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10 PASSOS PARA O PRIMEIRO LONGA-

METRAGEM
Os logotipos dos patrocinadores e apoiadores começam a aparecer na tela.
O som das pernas se arrumando nas cadeiras enchem o ambiente. Você
começa a olhar para os lados e tenta adivinhar o que as pessoas estão
pensando.

Será que elas vão gostar?

Todo escritor audiovisual tem o desejo de ver o seu filme na sala escura. É
mágico poder assistir a algo que você criou. É natural. Depois de tanto
esforço – às vezes anos para desenvolver uma obra – o que você deseja é,
no mínimo, que a ‘coisa’ funcione. Se aplaudirem, melhor ainda. Se
gostarem e recomendarem, perfeito!

Ok… mas aqui estamos falando do resultado, correto?

Eu também quero esse resultado. Quem não? Eu almejo isso tudo. Sinto a
mesma coisa. Mas a realidade é construída dia pós dia, manhã pós manhã.
Se eu ficar projetando o futuro, ele sempre será futuro. Agir no hoje é uma
ação muito relevante para você assistir seu filme na sala escura.

Nós precisamos começar a trazer à mente nosso contexto atual. Parar de


pensar como espectador e vivenciar o dia a dia do profissional escritor. Ao
criar um longa-metragem você precisa estar consciente sobre e disponível
ao PROCESSO.

Em outras palavras: esqueça – de uma vez por todas – o resultado final.

Sua energia deve ser inteiramente colocada no ponto crucial: na criação.


Enquanto seus pensamentos e emoções estiverem focando à sala escura, é
sinal de que seus neurônios ainda estão achando que você é o público. E
você quer ser o autor, lembra?

Vire o jogo. Crie o Incidente Incitante para o seu primeiro longa.

Por isso, resolvi listar neste texto os 10 principais tópicos que envolvem a
escrita do primeiro longa-metragem. São 10 caminhos que eu percebo na
prática, diariamente. São uma dose forte para quem irá vivenciar o
primeiro processo de longa.
O meu item preferido é o de número 8. E o seu? Diga-me nos comentários.

1 – Escreva algo em que acredite

Você vai passar meses pensando, estruturando, criando e escrevendo sobre


um assunto. Às vezes pode durar anos o processo de criação de uma obra
narrativa. Imagine você passar as horas de seu dia em cima de um tema
que detesta. É como se você fosse ao estádio de futebol assistir ao jogo do
time rival, com a camisa do time rival, gritando o nome do time rival. Não
faz sentido algum. Um exemplo comum: você está iniciando uma carreira
de escritor. Um produtor executivo lhe convida para escrever um roteiro
de longa. Antes de se empolgar e dizer sim, pense justamente se você
realmente acredita na proposta.

2 – Esqueça o roteiro

Já vi isso acontecer diversas vezes. Você ainda nem sabe nada do


personagem principal, mas fica se gabando pra todo mundo com a
primeira cena que você tem em mente. Isso é uma forma de se iludir, de
acreditar que basta sentar e escrever. Hora ou outra vai acontecer de se
perder no caminho e abandonar. O longa vai ficar na gaveta. Saiba que ao
ter uma ideia não basta transformá-la em texto. Você precisa logicamente
de um método. Sobre isso conversamos no próximo item.
3 – Tenha um método para se planejar

É imprescindível você saber – antes de escrever – os passos necessários


para criar uma estrutura narrativa. Não basta esquecer o roteiro (como
mencionei no item 02), é preciso também conhecer as peças que vão, em
sua união, constituir uma obra fílmica. Você tem um terreno, tem o
material, tem um projeto. Só depois disso você pode construir. Eu indico
sempre que você alie prática e teoria. Se você realmente não sabe como
transformar uma ideia solta em roteiro audiovisual, recomendo que assista
a este vídeo: Os Três Pilares da Construção Narrativa – nele eu apresento os
pontos de conexão entre o Criar, o Estruturar e o Escrever.

É bom colocar a mão na massa. Entretanto, não esqueça de estudar.


Comece pela leitura de livros técnicos, analise roteiros já escritos e
converse com pessoas que já escreveram roteiros. Viva isso na prática!

4 – Defina um cronograma e comece hoje!

Uma das frases que mais ouço é: “não tenho tempo pra escrever“. Com
baixíssima frequência eu ouço: “eu escrevi o roteiro de um longa e estou
com algumas dúvidas”. A ponte entre a ideia e o roteiro é bastante
grande. É preciso fôlego para iniciar a caminhada. Mesmo assim só
consegue terminar quem decide dar o primeiro passo. É imprescindível que
você tenha um caderno (ou um arquivo em branco no computador) para
anotar todas as ideias, devaneios e insights. Até aí tudo bem, você está
estimulando seu cérebro. Isso é um treino para a escrita. Porém, quando
você definir – “vou escrever um longa” – você precisa de um cronograma.
Você pode seguir um caminho certeiro com o e-book “Os 7 Passos para
Criar uma história”, que eu escrevi juntamente com o roteirista Tom
Freitas.

5 – Um olho no peixe e outro no gato

Eu nunca diria: “escreva apenas o que pode ser filmado”. Também não
acredito no contrário: “escreva qualquer coisa que imaginar, depois você
pensa se é possível fazer”. Deve haver um equilíbrio. Equilíbrio entre
conteúdo e mercado. Para isso, torna-se importante você conhecer as
áreas do cinema. Saber quanto custa um filme, como funciona a produção,
como se adquiri os recursos, quais são as câmeras disponíveis. Indico que
conheça também sobre a história do cinema nacional (em qualquer país
que você esteja pensando em trabalhar). Quanto mais souber melhor.
Posso escrever sem saber isso? Pode sim. Será um pouco egoísta e um
pouco utópico. Mas pode.

