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Qual o princípio funda- tornaram mais conhecidos. Um deles foi verdadeiro, o profundo está exatamente aí.
mental do zen-budismo? chamado de Sexto Ancestral na China, Myô disse:
Por que praticamos? A que por ser o sexto sucessor de Bodidarma – Eu estive com os monges de Mestre
leva essa prática? O que – o monge que levou os ensinamentos Ôbai por muitos anos, mas não fui capaz
é o despertar da consci- da Índia para a China, no século VI. de realizar meu verdadeiro eu. Agora,
ência? Como sair do antropocentrismo e Simultaneamente, foi a 33ª geração de recebendo sua instrução, sei, assim como
desenvolver uma consciência cosmoló- sucessores do Buda histórico, Xaquiamuni um homem bebendo água sabe se está
gica e abrangente da vida? O que é a Lei, Buda. Seu nome era Daikan Eno, e viveu fria ou quente. Meu irmão leigo, você
o Darma, o cossurgir interdependente e de 638 a 713. agora é meu mestre.
simultâneo de tudo o que é e não é? O Caso 23 do Portal sem Portas O ancestral falou:
O vazio, o assim como é, a origem (Mumonkan), uma série de contos zen – Se assim você o diz... Mas vamos
codependente – reciprocidade e reversi- compilados pelo monge Mumon Ekai nós dois chamar Ôbai de nosso mestre.
bilidade. Não há nada unidirecional. Não (1183-1260), reconta um episódio impor- Lembre-se de que o que agora obteve é
é o absoluto. Não é o relativo. Por isso é tante desse Ancestral do Darma: um tesouro incalculável. Preserve-o bem.
chamado de vazio. No vazio tudo é assim O Sexto Ancestral foi perseguido pelo Eno era órfão de pai. Tornou-se
como é. As diferenças são claramente per- monge Myô até as distantes montanhas lenhador para sustentar sua mãe.
cebidas, bem como a sua interdependên- Taiyu. Certo dia, ouviu a seguinte frase:
cia. Por isso o vazio é pleno: a distinção de O ancestral, vendo a chegada de Myô, “Sem fixar-se em parte alguma, a mente
cada aspecto é claramente realizada. colocou o manto e as tigelas sobre uma funciona”. Era uma frase do Sutra do
Quem desperta para a realidade, rocha e disse: Diamante, e quem o recitava era um dos
quem compreende o cossurgir, a – Este manto representa a fé. Não se monges discípulos do Quinto Ancestral,
interdependência, o vazio, o tal qual é, pode brigar por causa dele. Se você o conhecido como Mestre Ôbai.
pode ser chamado de ser iluminado, de quer levar, leve-o agora. Eno desperta. Deixa a mãe e vai ao
Buda, de seguidor dos ensinamentos do Myô tentou levantar o manto, mas ele mosteiro. Serve, como leigo, durante
Buda histórico, de sucessor da linhagem, era mais pesado que uma montanha e oito meses. O mestre um dia o chama a
de Buda Ancestral. É alguém que entrou não se movia. seus aposentos e o reconhece como seu
na correnteza, que compreendeu o Tremendo e gaguejando, falou: sucessor. Auxilia-o a fugir levando a tige-
princípio fundamental, que sabe por – Vim para o Darma, não pelo manto. la e o manto, símbolos do Darma. Ele é
que pratica, sabe que, embora a prática Suplico: por favor, me instrua. seguido pelo monge Myô, que havia sido
não leve a lugar nenhum, nos leva a O ancestral disse: um general. O diálogo acima ocorre.
conhecer nosso eu original – nossa – Não pense nem no bem nem no mal. A mente vazia de Myô: não pensar
consciência pura, cosmológica. Podemos Neste exato momento, qual é o eu origi- no bem nem no mal, nem em si mesmo
sair do estado alterado de consciência nal do monge Myô? nem nos outros. As palavras do Sexto
em que muitos de nós nos encontramos: Ao ouvir essas palavras, Myô foi dire- Ancestral auxiliam a ruptura: o eu ori-
ansiedades, depressões, expectativas, tamente iluminado. Seu corpo, coberto de ginal é a mente vazia. No silêncio, onde
raivas, bipolaridades. Adentramos o suor. Chorou e prostrou-se, dizendo: todos os sons habitam. No não eu, onde
estado natural da consciência, da mente, – Além das palavras secretas e do sig- todos os seres intersão.
da compreensão da natureza Buda, de nificado secreto que agora o senhor me
Nirvana, de tranquilidade e harmonia revelou, existe ainda algo mais profundo? Mãos em prece,
com o fluir da existência. O Ancestral respondeu:
Entre os inúmeros Budas Ancestrais, – O que disse a você não é nenhum
na nossa linhagem Soto Zen, alguns se segredo. Quando você enxerga seu eu Monja Coen 1
Eventos Depoimento Tentava praticar uma escrita mais afetiva, apreender uma
comunicação menos objetiva e mais sentida, mais humana.
