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ARCO (EM OBRA) II

FORMALIZANDO O INFORMALIZÁVEL

O seminário V, As formações do inconsciente juntamente com o seminário VI,


inauguraram uma capítulo essencial na psicanálise de Lacan por dois motivos: a
doutrina do desejo que vinha sendo estabelecida desde o seminário II é enfim
tratada com um profundidade sem igual, mas não apenas isso, encontraremos
grandes formalização de estruturas que articulam a práxis dialética analítica: o grafo
de desejo, a metáfora paterna, os triângulos edipianos que forma o esquema R e o
esquema I e o a divisão do sujeito e do Outro.

Ou seja, é como se grande parte das elaborações teóricas lacaninanas


tivessem neste dois seminários, o ponto de nodal para a organização dos princípios
norteadores do programa psicanalítico. Sobretudo a economia significante, isto é, de
suas trocas e deslocamentos na relação com o outro e Outro o que implica, a
grosso modo, a dialética analítica, mas também a possibilidade de formalização de
boa parte desta dialética.

Como o leitor e leitora percebe se não dividimos os temas dentro da


historicidade própria do seminário acabaremos por amontoar um sem número de
esquemas o que dificultaria o nosso debate. Assim, procederei da seguinte forma:
recortarei do seminário 5 os temas que envolvem o metáfora paterna objetivando
entrar debater e entender o que são os processos de formalização na presentes nos
esquemas L, R e I no artigo De uma questão preliminar a todo tratamento possível.
Em um segundo momento retomarei o grafo do desejo, sobretudo da na sua forma
estabelecida e canônica em Subversão do sujeito e a dialética do desejo.

Espero que o leitor e a leitora entenda que, diferentente dos capítulos


passados em que se tentava estabelecer um programa de pesquisa que incluísse a
palavra e sua modalidades de matematização, para este capítulo tento ir direto ao
argumento, assim, as ordens dos temas e não mais a historicidade ocupam a cena
principal.

Desde o seminário IV, as relações entre o S.I.R e a economia do significante


parecem responder a problemas distintos, mas não excludentes. É como se estes
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esquemas fossem criados com o objetivo de redistribuir os problemas que a prática


analítica enfrenta, isto é, a economia do significante e os processos dialéticos de
transformação necessários a clínicas, e o S.I.R na organização sistemática de
certas propriedades responsáveis pela realidade humana em geral. O V, retoma
estas questões laçando modos de estruturação destas questãoes, seja o grafo do
desejo, seja a construção do esquema da Realidade.

Como vamos nos deter neste último esquema é necessário partimos de


certas premissas. Peço desculpas aos leitores e leitoras, mas faremos alguns
abusos “citatórios”.

E esse 0 Nome-do-Pai, e, como veem, ele é, no interior do Outro, um significante


essencial, em torno do qual procurei centra-los no que acontece na psicose - a
saber, que 0 sujeito tem de suprir a falta desse significante que e 0 Nome-do-Pai.
Tudo 0 que chamei de reação em cadeia, ou de debandada, que se produz na
psicose, ordena-se em torno disso (152).

A posiçao do pai como simbólico não depende do fato de as pessoas haverem


mais ou menos reconhecido a necessidade de uma certa seqiiencia de
acontecimentos tão diferentes quanta um coito e um parto. A posi<;ao do Nome-
do-Pai como tal, a qualidade do pai como procriador, e uma questão que se situ a
no nível simbólico. Pode materializar-se sob as diversas formas culturais, mas não
depende como tal da forma cultural, é uma necessidade da cadeia significante
(p.187)

Penso que temos aqui dois grandes norteadores para entendermos como o
nome-do-pai “funciona” dentro do que Lacan parece querer pontuar. Por um Lado,
mesmo se expressando através das diversas manifestações culturais, possuindo o
seu lugar antropológico resquardado, ao mesmo tempo lhe é extemporânea,
digamos assim. Sua relação com a cultura está ligada ao contexto judaico-cristã da
religião ocidental. E como argumenta Eideszeinte (2009), a manifestação está ligada
ao lugar de religio, ou seja, ligação entre elementos, homem e Deus, por exemplo.

Entrementes, além desta função cultural, o não se limitar a ele que Lacan
propõe é a de que a função do conceito de nome do pai tem função de estabilização
da próprio cadeia siginicante. O esquema abaixo mostra que o S possui a função de
organizar o discurso representado pelos Sn+1 abaixo. Ou seja, sua função não é
constuir o discurso do Outro como tal, mas ao incluir-se no Outro, dotar a cadeia
significante a partir da relações metafóricas.
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para a psicose é o exemplo perfeito de como os processos de


formalização em psicanálise funcionam, seu objetivo e finalidade. Este texto
expande de forma considerável os debates apresentados no seminário III, IV e V,
introduzindo retificações importantes. Logo, temos aqui um dos maiores exemplos
de como a formalização pode ajudar não só a estabelecer a estrutura do sujeito na
neurose, mas como a psicose pode ser elabora. Todavia, como mostraremos, é
necessário muita precaução no uso do termo formalização da estrutura do sujeito na
psicose visto que a mesma é uma distorção das regras formais estabelecidas na
estrutura da neurose. Mas antes de avançarmos no texto, o que é formalização de
fato?
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ARCO IV (EM OBRA)

É PRECISO VER ESTA ESTÉTICA TRANSCENDENTAL AE!

