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Oral de português - Amor de Perdição

Mariana - Classificação, caracterização, valor simbólico-literário, linguagem.

Mariana, uma rapariga de 24 anos, é de uma classe social inferior à dos


protagonistas, com olhos tristes e bonitos, tem sido por vezes considerada como a
personagem mais romântica da história, porque o sentimento a satisfaz, sem sequer
esperar perceber o seu amor por Simão. Independentemente do amor entre Simão
e Teresa, Mariana ama-o e faz tudo por ele: cuida das suas feridas, arranja dinheiro
para ele, é cúmplice da paixão proibida, abandona o pai para lhe fazer companhia e
presta-lhe serviços na prisão, e finalmente suicida-se após a morte de Simão. Estas
atitudes – altruístas, resignadas e totalmente separadas da reciprocidade – fazem
de Mariana uma personificação do espírito de sacrifício, o que a torna abstrata, não
palpável.

Mariana é a personagem mais humana e mais complexa da obra, ainda que o autor
não explicite de modo minucioso o que se passa no íntimo da jovem, sugere suas
qualidades através de seus atos colocando-a diante de nossos olhos e fazendo com
que nos sensibilizamos com a sua singela vida que revela uma grande alma.

Trata-se, pois de uma personagem diferente e rara, pois no decorrer da trama nos
comove com sua dedicação e amor a um homem, Simão Botelho, mesmo sabendo
de sua extrema paixão por outra jovem, Tereza, configurando-se, assim, como uma
amante silenciosa, e, talvez, a personagem que mais sofre no romance, já que
nunca se realiza sentimentalmente, sendo capaz de renunciar sua própria felicidade
em nome da felicidade de Simão e morrer por amor tendo um final trágico.

É uma rapariga humilde, de vinte e quatro anos, com olhos azuis e uma grande
beleza.
Sendo, "fisicamente, mais insinuante que Teresa" (1946, p. 333). Dela o narrador
apenas nos diz que tem: "formas bonitas, um rosto belo e triste" (CASTELO
BRANCO, 1996, p. 41). Porém, evidencia seus encantos, através da fala de outros
personagens, expondo que fisicamente era mais favorecida em beleza que Teresa,
como no momento em que ela vai visitar Simão na prisão e o carcereiro a compara
à jovem fidalga atribuindo a Mariana maior graça, destacando a superioridade de
sua beleza: "Esta é bem mais bonita que a fidalga!" (CASTELO BRANCO, 1996, p.
86). Além do mais, suas ações demonstram que se trata de uma mulher corajosa,
concreta e forte; possuidora de um coração puro e honesto. Dona de casa muito
cedo, por ter perdido sua mãe quando criança, ela vive com o pai,
o ferrador João da Cruz, nas vizinhanças de Viseu. Sua relação com ele reflete
respeito mútuo e companheirismo. Mariana é uma filha dedicada e seu pai a admira
por sua determinação e caráter: "Vales tu mais, rapariga, que quantas fidalgas têm
Viseu!" (CASTELO BRANCO, 1996, p. 72). O pai orgulha-se da rebeldia e
determinação da moça: exibindo-a como mulher de fibra: "A Mariana!... Aquilo e d'a
pele de Satanás!" (CASTELO BRANCO, 1996, p. 107).
Contrária aos preceitos sociais fecha-se aos galanteios dos conquistadores da
aldeia, mesmo tendo varios pretendentes recusa-se a casar. Diferente do que
acontece a Teresa, Mariane tinha liberdade para escolher e o casamento não era
imposto por seu pai. Este confiava na filha, pois ela cuidava dele e o protegia
mantendo-o longe de encrencas

No entanto, toda essa robustez se desfaz no momento em que conhece Simão


Botelho, o protegido de seu pai, por quem se apaixona. Mariana amava em absoluto
o jovem rapaz e, ao lado do pai, estava sempre pronta a auxiliá-lo no que fosse
necessário. Cuidou de suas feridas causadas no confronto com os criados de
Baltasar; arrumou-lhe dinheiro fazendo-o aceitar sem que soubesse que na verdade
eram suas economias; torna-se sua confidente, amiga e cúmplice da paixão proibida
por Teresa e, até mesmo, abandona o pai para estar ao lado dele e prestar-lhe
serviços na prisão.

