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OS DIREITOS HUMANOS SOB A ÓTICA DA LEI NATURAL


Autores
José Eduardo Cruz Silva1
Matheus Furlan Melo Bravo2

RESUMO

Há décadas que nos debates do campo jurídico comumente se recorre ao conceito, que já
tomou proporções dogmáticas pelo mainstream jurídico, de direitos humanos para se
obter anuência de alguma tese, e se trata de um conceito de alta estima e grande valor,
principalmente no que respeita ao direito positivo, isto é, o juspositivismo. Todavia,
pouco se elucida a retórica humanista de direitos e deveres segundo a perspectiva de
direito natural. No século XIII, São Tomás de Aquino propôs que, embora haja no homem
certa semelhança com Deus, não se trata de um sinônimo de igualdade imanente, pois o
modelo ultrapassa em muito o modelado. E é exatamente dessa natureza divina que o ser
humano é concebido que Tomás de Aquino deriva a dignidade, essa sim intrínseca a
pessoa, e sua inerência ao homem. Logo, o homem, sendo um ser racional, é digno per se
por que é Imago Dei. (AQUINO. 2003. Q. 93). Aristóteles revelou a partir de premissas
básicas, que acaba por chegar em conclusões lógicas, que toda a conduta humana,
comissiva ou omissiva, parece visar um bem, isto é, uma finalidade. A responsabilidade
moral implica necessariamente em um dever humano absoluto e moral, que seria, por
exemplo, o dever de não matar, por via de consequência lógica o direito à vida, além de
constituir um direito natural e um bem básico, é um direito humano. Existem também
direitos humanos e morais que são relativos, assim dizendo, não são fins em si mesmo,
mas meios para se alcançar um bem humano absoluto. A pessoa humana, conforme dito
anteriormente, é um todo uno racional o que já condiciona o mesmo a auferir status de
dignidade, portanto a partir daí já possui direitos absolutos que não podem ser violados
por outrem. O jusnaturalismo tomista-aristotélico alicerça que um humano é imbuído de
tais direitos desde sua concepção, logo ele tem o direito de não ser morto, uma vez que
concebido. A linha de pensamento dominante na atmosfera da biologia - da embriologia,
por assim dizer – concorda que a vida surge na concepção, e as interações orquestradas
pelo zigoto com o fim de gerar estruturas necessárias para se desenvolver é um
comportamento coordenado singular de um organismo, só uma vida seria capaz de se
proteger e se desenvolver de tal forma (CONDIC, 2008 apud RIBEIRO, 2021). A
liberdade possui um caráter instrumental, sob a ótica jusnaturalista, e se resguarda a
liberdade para fazer algo, este algo pode ser benéfico ou maléfico, em virtude disso a
liberdade é um bem relativo e não absoluto. Segundo o Papa João Paulo II, a liberdade
não é permissão para fazer tudo o que se quer, ela visa a verdade e se consuma na busca
e vivência humana da verdade. A liberdade de expressão ela é necessariamente
cooperativa, pois envolve mais de uma pessoa para exercê-la. Ela está à serviço dos bens
básicos ao ser humano, então não é absoluta, mas a censura, sendo um caso
extraordinário, deve ser impressa legitimamente em três circunstâncias: sendo a
comunicação é abusiva, quando a comunicação visa indubitavelmente um fim mau ou
quando a comunicação resultará em uma injustiça.

Palavras-chave: Direito Natural, Direitos Humanos, Liberdades Civis.

1
Discente do 4º semestre do curso de Direito da UNEMAT.
2
Discentes do 4º semestre do curso de Direito da UNEMAT.
2

REFERÊNCIAS
AQUINO, Tomás. Suma Teológica. 2003b.

AQUINO, Tomás. Suma Teológica vol II. Trad. Dominicanos. Nova York: Christian
Classics, 1981.

ARISTÓTELES. De Anima. Ed. São Paulo Editora 34, 2012.

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 4 ed. Trad. Edison Bini. São Paulo. EDIPRO, 2014.

CONDIC, ML. When does human life begin? A scientific perspective. Westchester
Institute White Paper.