O seminário 9, A identificação, é decisivo para o que vamos debater no


decorrer da tese. Seus desenvolvimentos são um tanto quanto cruciais para os
próximos seminários, transformando-se numa coluna, ou melhor, o pivô que
coordena o “jogo” teorético. Isto por três motivos:

a) A saturação dos desenvolvimento em torno da crítica lacaniana das


relações de objeto, somada as reflexões sobre as modalidades de falta na
privação, frustração e castração, possibilitam o surgimento do objeto (a).
b) O início da leitura/interpretação do sujeito cogito de René Descartes. Os
desenvolvimentos lacanianos em torno desta questão filosófica tornam-se
condições sine qua non para o entendimento do sujeito da/na psicanálise.
c) A elaboração completamente contra-intuitiva do que é identificação em
psicanálise. Trata-se não dos vínculos imaginários que estamos
acostumados desde o estádio do espelho, mas de um elemento que
implica um tipo de vínculo, laço bem peculiar com o Outro: o traço unário.
d) O que nos leva diretamente à “pimenta, sal e tempero”, como se expressa
Lacan no seminário: o início de fato do uso da topologia de superfícies,
sobretudo o Toro. Contudo, se Lacan retoma o diálogo com Descartes no
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tocante ao conceito de sujeito, quando se trata de justificar o uso desta


topologia é com Kant da Crítica da razão pura que o debate, de ordem
muito mais crítica diga-se de passagem quando comparado a Descartes.

Ou seja, ao meu leitor e leitora, repito, este seminário é fulcral! O arco sobre
a trilogia da ciência é inviável sem a passagem pelos principais desenvolvimentos
que cobram um alto nível de abstração para quem se dispõem a estuda-lo.
Seguiremos como sempre, determinando os pontos necessários acima com
profundidade e sem simplificações grosseiras, pois os frutos desta empreitada no
seminário 9, serão colhidos no seminário 10, A Angústia, com uma nova teoria da
objetividade materialista: a objetalidade.

A identificação, falo do seminário, poderia passar a impressão de que Lacan


continuaria suas reflexões sobre o estádio do espelho ou mesmo as diversas
relações entre o outro imaginário e o grande Outro simbólico. Cometemos um grave
erro de leitura, mas isto o próprio Lacan deixa bastante claro.

Seu objetivo começa a ser desvelado pela própria autocrítica realizada ao


seminário 8. É como se o mesmo ainda estivesse trabalhando a identificação de
forma puramente empirista em que os conceitos são usados para classificar tipos de
identificação. É necessário superar o obstáculo empirista e dotar o analista de
conceitos que relacionem outras variáveis do tratamento, logo, a identificação deve
ser abordado por este último viés. E, como o leitor e leitora perceberam, é sobretudo
conceito de sujeito na função com o significante que a identificação deverá ser
abordada.

É preciso que Lacan demarque este programa de pesquisa dotando-o de


especificidade. Para tal empreitada Lacan traz dois autores: Husserl e Witgenstein.
De certa forma isto é bem contra-intuitivo, pois o mesmo poderia trazer dois
psicanalista e realizar uma espécie de crítica de suas abordagens, mas não! Trata-
se de um matemático com grandes incursões na reflexão filosófica e um outro que
revolucionou a filosofia analítica!

Todavia, por mais desgastante seja este debate, a introdução que Lacan faz
é importante para os próximo desenvolvimentos. Assim, procedamos junto com ele
em vez de pseudo-resumir a matemática e filosofia de Husserl e Wittgenstein que se
quer arranharia a superfície de suas reflexões.
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Voltando a Lacan. Em Hurssel há uma reflexão nuançada sobre um problema


bastante antigo, mas aparentemente de difícil solução: problema da identidade. Este
data de Aristóteles e pode ser resumido da seguinte: tudo que é, é! Em termos mais
psicológico e pedagógicos é como se o meu eu fosse sempre idêntico a ele mesmo.

Com a entrada histórica1 do sinal de igualdade (=) os lógicos traduziram-na


em termos de identidade (=), logo podemos afirmar que A=A (A é idêntico a si
mesmo). Ou seja, é como se o uso que se faz do sinal na matemática fosse distinto
daquele usado na lógica. Mas qual o problema? Comentarei a seguinte citação:

Se Russel pode dar em seus princípios matemáticos um valor


a equação, ao estabelecimento da igualdade de A=A, por seu
lado opor-se-a a ela, em razão propriamente de impasses que
parecem resultar daí, em nome de princípios de partida, e essa
recusa será mesmo fixado algebricamente, sendo tal igualdade
obrigada a um desvio de notação, para encontrar o que pode
servir de equivalente ao reconhecimento da identidade A é A
(p.12)

É aqui que reside o truque de mágica da lógica e, de acordo com Lacan


descoberto por Wittigenstein: o A=A esconde o fato que ele é pensado duas vezes.
Conta-se o apenas um A, e não dois As, como se o primeiro fosse a fusão de dois.
É este tipo de problema que é salientado por Witgenstein em Hurssel, confundir
identidade por igualdade.

A igualdade matemática implica não identidade, mas equivalência ou co-


variancia. Por exemplo, A = A do ponto de vista matemático quer dizer que há duas
grandezas A e A, distintas, mas em relação de equivalência, em que a posição de
uma transforma a da outra, não identidade.