6 – Vai ser demorado e difícil (se apoie nisso!)

Quanto mais bagagem você tem, mais a sua mochila pesa. Isso quer dizer:
quanto mais você entende o processo da escrita narrativa, mais o processo
pode tornar-se cheio de dilemas. Mas é comum. Enquanto você se mata
dentro do seu quarto, sem saber direito o que é melhor para a cena de
abertura, lembre-se que, no outro lado do mundo, há um outro roteirista
fazendo a mesma coisa. Isso faz parte. O que não faz parte é você
acreditar em um longa-metragem sem sofrimento. Mas e daí? Isso é bom
no final das contas. Quando você percebe que o obstáculo traz repostas
muito mais intensas, o problema passa a ser a solução.

7 – Domine o Clássico e encontre sua forma

Você já deve ter ouvido falar disso muitas vezes. Minha pergunta é: você
está levando a sério? É tentadora a ideia de ganhar prêmios pelo mundo
com algo inovador, chamativo, contemporâneo. Ok, pode ser que seja a
sua vibe mesmo. Entendo. Entretanto, alerto para o seguinte: toda e
qualquer criação parte do entendimento do clássico. O clássico é um filme
com início, meio e fim, com pontos de virada marcantes e estrutura
linear. Faça isso e ao perceber que deu certo você pode quebrar tudo o que
achar necessário. Ao descobrir que você sabe construir da maneira
tradicional, você vai encontrando a sua forma. Se partir do princípio
contrário, pode ser que leve muitos anos para ser (um pouco) reconhecido
ou você pode passar muitos anos em busca da sua forma, sem saber muito
bem como buscar.

8 – Não comece pelo longa

Dificilmente você será campeão mundial de surf aprendendo a surfar com


36 anos em ondas com 7 metros de altura. E ainda por cima competindo
com esportistas de 22 que surfam desde os sete. Ainda bem que no cinema
a idade não conta. O que conta como experiência no audiovisual é o tempo
de intensidade – o quanto você mergulhou naquilo que faz. Teria e Prática.
Pode começar a escrever com 73 anos. Mas nunca comece por um longa-
metragem. A não ser que você seja um escritor de literatura ou um
dramaturgo com 73 anos. Aí tudo bem. Neste caso você precisa
simplesmente aprender a questão técnica de como formatar um roteiro. O
que está em jogo aqui é aprendizado e prática. Quanto mais curtas você
fizer mais você vai entender os erros e os acertos de seu filme. É por isso
que eu sempre digo: a melhor forma de começar a ser um roteirista é
trabalhando para conteúdos publicitários. Isso faz você escrever muito e
acompanhar muitos sets de pertinho.

9 – Entenda seu longa como um próximo passo e não como o último


passo.

Você teve uma ideia genial e acredita que ela pode levar você ao Oscar.
Beleza! É ótimo ter esse alvo. Isso estimula e desperta sua vontade de
escrever. Mas lembre-se que não é possível derrubar uma ave de rapina
com um estilingue.Encare cada filme como uma partícula de um processo
maior. Pra crescer é precisar pensar no hoje, no agora, nos detalhes. Quem
se concentra demais no resultado acaba perdendo os mínimos caminhos e
possibilidades de desenvolvimento. Esse filme levou você até ‘aqui’. Agora
é hora de ir pra ‘lá’ e assim sucessivamente. Então, sendo bem realista, se
sua vontade é simplesmente ganhar prêmios pense em: estudar os
festivais, devorar os filmes vencedores, enxergar com olhos de jurados,
treinar a percepção, descobrir os processos de seleção, antenar-se para o
tipo de tendência que o festival cria e estar aberto a testar, testar, testar.
Mesmo assim, será um passo depois do outro.

10 – Se aproxime e converse com pessoas que já escreveram obras


maiores

Desculpa repetir: os filmes são resultados de um processo. Correto? Mas


quem faz os filmes são pessoas. É com elas que você deve conversar, tomar
café, trocar ideias, descobrir novos olhares, questionar. Muito importante
você sair da Netflix pra escrever. Participe de eventos, festivais, concursos,
aulas abertas, aulas fechadas, faça o meu curso de roteiro, faça outros
cursos de roteiro, mande mensagem pra desconhecidos, peça dicas, acesse
tutoriais, incomode, seja chato, ligue, envie e-mail, peça indicações de
caminho. E principalmente: esteja aberto. Ao novo. Ao velho. Ao que você
desconhece.

Aos mesmo tempo que parecem ser 10 itens básicos, eles são também
avançados e essenciais. É comum deslizar nas etapas mais simples! É
justamente por isso que muitas ideias não viram sequer curtas: pois há
muita concentração no “onde” chegar e esquecemos o “porquê” e o
“como” chegar.

Faz sentido pra você?


Comece a perceber em qual dos 10 itens você tem maior dificuldade.
Estude, se aprimore e seja forte ao tentar contornar as situações não
habituais. Vou dar um exemplo. Ao invés de dizer: “eu sou muito esperto
pra escrever uma comédia romântica, eu não dou bola para os elementos
do clássico”, tente pensar: “eu sou muito esperto, por isso sou capaz de
escrever uma bela comédia romântica e me divertir com isso, aprender
com isso e ainda testar alguns elementos chaves para meu estilo que é
desfragmentado”. Que tal?

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