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Teologia e Direitos Humanos [HT] - Givaldo Mauro de Matos - UNIGRAN

Aula 01

INTRODUÇÃO AOS
DIREITOS HUMANOS

“A questão dos direitos humanos, hoje, entendida em toda a sua complexidade,


aponta para um espaço de u-topia, (ou melhor, de eu-topia, de bom-lugar); funciona
como uma idéia reguladora, um horizonte que nunca poderá ser alcançado porque
está sempre mais além, mas sem o qual não saberíamos sequer para onde ir”.
Giuseppe Tosi

A - O QUE SÃO DIREITOS HUMANOS?

A primeira tarefa de um Curso de Direitos Humanos será a sua definição. Para tanto,
iniciamos denunciando que o conceito de Direitos Humanos não é uniforme, unívoco, mas de
diversas significações, variando entre autores e correntes teóricas. A perspectiva adotada aqui
será elencar alguns elementos comuns, acerca dos quais a discussão é pacífica.
Em seu Curso de Direito Constitucional Positivo, José Afonso destaca diversos
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termos empregados usualmente, como sendo da mesma categoria dos direitos humanos:
direitos naturais, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos subjetivos,
direitos fundamentais, liberdades fundamentais e liberdades públicas1. A Declaração
Universal dos Direitos Humanos preferiu a expressão ‘direitos humanos’, como forma de
contemplar homem e mulher, ao contrário do título ‘Declaração dos Direitos do Homem’,
de 1789, por ocasião da Revolução Francesa.
Duas correntes se destacam nessa tarefa. A primeira, composta por filósofos e
juristas, define os direitos humanos como equivalentes de direitos naturais, isto é, inerentes
ao ser humano. Já a segunda corrente, também composta por filósofos e juristas, prefere
definir os direitos humanos como o conjunto de direitos fundamentais, necessários à
realização integral do ser humano.
Eduardo R. Rabenhorst, doutor em Filosofia e professor na Universidade Federal
da Paraíba, propõe que o tema seja analisado a partir de seus pressupostos mais básicos, ou
seja, partindo da definição do que quer dizer o termo ‘direito’.
Etimologicamente, direito significa ‘aquilo que é reto, correto, justo’. Hoje, no
entanto, o significado é mais abrangente, e compreende o contrário daquilo que se chama
injustiça, ação deletéria injustificadamente despejada sobre um ser humano. Também
denota o ‘reconhecimento daquilo que nos é devido’.2

B - O SER HUMANO COMO SUJEITO DE DIREITOS

Na maior parte da história da humanidade, a realidade de ‘ter direitos’ é estranha,


pois o que prevalecia eram os deveres, sendo que os direitos eram prerrogativas das
divindades e dos reis e suas cortes. Daí, a repetição constante dos atos bárbaros cometidos,
sobretudo, contra grupos mais fracos e/ou minoritários, como o eram o dos escravos, que
eram tidos como objetos patrimoniais, serviçais de seus donos. Também dos camponeses
pobres, dos estrangeiros migrantes, das viúvas e dos órfãos, das mulheres e das crianças se
faziam imagens semelhantes.
Com a chegada da Modernidade, outra forma de ver o ser humano surge, uma
antropologia que vê neste um ser digno em si, portador de direitos, não somente de deveres.
Junto com essa noção, surgem também órgãos nacionais e internacionais de proteção a esses
direitos, bem como institutos conceituais, como é o caso da ideia moderna de Estado - uma
espécie de protetor dos indivíduos dentro de seu território – e dos Tratados Internacionais,
que são acordos feitos entre Estados, que visam a fomentar a proteção dos seres humanos
nos países signatários.
O significado do ‘ter direitos’ é amplo, como destaca Rabenhorst:

1
Curso de Direito Constitucional Positivo. Pg. 179.
2
Veja em “O que são Direitos Humanos?” In <http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/edh/redh/01/01_rabenhorst_oqs_dh.pdf> . Acessado
em Junho de 2009.
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Um direito, de forma muito geral, é a possibilidade de agir ou poder de exigir uma


conduta dos outros, tanto uma ação quanto uma omissão. Por exemplo, a Constituição
Federal, em seu artigo 5º, diz que todo brasileiro tem direito à liberdade de expressão.
Isso significa que temos a possibilidade de expressar livremente nossas convicções
religiosas, mas também que podemos exigir que os outros, principalmente o Estado ou
os membros de outras religiões, não criem obstáculos à nossa liberdade de culto.3