Lacan rapidamente destaca a importância de sair desse debate – que voltará


– para uma pequena investigação linguístico cultural sobre a identidade, ou seja,
como a identidade além de ser um problema lógico e matemático é, claramente
linguístico. Por exemplo, se acompanharmos a investigação de Beneviste (ÇÇÇÇ),
o linguista sustenta uma tese bastante similar a de Lacan: a linguagem determina o

1
https://www1.folha.uol.com.br/livrariadafolha/1260116-autor-conta-origem-do-
sinal-de-igual.shtml
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pensamento. Analisando como o verbo ser é usado na cultura indo-europeia para


com outras culturas na qual não há o verbo, percebe-se o quanto que a identidade
tal como é montada no ocidente é distinta em lugares que o verbo ser inexiste. O
interessante é que Lacan constrói um neologismo o mihilismo, junção de moi (eu)
com niilismo, para falar da tendência niilista do eu, questão esta já salientada por
nós na introdução.

E, exatamente aqui, que de maneira ainda mais contra-intuitiva salienta a


necessidade de investigar a relação da linguagem com a identidade, do sujeito com
o ser, diz que tomará o penso, logo sou de Descartes como pivô de sua reflexão,
pelo menos nas primeiras aulas do seminário. É como se, a análise empreendida
por Lacan desta fórmula, penso, logo sou, revela-se, através de seus impasses os
elementos fulcrais da identidade, ou melhor, desvela-se os fundamentos da
dependência do sujeito para com o significante.

Trazer Descartes para a reflexão analítica e sobretudo, tomando-o a partir da


experiência analítica, pressupõe colocar a questão quem sou eu? Se tal questão é
eminentemente clínica, visto que o analisante na raiz de seu conflito, de seu
pensamento pode coloca-la, mas esta reflexão é também filosófica e Descartes não
só tentou elaorar uma resposta para o quem eu sou como a sua resposta funda a
ciência moderna: o cogito, o dúvida sobre qualquer significado.

Assim, o cogito deve ser articulado ao processo significante que, também,


redestribui a função do significado a um papel subalterno. Lacan monta a seguinte
equação: Pensamento: cogito: significante, e é neste nível de homologia que seus
desenvolvimento (a do cogito) deve ser concebidos. E desta relação, a interpretação
do cogito como pensamento significante duas questões irão surgir: a) a antinomia
que o cogito, a partir da teoria significante, apresentaria: a desconexão entre o eu
penso e o eu sou; b) a posição central que o cogito ocupa em relação ao sujeito
suposta saber, Lacan argumenta que o cartesianismo não derivou nenhuma filosofia
da totalidade como a de Hegel que calcava-se num saber absoluto.
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ARCO 4 (EM OBRA)

A TRILOGIA DA CIÊNCIA

4.0) SEMINÁRIO 11: ENTRE CIÊNCIA E CIÊNCIA

O seminário XI (1964/2008) é sem dúvidas um dos momentos essenciais do


percurso de Lacan marcado pelas tensões institucionais que o levaram a construção
de sua própria escola de formação analítica, mas também é um dos primeiros
seminários a serem estabelecidos (ROUDINESCO, 1999) o que implica uma vasta
fortuna crítica de comentários e interpretações sobre o mesmo (HARARI, 1997;
FINK et all, 2008). Contudo, gostaríamos começar o debate em torno do seminário
sustentando uma hipótese inicial a de que Os quatro conceitos fundamentais da
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psicanálise pode nos ajudar a realizar uma espécie de balança do campo lacaniano
e isso não apenas no sentido passado de sua obra, mas também no futuro.

Logo, me parece que uma das questões centrais que acompanham o


seminário e, desta forma, o problema em torno do qual os argumentos de Lacan se
formam é: a psicanálise é de fato uma ciência? A insistência desta pergunta e a
possibilidade responde-la animam todo o seminário e a análise dos fundamentos da
psicanálise pode nos levar a repensar esta questão. Contudo, será que ao perguntar
sobre a capacidade da psicanálise estar à altura da ciência, tratar-se-ia apenas de
um exercício intelectual no qual se celebraria a cientificidade da psicanálise ao lado
de outras ciência já consagradas como a física, por exemplo?

Nossa hipótese está apoiada em outra perspectiva: ao se perguntar sobre a


cientificidade em psicanálise o que está em jogo é o desejo do analista, haja vista
que, ao se definir a função deste último, avançamos sobre os critérios da
demarcação da experiência analítica e, desta forma, sobre sua possível
cientificidade. Desta forma, analisaremos o SXI, SXII SXIII, pois nos parecem três
momentos ou tentativas sui generis de explanar estes pontos, através de
perspectivas distintas, logo, reconstituiremos a trama singular de cada seminário,
mas priorizando os argumentos de Lacan capaz de sustentar nossa perspectiva de
leitura.

O início do seminário no qual a ênfase das interpretações recaem em


demasia no processo político de excomunhão de Lacan da IPA é importante,
contudo, pode-se inferir que o contexto institucional força Lacan a centrar sua
primeira aula e dedica-la a examinar uma relação plausível de entre psicanálise e
ciência e, de forma específica, as considerações sobre a essência da experiência.
Devemos entender este intenso debate com a ciência devido ao suposto processo
religioso que estrutura as organizações psicanalíticas e que, desta forma, parece
negar uma posição mais científica e mais crítica, por exemplo.

