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DESCRIÇÃO

Introdução ao jornalismo de dados, com apresentação da evolução das tecnologias e do


armazenamento de dados, bem como as novas competências do jornalista e a estruturação do trabalho
específica para esse cenário.

PROPÓSITO
Conhecer o jornalismo de dados, não apenas em sua definição e contextualização histórica, mas com a
compreensão básica dos processos e rotinas de trabalho, permite que o interessado em processos
jornalísticos e na produção de notícia de maneira geral entre em um novo universo de análise da
realidade e descubra pautas de alto valor-notícia.

OBJETIVOS

MÓDULO 1

Reconhecer o jornalismo de dados

MÓDULO 2

Identificar a relevância da organização e do cruzamento de dados no jornalismo

INTRODUÇÃO
Como um marco que faz jus ao título de histórico para além de uma mera adjetivação vazia, o caso
Wikileaks é visto hoje como um divisor de águas no mundo do jornalismo de dados. Não apenas por
conta do impacto gerado na comunidade política, econômica e social internacional, mas também devido
ao volume gigantesco de informações que puderam ser extraídas a partir daquele vazamento de dados.
Não foram apenas números que vazaram, mas nomes e informações em uma planilha digital que
reverberaram a ponto de governos inteiros ou nações com estabilidade democrática se virem às voltas
com revelações bombásticas sobre assuntos como política e diplomacia.

A partir do conhecimento desse caso e do conceito de jornalismo de precisão, você conhecerá nesse
espaço de aprendizado e reflexão dois pilares do jornalismo de dados. A saber:

Uma apresentação do uso dos dados no trabalho jornalístico (por meio de uma discussão tecnológica,
pensando na relevância do armazenamento e do cruzamento de dados para o jornalismo).


Uma discussão sobre a produção de notícia a partir de bancos de dados (no sentido organizativo e de
criação de novas competências e editorias do campo jornalístico).

No contexto de avanços tecnológicos constantes (de forma localizada não só no polo da produção, mas
também da recepção), o volume de dados criados e disponíveis no espaço on-line torna-se monumental.
Dessa forma, pensando em uma introdução ao jornalismo de dados, é preciso compreender como esses
dados acompanham a evolução das tecnologias, os processos de armazenamento, os critérios
organizativos para a criação de planilhas digitais editáveis e, finalmente, porque o cruzamento de dados
é essencial para o jornalismo hoje.

MÓDULO 1

 Reconhecer o jornalismo de dados

MARCO HISTÓRICO DO JORNALISMO DE


DADOS: O CASO WIKILEAKS
Quem não se lembra do caso Wikileaks? Esse nome e o de Julian Assange estamparam as páginas dos
jornais impressos e digitais e ocuparam horas e horas dos noticiários de rádio e TV. Naquele momento,
jornalistas do mundo todo tiveram acesso a informações sensíveis e a um imenso volume de dados. Foi
necessário estruturá-los para que de meros dados se tornassem informação. E essa é a alma do
jornalismo de dados.

Os pesquisadores Christofoletti e Oliveira (2011) sintetizaram com primazia o eixo central do que foi o
Wikileaks:

EM 28 DE NOVEMBRO DE 2010, TORNARAM-SE


CONHECIDOS 251.287 COMUNICADOS INTERNOS DO
DEPARTAMENTO DE ESTADO DOS ESTADOS UNIDOS,
ESCRITOS PARA 280 EMBAIXADAS E CONSULADOS DE 180
PAÍSES. ESSE DILÚVIO INFORMACIONAL CHEGOU À TONA
PELO SITE WIKILEAKS COM O RESPALDO MIDIÁTICO DE
CINCO DOS MAIORES VEÍCULOS CONVENCIONAIS DE
INFORMAÇÃO DO MUNDO: OS JORNAIS THE GUARDIAN
(DA INGLATERRA), THE NEW YORK TIMES (DOS ESTADOS
UNIDOS), LE MONDE (DA FRANÇA) E EL PAÍS (DA
ESPANHA), ALÉM DA REVISTA SEMANAL ALEMÃ DER
SPIEGEL. A PUBLICIZAÇÃO DESSES DOCUMENTOS AINDA
PROVOCA REPERCUSSÕES NO QUASE SEMPRE BEM-
EDUCADO MUNDO DA DIPLOMACIA INTERNACIONAL

(CHRISTOFOLETTI, OLIVEIRA, 2011, p. 231-232).

Na base de tudo isso, e como figura de destaque no epicentro do terremoto informativo que abalou o
mundo, estava Julian Assange. Considerado como uma mistura de hacker e jornalista (às vezes
assinalado como hacker-journalist), em 2006 o ativista Julian Assange fundou a Wikileaks como uma
plataforma on-line sustentada pela disseminação da filosofia hacker de que “a informação quer ser livre”,
como rememora Moura (2018, p. 28).

Tal organização, apresentada como sem fins lucrativos, conseguiu tornar públicos centenas de milhares
de documentos referentes à atuação dos EUA na política externa, em casos como a guerra do
Afeganistão e do Iraque, por exemplo. Desse modo, temas sensíveis e de extrema importância, que
estariam até hoje em completo sigilo, foram desnudados ao público por meio dos dados dessa
plataforma e das narrativas jornalísticas que os formataram enquanto notícias e grandes reportagens
especiais ao redor do planeta.

Os vazamentos foram distribuídos em momentos, por meio de um sistema de criptografia encarregado


de preservar a identidade de quem submetia a informação. Assange se tornou uma figura odiada com a
mais alta intensidade pelo governo norte-americano, mas também foi fundamental para compreender o
posicionamento do jornalismo de dados como nova narrativa a permear as rotinas de trabalho nas
redações, inclusive, de portais de on-line.