Obviamente, isso implicará ainda no meu reconhecimento da liberdade garantida ao


outro, pois todo direito corresponde também a um dever, isto é, na necessidade de reconhecer
o mesmo direito do outro.
A existência de um direito, por outro lado, e infelizmente, não implica necessariamente
em que eles serão respeitados ou efetivados. Dado aos constantes conflitos humanos, nas mais
diversas dimensões – culturais, econômicas, sociais, religiosas, etc, é necessário algo mais do
que a simples existência de um direito, para o alcance de sua efetivação. Dois instrumentos
principais podem ser citados:

Em primeiro lugar, os instrumentos jurídicos, que são as leis, no sentido mais


amplo da palavra (Declarações, Tratados, Pactos, Convenções, Constituições, etc.),
e as instituições responsáveis pela sua aplicação. Em seguida, os instrumentos
extra-jurídicos resultantes do poder social, isto é, da nossa própria capacidade de
organização e de reivindicação (movimentos sociais, associações de moradores,
partidos políticos, sindicatos, etc.).4

C – DEFINIÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

No caso dos direitos humanos, persiste uma diferenciação fundamental quanto a


outros direitos ou legislações, que é o que toca a sua origem ou legitimidade, como destaca
Rabenhorst:

São direitos que possuímos não porque o Estado assim decidiu, através de suas leis,
ou porque nós mesmos assim o fizemos, por intermédio de nossos acordos. Direitos
humanos, por mais pleonástico que isso possa parecer, são direitos que possuímos
pelo simples fato de que somos humanos.

Em outras palavras, a dignidade humana, a despeito do reconhecimento desses


direitos pelo Estado ou por instituições civis, fundamentam esses direitos. Nessa esteira,
ressalta convergente luz o teólogo alemão Karl-Josef Kuschel:

Na compreensão da Idade Moderna, os direitos humanos não são simplesmente


benefícios do respectivo ethos. Eles são direitos, e como tais competem a toda pessoa
individualmente frente às outras pessoas, particularmente frente a autoridades políticas
ou também religiosas. Portanto, os direitos humanos não são garantias dadas pela
respectiva lei moral, mas reivindicações de todo ser humano. Eles cabem a cada ser
humano enquanto tal, independentemente de sexo, raça, língua, concepção religiosa
ou política, bem como da posição econômica e social. Por isso, são direitos naturais,
inatos, inalienáveis e invioláveis, que têm validade sempre e em toda parte. Por isso,
os direitos humanos se assentam no princípio fundamental da igual dignidade e da
3
Idem
4
Rabenhorst. Idem.
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igual liberdade de todo ser humano e se subtraem fundamentalmente à disposição por


parte de autoridades políticas e eclesiásticas.

Vale ainda fazer uso de precisas conceituações elencadas por Daniela Paes Moreira
Samaniego, professora de Direito na Universidade de Cuiabá, extraída da pena de diversos
autores e juristas, relacionados em seu artigo Direitos Humanos como Utopia.5

“Direitos Humanos são as ressalvas e restrições ao poder político ou as imposições a


este, expressas em declarações, dispositivos legais e mecanismos privados e públicos,
destinados a fazer respeitar e concretizar as condições de vida que possibilitem a
todo o ser humano manter e desenvolver suas qualidades peculiares de inteligência,
dignidade e consciência, e permitir a satisfação de suas necessidades materiais e
espirituais”.
“Os Direitos Humanos colocam-se como uma das previsões absolutamente necessárias
a todas as Constituições, no sentido de consagrar o respeito à dignidade humana,
garantir a limitação de poder e visar o pleno desenvolvimento da personalidade
humana.”
“Direitos Humanos são uma idéia política com base moral e estão intimamente
relacionados com os conceitos de justiça, igualdade e democracia. Eles são uma
expressão do relacionamento que deveria prevalecer entre os membros de uma
sociedade e entre indivíduos e Estados. Os Direitos Humanos devem ser reconhecidos
em qualquer Estado, grande ou pequeno, pobre ou rico, independentemente do sistema
social e econômico que essa nação adota.”
“Por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles
direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria
natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam
de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade
política tem o dever de consagrar e garantir”.

Em síntese, os direitos humanos são aqueles direitos essenciais à existência humana,


para que esta possa se expressar conforme sua dignidade.