Há aqui um rápido passeio por distintas tradições epistemológicas. Se pode


inferir, por exemplo, uma incursão em torno de concepções próximas ligadas ao
empirismo ao trazer e questionar a concepção de ciência própria como “(...)
especificada por um objeto definido, reprodutível, que chamamos de experiência (...)
(p.15)”. Para Quine (2010) e Fraassen (2007) o que condiciona a lógica da
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experiência científica é a capacidade em reproduzir esta mesma experiência, e, o


que denominamos objeto na ciência, são fenômenos estabilizados, o experimentum
crucis, que servem como parâmetro para prever acontecimentos.

Logo, o que Lacan (1964/2008) coloca em reflexão é que se este tipo de


concepção de experiência não é pertinente ao que a experiência analítica propõe,
isto é, se à concepção de experiência como reprodução e verificação é base da
ciência a psicanálise teria dificuldades em atende-la plenamente. A pergunta
poderia ser colocada de outra forma: o conceito de experiência tal como as
concepções empiristas defendem seriam da mesma natureza de uma concepção de
experiência em psicanálise?

A resposta inicial dada por Lacan preza por uma postura de prudência,
“porque esse objeto muda, e singularmente no curso de uma ciência” p. (16). Há
aqui dois desdobramentos possíveis para a postura que Lacan prefere adotar. A
primeira se deve a de que a lógica científica produz novos fatos e novas evidências
e que desta forma relativiza as posições mais positivistas como a de Duhem (2014)
que expressa a necessidade de um único objeto de investigação para a ciência.

Assim, definir a psicanálise a partir de uma concepção de experiência


empirista que teria como resultado a formulação de um objeto de estudo imutável
seria problemático e contraproducente para a própria natureza do devir científico.
Pode-se, por analogia, verificar o quanto as abordagens empiristas lograriam quanto
a resposta se a psicanálise é uma ciência, haja vista que, a própria noção de
experiência destas seriam incompatíveis com a estrutura da ciência, imagine-se no
âmbito das incertezas e indeterminações quer permeiam um processo clínico. Disto
resulta esta enfática afirmação: “à noção de experiência (...) não basta para definir
uma ciência” (p.16).

Estas ponderações lacanianas que parecem circunscrever o campo de


problemas do seminários é essencial para a investigação de nossa tese, pois o que
Lacan faz aqui é tentar entender o que é a práxis analíticas, ou melhor, os critérios
que demarcam experiência analítica. O que chamamos de experiência em
psicanálise não é uma reprodução de fenômenos que ao serem estabilizados por
procedimentos metodológicos ganhariam o estatuto de evidências, mas, também,
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não é o seu contraponto a chamada experiência imediata base dos estudos da


psicologia espiritualistas (WUNDT,2018) e fenomenológicas (MERLEAU-PONTY).

Logo, temos algumas classes de perguntas que vem se desenhando: a mais


óbvia é sobre uma definição possível de experiência psicanalítica ou pelo menos do
lugar específico que a experiência ocupa no campo psicanalítico, seja do ponto de
vista mais pragmático o que envolveria os procedimentos relativos ao tratamento,
seja do ponto de vista mais epistemológico no tocante a capacidade da experiência
em transformar os conceitos; a segunda se refere a possibilidade da psicanálise vir
a ser uma ciência.

Se a noção mesma de experiência no campo científico (entendido aqui a


partir das ponderações positivistas e empiristas) coloca problemas à psicanálise, há
um outro elemento que entra neste cálculo: a função que dá condições de
possibilidade para que a experiência exista: o desejo do analista. Sem o desejo do
analista não há experiência, logo a questão da cientificidade da psicanálise pode ser
resolvida ao demarcarmos qual é o desejo do analista.

Contudo, esta ultima questão só parece ser abordada depois de concretizada


os fundamentos da psicanálise: o inconsciente a reppetiçãoe a transferência e a
pulsão.

SEMINÁRIO 12

Prezado leitor e leitora, se por acaso trocássemos a sequência dos seminário


de Lacan, o da Angústia, pelo seminário XII, dificilmente sentiríamos alguma
descontinuidade. Falo das relações bastante estreitas no tocante aos temas
trabalhados entre A identificação e Os problemas cruciais da psicanálise.

Porém, os problemas da psicanálise no tocante a sua possível ou não


cientificidade só podem ser colocados depois de fundada as premissas teóricas que
estruturam sua práxis. Um estilo de raciocínio cria seus objetos, mas também seus
problemas

Pois, ambos tratam de centrar suas forças em torno do sujeito e do


significante a partir de modelos topológicos. Contudo, é o tema da cientificidade da
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psicanálise que comanda e centraliza as discussões. Proponho há existência de três


estruturas de discurso que comandam o seminário:

1) O aprofundamento das relações entre sujeito e linguagem, ou melhor, o


significante. Como dito acima, o vínculo entre o seminário 12 e o
seminário 9 é bastante forte. O tema é mais uma vez objeto de
investigação, mas valorizando uma outra superfície: a garrafa de Klein.
Teremos uma revisão do problema da demanda articulada a dimensão do
tempo em psicanálise.
2) A reflexão sore a ontologia. Aqui os efeitos dos debates sobre a estatuto
ontológico da psicanálise são retomados com um posicionamento
bastante forte por parte de Lacan.
3) Temos a retomada do sujeito cartesiano a partir

No início do seminário, um personagem que ainda não tinha sido mencionado


surge: é nada mais, nada menos que Noam Chomsky e seu clássico livro As
estruturas sintáticas (2015). Lacan tecerá uma crítica a Chomsky com o intuito de
introduzir o problema das relações do sujeito com a linguagem. Assim, não faremos
nenhum embate tal como realizamos com Kant, pois a importância do primeiro é
muito pontual quando comparada ao filósofo de Koninsberg. Vamos extrair a
essência do argumento lacaniano, visando contextualizar as questões iniciais do
seminário 12.

