Você está na página 1de 5

Universidade Federal Fluminense

História da África I

(GHT00642) | Felipe Paiva Soares

A costa oriental africana e suas dinâmicas

Ian Cardozo dos Anjos – Matrícula nº 121002006

Niterói, 2022
Resenha do Texto: A. Salim “A costa oriental da África” In B. A. OGOT (Edit.).
História Geral da África. Vol. V

No capítulo A costa oriental da África, A. Salim expõe as dinâmicas políticas,


econômicas, comerciais e religiosas da costa oriental africana. Na obra, é o possível
perceber um marco definido para o contexto da região estudada, a saber, a chegada dos
portugueses. É sob o prisma da introdução lusitana que Salim aborda os conflitos,
alianças e disputas entre os estrangeiros e locais, além de ativas relações entre as
cidades e reinos da região. Outro aspecto importante é o de relativa autonomia das
cidades da costa oriental africana, assim como a influência de fatores externos. A
religião é exposta por Salim como um fator de identidade que agrega, mas que também
separa. É necessário apresentar os principais pontos e dados expostos e analisados por
Salim.
Salim inicia sua exposição relatando as intensas atividades entre as cidades africanas
ainda antes da chegada dos portugueses. Porém, ele mostra que a cidade de Kilwa, que
era uma das grandes potências da região por causa de sua atuação no comércio
marítimo, começou a declinar, e que este declínio possibilitou o futuro sucesso da
intervenção portuguesa (p. 884). Mas além de Kilwa, Salim também mostra a existência
de outras cidades importantes como Zanzibar, Melinde e Mombaça. Melinde e
Mombaça eram grandes rivais e disputavam a hegemonia sobre a região. A questão
comercial é atrelada às dinâmicas destes Estados, já que o comércio de outro e marfim
constituía uma importante atividade econômica (p. 886).
Um importante aspecto da análise de Salim é o contraste entre a fragmentação política
e a homogeneidade religiosa e cultural (p. 887). A língua Kiswahili se disseminou entre
os povos de cultura suaíli. O Islã e a cultura árabe também foram elementos
unificadores, pois como atesta Salim, o Islã introduziu o conceito de urbanidade,
transcendo a esfera religiosa. Salim ressalva o sincretismo religioso e cultural, já que o
Islã e a cultura árabe conviveram e se fundiram com diversas crenças e culturas próprias
da região, moldando os parâmetros culturais (p. 888).
Como dito anteriormente, Salim dá à religião, um papel importante como um fator de
agregação ou divisão. A própria expansão portuguesa no oriente se dá como uma
espécie de cruzada, pois visa conter o Islã “no plano comercial, político, militar e
religioso” (p. 890). Desta maneira, percebe-se que a religião e a civilização islâmica,
que tanto contribuíram para moldar os parâmetros culturais da costa oriental da África,
também incentivaram a expansão portuguesa.
Salim explica a ambiguidade e pluralidade das relações entre os portugueses e os
africanos orientais. Em Moçambique e em Mombaça, os portugueses não foram bem
recebidos, mas em Melinde, ocorreu um estreitamento que resultou em uma aliança
entre Melinde e Portugal (p. 891). A entrada dos portugueses no cenário político,
também significou sua inserção no panorama comercial. As ações lusitanas foram tão
plurais que, embora em alguns lugares, alianças fossem firmadas, em outros, o uso da
força foi necessário. Um bom exemplo aplicado por Salim é o de Kilwa, que foi pilhada
e sofreu outros ataques (p. 893).
Assim, é possível dizer que a própria fragmentação da costa oriental africana
contribuiu para a pluralidade portuguesa, já que os portugueses se aproveitaram das
intrigas e disputas já existentes entre os reinos africanos. Isso fica muito claro quando
Salim relata a destruição de Mombaça e o fortalecimento de Kilwa, que acabou cedendo
aos assédios dos lusitanos (p. 893). Salim também afirma que em Mombaça, a política
de destruição praticada pelos portugueses não rendeu frutos. A ocupação portuguesa
teria bagunçado e desorganizado o cenário político e comercial da região, que só se
recuperou após a partida dos portugueses (p. 894).
As dinâmicas do ouro e do marfim também se destacam na análise de Salim. Além de
expor que esses dois produtos eram os proeminentes no comércio, Salim mostra que a
alternância de oferta e demanda, como o caso de Kilwa e aumento do comércio de
marfim devido à escassez de ouro (p. 894). Salim conclui que “os portugueses não
tiveram uma clara política de ocupação ou de administração na costa suaíli”, revelando