Símbolo da mulher romântica que renuncia da própria vida para o bem do homem
que ama, Mariana passa a viver exclusivamente para Simão, estando sempre ao
seu lado quando este necessita de cuidados e companhia; transformando-se em
sua serva sem pedir nada em troca: "Não me quer aqui? Irei, e voltarei quando
vossa senhoria chamar. Dissera isto Mariana com os olhos a verterem lágrimas.
Simão notou as lágrimas, e pensou um momento na dedicação da moça; mas não
lhe disse palavra alguma" (CASTELO BRANCO, 1996, p. 64).

Mesmo quando Simão diz a ela que só pode retribuir seu amor com amizade, sua
reação causa surpresa, já que suas atitudes permanecem fiéis a esse amor, ela
continua a ajudá-lo e servi-lo sem nunca medir sacrifícios, embora soubesse que
não seria correspondida.

Pelo fato de possuir um nobre caráter e grandioso amor por Simão, quando este
não tem mais como se comunicar com Teresa, Mariana se dispõe a ajudar
chegando ao ponto de abnegar seus próprios sentimentos por compaixão da
situação do fidalgo: "- Se o senhor Simão quer, eu vou à cidade e procuro no
convento a Brito, que é uma rapariga minha conhecida, moça duma freira, e dou-lhe
uma carta sua para entregar à fidalga" (CASTELO BRANCO, 1996, p. 71).

Por amar intensamente Simão, Mariana adota uma posição compassiva e sobre-
humana, sendo capaz de controlar seu ciúme, para ajudar Simão a aproximar-se de
Teresa, o que é uma contradição um tanto inexplicável, pois seria de se esperar que
ela tentasse, na verdade, separá-los. Todavia, ela levou as cartas de Simão a
Teresa sem qualquer interesse, ou mesmo, sem esperar por recompensas; firme
rejeita a quantia que Simão lhe oferece para levar o recado a Teresa, assim como,
recusa o anel que Teresa lhe dá em agradecimento por levar-lhe o recado
respondendo ao questionamento da fidalga: "- Porque não fiz algum favor a
vossa excelência. A receber alguma paga há de ser de quem me cá mandou. Fique
com Deus, minha senhora, e oxalá que seja feliz" (CASTELO BRANCO,1996.p.74).

Essa última fala de Mariana deixa bem claro que o que ela fez não foi pensando no
bem de Teresa, mas sim, no do seu amado Simão, todas as suas atitudes eram na
tentativa de deixar mais ameno o sofrimento do fidalgo. Agindo sem esperar
reciprocidade, em desprendimento e renúncia total de sua felicidade, Mariana
mostra-se paciente diante dos acontecimentos; se sacrifica tanto por amor que se
torna uma personificação do espírito de Sacrifício, uma simbologia de caráter
perfeito e assim caracteriza-se como uma personagem ultrarromântica sublime por
seus sentimentos e ações que chegam a despertar a comoção do narrador: Tão
grande era o amor de Mariana por Simão que em certos momentos, apesar de ser
forte e destemida, vacila e exibe seu lado frágil: "Mariana, [...], quando viu seu pai
pensar a chaga do braço de Simão, perdeu os sentidos. [...] e o acadêmico achou
estranha sensibilidade em mulher afeita a curar as feridas com que seu pai vinha
laureado de todas as feiras e romarias. [...]" (CASTELO BRANCO, 1996, p. 60).
Do mesmo modo, assim que fica sabendo que Simão, seu amor, fora condenado à
forca, fica abalada psicologicamente, chegando a endoidecer e quase morrer, o que
faz com que Simão, por um momento, deixe de pensar apenas em Teresa e comece
a pensar também na dor de Mariana, demonstrando preocupação por ela

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