O livro As estrutura sintáticas (2015) tem como objeto principal de suas teses
a seguinte cadeia significante: Colorless green ideas sleep furiously" ("Ideias
verdes incolores dormem furiosamente"). Por mais que exista uma estrutura
gramatical com sujeito, verbo, adjetivo e advérbio, ou seja, uma estrutura que
garanta a sua “gramaticabilidade” e sintaxe, esta frase é a-semântica, sem
significação.

O ponto de Lacan é o de que esta frase só pode ser tida como sem
significação se for elidido o contexto da enunciação. Ou seja, esta sintaxe, sintagma
ou cadeia significante a depender do momento clínico por exemplo, esta frase para
determinado analisante pode ter significação. O interessante desta posição é a
crítica de Lacan ao formalismo estruturalista de que Chomsky por excluir a posição
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do sujeito na relação com a linguagem. Contudo, esta é uma crítica a um tipo de


estruturalismo e a um tipo de formalismo, nada nos autoriza, ainda a decretar a
morte do estruturalismo em Lacan.

Contudo, o ponto nelvrágico do argumento crítico lacaniano se reflate na


posição do próprio psicanalista. Pois, se se considera que o campo da psicanálise
envolve a relação do significante com o sujeito e, desta forma, toda cadeia
significante pode ganhar efeito de sentido, o psicanalista, pode lidar no interior de
suas práxis com a fala deve estar preparado a excluir certas posições clínicas, como
por exemplo a de Chomsky, mas, mais ainda, aquelas que objetivariam transformar
a linguagem em objeto ou mesmo posições dialética mais extremas como a de
Hegel que desejariam explicar todas as nuances da fala. Mas por que Lacan, faz tal
questionamento: tanto Chomsky, Hegel ou aqueles engajados na metalinguagem
rejeitariam uma espécie de perda ligada a cadeia significante: que a produção do
sentido articula-se com o nonsense, não há sentido pleno.

Esta é uma discussão bastante densa, pois envolve a produção de sentido,


sua diferença para com a significação e significado somada a noção de introdução
do referente. É muita coisa. Para conseguir dirimir inicialmente a topologia referente
ao seminário 9 será essencial.

Desta forma, a melhor maneira de entrar no problema da relação do significante


com o sujeito é via topologia de superfície. O estilo de raciocínio que empregamos
para pensar esta modalidade de geometria deve ser pareada com a estrutura de
linguagem tal como Lacan quer desenvolver e isto terá consequências tanto para a
crítica ao individualismo, como para determinadas propostas ontológicas. Vejamos.
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A figura acima é uma esfera, mesmo com pequenas deformações laterais a


mesma não perde digamos a sua essência: a divisão entre interno e externo, ou
seja, não há comunicação entre a “casca” da esfera e o seu interior. Trazer esta
figura para a discussão não é um preciosismo intelectual. Lacan localiza que existiu
em um determinado perído de nossa história uma significância dominada pela
esfera. O que isso quer dizer? Quer dizer que durante um momento da nossa
história, essencialmente dominada a cosmologia Aristotélica através do qual todos
os objetos tinham um lugar e significado delimitado. No qual o homem é visto como
um indivíduo, com uma vida interior, um psiquismo, que habitaria a esfera, enquanto
que sua casca o separaria da esfera pública, ou melhor das massas.

Lacan coloca a psicanálise como critica a maneira esferoide de se pensar,


baseada em dicotomias e reapresenta a banda de moebius como uma estrutura que
responde ao estilo de raciocínio em psicanálise. A construção como se sabe é
bastante simples, pega-se uma tira de papel, pinte um lado de preto, junte a tira a
partir de uma semi-torção e o resultado é este:

Diferente da tira de papel que possui dois lados, a banda de moebius é uma
superfície que subverte o estilo esférico, pois aqui não há mais dentro nem fora,
15

mas uma contituidade. Lacan realiza algumas operações que cortam a figura para
ilustrar o quanto as mesmas não obedecem a nossa intuição comum:

Por exemplo, se cortarmos um cilindro ao meio em alpha teremos dois


cilindros idênticos, divididos, mas preservam suas características:

O mesmo não acontece com a anda de moebius. Se realizarmos um corte


longitudinal, a banda volta a ser uma tira de papel com um lado branco e o outro
azul.

Agora se fizermos o corte que circunda a banda o resultado é contra-intuitivo.


Em vez de termos duas bandas como no caso do cilindro cortado ao meio, teremos
um tira cilíndrica com dentro e fora, “sem a estrutura moebiana”, mas com o dobro
de tamanho da anda original.
16

Ou seja, a banda de moebius não pode ser dividida, tal como o cilindro, pelo mesmo
tipo de corte.