MAIS DO QUE O VOLUME HOMÉRICO DE DADOS


DISPONÍVEIS NA PLATAFORMA, O CASO DO WIKILEAKS É
CONSIDERADO UM MARCO HISTÓRICO PORQUE
CONSEGUIU TRAZER AO CENTRO DO DEBATE
ACADÊMICO E PROFISSIONAL QUESTÕES COMO A
PREPARAÇÃO DA COMUNIDADE PARA TRABALHAR COM
DADOS QUE REUNIAM CARACTERÍSTICAS FORA DO
HABITUAL, OU SEJA, DADOS SENSÍVEIS REUNIDOS EM
GRANDES MONTANTES DE FONTES PROFUNDAMENTE
SIGILOSAS.
Adiante é possível ver, na busca de traduzir em imagem, a grandeza e a abrangência das inúmeras
fontes globais que alimentaram a plataforma Wikileaks (tais fontes são chamadas também de cables ou
diplomatic cables, isso é, algo como “telegrama diplomático” em uma tradução mais próxima à língua
portuguesa):

 Infográfico que ilustra a origem das informações vazadas no caso Wikileaks.

JORNALISMO DE PRECISÃO E AS IDEIAS


PRECURSORAS DE PHILIP MEYER
Jornalismo de precisão (precision journalism) é um termo que vincula a aplicação de métodos de
pesquisa de ciências sociais (incluindo métodos de pesquisa de levantamento) à prática de coleta de
informações para fins noticiosos.

SEMELHANTE A UM CIENTISTA SOCIAL, UM JORNALISTA


DE PRECISÃO DIVULGA A METODOLOGIA DE COLETA DE
DADOS BEM O SUFICIENTE PARA QUE OUTRO
JORNALISTA OU PESQUISADOR DE PRECISÃO POSSA
REPLICAR OS ESTUDOS DE PESQUISA E,
APARENTEMENTE, CHEGAR ÀS MESMAS CONCLUSÕES.

O termo foi cunhado pelo pesquisador Everette E. Dennis, no inverno de 1971, como parte de um
seminário da Universidade de Oregon. Mas foi por meio do pioneirismo de Philip Meyer, um prestigiado
jornalista e professor emérito na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill (Estados Unidos),
que a expressão ganhou o mundo.

Em seu livro Precision Journalism: A Reporter's Introduction to Social Science Methods (Em tradução
livre, Jornalismo de Precisão: uma introdução de um repórter aos métodos sociais), publicado pela
primeira vez em 1973, Meyer defende a aproximação entre jornalismo e técnicas de pesquisa
quantitativa das ciências sociais.

Nas palavras de Rodrigo Menegat, que entrevistou Meyer, “o livro é, em sua maior parte, um manual
para jornalistas — tradicionalmente avessos a disciplinas como matemática e estatística — trabalharem
com números” (MENEGAT, 2016, p. 168).

Portanto, fazendo uma conexão entre o pensamento pioneiro de Meyer e o jornalismo de dados
contemporâneo, podemos nos voltar ao exemplo do Wikileaks, em que a precisão era fundamental para
manter a legitimidade, a confiabilidade e a credibilidade dos dados vazados que seriam transformados
em matéria noticiosa.

[O WIKILEAKS] PERMITIU QUE O JORNALISMO COMO UM


TODO REPENSASSE AS FORMAS DE OBTENÇÃO DE
INFORMAÇÃO E AS MANEIRAS DE CONTAR AS HISTÓRIAS.
PARA BAACK (2011), A QUANTIDADE DE DADOS VAZADOS
EVIDENCIOU, PARA A COMUNIDADE JORNALÍSTICA, A
UTILIDADE DAS TÉCNICAS DE JORNALISMO DE DADOS NA
ANÁLISE DA INFORMAÇÃO E NA CRIAÇÃO DE
VISUALIZAÇÕES PARA A APRESENTAÇÃO DO TRABALHO.
(MOURA, 2018, p. 29)

EVOLUÇÃO DAS TECNOLOGIAS E O


ARMAZENAMENTO DE DADOS
Mais do que apenas trazer ao cotidiano o uso de múltiplas telas ou possibilitar que o receptor saísse de
uma zona passiva para transformar-se em prosumer, o avanço tecnológico tem fornecido ao universo
digital uma possibilidade única de armazenamento de dados como nunca observado em tempos
contemporâneos.

PROSUMER

Producer + consumer, ou seja, produtor e consumidor, em inglês. A figura do consumidor de mídia, que
também a produz, tem gerado inúmeras discussões e novas percepções em diferentes campos do
saber.

 EXEMPLO

Você pode até não se lembrar, mas sempre houve uma limitação muito restrita aos bens de consumo
para que o receptor tivesse à mão uma quantia finita muito específica de dados. No campo da música,
por exemplo, ao ter acesso a um disco de vinil, uma fita cassete, um CD, um DVD ou mesmo um
aparelho do tipo iPod (mp3), ainda assim sabíamos quantas músicas poderiam “caber dentro” desses
suportes/dispositivos.
E, ainda que saibamos que as possiblidades de armazenamento e compactação de conteúdo tenham se
transformado do vinil ao mp3, é no arquivamento de dados em nuvem que encontramos possibilidades
quase infinitas de armazenamento de sons, textos, imagens, vídeos etc.

Ao localizar a discussão no campo do jornalismo, as coisas não são diferentes: o armazenamento de


dados só é possível pelo avanço cotidiano e célere das formas tecnológicas que atravessam o fazer
noticioso. Como recorda Barbosa (2005, p. 1317-1318): “A evolução tecnológica e a convergência entre
informática, telecomunicações e meios de comunicação gerou o produto ou sintoma da mudança
tecnológica mais radical — a internet — que permitiu a emergência de uma nova modalidade de
jornalismo.” Tal modalidade, como veremos ao longo dessa discussão, atende pelo nome de jornalismo
de dados. Em outras palavras:

O JORNALISMO DE DADOS É PRODUTO DA EVOLUÇÃO DO


JORNALISMO A PAR DA EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E
SOCIAL. NASCIDO DA INFLUÊNCIA DE VÁRIAS
CORRENTES DENTRO DO JORNALISMO TAIS COMO O
COMPUTER ASSISTED REPORTING [REPORTAGEM
ASSISTIDA POR COMPUTADOR], O JORNALISMO DE
PRECISÃO E O JORNALISMO DE INVESTIGAÇÃO SÃO
CADA VEZ MAIS OS EXEMPLOS DESSE TIPO DE
JORNALISMO.

(MARTINHO, 2014, p.72).

Um ponto muito importante nesse cenário é justamente como os dados (para além de estarem se
multiplicando nos dias correntes) também têm trazido a possibilidade cada vez mais crescente de uma
organização e sistematização vinculada ao uso jornalístico das informações virtuais.