D – DIGNIDADE HUMANA VERSUS ESTADO

Kuschel termina sua definição ressaltando o lugar de primazia dos direitos humanos,
afirmativa que nos revelará, em sua discussão, parte da razão de seu surgimento: “Portanto,
segundo sua essência, os direitos humanos precedem o direito estatal e religioso e até
determinam, por sua vez, o direito estatal e religioso”.6
Como iremos destacar em aula posterior, acerca da história do surgimento,
manifestação e positivação – reconhecimento e tutela, por parte do Estado – os direitos
humanos surgem contrapostos a duas instituições presentes na Idade Média – na verdade, em
toda a antiguidade - caracterizadas por práticas a eles antagônicas: a Religião e o Estado.
A religião, em sua tese de que só Deus poderia ser considerado sujeito de direitos,
caracterizava-se, parcialmente, por fazer cumprir leis que hoje são consideradas negadoras do
ser humano: Censuras, intolerâncias e guerras, penas de morte aos hereges, etc. Obviamente
que esta não era a única face da Igreja, visto suas grandes e preciosíssimas contribuições
5
In: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=76 >. Acessado em Junho de 2009.
6
In: Fundamentação atual dos direitos humanos entre judeus, cristãos e muçulmanos. Cadernos Teologia Pública. Ano IV – N. 28 – 2007.
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ao desenvolvimento da Humanidade, como um todo, mas no que toca às revoluções que


ansiavam por um Estado laico, com poder civil e não-religioso, eram seus abusos o que
estava em pauta. Já o Estado foi não poucas vezes caracterizado por sua tirania, absolutismo,
arbitrariedade e elitismo, favorecedor de pequenos grupos oligárquicos. Cumpre lembrar
também os resultados de não poucas uniões entre essas duas instâncias, que foram responsáveis
por grandes massacres, como os promovidos pela Inquisição.
Na medida do alvorecer filosófico e humanista, que marca a chegada do Iluminismo,
mais e mais vozes denunciam o que julgam ser o novo elemento sobre o qual a História deve
girar, a saber, o ser humano. Daí, inclusive, o termo ‘humanismo’. Questiona-se as distinções e
hierarquias sociais tidas como naturais ou divinamente criadas, bem como o poder de censura,
imposto pela religião. Nessa direção, irá se afirmar o que se chamará de ‘direitos humanos’, ou
seja, o legítimo lugar que deve ocupar o ser humano frente a instâncias negadoras da vida, da
liberdade, da igualdade e da fraternidade, donde conclui Kuschel, a precedência dos direitos
humanos sobre os direitos estatais e religiosos. Sem entrar na discussão de forma aprofundada,
cumpre notar que, com o termo ‘direitos religiosos’, o autor entende aquelas prerrogativas
reclamadas pelas instituições religiosas, a despeito ou contrariamente ao ser humano.
Milhares de não-cristãos foram mortos pelos cristãos, na Idade Média. A Inquisição
atravessou parte da Modernidade fazendo suas vítimas entre os hereges, prática também
repetida por instâncias protestantes. Milhões de negros africanos foram capturados e trazidos
como escravos para o Continente Americano. Milhões de índios foram dizimados por guerras e
doenças trazidas pelos europeus. Milhões de judeus foram mortos nos campos de concentração
do nazismo. Milhares de pessoas continuam a morrer de fome todos os dias e anos. As guerras
contemporâneas continuam fazendo suas vítimas, sobretudo em regiões paupérrimas, entre
civis, idosos e crianças. A lista da negação da humanidade continua, pelo que aponta o sentido
da afirmação de Kuschel – o da realidade e da necessidade do reconhecimento dos direitos
humanos, sobre as pretensões de toda e qualquer instituição mundana. Sintetizando, os direitos
humanos surgem, a princípio, como instrumentos de proteção contra o Estado e qualquer
instância mais poderosa do que o ser humano como indivíduo. Com essa visão concorre o
professor de Criminologia na Faculdade de Psicologia da Universidade de Buenos Aires, Emilio
Garcia Mendez:

Parece-me que ninguém a formulou melhor que Michael Ignatieff, quando afirma:
“[Os] direitos humanos são a linguagem mediante a qual os indivíduos criaram uma
defesa de sua autonomia contra a opressão da religião, do Estado, da família e do
grupo”.7

