mulheres em foco: construções cinemato-
gráficas brasileiras da participação política feminina (Ed. Cultura Aca-
dêmica/Unesp, 2010).

Edson Grandisoli - É graduado em Ciências Biológicas (1994), mestre em


Ecologia (1997) e tem se dedicado à Educação Básica desde 1997, quan-
do iniciou sua carreira de professor de Ciências e Biologia. Em sua
trajetória como educador tem colaborado com diversas instituições de
ensino públicas e particulares na criação e desenvolvimento de progra-
mas e projetos interdisciplinares em Educação para a Sustentabilida-
de, tema da sua tese de doutoramento defendida em 2018. Atualmente
é diretor educacional da Reconectta, consultor, palestrante e colabora
como pesquisador do Projeto Temático “Governança Ambiental da
Macrometrópole Paulista face à variabilidade climática”.

Fernando Rocha Nogueira - Possui graduação em Geologia pela Uni-


versidade de São Paulo (USP) e doutorado em Geociências e Meio
Ambiente pelo Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Uni-
versidade Estadual Paulista. É professor adjunto IV do Centro de
Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas e docente
permanente do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e
Gestão do Território da Universidade Federal do ABC. Coordena o
Laboratório Gestão de Riscos (LabGRIS-UFABC).

Gabriela Marques Di Giulio - Doutora em Ambiente e Sociedade e pro-


fessora do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de
Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Suas áreas de
interesse incluem Ambiente e Sociedade; Ciência e Comunicação;
Riscos e Incertezas; Dimensões Humanas das Mudanças Climáti-
cas; Interfaces entre Ciência e Política.

Guarany Ipê do Sol Osório - Coordenador do Programa Política e Eco-


nomia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGV-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

ces). Atuais temas de pesquisa: (i) políticas públicas sobre mudança


do clima; (ii) retórica e estratégias de persuasão no processo de
políticas públicas; (iii) divulgação científica; (iv) instrumentos eco-
nômicos e meio ambiente; e (v) políticas de recursos hídricos. Pro-
fessor das disciplinas: Mudança do clima: gestão empresarial e re-
gulação do Mestrado Profissional em Gestão para Competitividade
– Sustentabilidade da FGV EAESP; e Políticas públicas e mudança
do clima do Master em Administração – Sustentabilidade da FGV
EAESP. Doutorando em Administração Pública e Governo pela
FGV EAESP. Mestre em Ciências Jurídico-Ambientais pela Faculda-
de de Direito da Universidade de Lisboa.

Gustavo Velloso Breviglieri - Mestre em Políticas Públicas e Desenvol-


vimento Humano pelas Universidades das Nações Unidas (UNU-
MERIT) e de Maastricht (MGSoG), e economista pela Escola de
Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP).
Pesquisador do Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces),
se especializa em pesquisas teóricas e aplicadas sobre o uso de ins-
trumentos econômicos para a gestão de recursos naturais e do meio
ambiente, como o uso de mercados de direitos de uso de água e sis-
temas de comércio de emissões para lidar com a mudança do clima.

Jeroen van der Heijden - É o presidente inaugural da prática regulató-


ria na Universidade Victoria, de Wellington, Nova Zelândia (Escola
de Governo). Ele trabalha na interseção de regulação e governança,
com um interesse específico em administração regulatória e regimes
de governança dinâmicos. A pesquisa do presidente tem como ob-
jetivo ajudar a encontrar respostas adequadas de governança local,
nacional e internacional para alguns dos desafios mais prementes do
nosso tempo: mudanças climáticas, esgotamento de recursos e cres-
centes desigualdades em toda a população mundial. Seu trabalho é
organizado em torno de inovações na regulamentação e como as boas
práticas regulatórias podem atender aos objetivos críticos da política
da Nova Zelândia. Isso permite que ele tire lições da Nova Zelândia e
de outros lugares para melhorar a regulamentação da Nova Zelândia
e seu impacto no desempenho econômico e social, e para mostrar o
estado-da-arte da prática regulatória na Nova Zelândia para o res-
to do mundo. Anteriormente, o professor van der Heijden ocupou
cargos na Universidade Nacional da Austrália (Escola de Regulação
e Governança Global), na Universidade de Amsterdã (Faculdade de
Direito), na Universidade de Tecnologia de Delft (Faculdade de Tec-
nologia, Política e Administração) e na Universidade de Wageningen.
Grupo de Políticas). Publicou amplamente sobre regulamentação e
governança, incluindo cinco livros e mais de 50 artigos nos principais
periódicos acadêmicos. Os livros incluem Inovações na Governança do
Clima Urbano (Cambridge University Press, 2017) e Governança para
Sustentabilidade Urbana e Resiliência (Edward Elgar, 2014).