Dessa forma, como a internet está em toda parte e diante da imensa produção de dados estimulada
pelas tecnologias da informação, surge o big data, as bases de dados que podem ser explicadas como
modelo de sistematização de coleta e armazenamento de informação.

Em computadores, um meio de armazenamento é qualquer tecnologia — incluindo dispositivos e


materiais — usada para colocar, manter e recuperar dados eletrônicos. Refere-se também a um
dispositivo físico ou componente em um sistema de computação que recebe e retém informações
relacionadas a aplicativos e usuários.

O ARMAZENAMENTO DE DADOS SIGNIFICA


ESSENCIALMENTE QUE OS ARQUIVOS E DOCUMENTOS
SÃO GRAVADOS DIGITALMENTE E SALVOS EM UM
SISTEMA DE ARMAZENAMENTO PARA USO FUTURO.
LOGO, O ARMAZENAMENTO DE DADOS PODE OCORRER
EM DISCOS RÍGIDOS FÍSICOS, DRIVES DE DISCO, DRIVES
USB OU VIRTUALMENTE NA NUVEM (COMO NO ICLOUD,
ONEDRIVE, GOOGLE DRIVE, DROPBOX ETC.).

Assim, percebemos que o jornalismo de dados caminha lada a lado com a evolução tecnológica:
“seja do ponto de vista da gestão das informações, seja do ponto de vista do armazenamento e
recuperação dos dados e, sobretudo, como um suporte para novos modelos de estruturação de
narrativas”, como afirma Machado (2004, p. 303).

PLANILHAS DIGITAIS
As planilhas de dados em papéis ou outros formatos físicos (pré-Excel ou outras formas de edição de
planilhas digitais) já são usadas há muito tempo no campo jornalístico, de acordo com o jornalista e
pesquisador da Birmingham City University (Reino Unido) Paul Bradshaw.

Segundo ele, há vinte anos trabalha-se com planilha de dados, e essa era praticamente a única forma
de obter valor no cruzamento de dados. Porém, “nós vivemos em um mundo digital agora, um mundo no
qual quase tudo pode ser — e quase tudo é — descrito em números” (GRAY, BOUNEGRU,
CHAMBERS, 2012 apud LIMA JUNIOR, 2012, p. 212).

Ao adentrarmos o campo do JBD (jornalismo de banco de dados ou jornalismo de dados), as planilhas


digitais ganham mais força posto que potencializam ou redimensionam o processo produtivo e rotinas
de trabalho jornalístico justamente porque elas são editáveis, interconectáveis e, acima de tudo,
rápidas de ser atualizadas e compartilhadas entre si e para outros meios a partir de inúmeras formas de
armazenamento e compactação digital.

 DICA
Como recorda Araújo (2016), trazendo de volta Paul Bradshaw ao centro do debate, é recomendado que
“[…] o jornalista tenha conhecimento especializado para realizar certas tarefas. […] Ele [Bradshaw]
sugere noções de estatística para compreensão de planilhas, material básico nesse novo setor do
jornalismo baseado em números e outras informações compiladas em forma não textual” (ARAÚJO,
2016, p. 156).

A partir do domínio das planilhas Excel, ficou clara a importância do software de gerenciamento de
planilhas na resolução de tarefas intrínsecas ao jornalismo de dados.

 EXEMPLO

Podemos indicar outro grande marco nesse tipo de jornalismo a partir da primavera de 2010,
começando com nada mais nada menos que uma planilha: 92.201 linhas de dados, cada uma contendo
detalhes de uma ação militar no Afeganistão: os war logs (registros de guerra) liberados pelo WikiLeaks.
As planilhas digitais foram essenciais ao processo de organização dos dados vazados à imprensa e que
tomaram conta dos noticiários do mundo todo, como lembram Jonathan Gray, Liliana Bounegru e Lucy
Chambers (2012).

Por fim, a estruturação das planilhas deve seguir a direção oferecida pela pirâmide invertida do
jornalismo de dados, como mostra a imagem. Nela, é possível perceber que o passo a passo deve
cumprir a seguinte ordem de ação.

 A pirâmide invertida do jornalismo de dados.


FLUXO DE TRABALHO
Quer saber mais sobre a pirâmide invertida do jornalismo de dados? Clique e assista!

Não é demais recapitular que a finalidade de todo o processo é comunicar. Assim explica Isabella Moura
(2018, p. 23), é que, no ato de comunicação, “socializar os dados no jornalismo pode significar a
transferência de autonomia para o público, ao fornecer os dados e permitir que parta deles a indicação
dos pontos de interesse”.

É necessário observar que na última etapa, a da comunicação, os dados ainda podem ser subdivididos
em seis níveis partindo da base. São eles:

UTILIZAÇÃO

PERSONALIZAÇÃO

HUMANIZAÇÃO

SOCIALIZAÇÃO

NARRAÇÃO
VISUALIZAÇÃO DOS DADOS

A CONSTRUÇÃO DE UMA PLANILHA DIGITAL NO


JORNALISMO DE DADOS É MAIS DO QUE UMA SIMPLES
FERRAMENTA OU REPOSITÓRIO ORDINÁRIO: ELA É PARTE
VITAL DE TODO O PROCESSO.

CONCEITO DE JORNALISMO DE DADOS


Se por um lado é relevante observar como a evolução tecnológica tem fornecido meios para que o
armazenamento e o cruzamento de dados potencializem a estrutura e a sistematização da informação
no campo jornalístico, por outro, também é preciso atentar para como o jornalismo de dados tem sua
conceituação situada justamente nas fronteiras de outras formas e práticas do fazer noticioso. Em outras
palavras, uma revisita ao campo histórico — dos primórdios do jornalismo de precisão trazido por Meyer
nos anos 1970 até a “explosão” provocada pelos vazamentos de dados do Wikileaks à imprensa na
primeira década dos anos 2000 — é fundamental para entendermos não só o presente do jornalismo de
dados, como, de forma especulativa, imaginarmos qual será o seu futuro.

Como Martinho (2014) assinala de antemão, interessa-nos procurar não apenas uma definição
consensual, única e exclusiva do que se trata o jornalismo de dados, mas entender que esse campo é
formatado por pilares estruturais que, paradoxalmente, são sólidos, mas passam por transformações
constantes e muito ágeis.