Isso se dá a partir do reconhecimento da dignidade humana, irredutível e invariável,


determinadora das relações humanas, sobretudo no campo político, econômico, jurídico e
social. Trabalharemos esse tema em aula posterior.
7
Mendez, Emilio Garcia. Origem, Sentido e Futuro dos Direitos Humanos: Reflexões para uma Nova Agenda. SUR – Revista Internacional
de Direitos Humanos. Pg. 10.
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E - CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

a) Gerações de Direitos Humanos


Os direitos humanos, na integralidade da Declaração da ONU de 1948, não surgiram
de uma só vez. A evolução se deu conforme os desafios encontrados em cada época em que
foram sendo reconhecidos.
Momentos históricos específicos sofreram conflitos materiais e ideológicos que
reclamaram a materialização de mecanismos protetores dos direitos, que por sua vez, foram
incorporados pelas legislações dos povos, a fim de alcançarem caráter de irrenunciabilidade.
Celso Lafer, em sua obra A Reconstrução dos Direitos Humanos8 nos apresenta o
desenvolvimento dos direitos humanos a partir do conceito de ‘gerações de direitos
fundamentais’, linha adotada também pelo constitucionalista Paulo Bonavides, em seu Curso
de Direito Constitucional,9 sendo que este último acrescenta uma geração a mais do que a
apresentada por Lafer. Cada geração está relacionada com a necessidade de proteção dos
interesses da humanidade, frente a conflitos históricos específicos. Essa classificação nos
permitirá visualizar tanto o lugar quanto a forma pela qual se deu tal evolução.
Os direitos humanos de primeira geração são aqueles que se relacionam, sobretudo,
com a proteção da vida e da liberdade. Foram estabelecidos, tendo em vista a limitação
do Estado frente à liberdade dos cidadãos, característicos da luta dos franceses, à época da
Revolução (1789). Destacam-se, repito, a proteção da liberdade, a segurança e integridade
física e moral da pessoa, o direito de não ser submetido a torturas ou tratamentos cruéis,
desumanos ou degradantes, a igualdade diante da lei, a proibição de submeter alguém à
escravidão ou servidão e a liberdade de opinião, de reunião e de associação.
Os direitos humanos de segunda geração caracterizam-se por sua exigência da
proteção prestada pelo Estado, de cunho social. Após a Revolução Francesa, e em toda a
Revolução Industrial na Europa, movimentos surgiram exigindo do Estado uma atuação/
intervenção na Economia, tendo em vista as injustiças provocadas pelo sistema capitalista
à época do liberalismo econômico clássico. Destacam-se aqui os direitos trabalhistas,
previdenciários, direito de habitação, de educação, de cultura e ciência e o direito a um nível
de vida adequado.
A terceira geração relaciona-se com a fraternidade, tendo em vista as necessidades
crescentes de grupos sociais inteiros, como se verifica nos movimentos de urbanização.
Destacam-se o direito à paz, à livre determinação dos povos, o direito ao meio ambiente e o
direito de beneficiar-se do patrimônio comum da humanidade.
Por fim, fala-se em direitos humanos de quarta dimensão. Estes relacionados,
sobretudo, ao pluralismo e à genética, tendo em vista a possibilidade de as atuais tecnologias
genéticas alterarem o patrimônio genético da humanidade não só como indivíduos, mas como
espécie.
8
Lafer, Celso. A Reconstrução dos Direitos Humanos. p. 127-131.
9
Curso de Direito Constitucional. p. 514-531.
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b) Divisão jurídica dos Direitos Humanos


Para efeitos didáticos, os direitos humanos também podem ser visualizados a partir
da seguinte classificação:10

1. Direitos civis - são o direito à igualdade perante a lei; o direito a um julgamento


justo; o direito de ir e vir; o direito à liberdade de opinião; entre outros;
2. Direitos políticos - são o direito à liberdade de reunião; o direito de associação;
o direito de votar e de ser votado; o direito de pertencer a um partido político; o direito de
participar de um movimento social, entre outros;
3. Direitos sociais - são o direito à previdência social; o direito ao atendimento de
saúde e tantos outros direitos nesse sentido;
4. Direitos culturais – são o direito à educação; o direito de participar da vida cultural;
o direito ao progresso científico e tecnológico; entre outros;
5. Direitos econômicos - são o direito à moradia; o direito ao trabalho; o direito à
terra; o direito às leis trabalhistas e outros;
6. Direitos ambientais - são os direitos de proteção, preservação e recuperação do
meio ambiente, utilizando recursos naturais sustentáveis.