GEORGE, Robert. Making men moral: civil liberties and public morality. Oxford:
Clarendon Press, 1995.

KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática. Lisboa: Edições 70,1986.

PAULO II, João. Mensagens de sabedoria e paz. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

RIBEIRO, Mário da S. Dignidade da pessoa humana e direito à vida: estudos de


filosofia, direito e bioética. Ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2021.
1

OS DIREITOS HUMANOS SOB A ÓTICA DA LEI NATURAL


José Eduardo Cruz Silva
Matheus Furlan Melo Bravo

1. INTRODUÇÃO
Há décadas que nos debates do campo jurídico comumente se recorre ao
conceito, que já tomou proporções dogmáticas pelo mainstream jurídico, de direitos
humanos para se obter anuência de alguma tese, e se trata de um conceito de alta
estima e grande valor, principalmente no que respeita ao direito positivo, isto é, o
juspositivismo. Todavia, pouco se elucida a retórica humanista de direitos e deveres
segundo a perspectiva de direito natural.
O escolástico e doutor da Igreja, Tomás de Aquino (séc. XIII), que, com
supedâneo nas obras de Aristóteles (séc. IV a.C.), introduziu o tema do jusnaturalismo
de forma ordenada e sólida. O filósofo definiu, corretamente, a lei natural como um
pilar basilar da sociedade que consolida um conjunto de preceitos morais que
independem de reconhecimento por parte de qualquer autoridade, ou seja, mesmo
que uma instituição influente com poder discricionário sobre os indivíduos, não poderia
jamais contrariar os bens básicos estabelecidos pela lei natural.
Perlustrando o juízo de direitos humanos, de acordo com o prisma
jusnaturalista, se torna semiótica a diferença conceitual entre a visão de direitos
humanos do status quo e aquilo que a lei natural define acerca do tema.

2. PREMISSAS DO DIREITO NATURAL


No século XIII, São Tomás de Aquino propôs que, embora haja no homem certa
semelhança com Deus, não se trata de um sinônimo de igualdade imanente, pois o
modelo ultrapassa em muito o modelado. E é exatamente dessa natureza divina que
o ser humano é concebido que Tomás de Aquino deriva a dignidade, essa sim
intrínseca a pessoa, e sua inerência ao homem. Logo, o homem, sendo um ser
racional, é digno per se por que é Imago Dei. (AQUINO. 2003. Q. 93).1
Saltemos alguns séculos até Immanuel Kant (séc. XVIII), que, apesar de não
adicionar o atributo religioso às suas páginas, concordou com Tomás de Aquino,
apesar do emprego de outras palavras, dizendo que pode ser investidos a vontade e

1
AQUINO, Tomás. Suma Teológica. 2003b, q. 93.
2

o poder sobre algo utilizando-o simplesmente como um meio, no entanto unicamente


o homem, como criatura racional, é um fim em si mesmo. (KANT. 1986. p. 103).2
A partir daí, ambos autores trazem luz ao tema da dignidade a ponto de concluir
que a pessoa humana está cingida por deveres e direitos pré-positivos e inalienáveis
que possibilitam a justiça e o bem comum, ou seja, o fato do ser humano ser digno
em si já lhe confere titularidade de direitos naturais.

3. DIREITOS E DEVERES ABSOLUTOS E RELATIVOS


Aristóteles revelou a partir de premissas básicas, que acaba por chegar em
conclusões lógicas, que toda a conduta humana, comissiva ou omissiva, parece visar
um bem, isto é, uma finalidade.3
Tomás de Aquino, dezessete séculos mais tarde, disseca esse pensamento de
Aristóteles estabelecendo que tais bens possuem uma plêiade de ordens, mas uma
ordem desses bens é básica, real, fundamental e, portanto, absoluta. O doutor da
Igreja afirmou que vida, matrimônio, conhecimento, sociabilidade, religião e a
prudência compõem o gênero de bens básicos absolutos, que são um fim em si
mesmo.4
Estes bens básicos existem do ponto de partida de elaborações mentais cuja a
competência é instaurar um caminho a ser seguido para sua consecução, e qualquer
interrupção ou estorvo a preservação destes bens absolutos é uma violação aos
direitos naturais. Logo, um bem básico é para ser feito e perseguido, e o mal é para
ser evitado, eis o primeiro princípio da razão prática de Tomás de Aquino.5
A responsabilidade moral implica necessariamente em um dever humano
absoluto e moral, que seria, por exemplo, o dever de não matar, por via de
consequência lógica o direito à vida, além de constituir um direito natural e um bem
básico, é um direito humano.
Existem também direitos humanos e morais que são relativos, assim dizendo,
não são fins em si mesmo, mas meios para se alcançar um bem humano absoluto.
O direito à liberdade é um exemplo de bem moral relativo, pois se trata de um
bem instrumental, é um meio e não um fim. A liberdade nada mais é do que a