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

José A. Marengo - Pesquisador 1-A do CNPq. Possui graduação em Fisi-


ca y Meteorologia, na Universidad Nacional Agraria; mestrado em
Ingenieria de Recursos de Agua y Tierra, na Universidad Nacional
Agraria em Lima, Peru; e doutorado em Meteorologia, na Universi-
ty of Wisconsin, Madison, nos EUA. Fez pós- doutorado na NASA-
GISS e Columbia University, em Nova York e na Florida State Uni-
versity, na Florida, EUA em modelagem climática. Foi coordenador
científico da previsão climática do CPTEC INPE. Atualmente é pes-
quisador titular e coordenador geral de Pesquisa e Desenvolvimen-
to no Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres
Naturais (CEMADEN). É professor na pós- graduação do INPE. É
membro de vários painéis internacionais das Nações Unidas (IPCC,
WMO). Atualmente é membro do Comitê Científico do Painel Bra-
sileiro de Mudanças Climáticas, CLA y RE dos Relatórios do IPCC
AR5 GT1 e 2, e é membro titular da Academia Brasileira de Ciên-
cias, da Academia de Ciências do Estado de São Paulo, e da The
World Academy of Sciences (TWAS).

Jutta Gutberlet - É professora de Geografia na Universidade de Victoria,


Canadá, onde desenvolve pesquisas de ação participativa e comuni-
tária voltadas para uma agenda de justiça social e ambiental e ques-
tões de governança. Recentemente, publicou o livro Urban Recycling
Cooperatives: Building Resilient Communities, pela Routledge Taylor
&amp; Francis Group.

Jussara de Lima Carvalho - Graduada em Engenharia Química pela


UFSCar, mestre em Saneamento e Hidráulica pela EESC/USP,
e doutora em Governança da Água pelo PROCAM/USP. Atuou
como secretária executiva do Comitê de Bacias Hidrográficas do
Sorocaba e Médio Tietê. Atuou como secretária de Meio Ambiente
da Cidade de Sorocaba. Foi secretária executiva do ICLEI para a
América do Sul. Exerceu a gerência de Mudanças Climáticas na
CETESB e atualmente ocupa o cargo de assessora internacional da
Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

Katia Canil - Possui graduação em Geografia pela Universidade de


São Paulo (USP), mestrado e doutorado em Geografia (Geogra-
fia Física), USP. Foi pesquisadora do Instituto de Pesquisas Tec-
nológicas do Estado de São Paulo de 1992 a 2013. Atualmente é
professora adjunta da Universidade Federal do ABC (UFABC) e
integrante do grupo de pesquisa em Gestão de Riscos da UFA-
BC. É professora colaboradora dos Programas de Pós-Graduação
em Ciência e Tecnologia Ambiental e Planejamento e Gestão do
Território, da UFABC.

Klaus Frey - Professor titular de Políticas Públicas na Universidade Fede-


ral do ABC (UFABC) e pesquisador de produtividade do CNPq, de-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

senvolvendo pesquisas nas áreas de políticas públicas e ambientais,


governança pública, democracia e desenvolvimento sustentável. Re-
centemente, editou os livros Politics and conflict in governance and
planning: theory and practice, pela Routledge Taylor &amp; Francis
Group, (com Ayda Eraydin), e Governança multinível e desenvolvimen-
to regional sustentável (com José M. Brasiliense Carneiro), pela Ofi-
cina Municipal.