c) Dimensões dos Direitos Humanos


Teóricos há que preferem usar o termo ‘dimensões’, no lugar de ‘gerações’ de direitos
humanos. Importa em que possuem igual significado, quando se referem ao desenvolvimento
histórico dos direitos humanos. Já o doutor em Filosofia, Giuseppe Tosi, professor na
Universidade Federal da Paraíba, usa o termo ‘dimensões’, para se referir às perspectivas
pelas quais podem ser vistos. Elenca pelo menos seis delas, a saber, a jurídica, a política, a
econômica, a social, a cultural e a educativa.11 Passamos a descrevê-las.
A dimensão ética ressalta os direitos humanos como valores universais, atrelados
à própria essência do ser humano, pelo que devem, por isso mesmo, ser considerados como
superiores até mesmo às legislações jurídicas dos Estados, a fim de servirem como indicativos
de transformação.
A dimensão jurídica, por sua vez, é compreendida pelo fato de que, a partir do
momento em que foram positivados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinado
pelos pactuantes das Nações Unidas, devem servir como conjunto de direitos positivos a
serem integrados às legislações nacionais, pelas Constituições e leis ordinárias, a fim de
conquistarem maior protetividade por parte dos Estados.
A dimensão política é compreendida pelo fato de que não bastam que tais direitos
sejam reconhecidos pela Comunidade Internacional ou Nacional, mas que sejam tomadas
medidas efetivas para implementá-los, tanto sob formas negativas (o Estado coibindo os

http://www.redhbrasil.net/documentos/bilbioteca_on_line/modulo1/6.o_significado_dudh_tosi.pdf >. Acessado em Junho de 2009.


11
Tosi, Giuseppe. O Significado e as Conseqüências da Declaração Universal de 1948. In: <http://www.redhbrasil.net/documentos/
bilbioteca_on_line/modulo1/6.o_significado_dudh_tosi.pdf >. Acessado em Junho de 2009.
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fatores transgressores dos direitos humanos) quanto formas positivas (a implementação de


políticas públicas, afirmativas dos direitos humanos).
A dimensão econômica é compreendida com o reconhecimento do fato de que os
valores expressos na Declaração só podem ser efetivados a partir de garantias materiais e
regulação da economia, a fim de que se alcance a condição de igualdade.
A dimensão social revela que seria utopia entender que apenas o Estado é responsável
pela implementação e proteção dos direitos humanos. Os mesmos devem ser tutelados
pela sociedade como um todo, através de múltiplas atividades, tais como a organização de
movimentos sociais, associações, sindicatos, ONG’s, conselhos populares, etc.
A dimensão cultural implica no reconhecimento de que tais direitos não são garantidos
apenas a partir de ações materiais, mas também através da mudança de valores como um
todo, possibilitada a partir da formação de uma cultura que tenha os direitos humanos como
elementos básicos de sua manifestação.
Por fim, a dimensão educativa, que parte do reconhecimento de que, apesar de se
apregoar que os direitos humanos são naturais, isto é, inerentes ao ser humano, é preciso
reconhecer também que são conquista histórica que deve ser repassada de geração a geração,
através, sobretudo, de uma educação libertadora e humanizadora.

F - CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DOS DIREITOS HUMANOS

Na atualidade, algumas características são reclamadas quanto aos direitos humanos,


em virtude do fato de que tem sido necessário um entendimento comum acerca dos mesmos,
a despeito da compreensão de cada corrente teórica. São elas a imprescritibilidade, a
inviolabilidade, a universalidade e a efetividade.
Sobre o tema, disserta parcialmente Flávia Piovesan:

Neste cenário, a declaração de 1948 inova a gramática dos direitos humanos ao


introduzir a chamada concepção contemporânea de direitos humanos, marcada
pela universalidade e indivisibilidade destes direitos. Universalidade porque clama
pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que a condição de
pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano
como um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade.
Indivisibilidade porque a garantia dos direitos civis e políticos é a condição para a
observância dos direitos sociais, econômicos e culturais e vice-versa. Quando um
deles é violado, os demais também o são. Os direitos humanos compõem, assim,
uma unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, capaz de conjugar o
catálogo de direitos civis e políticos ao catálogo de direitos sociais, econômicos e
culturais.12