2 KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática. Lisboa: Edições 70,1986. P. 103.


3 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 4 ed. Trad. Edison Bini. São Paulo. EDIPRO, 2014.
4 AQUINO, ST. Suma Teológica. 2003b.
5 AQUINO, ST. Suma Teológica vol II. Trad. Dominicanos. Nova York: Christian Classics, 1981.
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capacidade de autocontrole de si mesmo para realização de outros expedientes que


inevitavelmente irão visar um bem superior, é um intermédio para a procura de um
bem que será amparado pelo direito humano absoluto.
Assim como os bens básicos absolutos, os bens instrumentais devem ser
perseguidos incessantemente pelo ser humano, todavia o jusnaturalismo admite
existência de ocasiões em que são legítimas medidas de uma autoridade competente
para tolher o direito retro citado, por exemplo: a prisão de algum delituoso.

4. ASSASSINATO INTRAUTERINO, OU ABORTO


Polêmica: o aborto não compõe o rol de direitos humanos absolutos ou relativos
determinados pela lei natural. A prática abortiva é uma agressão tenaz contra o bem
básico da vida. Esse é o momento em que a biologia e a filosofia se unem, pois o
primeiro biólogo do mundo, Aristóteles, sentenciou que a vida é nutrição por si mesmo,
o crescimento e o envelhecimento, e o aborto nada mais é do que a interrupção
desses estágios.6
A pessoa humana, conforme dito anteriormente, é um todo uno racional o que
já condiciona o mesmo a auferir status de dignidade, portanto a partir daí já possui
direitos absolutos que não podem ser violados por outrem. O jusnaturalismo tomista-
aristotélico alicerça que um humano é imbuído de tais direitos desde sua concepção,
logo ele tem o direito de não ser morto, uma vez que concebido.
A linha de pensamento dominante na atmosfera da biologia - da embriologia,
por assim dizer – concorda que a vida surge na concepção, e as interações
orquestradas pelo zigoto com o fim de gerar estruturas necessárias para se
desenvolver é um comportamento coordenado singular de um organismo, só uma vida
seria capaz de se proteger e se desenvolver de tal forma (CONDIC, 2008 apud
RIBEIRO, 2021).7
Corroborando com a bioética e vinculando-a ao direito natural, cumpre elucidar
que a dignidade da pessoa humana é uma excelência do ser humano, que se
expressa na titularidade de deveres e direitos humanos. Portanto, o nascituro é um
ser vivo, humano, pessoal e digno que, desde a concepção, está dotado do direito
humano absoluto de não ser morto por outrem.

6ARISTÓTELES. De Anima. Ed. São Paulo Editora 34, 2012.


7
RIBEIRO, Mário da S. Dignidade da pessoa humana e direito à vida: estudos de filosofia, direito
e bioética. Ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2021, p. 225.
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Cumpre aqui indexar três tipos distintos de prática abortiva, duas podem ser
consideradas infanticidas. São as espécies de aborto: voluntária, persuadida e
“terapêutica”.
O aborto voluntário é um infanticídio por si só, a pessoa abortista sabe que o
nascituro tem direito à vida e o aborto é intencional. Neste caso a culpa é de quem
realizou o aborto e é um ato intrinsecamente antijurídico.
O aborto persuadido é um infanticídio também e também é intrinsecamente
antijurídico. No entanto, muitas vezes a mulher que realiza é persuadida, seja pelos
pais, pelo parceiro ou até por ordem judicial, por esses motivos a culpa, talvez, será
atribuída em grande parte a quem persuadiu, mas não isenta totalmente a abortista.
O aborto “terapêutico” é o mais complexo. Consiste o aborto aqui, em um efeito
colateral decorrente de um procedimento médico indispensável a salvaguarda da vida
da mãe que está em perigo, então não é uma prática ativa de assassinato intrauterino.
Não é de forma alguma intrinsecamente antijurídico, mas cabe salientar que esta
ocasião é excepcionalíssima.