Lacan traz um outra propriedade ao aplicar uma tira de papel a banda de


moebius. Aplicar, em topologia de superfícies significa interpolar e recobrir uma
superfície por outra (TOMEI, 2002). Vejamos!

Passo 1, peguemos a tira de papel a baixo:

Passo 2, agora cobrimos a superfície da banda de moebius, o resultado é:

Expressão da mesma figura de modo tridimensional:


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É de fundamental importância pontuar que esta estrutura em que uma tira


recobre a banda é designada por Lacan como a demonstração da estrutura
topológica do significante. Pensemos da seguinte forma, no dia a dia clínico as
palavras que são trocadas entre analisante e analista que remetem aos problemas
do primeiro para o a escuta do segundo, não são desenvolvidas de forma linear,
como se houvesse um encadeamento de palavras que articulassem
cronologicamente os problemas do passado, para o presente e, quem sabe futuro.
Lacan, ao investigar as relações entre significante e sujeito, está elaborando uma
estrutura capaz de dar inteligibilidade as diversas manifestações clínicas que
importam a psicanálise, como erros, problemas que se articulam com outros
problemas, demandas simples, mas que se vinculam com uma série de questões
imperceptíveis. Uma banda de moebius recoberta por uma tira deve ser entendida
como o nó ou o enlaçamento complexo dos significante, ou melhor está estrutura é
a cadeia significante.

A cadeia significante implica elos, e elos que encaixam, o que não supúnhamos de
início (16, p.29). E para demonstrar mais uma vez como a cadeia significante é um
nó e não deve ser entendida como um tipo de discurso teleológico, trabalahrá com o
silogismo Aristotélico aplicado a banda. O silogismo é a base da lógica de
Aristóteles em que, a partir de proposições, pode-se encadear inferências, por
exemplo:

a) Todo homem é mortal


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b) Sócrates é homem
c) Logo Sócrates é mortal

Através do silogismo percebe-se ummconjunto de causa e efeito que leva a


morte de Socrates. Esta seria uma primeira manifestação do sentido, uma segunda
é transformar o silogismo em uma cadeia significante que se articula a partir da
lógica moebiana. Como vimos, não há dentro ou fora na banda, nem mesmo um
sentido a ser direcionado. O intuito de Lacan é chegar ao ponto de que, a partir da
múltiplas formas que estas cadeias significantes se poderia produzir o senido como
uma questão. Por exemplo, imagine-se socrates buscando seu analista antes de
sua morte trágica. Ao relatar o silogismo, o analista em vez de tomar aquelas
palavras como o seu destino inexorável pergunta-se a socrates, O que é um
homem? Desmontando o silogismo.

A psicanálise deve pensar que os significante então encadeado como anéis


ou bandas de moebius enlaçadas. Contudo, engana-se quem pensa Lacan quer
realizar uma formalização irrestrita a psicanalise através das superfícies. Logo após
trazer este exemplo, retoma o problema que seria a metalinguagem em psicanálise
e sua consquencia: a desvalorização da fala concreta de nosso analisante. A
metalinguagem transforma a linguagem num-objeto, rebaixando o seu statuto.

O.K COMPUTER: a psicanálise minorada


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O seminário 13, o objeto da psicanálise possui uma primeira aula já clássica


no lacanismo: A Ciência e a verdade: a divisão do sujeito entre saber e verdade.
Contudo, como é constatada pelos editores da versão starfela, há diferentes tons
entre a versão do seminário e a versão do seminário. Estes tons serão, sempre que
possível apresentados e discutidos. Contudo, nossa linha percorrerá a versão do
seminário e que o leitor e leitora perceberá posteriormente a justificativa desta
escolha.

Se há uma questão central e de difícil acesso é a definição de objeto,


somada a problemática do sujeito.

O final do seminário 12, como vimos, se organiza através do estabelecimento


do status do sujeito da experiência analítica psicanálise. Não à toa o próprio Lacan,
em suas primeiras falas, deixa claro o quanto que Os problemas cruciais da
psicanálise tinha, de fato, como problema crucial ser um fio condutor que levasse a
psicanálise a uma aproximação com o campo científico. Veja-se que desde o
seminário 11, estas aproximações são calculadas, refletidas, não há uma resposta
fácil sobre os critérios que levariam a psicanálise a ser ciência. Quanto a isto reina
em Lacan um espírito de prudência.

Todavia, se no seminário 11, esta questão não parecia emergir com uma
maior força, mesmo na tentativa de fundamentar a psicanálise, aqui temos
vislumbres de uma maior articulação entre os dois campos via, justamente, o
conceito de sujeito. Não a toa, que o programa de pesquisa sobre as posições
subjetivas e as distintas formas de divisão, fenda ou saltung entre sujeito, saber e
verdade contribuem para uma primeira relação: o sujeito da ciência.

E é deste ponto de vista que o seminário 13 começa. Ressaltando o quanto a


pesquisa empreendida no seminário 12 permite o analista fundar sua prática em um
dispositivo racional capaz de operacionalização. Todavia, este status do sujeito é
condição necessária, mas não suficiente ainda alguns passos que terão de ser
dados por Lacan para uma maior relção da psicanálise como ciência.