uma atuação limitada da parte dos portugueses. Desta forma, foi esta limitação que
permitiu uma maior atuação comercial por parte dos estados africanos. Salim também
confronta a ideia de que os portugueses não tinham um real interesse na costa oriental
africana. Como ele mostra, apesar de Goa ser o grande centro oriental da expansão
portuguesa, foi estabelecida uma administração local em Melinde, que atenta os
interesses portugueses (p. 895).
A manutenção de autonomia do estado permitiu a recuperação de Mombaça. Salim
atesta que a influência muçulmana foi importante para os casos de aversão aos
portugueses, como os conflitos entre os portugueses e os turcos e mamelucos (p. 896).
Salim também revela a atuação de áreas que podem se chamar de “satélites”, como é o
caso de Kilifi, cidade entre as rivais Melinde e Mombaça (p. 898). Para Salim, em suma,
a ocupação portuguesa tem como grande resultado, a exigência do pagamento de
impostos (p. 899).
É destacado um novo evento: a inserção de holandeses e britânicos no contexto
oriental (p. 899). A introdução de holandeses e ingleses enfraqueceu o domínio
português. Salim expõe a ocupação de Moçambique pelos holandeses (p. 903), e a
atuação inglesa no período da União Ibérica, se juntando aos locais contra os
portugueses (p. 903). Porém, além de se conflitarem contra outras potências europeias
pela hegemonia da costa oriental africana, os portugueses acabaram confrontando outros
inimigos. Salim dá destaque aos conflitos entre os portugueses e Mombaça. Como ele
afirma, a troca de dinastia não impediu que os conflitos ocorressem.
A partir dos dados expostos por Salim, pode-se afirmar que ocorreu uma verdadeira
cristianização de parte da elite de Mombaça. Um bom exemplo é o caso do herdeiro
Yusuf, que estudou em Goa, se converteu ao cristianismo e casou-se com uma mulher
de origem portuguesa e asiática, além de lutar ao lado dos lusitanos e aportuguesar seu
nome (p. 901-2). Mas Salim destaca que após desentendimento, Yusuf foi deixado de
lado pelos portugueses e retornou ao islamismo. Isso mostra como que a religião
exerceu um papel de identidade, seja de assimilação à cultura lusitana cristã, ou de
resistência apoiada no islamismo (p. 902).
Salim também relata uma disputa entre os portugueses e árabes, que visavam o controle
da costa suaíli (p. 905). Mas, mesmo com esta disputa, a derrota portuguesa se aliou
pelo próprio povo da costa, como Mombaça, Zanzibar, Penba e Máfia (p. 906). Isso
mostra a disseminação de resistências à ocupação portuguesa. Neste contexto, Salim
apresenta os fatores da decadência portuguesa na costa oriental africana:
“A derrota portuguesa foi atribuída a toda uma série de fatores: a fraqueza, a
imperícia e a anarquia do sistema colonial; a indecisão, a imprudência, a
incapacidade e a cupidez de inúmeros administradores que pensavam,
sobretudo, em encher seus bolsos, alienando a simpatia da população suaíli;
os estragos causados pelo clima e as doenças, que dizimaram uma população
portuguesa já pouco considerável; as facções locais, cujas lutas serviram,
durante certo tempo, aos interesses dos portugueses, mas que não tardaram a
se voltar contra eles. Aproximadamente no final do período estudado, os
portugueses encontravam-se no fim dos seus recursos (mesmo Goa, por
exemplo, fora deixada sem defesa em janeiro de 1730, na ocasião de um
derradeiro e desesperado esforço a fim de retomarem a sua parte na África
Oriental.). Tal esforço foi mal sucedido, pois só conseguiram, com grande
pena, constituir um corpo expedicionário.” (p. 907).

Mas Salim também mostra as influências externas, como comerciais, políticas e


religiosas de outras regiões (p. 907-8). Para ele, o Islã foi um fator sem igual, os Sharifs
desempenharam um papel crucial contribuindo para o desenvolvimento e “reabilitação
econômica” (p. 908-9).
Salim conclui o capítulo ressaltando alguns aspectos como: a introdução portuguesa
nos aspectos locais; a cristianização e exploração desta região que resultaram em
conflitos religiosos entre o Islã e os cristãos; o sucesso parcial do comércio lucrativo
português; a capacidade de algumas cidades africanas se recuperarem e se
reestabelecerem, como o caso de Mombaça (p. 912-3).
À luz do que foi exposto pro Salim, pode-se compreender e destacar o papel da
religião como fator de unidade e também de divisão; as atividades comerciais; as
disputas, alianças e conflitos entre os diversos estados envolvidos.

Você também pode gostar