Coração e razão alinhados, quem sabe.
Acontece A escuta do coração: sentir-se Enquanto dizemos “desculpa”, os portugueses dizem “peço
desculpas”. E isso já é uma grande diferença. De maneira ativa,
no Zendo em zazen durante uma jornada os portugueses já se apropriam do reconhecimento de sua
ação como sujeito, e nós, brasileiros, muitas vezes demoramos
para enxergar nosso papel na relação com o outro.
Entre o final de abril e o começo de junho deste ano, tive a Nesses últimos quase três anos passei por dolorosas desilu-
oportunidade de conhecer Portugal e França. Na verdade, Portugal sões. Nunca ouvira a canção Meu Mundo Caiu, da Maysa, antes
não era um país que me despertasse curiosidade imediata, pois de a própria Monja Coen me apresentar. Ela mesma cantara
sempre havia outros a visitar e mais desafiantes para treinar outros para mim: “Se meu mundo caiu, eu que aprenda a levantar”.
idiomas. Mas aqui estava. E bem à minha frente. Num momento Esses versos, cantados há mais de um ano, reconectaram-se de
em que eu realmente precisava arejar. Enxergar novas cores para sentido nessa minha viagem.
reequilibrar minha visão, coração e discernimento. Etimologicamente, a palavra ilusão provém do latim ludus,
1.
Atílio Avancini
proximidade da culinária, a da cidade cosmopolita, a lín-
compreensão da origem da gua que não domino. Porém,
arquitetura de cidades como quando menos esperava, mais
1. Combate do Darma da Monja Kokai Eckert, no Templo 3 Salvador e Ouro Preto. O aco- uma vez deparei com o terno.
Zenguenji, em Mogi das Cruzes, em 4 de julho, com a lhimento proporcionado pelas Tinha o endereço de uma
presença do Reverendo Sookan Rôshi. trocas em boas e profundas amiga de minha mãe que eu
conversas com os portugue- não conhecia. E, mesmo sem
Templo Taikozan Tenzuizenji, em 30 de junho. de seminários, conhecer a Gratidão e sincretismo na Igreja do Bom Jesus, em Braga (Portugal) um templo budista. Durante a
Universidade do Minho, apren- prática da meditação, percebi
der sobre escrita criativa. Despertava minha curiosidade inte- uma goteira e me inquietei. Custou-me o retorno a tudo o que
lectual e a vontade de retomar, com afeto e leveza, meu projeto vinha me deliciando em Portugal. Terminada a prática, um dos
engavetado de doutorado. monges sorriu e me explicou sobre a fluidez da gota que eu
Um dia, levantei bem cedo e voltei à prática de hatha yoga. Os não deixava ir embora durante meu exercício. Entre palavras,
dias se passavam e eu agradecia, todas as manhãs, cada oportuni- práticas, eu, ela, ele, nós continuamos a caminhar até a saída
dade oferecida e vivenciada. Sem perceber, meus passos estavam do templo. E aprendi a conjugar não só um novo verbo, mas
mais curtos, minha respiração voltara a ser mais longa, sentava- apreedi mais um saber para o coração.
-me para a prática do zazen, e assim recomecei. Deixei-me guiar De Paris retornei a São Paulo e, hoje, me dou conta de que
por um sentido que estava aquecido e, pela primeira vez, senti-me foi o encontro de 40 dias e 40 noites alentando um novo hori-
5. habitando o que os japoneses chamam de “espaço Mah”. zonte. Agora inspiro. Expiro. E percebo que, por mais que tenha
Mah é o espaço intervalar, o vazio. Não no sentido que no voltado no inverno, trouxe comigo botões de flores. Lá se vai a
Ocidente conhecemos, como algo negativo, de falta, a ser pre- quarentena. Afinal, conscientizo-me de um processo de cura a
enchido. Entretanto, um valor de espaço de possibilidades que, trabalhar. Cada dia, um novo passo. Em frente, à frente...
para existirem, precisam habitar o não ocupado, o esvaziado e
livre para a circulação do novo. Mãos em prece, gasshô
Esvaziava meus pulmões, esvaziava meus pensamentos e
emoções acumuladas. Sentava-me. Assentava-me, praticava Juliana Kiyomura é comunicadora, pesquisadora em
zazen. Depurava uma escuta mais humilde e ativa. Passei a sociologia da imigração e novas mídias pela USP, e
2 7. 6. observar a apropriação que fazia da língua e suas linguagens. praticante de zazen há dois anos. 3
Estudos do Darma dias de muitas alegrias e encontros de familiares. Geralmente
no dia 15 todos vão a um templo para as celebrações, que ter-
minam com a dança de alegria por saber que todos os ances-
Celebrações trais estão bem e livres de sofrimento.