Assim, como primeiro movimento em busca de definição conceitual, vale observar que:

[…] HÁ, DE FATO, ABORDAGENS NOVAS AO JORNALISMO


QUE TÊM POR BASE MUDANÇAS COMO: O AUMENTO DA
QUANTIDADE DE DADOS EXISTENTES EM FORMATO
DIGITAL; O AUMENTO DA QUANTIDADE DE DADOS
DISPONÍVEIS, COMO CONSEQUÊNCIA DAS POLÍTICAS DE
ABERTURA DE DADOS, TANTO A NÍVEL PÚBLICO COMO
PRIVADO; OS AVANÇOS TECNOLÓGICOS QUE PERMITEM A
DEMOCRATIZAÇÃO DE FORMAS MAIS FÁCEIS E RÁPIDAS
DE TRATAMENTO E VISUALIZAÇÃO DE DADOS; [E
FINALMENTE] O AUMENTO DA LITERACIA DIGITAL DA
POPULAÇÃO.

(MARTINHO, 2014, p.72).

Por sua vez, Mancini e Vasconcellos (2016), ao tratar do tema, falam que a conceituação do campo
jornalístico baseado em dados deve procurar voltar seu foco para perceber as linhas tênues que
aproximam o jornalismo investigativo do jornalismo de dados. Segundo os autores, pesquisadores e
jornalistas que utilizam o JD adotam uma visão que associa a capacidade investigativa às novas
possibilidades da tecnologia.

BASICAMENTE, AS TÉCNICAS CONSISTIRIAM NA


PRODUÇÃO, TRATAMENTO E CRUZAMENTO DE GRANDE
QUANTIDADE DE DADOS, PERMITINDO UMA MAIOR
EFICIÊNCIA NA RECUPERAÇÃO DA INFORMAÇÃO, NA
APURAÇÃO DA REPORTAGEM A PARTIR DO CONJUNTO DE
DADOS, NA CIRCULAÇÃO EM DIFERENTES PLATAFORMAS
E NA GERAÇÃO DE VISUALIZAÇÕES E INFOGRAFIAS.

(TRÄSEL, 2013 apud MANCINI; VASCONCELLOS, 2016, p. 71).

A tabela a seguir, produzida por Moura (2018), busca dar corpo à visualização oferecida pelas reflexões
sobre como a conceituação de jornalismo de dados perpassa outras áreas que não necessariamente
surgiram agora, mas que vêm sendo trabalhadas ao longo do tempo nas rotinas produtivas jornalísticas:
JORNALISMO DE BASE DE DADOS =
JP + JI + JP+ RAC + JA + VOLUME DE DADOS +
VISUALIZAÇÕES + PROGRAMADOR

Jornalismo de profundidade Pode verificar-se consoante o tema.

Utilizam-se técnicas que são próprias do jornalismo


Jornalismo investigativo
investigativo.

Em alguns casos, os métodos de investigação propostos por


Jornalismo de precisão
Philip Meyer são utilizados.

Reportagem Assistida por


Quase sempre segue os procedimentos associados a RAC.
Computador

Jornalismo analítico Há apropriação de métodos analíticos na análise dos dados.

 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal

 Tabela: Áreas fronteiriças que rodeiam a conceituação do jornalismo de dados.


Extraído de MOURA, 2018, p.17, adaptado por Pedro Tamburro.

Avançando na direção de construir mais fronteiras (na lógica de aglutinação e não de exclusão), Moura
(2018) procura demonstrar que o jornalismo de dados vai além do jornalismo investigativo. Para a
autora, o jornalismo de base de dados (ou simplesmente jornalismo de dados em sua forma mais
encurtada) é resultado direto das áreas fronteiriças que se tocam, se misturam e acabam por trazer
novas produções de sentido na esfera da adjunção (ou seja, não necessariamente jornalismo em
profundidade é o mesmo que jornalismo de dados, mas suas bases são semelhantes, se afetam,
caminham de modo adjunto).
 RESUMINDO

Uma definição possível (mas, novamente, não exclusiva) é que o jornalismo de dados pode ser lido
como um termo que abrange um conjunto cada vez maior de ferramentas, técnicas e abordagens para
contar histórias. Ele pode incluir tudo, desde reportagens assistidas por computador (RAC), usando
dados como fonte, até a visualização de dados mais avançada e aplicativos de notícias. O objetivo
unificador é jornalístico: fornecer informações e análises para ajudar a nos informar sobre
questões importantes do dia.

O JORNALISMO DE DADOS, NA VISÃO DOS AUTORES AQUI


TRABALHADOS, É UM NOVO CONJUNTO DE HABILIDADES
PARA PESQUISAR, COMPREENDER E VISUALIZAR FONTES
DIGITAIS EM UMA ÉPOCA NA QUAL AS HABILIDADES
BÁSICAS DO JORNALISMO TRADICIONAL NÃO SÃO
SUFICIENTES. NÃO É UMA SUBSTITUIÇÃO DO
JORNALISMO TRADICIONAL, MAS UM ACRÉSCIMO A ELE.

JORNALISMO DE DADOS
Os jornalistas Marcelo Soares e Catharina Epprecht conversam sobre o jornalismo de dados. Clique
para assistir!

VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 2

 Identificar a relevância da organização e do cruzamento de dados no jornalismo

RELEVÂNCIA DO CRUZAMENTO DE DADOS


PARA O JORNALISMO
A importância dos dados para o jornalismo (especialmente a partir da transformação de um dado isolado
em informação contextualizada) se dá, majoritariamente, pelo cruzamento desses dados. Ao pensarmos
a etapa do cruzamento (que pode ser entendido também como combinação de dados), seguindo a
pirâmide invertida do jornalismo de dados, vemos que a relação de quantidade (ou volume de dados)
está diretamente ligada às dificuldades, facilidades, potencializações e limitações de tais cruzamentos
que impactam o último filtro da cadeia de produção jornalística, ou seja, a publicação do material final.