Leandro Giatti - Professor associado no Departamento de Saúde Am-


biental da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São
Paulo. Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universida-
de São Judas Tadeu, mestrado e doutorado em Saúde Pública pela
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, área
de concentração Saúde Ambiental. Pesquisador CNPq nível 2, bol-
sa de produtividade em pesquisa. Orientador permanente no Pro-
grama de Pós-Graduação em Saúde Pública/FSP-USP. Orientador
permanente e membro da comissão de coordenação do Programa
de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Ambiente, Saúde e
Sustentabilidade/FSP-USP. Atua na coordenação de sub-projeto de
pesquisa junto ao INterdisciplinary CLimate INvEstigation Center
(INCLINE). Pesquisador colaborador no grupo de pesquisa Meio
Ambiente e Sociedade do Instituto de Estudos Avançados/IEA-USP
e no Centro de Estudos de Governança Socioambiental (IEE/USP).

Luciana Travassos - Docente do bacharelado de Planejamento Territo-


rial e do bacharelado em Ciências e Humanidades da Universidade
Federal do ABC. Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo
pela Universidade de São Paulo, mestrado e doutorado em Ciên-
cia Ambiental pela mesma universidade. Foi assessora da Secreta-
ria Municipal de Desenvolvimento Urbano, docente da Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP),
do Instituto Mauá de Tecnologia e do Centro Universitário FIAM/
FAAM, e pesquisadora do Laboratório de Urbanismo da Metrópole
(LUME-FAUUSP). Coordenadora do Grupo 2 do Projeto Temático
FAPESP “Governança Ambiental da Macrometrópole Paulista face
à variabilidade climática”.

Luciana Yokoyama Xavier - Atua na área de gestão costeira, com


interesse na gestão participativa, áreas marinhas protegidas,
aprendizagem social e integração ciência e gestão. Possui graduação
em Oceanografia (2007), mestrado (2010) e doutorado (2017)
em Oceanografia com ênfase em gestão costeira pelo Instituto
Oceanográfico da Universidade de São Paulo. Desde 2018 atua como
pós-doutoranda no Laboratório de Manejo, Ecologia e Conservação
Marinha do IOUSP, desenvolvendo seu projeto de pesquisa junto
ao Projeto Temático “Governança Ambiental da Macrometrópole
Paulista face à variabilidade climática”.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Luísa Schmidt - Socióloga, investigadora principal no Instituto de Ciências


Sociais da Universidade de Lisboa, onde coordena o Observatório
de Ambiente, Território e Sociedade (OBSERVA). Integra o Comitê
Científico do Programa Doutoral Interdisciplinar em “Alterações
Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável”; é membro
do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e
do European Environment Advisory Council.

Marina Ribeiro Corrêa - Bacharel e licenciada em Ciências Biológicas


pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP).
Atualmente desenvolve seu mestrado pelo Programa de Pós-Gradua-
ção em Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da
Universidade de São Paulo (IEE-USP) junto ao Laboratório de Ma-
nejo, Ecologia e Conservação Marinha do Instituto Oceanográfico
da Universidade de São Paulo (IO-USP). É bolsista FAPESP, Processo
2018/13238-9, no Projeto Temático “Governança Ambiental da Ma-
crometrópole Paulista face à variabilidade climática”.

Mariana Nicolletti - Doutoranda em Administração Pública e Governo


pela FGV/ EAESP, vem atuando nos últimos cinco anos no FGVces
em mudanças climáticas junto a governos e empresas. Entre os pro-
jetos que coordenou estão o Economy-Wide Adaptation to Climate
Change e a Plataforma AdaptaClima. Graduada em Administração
e mestre em Psicologia Social, suas áreas de pesquisa são autoges-
tão, aprendizagem social e adaptação à mudança do clima.

Micaela Trimble - Doutora em Recursos Naturais e Gestão Ambiental.


Foi pós-doutoranda na Universidade Federal do Paraná. Atualmente
trabalha no Instituto Sul-Americano de Estudos em Resiliência e Sus-
tentabilidade (SARAS), no Uruguai. É membro do Sistema Nacional
de Pesquisadores. Suas áreas de especialização incluem governança
ambiental e cogerenciamento adaptativo de sistemas socioecológicos.