Para monges e monjas, é uma época de muito trabalho,
pois todos esperam pelos religiosos para rezar em seus altares
OBON ou URABON especiais de Obon. Geralmente iniciamos as preces na casa dos
devotos por volta das 5 ou 6 da manhã e oramos até cerca das
Durante os meses de julho ou de agosto, por volta do dia 15, 7 ou 8 da noite. Em algumas casas nos oferecem almoço e em
todos os templos budistas japoneses celebram o Obon Sejiki-e. outras um pouco de chá e doces.
Nas áreas de Tóquio e Yokohama, a cerimônia ocorre em julho; A celebração no templo é chamada de Obon Sejiki-e. Um
em Okinawa, Chugoku e Shikoku (mais ao sul), em torno de 15 altar especial é montado, distante do altar de Buda, e vários ali-
de agosto. Como nosso templo atende pessoas das várias áreas mentos são nele colocados. Entoa-se o Portal do Doce Néctar
do Japão, faremos a cerimônia tanto em julho como em agosto, (Kanromon), e a pessoa que oficia a celebração invoca todos
nos domingos próximos a essas datas. os espíritos a vir e ter condições de receber as ofertas, ficando
A cerimônia de Obon é para honrar os espíritos dos ancestrais. completamente satisfeitos.
A origem do nome vem de Ullambana – Urabon – Obon, que sig- Assim, todos se libertam de dores e sofrimentos e podem
nifica literalmente “pendurado de cabeça para baixo”. Os textos voltar tranquilos para o mundo dos espíritos.
budistas antigos relatam que Maha Maudgalyana, chamado no Neste ano, a cerimônia será celebrada no domingo 12 de
Japão de Mokuren Sonja, era um dos principais discípulos de Buda. julho, às 13 horas. Haverá outra celebração em agosto (confira
Mokuren Sonja possuía poderes sobrenaturais e, quando sua na programação, na última página).
mãe faleceu, viu que ela entrara em um mundo de sofrimentos
(de cabeça para baixo). Consultou Buda, que o orientou assim:
depois de três meses de treinamento intensivo, monges e mon- O-HIGAN – EQUINÓCIO DE PRIMAVERA E DE OUTONO
jas, leigos e leigas fariam uma grande celebração. Formariam
um altar especial, com uma grande variedade de alimentos, Na semana do equinócio, as pessoas preparam seus altares
e ele, Buda, faria uma prece especial, para chamar e abrir as familiares e os templos se organizam para receber muita gente.
gargantas dos espíritos famintos e dos que sofriam, para que É momento de orar pelos falecidos e também de pedir sabedoria
recebessem as ofertas e ficassem satisfeitos. aos vivos. Nos templos, a celebração se parece com a de Obon,
Assim foi feito, e Mokuren Sonja, vendo que sua mãe esta- pois o altar é semelhante e as preces são as mesmas do Sejiki-e.
va livre do sofrimento, começou a dançar de alegria. Essa é a A palavra O-higan significa atravessar para a outra margem,
origem do obon odori (dança de obon, geralmente realizada ao ou seja, sair do sofrimento causado pela ignorância e alcançar
final das celebrações). a tranquilidade da sabedoria perfeita. Os Seis Paramitas (ou
É, até hoje, no Japão, uma ocasião especial, em que familia- Haramitas) são a base dessa travessia: doação ou generosida-
res se reúnem. Na noite que antecede o dia 13 de julho, fazem de, preceitos ou vida ética, perseverança ou prática incessante,
um pequeno fogo com folhas secas de cânhamo, cedro ou paciência ou resiliência, meditação ou concentração correta,
pinheiro, na porta de casa, para chamar os espíritos ancestrais. sabedoria ou compreensão correta.
Durante três dias, um altar especial é colocado na sala princi- Quem pratica as Seis Perfeições ou os Seis Paramitas facil-
pal, com os tabletes memoriais e várias ofertas. Na noite do dia mente atravessa o oceano de sofrimento, nascimento, velhice e
15, ou na manhã do dia 16, novamente fazem um foguinho à morte para chegar à margem de Nirvana. A celebração é reali-
porta de casa para que os espíritos possam ir embora. São três zada nos equinócios, pois é quando o dia e a noite têm a mesma
duração e os opostos se equivalem, facilitando a travessia.
Essa cerimônia será realizada em nosso templo no mês de
setembro, no domingo próximo ao equinócio (veja na progra-
mação, na última página).
RYOSO-KI
Participe você também! 5/4 Lilian Maria Nakhle – Jishin (bondade, Programa de Rádio
Mande fotos, sugira pautas, envie sua amor – coração, mente) Momento Zen: segunda, às 19h30,
dúvida sobre o Zen, escreva um artigo. 12/7 Thiago Fonseca Veras, de Fortaleza-CE. na Rádio Mundial (FM 95.7, AM 660,
8 Contato: zendobrasil@gmail.com Shin (verdade), Zan (montanha) www.radiomundial.com.br).