A partir de grandes volumes de dados, padrões específicos servem de contextualização. Outra


possibilidade é o cruzamento de informações de diferentes bases de dados, dando origem aos artigos
alicerçados em dados. Tais produções revelam que o cruzamento de dados no jornalismo não vê a fonte
primária (dados) meramente como um ponto de partida, ao contrário, o jornalismo de dados também
visualiza tal tipo de fonte como ponto de chegada, como materialidade informativa em potência.

Faz-se necessário relembrar que, mesmo em um espaço de constante evolução tecnológica, o


jornalismo de dados deve compreender o uso de planilhas digitais, por exemplo, como mais uma forma
do fazer noticioso. Quer dizer, mais do que a presença da tecnologia à mão do jornalista, é o uso que se
faz dela que pode determinar como o cruzamento de dados será útil, singular e precioso para a
construção de uma reportagem:

DE CERTO MODO, A TECNOLOGIA INCENTIVA E PODE


CRIAR CONDIÇÕES PARA NOVAS PRÁTICAS NO
PROCESSO DE APURAÇÃO JORNALÍSTICA. O TELEFONE
PERMITE QUE SEJA FEITA UMA ENTREVISTA A
QUILÔMETROS DE DISTÂNCIA, ALTERANDO O CONTATO
PRESENCIAL ESTABELECIDO ENTRE UM JORNALISTA E
UM ENTREVISTADO POR UM NÃO PRESENCIAL. CONTUDO,
E ESSE É O NOSSO PONTO, O TELEFONE NÃO MODIFICA O
LUGAR DO JORNALISTA COMO PROFISSIONAL QUE
PRECISA DESENVOLVER ALGUMA COMPETÊNCIA PARA
REALIZAR ENTREVISTAS. PARA ALÉM DO OBJETO FÍSICO
QUE SIMULA UMA RELAÇÃO PRESENCIAL DA
ENTREVISTA, EXISTE UM JORNALISTA DOTADO DE
HABILIDADES E DO INTERESSE EM EXTRAIR
INFORMAÇÕES POR MEIO DO MÉTODO DE ENTREVISTA. O
PONTO AQUI NÃO É O OBJETO TÉCNICO EM SI, MAS COMO
ESSE OBJETO PODE SER EXPLORADO.

(MANCINI; VASCONCELLOS, 2016, p. 72).

 ATENÇÃO

A capacidade de extrair grandes quantidades de informações e sistematizá-las não é (ainda)


jornalismo de dados. Ou seja, obter os conjuntos de dados ou acessar informações que pareciam
confidenciais não é um propósito jornalístico em si. O objetivo final do jornalismo é o interesse
público. Encontrar associações que não foram vistas nas abundantes quantidades de
informações disponíveis na web e divulgá-las faz parte da prestação de contas.

Os poderes de um Estado, obrigados a dar transparência às suas atividades, permitem que os


jornalistas mantenham e atualizem sua função original de vigilantes e, nesse sentido, o
cruzamento de dados pode ser visto como algo que instiga o jornalista a procurar conexões que
não estão na superfície.

Dessa forma, podemos pensar que o cruzamento de dados é elemento essencial para um
jornalismo de dados que se pressupõe ser inovador.

A PARTIR DAS POSSIBILIDADES COMBINATÓRIAS E DO


CRUZAMENTO ENTRE AS INFORMAÇÕES INSERIDAS
NUMA BD (BASE DE DADOS), A CLASSIFICAÇÃO EXTERNA
PODERÁ SER FEITA PELOS CONTEXTOS TEMPORAL,
GEOGRÁFICO, HISTÓRICO, CULTURAL, ECONÔMICO,
RELIGIOSO, ENTRE OUTROS, AMPLIANDO ASSIM O
ESPECTRO EM RELAÇÃO ÀS TEMATIZAÇÕES
CONVENCIONAIS.

(BARBOSA, 2005, p. 1316).

Ao compreendermos que o jornalismo de dados tem sua conceituação por limiares que tocam
em outros pontos da produção noticiosa (como o jornalismo de precisão), torna-se necessário
discutir de que forma os bancos de dados podem ser úteis ao debate sobre três pontos
interconectados:

A relevância dos dados na organização do jornalismo.


2

A construção de novas competências do jornalista de dados.

A criação de novas editorias que começam a surgir a partir desse contexto.

ORGANIZAÇÃO DO JORNALISMO DE DADOS


Tanto dados quanto jornalismo são termos muito amplos, complexos e, a depender do ponto de
vista, com significados que passam por mudanças de sentido reiteradas. Algumas pessoas
pensam em dados como qualquer coleção de números, provavelmente reunidos em uma
planilha. Se pararmos para pensar, há cinquenta anos, esse era praticamente o único tipo de
dado com o qual os jornalistas lidavam. Mas agora vivemos num mundo digital em que números
imperam.

Se olharmos de modo pragmático, o histórico de sua carreira no LinkedIn, a quantia hipotética de


300 mil documentos confidenciais que está armazenada nas nuvens de uma multinacional, ou
mesmo seus e-mails pessoais, todas essas informações são descritas com apenas dois
números: zeros e uns. Logo, tal configuração binária consegue dar forma para dados que, sem
contexto ou cruzamento, são apenas pontos isolados no mundo informacional.
VAMOS REFLETIR: O QUE TORNA O JORNALISMO
DE DADOS DIFERENTE DAS DEMAIS FORMAS DE
JORNALISMO?

RESPOSTA

Em grande parte, são as novas possibilidades que se abrem quando você combina o tradicional “ter
faro para notícias”, e a capacidade de contar uma história convincente, com a escala e a variedade de
informações digitais agora disponíveis por meio dos bancos de dados.