5. LIBERDADES CIVIS
A liberdade possui um caráter instrumental, sob a ótica jusnaturalista, e se
resguarda a liberdade para fazer algo, este algo pode ser benéfico ou maléfico, em
virtude disso a liberdade é um bem relativo e não absoluto. Segundo o Papa João
Paulo II, a liberdade não é permissão para fazer tudo o que se quer, ela visa a verdade
e se consuma na busca e vivência humana da verdade.8
A liberdade de expressão ela é necessariamente cooperativa, pois envolve
mais de uma pessoa para exercê-la. Ela está à serviço dos bens básicos ao ser
humano, então não é absoluta, mas a censura, sendo um caso extraordinário, deve
ser impressa legitimamente em três circunstâncias: sendo a comunicação é abusiva,
quando a comunicação visa indubitavelmente um fim mau ou quando a comunicação
resultará em uma injustiça.9
A liberdade de imprensa é a liberdade supramencionada segundo os veículos
de comunicação, que produz benefícios no combate à corrupção, às arbitrariedades
dos poderes e dissemina anseios e alerta as dificuldades do povo, portanto sua
limitação deve ser raríssima. Havendo a necessidade de censura, far-se-á ela em

8 PAULO II, João. Mensagens de sabedoria e paz. Rio de Janeiro: Sextante, 2005, p. 59.
9 GEORGE, Robert. Making men moral: civil liberties and public morality 1995, p. 198-199.
5

razão da comunicação ser abusiva ou puramente manipuladora, se ela visar um fim


indubitavelmente mau ou se resultar em uma injustiça.
A liberdade de associação é um meio para a liberdade de expressão, dentro de
um contexto coletivo. Sua limitação se dará em consequência dos abusos resultantes
dessa associação, enquadrados nas mesmas situações da liberdade de imprensa.
A liberdade religiosa, diferente das demais liberdades, é um bem básico
absoluto e universal, portanto não pode ser cerceado em hipótese alguma. A liberdade
de culto consiste na crença, e não cabe reinventar acepção para este direito a fim de
usá-lo como artifício para violar bens básicos de outrem.

6. CONCLUSÃO
Face ao exposto, tornou-se notória a visão jusnaturalista, seguindo uma
corrente filosófica tomista-aristotélica, acerca dos direitos humanos. Os direitos
humanos, segundo o que se conclui, são intermediários para alcançar os direitos mais
sólidos, isto é, os direitos naturais que antecedem uma positivação. O maior fruto
deste manuscrito é o entendimento de que os direitos de ordem humana são relativos
e podem ser subtraídos, ao passo que os direitos da ordem natural são imutáveis,
perenes, inquebrantáveis e, portanto, indeléveis.

REFERÊNCIAS
AQUINO, Tomás. Suma Teológica. 2003b.
AQUINO, Tomás. Suma Teológica vol II. Trad. Dominicanos. Nova York: Christian
Classics, 1981.
ARISTÓTELES. De Anima. Ed. São Paulo Editora 34, 2012.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 4 ed. Trad. Edison Bini. São Paulo. EDIPRO,
2014.
CONDIC, ML. When does human life begin? A scientific perspective. Westchester
Institute White Paper.
GEORGE, Robert. Making men moral: civil liberties and public morality. Oxford:
Clarendon Press, 1995.
KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática. Lisboa: Edições 70,1986.
PAULO II, João. Mensagens de sabedoria e paz. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.
RIBEIRO, Mário da S. Dignidade da pessoa humana e direito à vida: estudos de
filosofia, direito e bioética. Ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2021.

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