1) A relação entre o sujeito da psicanálise e o sujeito da ciência


2) A relação entre o objeto da psicanálise e o objeto da ciência
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O primeiro ponto está, de certo modo, articulado desde o seminário 9, ao


articular o cogito cartesiano ao sujeito da psicanálise é claro que o caminho para
afirmar que o sujeito da ciência é o da psicanálise está parcialmente posto. O
problema maior refere-se a esfera do objeto, haja vista que não existe no seu ensino
nada que coloque os dois no mesmo plano, ao contrário, houve um afastamento
crítico com as teorias do conhecimento paranoico.

Uma outra questão se deve a própria definição de objeto da ciência cobrada


por Lacan. De acordo com o mesmo a epistemologia, que teria o papel de definir ou
melhor reduzir em cada caso o objeto não o fez, e, também, não explicou a
transformação através do qual a ciência modificou o status do seu objeto. Esta
minoração do objeto da ciência passa pela análise das condições históricas de seu
surgimento, as consequências desse saber no tocante ao nosso cotidiano e a
matematização da energética.

Todavia, se pela perspectiva da noção de objeto da ciência as relações desta


última com a psicanálise ainda são difíceis de estabelecer. Não se pode dizer o
mesmo se tomarmos o ponto de vista do sujeito. Pois a retomada lacaniana do
problema do cogito cartesiano é justamente a construção das conexões entre
ambos os campo. E esta conexão tem nome: o sujeito da ciência.

Esta constatação ocupara toda a primeira aula, haja vista que é preciso tirar
quais as consequências de admitira que o sujeito da psicanálise é o sujeito da
ciência.

Inicialmente, Lacan defini as premissas que circunscrevem o sujeito da


ciência e elas são peculiares: o sujeito é pensado como a rejeição de todo o saber
que se apoie no ser, se ancore no ser. Veja bem, não é a rejeição do saber
inconsciente, mas aquele que saber que possui vínculos com o ser. Mas, ainda está
complicado, é necessário alguns apontamentos fora do campo psicanalítico, em
especial trazer uma citação do autor que Lacan considera o seu guia para este
debate Koyré. Em Do mundo fechado ao universo infitino:

De outra parte a gradual dissolução da ontologia tradicional, sob o


impacto da nova filosofia, pôs em questão a validade da inferência do
atributo a substância. Em consequencia, o espaço perdeu
progressivamente seu caráter atributivo ou substancial (...) ele
passou a ser cada vez mais o vazio dos atomistas, nem substância,
21

nem acidente, o nada infinito, incriado, o quadro da ausência de todo


ser (...). (p.243).

Nesta obra fundamental (já citada por nós no seminário II), Koyré está
tentando delimitar os efeitos do advento da astronomia para a concepção de mundo
do homem. Esta ciência desaloja a ontologia natural que compreendia que o
universo era fechado e que todos os objeto que o preenchem são dotados de
sentido. O saber fisíco-matemático não se ancora nas aparência dos seres, mas na
produção matematiza do real, ou seja, cálculos. O astrônomo não precisa tocar nas
estrelas, se ancorar nelas, “basta” empreender um conjunto de deduções e ou
induções através de cálculos e fórmulas.

O que Lacan está sustentando que este procedimento de matematização é


no mínimo uma barreira a uma volta a uma concepção naturalista de ontologia ou
de ser. O sujeito da ciência é desnaturalizado. E este procedimento é essencial para
o surgimento da psicanálise como prática, não por causa de um status científico que
ela não teve, não pelo suposto cientificismo que influenciou Freud. Ao contrário,
Lacan defende o cientificismo de Freud pois foi através do mesmo que ele pode
sustentar a prática da psicanálise contra tendências mais tradicionais de ontologia
como era o caso de Jung.

A ciência é condição necessária para dizermos não a determinadas


ontologias, sobretudo as naturalistas. É o cientificismo que permite reduzirmos a
manifestação evanescente do sujeito da ciência na psicanalise entre o saber e a
verdade.

Daí entende-se a importancia para a constituição do campo ciêntífico da


psicanálise que não é sem problemas. A demarcação do campo psicanalítico seria
um deles e Lacan no mínimo heterodoxo quanto a isto. A demarcação do campo
psicanalítico se institui não pela redução do objeto, sua circunscrição, mas do
sujeito!

Percebam, quando falamos de demarcação na ciência denota-se ao menos


dois tipos de propostas epistemológicas: a do círculo de Viena na figura de Carnap
ou o racionalismo crítico de Popper. Para ambos, a ciência se constitui através de
procedimentos que delimitem a sua experiência, seu objeto, mesmo que os dois
22

autores discordem dos princípios que embasam o cientista na conquista da


experiência. Demarcar é acentuar qual o objeto da ciência e como
metodologicamente podemos apresentá-lo como distinto de outras ciências. Trata-
se da redução da realidade sensível, para o primeiro, ou o teste e reprodução da
experiência para o segundo.

Entretanto, mesmo que haja diferenças entre abordagens de redução do


objeto: Carnap é um empirista lógico, ou seja, a ciência se constitui através de
verificações de observações que podem ser formalizadas em linguagem lógica.
Através de observações da realidade, seriam criados teoremas capazes de capturar
a “essência” desta experiência para que, num segundo momento, tais teoremas
possa ser comparados e, se possível, generalizadas. Evita-se tanto a metafísica
como a linguagem natural por serem uma linguagens confusas e amplas demais.
Assim, a lógica seria a linguagem formulaica de referência, visto que evitaria
desentendimentos.