Como afirmam Manovich (2001) e Barbosa (2004), é preciso pensar os bancos de dados como
uma nova metáfora sintetizadora das formas culturais que perpassam a construção da notícia e,
de modo integrado, o próprio cotidiano de milhares de pessoas que lidam consciente ou
inconscientemente com um volume de dados quase incomensurável. Assim:

[…] O BANCO DE DADOS PODE ARMAZENAR


INDIVIDUALMENTE OU A PARTIR DE DIVERSAS
COMBINAÇÕES QUALQUER TIPO DE DADO OU OBJETO
DIGITAL, DESDE DOCUMENTOS TEXTUAIS A
FOTOGRAFIAS, CLIPS, SEQUÊNCIAS DE ÁUDIO, IMAGENS
ESTÁTICAS, EM MOVIMENTO, OU, AINDA, ANIMAÇÕES,
MAPAS, GRÁFICOS, ENTRE OUTROS, QUE PODEM SER
NAVEGADOS/ACESSADOS DE MODOS VARIADOS. [O]
BANCO DE DADOS SE TORNA O CENTRO DO PROCESSO
CRIATIVO DO DESIGN DA NOVA MÍDIA, GERANDO UM TIPO
DE NARRATIVA QUE É CONSTRUÍDA PELA LIGAÇÃO DE
ELEMENTOS DO BANCO DE DADOS EM UMA ORDEM
PARTICULAR.

(BARBOSA, 2004, p. 462)

O jornalismo de dados pode ajudar um jornalista a contar uma história complexa por meio de
infográficos envolventes ou pode ajudar a explicar como uma história se relaciona a um
indivíduo.

 DICA

Os dados podem ser a fonte do jornalismo de dados, ou podem ser a ferramenta com a qual a
história é contada — ou podem ser ambos. Como qualquer fonte, deve ser tratada com ceticismo;
e, como qualquer ferramenta, devemos estar cientes de como ela pode moldar e restringir as
histórias. Por isso, bancos de dados devem ser inteligentes e dinâmicos.

Antes de tudo, um banco de dados é uma coleção organizada de dados geralmente armazenados
e acessados eletronicamente a partir de um sistema de computador. Bancos de dados mais
complexos costumam ser desenvolvidos a partir de técnicas de modelagem e design formal.
 ATENÇÃO

Machado (2004) ressalta que é preciso cuidado ao lidar com os bancos de dados no campo
jornalístico para não correlacionarmos automaticamente a ideia de que dados são o mesmo que
narrativa, ou seja, que apenas os dados na sua natureza bruta já falariam por si só. É preciso dar
ordem aos dados, organizá-los e, a partir daí, criar uma narrativa jornalística para que eles se
transformem em informações dotadas de contexto, relevância, credibilidade, legitimidade etc.

Como ressalta Barbosa (2004), não podemos entender os bancos de dados a partir de uma visão
meramente tecnicista. Pelo contrário, os bancos de dados são parte preponderante na
organização das ideias que serão formatadas na narrativa jornalística. Posto de outro modo, a
compreensão do “potencial do banco de dados na era do computador vai além daquela noção
mais básica de coleção de itens para rápida recuperação e que até então norteou os
procedimentos de armazenamento e ordenamento de informações para adquirir o status de nova
forma cultural simbólica, um novo modo de estruturar a experiência humana” (BARBOSA, 2004,
p. 462).

Assim, como uma maneira de mostrar que o banco de dados é algo basilar tanto no jornalismo
de precisão quanto no jornalismo de dados, o caso do Wikileaks evidenciou ao mundo uma nova
concepção do jornalismo que começou a ser chamada de data-driven journalism –jornalismo
direcionado ou dirigido por meio de dados (BAACK, 2011).

Logo, para além de um acessório secundário que confirma informações ou mesmo quase que
como uma peça adornável que faz parte de um infográfico, os bancos de dados entram em cena
como mobilizadores do relato jornalístico em sua expressão máxima.
NOVAS COMPETÊNCIAS DO JORNALISTA
Como é possível perceber, o jornalismo (seja ele lido enquanto campo profissional ou como
esfera de discussão acadêmica) vem passando por mudanças significativas a partir do universo
digital e, no caso específico do jornalismo de dados, pelo trabalho de coleta e mineração de
dados armazenados e passíveis de cruzamento nos bancos de dados atuais. Porém, mais do que
o próprio jornalismo em si, o profissional que atua nessa área também é afetado pelas
transformações e avanços tecnológicos que envolvem o fazer noticioso. Desse modo:

NA ATUAL CONFIGURAÇÃO TECNOLÓGICA


PROPORCIONADA PELA INTERNET, ESTRUTURADA PELO
INTERMÉDIO DO AUMENTO DE VELOCIDADE DE
TRANSMISSÃO, PELA EVOLUÇÃO DAS MÁQUINAS
COMPUTACIONAIS COM GRANDE CAPACIDADE DE
PROCESSAMENTO E ARMAZENAMENTO DE DADOS, COM
O DESENVOLVIMENTO DE LINGUAGENS DE
PROGRAMAÇÃO CADA VEZ MAIS AMPLAS E QUE
NEGOCIAM DE VÁRIAS FORMAS COM ROBUSTOS BANCOS
DE DADOS, A ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO JORNALISMO
TAMBÉM DEVE TER OUTRAS CONFIGURAÇÕES.

(LIMA JUNIOR, 2012, p. 210)

Ou seja, novas competências começaram a ser exigidas do jornalista que atua no jornalismo de
dados, especialmente porque é sua responsabilidade proporcionar contexto informacional aos
dados e transformá-los em narrativas noticiosas.

Vejamos o que Crucianelli (2013) diz a respeito do jornalismo de base de dados:


“O jornalismo de base de dados é representado pela soma de diversas disciplinas do jornalismo.
O que o JBD (jornalismo de base de dados) acrescenta ao conjunto dessas disciplinas é o
manuseio de um grande volume de dados, a possibilidade de produzir visualizações de dados
interativas e também a integração do trabalho do programador entre as práticas jornalísticas.”
(CRUCIANELLI, 2013 apud MOURA, 2018, p. 17)

Um exemplo desse tipo profissional é Frédérik Ruys, um jornalista de dados holandês que
desenvolve infográficos e, na mesma intensidade, também atua como designer de informação.
Ele é um dos fundadores do Infographics Congress, curador do livro Infographics, na Holanda, e
editor da única revista que trata do tema, a Infographics. Ruys não é apenas jornalista de dados,
mas também designer e programador.

De modo geral, o jornalista de dados é guiado pela seguinte tríade:


AQUISIÇÃO

ANÁLISE

APRESENTAÇÃO

Assim, o jornalista de dados precisa:

Ter a competência da aquisição para obter dados, quer isso signifique copiar de um site, baixar
uma planilha, preencher uma solicitação de registros públicos ou algum outro meio.