Néstor Mazzeo - Doutor em Ciências. Trabalha no Departamento de Eco-


logia Teórica e Aplicada do Centro Universitário da Região Leste,
Universidade da República, Uruguai. É membro do Sistema Nacio-
nal de Pesquisadores. Suas principais linhas de pesquisa, ensino e
divulgação estão relacionadas à ecologia e à restauração de sistemas
aquáticos como sistemas socioecológicos. É diretor executivo do Ins-
tituto SARAS.

Paulo A. A. Sinisgalli - Possui graduação em Engenharia Civil e Sanitá-


ria pelo Instituto Mauá de Tecnologia, mestrado em Ciência Am-
biental pela Universidade de São Paulo, doutorado em Economia
Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas e livre docência
pela Universidade de São Paulo. Possui pós-graduação em Environ-
mental Management pela Universidade Técnica de Dresden, Ale-

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

manha, e foi Visiting Student na Universidade de Kent, em Canter-


bury, Inglaterra. É credenciado nos programas de pós-graduação
da USP: Ciência Ambiental e Modelagem de Sistemas Complexos.
Fez pós-doutorado na Universidade de Wageningen, na Holanda,
em Gestão Participativa de Recursos Hídricos. Atua nas áreas de
Economia Ecológica e Gestão de Recursos Hídricos. É pesquisador
principal, coordenador do Grupo 3, do Projeto Temático FAPESP
“Governança Ambiental na Macrometrópole Paulista face à variabi-
lidade climática”.

Pedro Luiz Côrtes - Professor do Departamento de Informação e Cultu-


ra da Escola de Comunicações e Artes da USP, onde ocupa o cargo
de chefe de departamento. Professor do Programa de Pós Gradua-
ção em Ciência da Informação da Escola de Comunicações e Artes
da USP (ECA-USP), onde é responsável pela disciplina Gestão da
Informação e do Conhecimento. Professor convidado da Universi-
dade do Porto (Portugal). Professor convidado da Universidad de
Buenos Aires e Universidad Nacional de Quilmes (Argentina), Uni-
versidad Tecnológica Metropolitana e Universidad de laFrontera
(Chile), Universidad Autónoma del Estado de Hidalgo (México) e
Instituto Politécnico de Leiria (Portugal). Criador e coordenador
da Rede Internacional de Estudos Sobre Meio Ambiente e Sustenta-
bilidade (RIMAS), www.rimas.academy. Pós-doutorado em Ciência
e Tecnologias do Ambiente na Universidade do Porto, Portugal, li-
vre-docência em Ciência da Informação pela Universidade de São
Paulo, pós-doutorado em Ciência da Informação na Escola de Co-
municações e Artes da USP, doutorado em Ciências da Comunica-
ção pela USP, mestrado em Administração pela FECAP e gradua-
ção em Geologia pela USP.

Samia Nascimento Sulaiman - Pós-doutoranda em Planejamento e Gestão


do Território, Universidade Federal do ABC (UFABC). Pós-doc em
Ciências Ambientais, Instituto de Energia e Ambiente da Universi-
dade de São Paulo (USP), doutora e mestre em Educação, USP; mes-
trado em Planejamento e Gestão de Riscos Naturais, Universidad de
Alicante, Espanha. Graduação e Licenciatura em Letras (USP). Pes-
quisadora do Laboratório de Gestão de Risco (LabGRis), UFABC.

Sandra Momm - Arquiteta e urbanista, doutora em Ciência Ambiental,


professora do Programa de Graduação e Pós-Graduação em Plane-
jamento Territorial da Universidade Federal do ABC. Coordenado-
ra do Grupo 2 do Projeto Temático FAPESP “Governança Ambien-
tal da Macrometrópole Paulista face à variabilidade climática”.

Silvana Zioni - Arquiteta e urbanista, doutora em Planejamento Urbano


e Regional, professora do Programa de Graduação e Pós-Gradua-
ção em Planejamento Territorial da Universidade Federal do ABC.