Já Popper, parte de ideias que tenham a capacidade de reprodução


experimental, a principal ênfase deste autor não é a definição de um objeto, mas a
construção de hipóteses articulados com uma metodologia. Não há uma extrema
preocupação com a linguagem, muito menos uma negação da metafísica, mas a
construção metodológica e sua possível replicabilidade universal. Porém, como
afirma Hackinq, ambos concordam com a unicidade da ciência, de que o método
advindo da física é universal e modelo para todas as outras, rejeitando teses como a
de Dilthey em torno da divisão entre ciências explicativas e ciências compreensivas.

A posição lacaniana é bem lacaniana. Ao mesmo tempo que visa o sujeito da


ciência, sua demarcação se acentua neste ponto e não no tipo de objeto, pois ele
salienta, e é possível plenamente sustentar a ideia da questão ou dificuldade em
reduzir é o objeto da ciência como vimos a epistemologia logrou a especificar o
objeto em cada ciência, visto que afirma um único tipo de ciência: a física.

A diferença entre radical entre Carnap, Popper e Lacan é que a demarcação


da psicanálise em relação a três campos que investigará a ênfase não será dada ao
objeto sensível e verificável, a experiência reflicável metodologicamente, mas no
sujeito da ciência e, com o adicional que este é o sujeito da psicanálise, logo a
mesma habita o campo ou espaço científico pelo menos. Resolve-se, assim, o
23

problema levantado por Lacan no seminário 11, como vimos, que é por qual
caminho a psicanálise relaciona-se com a ciência? O seminário 13 começa a
esboçar através da correlação do sujeito da ciência como sujeito da psicanálise.

Vejamos como isto transcorre. Lacan traz três exemplos que diferenciam a
psicanálise a partir do forma que trabalham o sujeito da ciência.

O primeiro exemplo remete-nos a uns dos fundadores da antropologia Levi-


Bruhl e a epistemologia genética de Jean Piaget. Lacan dirige a mesma critica: ao
negligenciar o sujeito da ciência a mentalidade primitiva aparece a partir de crierios
desenvolvimentistas. É como se, o sujeito da ciência nos resquardasse de
transformar o sujeito num indivíduo com tendências e acepções
desenvolvimentistas, considerando o primitivo, a criança como seres inferiores que
ainda não alcançaram a plenitude de seu potencial.

O segundo exemplo estaria calcados em certos desenvolvimentos da


linguística. E aaqui Lacan volta a criticar Chomsky e principalmente no uso do
formalista que também negligenciaria o sujeito da ciência ao separar sintaxe de
semântica.

Por últmimo, o formalismo interno a sua própria psicanálise. Ou seja, Lacan


dirige uma critica a sutura do sujeito, texto de Miller, como uma manifestação de
tendências que excluem o sujeito da ciência. Sua critica recai no tipo de formalismo
usado por Miller que acabaria por localizar elaborar uma lógica do significante que
acabaria por se tornar um conceito puro, universal, a todas as outras ciências.

Contra a tendência colocada por Miller de sutura, Lacan traz um autor que já
tinha citado no seminário a identificação Kurt Godel. Vale apana contextualizar a
contribuição godeliana mais conhecida afim de aprofundarmos o sujeito da ciência
lacaniano.

Como vimos com no capítulo sobre a estética transcendental, grande parte


da matemática e da geometria tinham como modelos de racionalidade os axiomas e
os teoremas de Euclides que por sum simplicidade tinha a capacidade de deduzir
boa parte do sistema arquitetônico matemático (SHAPIRO, 2010). Esta ideia de
axiomatizar a geometria, bem como os ramos da matemática como a álgebra,
transformou-se em grandes programas de pesquisas que envolviam a elaboração
de sistemas capazes de englobar as mais variadas formas de raciocínio
24

matemático. Para deixar mais claro, é como se, a partir de alguns lotes de terra, se
pudesse construir um prédio de tamanho estratosférico.

Em 1931, Godel publicou o seu teorema da incompletude que colocava


limites até onde um sistema matemático é capaz de padronizar toda a matemática
sem cair em tautologias.

Quando Lacan, faz criticas ao programa de sutura do sujeito, em especial a


Miller, ele está pontuando que a estratégia de compor uma lógica do significante
que englobasse as áreas como a lógica e a teoria social é tautológica. Suturar o
sujeito por meio de uma lógica pura constituinte da cadeia significante é ultrapassar
os limites da própria psicanálise.

Dai que o próximo passo de Lacan é ponderar qual as posições que o


analista não deve assumir. E são quatro posições.

1) A posição que sustenta o pensamento mágico. A magia aqui é


considerada como um avatar da psicologização do sujeito, quando por
exemplo, se exclui o sujeito da ciência para no desenvolvimento infantil ou
mesmo da mente primitiva. Verdade como causa eficiente
2) Posição escatológica que municia tratamentos baseados num fim único
de análise, ou mesmo traçam um único destino a ser seguido. Verdade
como causa final
3) A posição ligada a sutura do sujeito, em que o formalismo acaba por
unificar a diversidade através de poucos axiomas.verdade como causa
formal.
4) Por último, a negligencia por parte da psicanálise da matéria que lhe é
constituiente.

ARCO 5 (EM OBRA)

A TRILOGIA DO SER E DO PARESSER


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CONCLUSÃO

Não há conclusão. O que se concluiu que


possamos concluir a seu respeito? Não há sortes a
tirar, nem conselhos a dar. Adeus

William James

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