Ter a habilidade genérica da análise para fazer cálculos ou outras manipulações nos dados,
assim como para procurar padrões, histórias ou pistas.
Saber realizar a apresentação a partir da publicação de dados de forma informativa e envolvente.

Por conseguinte, fazendo uso da imagem produzida por Frédérik Ruys, é possível estender essa
reflexão para seis grandes competências que passaram a ser exigidas (ou, minimamente
ressignificadas) de modo específico pelo jornalista de dados no novo contexto digital, a saber:

PESQUISA

Ao ter em mente uma possível linha narrativa a direcionar sua produção, o jornalista de dados
inicia sua busca pelos dados.
ANÁLISE

O jornalista de dados precisa realizar testes de usabilidade e consistência para poder ver se a
base de dados que ele acabou de organizar e compilar está coerente e limpa.

COMBINAÇÃO
Os dados são filtrados, enriquecidos, cruzados. E é aí que o jornalista começa a busca por
padrões de interesse público.

VISUALIZAÇÃO

O jornalista de dados também precisa checar diferentes métodos de visualização dos dados por
meio de mapas, imagens e infográficos, pois um volume grande de dados sem forma não diz
nada.
ESCRITA

Junto ao editor, o jornalista pode escrever, por exemplo, a narração para uma matéria
audiovisual, ou mesmo determinar no storyboard os movimentos e ângulos da câmera.

ANIMAÇÃO

O jornalista de dados pode, finalmente, ser responsável por produzir animações do início ao fim,
ou seja, desde a reunião dos dados e briefing até o processo de renderização do material final.

Assim, mesmo que já tenham passado tantos anos desde a publicação da obra seminal de Meyer,
é possível ver que o jornalismo de dados deve muito de seu desenvolvimento às ideias
precursoras trazidas pelo pesquisador estadunidense. Em uma entrevista na qual discute a
atualidade do seu pensamento em um cenário já tomado pela efervescência de dados em todas
as telas, plataformas e meios, Meyer diz:

JORNALISTAS SEMPRE SERÃO NECESSÁRIOS E A


ECONOMIA SEMPRE DESCOBRIRÁ UMA MANEIRA DE
MANTÊ-LOS NA ATIVA. MAS ESSE PROCESSO DE
DESCOBERTA PODE SER LONGO E DOLOROSO. ISSO É UM
MOMENTO INTERESSANTE PARA SER JORNALISTA, E ISSO
É TANTO UMA BÊNÇÃO QUANTO UMA MALDIÇÃO. PARA
OS JOVENS JORNALISTAS DE HOJE É UMA MARAVILHOSA
OPORTUNIDADE.

(MENEGAT, 2016, p. 171-172)

NOVAS EDITORIAS E ESTRUTURAÇÃO DO


TRABALHO
É premente destacar que o jornalismo de dados não se furta de apropriar-se do “novo” ou das
potencialidades oferecidas pelo armazenamento, cruzamento e tratamento de dados ao trabalho
final do jornalista. Sendo assim, como recorda Martinho (2014), o jornalismo de dados é
contemporâneo a dois grandes elementos do tempo atual:

Big data


Tendência à abertura de dados

[O JORNALISMO DE DADOS] VAI AO ENCONTRO DE


ALGUNS DOS DESAFIOS QUE ELES [OS DOIS GRANDES
ELEMENTOS] TRAZEM, APROVEITANDO O SEU POTENCIAL
E TORNANDO-OS MAIS INTELIGÍVEIS E ACESSÍVEIS. SEJA
ORIENTADO PARA AS HISTÓRIAS, PARA OS PROCESSOS
OU PARA AS BASES DADOS, É JORNALISMO DE DADOS,
PORQUE A SUA MATÉRIA-PRIMA SÃO OS DADOS […].

(MARTINHO, 2014, p. 72)

A partir daí, podemos ver que novas editorias começaram a ser pensadas dentro do contexto do
jornalismo de dados. Aqui, falaremos brevemente de dois exemplos do cenário jornalístico
brasileiro recente (exemplos de produtos comunicacionais entendidos como nativos digitais,
isso é, empreendimentos que foram pensados, criados e desenvolvidos no universo on-line já
sob as lógicas de produção e recepção do ciberespaço interativo):

EDITORIA GRÁFICO
A editoria Gráfico, como parte do portal Nexo, é reservada para reportagens baseadas em dados
dispostos por gráficos, infográficos, tabelas e toda sorte de materialidades dotadas de
visualidade em formatos coloridos, preto e branco, animados, fixos, interativos etc. Com temas
que transitam da saúde em tempos de pandemia da Covid-19 ao desequilíbrio entre gênero e
nacionalidade na carreira de astronautas ao redor do mundo, essa editoria de jornalismo de
dados é exemplo de como a estruturação do trabalho jornalístico tem sido remodelada
continuamente não só pelo aspecto tecnológico, como também pela maneira que o jornalista
interpreta ou modela os dados que têm à mão.

EDITORIA
DADOS ABERTOS
A editoria Dados Abertos, do portal Gênero e Número, é um espaço único no qual o jornalismo de
dados ao mesmo tempo que mostra o produto noticioso final (as reportagens), também dá ao
leitor a oportunidade de entender os bastidores por trás da construção noticiosa baseada em
dados. Como o próprio portal explica: “Aqui disponibilizamos todas as bases consultadas ou
levantadas pela equipe da Gênero e Número durante o processo de apuração dos conteúdos
publicados. Consulte, baixe e reutilize. Os dados são abertos!”.

Tal abertura de dados promovida pela editoria em questão faz parte de uma visão na qual o
jornalista, o portal e o receptor acabam por atuar, em tese, em regime de cocriação da notícia.

SÃO PRECISAMENTE ESSAS NOVAS ROTINAS, LIGADAS À


NATUREZA DO SUPORTE E QUE DESTACAM IMAGINÁRIOS
ESPECÍFICOS A ELAS, QUE VÃO SE ENGAJAR NA
CONSTRUÇÃO DE UM DISCURSO PARALELO SOBRE O
JORNALISMO DE DADOS COMO UMA NOVA FORMA DE
ATIVIDADE JORNALÍSTICA COLABORATIVA […].