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

Sílvia Helena Zanirato - Doutora em História pela Universidade Esta-


dual Paulista Júlio de Mesquita Filho; especialista em Gestão do
Patrimônio Cultural pela Universidade Federal de Pernambuco; e
pós-doutora em Geografia Política pela Universidade de São Paulo
e em História pela Universidad de Sevilla. Livre docente pela Uni-
versidade de São Paulo. Professora do Curso de Gestão Ambiental
da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de
São Paulo e dos Programas de Pós-graduação em Ciência Ambien-
tal e em Mudança Social e Participação Política, ambos da USP. Foi
professora visitante na Universidade Federal da Bahia e na Univer-
sidad de Sevilla e coordenadora do Programa de Pós-graduação em
Mudança Social e Participação Política. Coordenadora de Projeto
Fapesp “Patrimônio cultural do Vale Histórico Paulista: análise da
vulnerabilidade às mudanças climáticas”; coordenadora do Projeto
CNPq “Gestão de riscos de bens com função patrimonial às mudan-
ças climáticas: medidas para a formulação de políticas públicas”. É
coordenadora no Brasil da Cátedra UNESCO “Turismo, Cultura e
Desenvolvimento”. É pesquisadora principal, no âmbito do Grupo
2, do Projeto Temático FAPESP “Governança Ambiental na Macro-
metrópole Paulista face à variabilidade climática”.

Tiago S. Vasconcelos - É formado em Ciências Biológicas pela UNESP,


campus de São José do Rio Preto; mestre em Biologia Animal pela
mesma instituição e doutor em Zoologia pela UNESP, campus de
Rio Claro. Fez estágio de pós-doutoramento vinculado ao Dept. of
Ecology and Evolutionary Biology da University of California (Ir-
vine, USA), onde adquiriu experiência com biogeografia e macro-
ecologia de anfíbios. Desde 2012 é pesquisador vinculado ao Depar-
tamento de Ciências Biológicas da UNESP de Bauru, onde leciona
e desenvolve pesquisas na área de biogeografia e macroecologia de
anfíbios neotropicais e impactos potenciais das mudanças climáti-
cas sobre a diversidade desses organismos.

Vanessa Empinotti - Desenvolve pesquisa em Governança Socioambien-


tal, com foco em segurança hídrica, relações entre o rural e o ur-
bano e planejamento territorial a partir da perspectiva da Ecolo-
gia Política. Atualmente é professora adjunta de Planejamento e
Política Rural na Universidade Federal do ABC, onde é vinculada
ao Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplica-
das, ao bacharelado em Planejamento Territorial e ao Programa de
Pós Graduação em Planejamento e Gestão do Território. Colabo-
ra como pesquisadora associada no Grupo de Acompanhamento e
Estudos de Governança Ambiental, GovAmb/IEE/USP. É também
editora adjunta da Revista Ambiente e Sociedade, além de parecerista
de revistas nacionais e internacionais e agências de fomento. É dou-
tora em Geografia, com especialização em Desenvolvimento Sus-
tentável pela Universidade do Colorado, em Boulder, EUA, mestre

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Governança e Planejamento Ambiental: adaptação e políticas públicas na Macrometrópole Paulista

em Ciência dos Solos pela Universidade Federal do Rio Grande do


Sul (UFRGS) e com graduação em Agronomia pela Universidade
Federal do Paraná (UFPR).

Wilson Cabral de Sousa Jr. - É graduado em Oceanologia pela Univer-


sidade Federal do Rio Grande, mestre em Sensoriamento Remoto
pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, e doutor em Eco-
nomia pela Universidade Estadual de Campinas, com Phd Sandwi-
ch pela University of London. Realizou pesquisas de pós-doutora-
do junto ao Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de
São Paulo e ao Sustainability Research Centre da Universidade de
Sunshine Coast/Austrália. Atualmente é professor associado do
Instituto Tecnológico de Aeronáutica. É autor do livro Gestão das
águas no Brasil: reflexões, diagnósticos e desafios, dentre outros.
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