Agregadas a essas características, cumpre ressaltar a imprescritibilidade, já citada,


e a efetividade. A imprescritibilidade implica em que nenhum desses direitos podem ser
relativizados ou perdidos. Também que são inalienáveis, não podendo ser transferidos ou
12
Piovesan, Flávia. Direitos humanos: desafio da ordem internacional contemporânea. In: Educação para a Paz e Direitos Humanos. Pg. 223.
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negados, nem mesmo pela pessoa que imagina poder negociar com eles. São irrenunciáveis,
ou seja, mesmo que o ser humano queira dispor desses direitos, não dá a outrem a liberdade
de ofender tais direitos. Exemplo ilustrativo desse fato é que o Código Penal Brasileiro
considera como crime qualquer ajuda que alguém possa oferecer a outrem que queira cometer
suicídio (Art. 122 CP). O fato de que alguém esteja disposto a se suicidar – aparentemente
renunciando o direito à vida – não dá a ninguém o direito de tirar – ou ajudar a tirar - essa
vida. A vida é um direito indisponível e intransferível, até mesmo pelo e para o próprio
sujeito. Outro exemplo estaria na possibilidade do desejo de alguém doar um órgão de seu
corpo, sem o qual não viveria. Em periclitando sua vida, tal disposição se torna contraditória
com os direitos humanos, sendo proibida, portanto.
Já a efetividade é o entendimento de que tais direitos devem ser tutelados e efetivados
pelo Poder Público, usando dos meios necessários para tanto, inclusive a própria força física.
Partem do reconhecimento de que há, além da contínua presença de conflitos entre vontades,
uma concreta desigualdade de poder, o que representa que, salvo intervenção do Estado, as
pessoas ou grupos minoritárias em poder sucumbirão aos arbítrios egoísticos dos detentores
do poder.

DIREITOS HUMANOS COMO TOTALIDADE

Antes de finalizar, vale ressaltar a compreensão da Conferência das Nações


Unidas sobre Direitos Humanos realizada em Viena, em 1993: os direitos humanos devem
ser compreendidos em sua unidade e indissociabilidade! A dignidade humana cobra-os
como conjunto e, ainda, pode-se dizer, está aberta a possíveis outros reconhecimentos que
surgirem no desenrolar da História. Em outras palavras, um Estado não pode escolher alguns
direitos humanos para torná-los efetivos, e renegar outros, como se não fossem essenciais e
característicos da dignidade humana.
Ao final de nosso curso, apontaremos alguns desafios que se desenham hoje à
efetivação dos direitos humanos.

FONTES:

Afonso, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros


Editores, 2006.
Bonavides, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores,
2002. 12. Edição.
Kuschel, Karl-Josef. Fundamentação atual dos direitos humanos entre judeus,
cristãos e muçulmanos. Cadernos Teologia Pública. Ano IV – N. 28 – 2007.
Lafer, Celso. A Reconstrução dos Direitos Humanos. São Paulo: Companhia das
Letras, 2006.
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Mendez, Emilio Garcia. Origem, Sentido e Futuro dos Direitos Humanos:


Reflexões para uma Nova Agenda. SUR – Revista Internacional de Direitos Humanos. Ano
1 • Número 1 • 1° semestre de 2004. São Paulo: 2004.
Piovesan, Flávia. A Cultura da Paz e os desafios dos Direitos Humanos. In: Educação
para a Paz e Direitos Humanos. Brasília: Presidência da República, Secretaria Geral,
2008.

SÍTIOS ELETRÔNICOS:

Samaniego, Daniela Paes Moreira. < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=76


> Acessado em Julho de 2009.
Rabenhorst, Eduardo R. O que são Direitos Humanos? In: <http://redhbrasil.net/
documentos/bilbioteca_on_line/modulo1/1.o_q_sao_dh_eduardo.pdf > .Acessado em Junho
de 2009.
Tosi, Giuseppe. O Significado e as Conseqüências da Declaração Universal de 1948.
In: <http://www.redhbrasil.net/documentos/bilbioteca_on_line/modulo1/6.o_significado_
dudh_tosi.pdf >. Acessado em Junho de 2009.

ATIVIDADES
As atividades referentes a esta aula estão disponibilizadas na ferramenta “Atividades”.
Após respondê-las, envie-nas por meio do Portfólio- ferramenta do ambiente de aprendizagem
UNIGRAN Virtual. Em caso de dúvidas, utilize as ferramentas apropriadas para se comunicar
com o professor.

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