(CHARBONNEAUX; GKOUSKOU-GIANNAKOU, 2005, p. 283)

Por sua vez, valendo-se das discussões empreendias por Mancini e Vasconcellos (2016), nota-se
que Moura (2018) também destaca o papel do jornalista em se adaptar a esse novo cenário
dirigido e dominado pelo império dos dados, da dataficação:
“Segundo os autores [Mancini e Vasconcellos], entre as mudanças essenciais que permitem a
sua conceitualização, está o desenvolvimento de competências e da constituição metodológica
do trabalho adotado por parte dos profissionais. Apesar de a tecnologia facilitar o processo
como um todo, a definição de JBD [jornalismo de base de dados] encontra-se na própria ação, no
trabalho com os dados e na forma como eles são abordados.” (MOURA, 2018, p. 24-25)

É importante pensar como, no trânsito entre o novo e o antigo, os jornalistas precisaram se


adaptar às muitas transformações pelas quais a estrutura do trabalho no jornalismo de dados
passou e ainda continua passando.

ENTRE OS ANTIGOS E NOVOS PROFISSIONAIS DO


JORNALISMO, OS MEDIADORES DO JORNALISMO DE
DADOS BUSCARAM ATUAR COMO TUTORES NO
APRENDIZADO DAS NOVAS ROTINAS PROFISSIONAIS E
DOS MÉTODOS DE PESQUISA POR INFORMAÇÃO.

(CHARBONNEAUX; GKOUSKOU-GIANNAKOU, 2005, p. 274)

Como defende Isabella Moura (2018, p.25), o fundamental no jornalismo de dados é a


“oportunidade para trabalhar com uma grande quantidade de dados que anteriormente não
estava disponível, e de contar com ferramentas que antes não existiam”.
RECAPITULANDO O APRENDIZADO
No vídeo a seguir, o jornalista Marcelo Soares conta mais da sua experiência e dá dicas sobre
sua especialidade, o jornalismo de dados! Não perca!

VERIFICANDO O APRENDIZADO

CONCLUSÃO

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A introdução ao jornalismo de dados foi apresentada, neste conteúdo, a partir da evolução das
tecnologias e do armazenamento de dados por meio de planilhas digitais. Mais do que isso, foi
possível perceber como o cruzamento de dados no jornalismo fez com que as narrativas
noticiosas ganhassem um novo peso no contexto digital. Assim, de modo reflexivo, o uso dos
dados no trabalho jornalístico também acabou passando pelas fronteiras da própria
conceituação do que se convencionou chamar de jornalismo de dados.

Finalmente, como marco histórico do jornalismo de dados, o caso do Wikileaks representou o


ápice do uso de dados sem deixar de lado a relevância dos preceitos trazidos pelo jornalismo de
precisão às ideias precursoras de Philip Meyer.

Desse modo, pudemos ver que a produção de notícia a partir de bancos de dados vem passando
por uma reestruturação da organização do jornalismo que se divide em dois eixos:

As novas competências do jornalista de dados


&

As novas editorias direcionadas especificamente ao jornalismo de dados

 PODCAST
Agora com a palavra o professor Anderson Lopes, relembrando tópicos abordados em nosso
estudo. Vamos ouvir!

AVALIAÇÃO DO TEMA:

REFERÊNCIAS
ARAÚJO, L. V. A web e o jornalismo de dados: mapeamento de conceitos-chave. Dispositiva, v. 5,
n. 1, 2016. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

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2011. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

BARBOSA, S. Banco de dados como metáfora para o jornalismo digital de terceira geração. Anais
VI LUSOCOM, 2004.

BARBOSA, S. Jornalismo digital e bases de dados: mapeando conceitos e funcionalidades. Livro


de Actas — 4º SOPCOM, 2005, p. 1310-1321. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

CHARBONNEAUX, J.; e GKOUSKOU-GIANNAKOU, P.  O jornalismo de "dados", uma prática de


investigação? Um olhar sobre os casos alemão e grego. Brazilian Journalism Research, v. 11, n.
2, 2005. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

CHRISTOFOLETTI; e R., OLIVEIRA, C. Jornalismo pós-Wikileaks: deontologia em tempos de


vazamentos globais de informação. Contemporanea — Revista de Comunicação e Cultura, v. 9, n.
2, 2011. Consultado na internet em: 10 mai. 2021.

GEHRKE, M.; e MIELNICZUK, L. Philip Meyer, the outsider who created precision journalism
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LIMA JUNIOR, W. T. Big data, jornalismo computacional e data journalism: estrutura, pensamento
e prática profissional na Web de dados. Estudos em Comunicação, n. 12, 207-222. Consultado na
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MANCINI, L.; e VASCONCELLOS, F. Jornalismo de dados: conceito e categorias. Fronteiras —


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MANOVICH, L. The language of new media. Cambridge: MIT Press, 2001.

MARTINHO, A. P. Jornalismo de dados: caraterização e fluxos de trabalho. Exedra — Revista


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MENEGAT, R. Philip Meyer: precisão na informação e qualidade na gestão [entrevista]. Revista


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MOURA, I. C. O estado do jornalismo de dados no cenário luso-brasileiro. Dissertação (mestrado


em jornalismo) — Universidade Nova de Lisboa, 2018.

EXPLORE+

Quer saber mais sobre as conexões práticas entre o jornalismo digital e o mercado
jornalístico? A dica é visitar o portal Data Journalism que, com seus conteúdos em inglês,
apresenta fontes, referências, livros, produções e dicas pragmáticas para realizar um bom
projeto baseado na potência do armazenamento e do cruzamento de dados jornalísticos.

Para quem deseja se aprofundar um pouquinho mais no tema do jornalismo de dados e


suas possíveis conceituações, busque a tradução do livro de Jonathan Gray, Liliana
Bounegru e Lucy Chambers intitulada Manual do jornalismo de dados. A tradução está
disponível on-line no site do Knight Center for Journalism in the Americas.

O podcast Pizza de Dados (o primeiro no Brasil a tratar sobre ciência de dados) tem um
episódio especial em sua programação que trata justamente do jornalismo de dados, das
novas capacitações exigidas pelo jornalista e das novas editorias que surgem nesse
cenário. Procure e ouça o episódio 36!

CONTEUDISTA
Anderson Lopes

 CURRÍCULO LATTES

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