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Estrutura e Acabamentos de Edifícios

Licenciatura em Engenharia Civil

Avaliação de Patologias em estruturas de betão armado


Caso de estudo: Ponte-Cais do Porto de Pemba

Autor: Paulino Jequecene

Tete, 2022
CASO DE ESTUDO

1.1 Introdução

O presente capítulo tem como objectivo definir e caracterizar a zona de estudo e as estruturas
que nela estão localizadas para posterior análise das patologias observadas e também servir
como base para a verificação de segurança estrutural.

A descrição de alguns parâmetros climáticos, como regime de ventos e temperatura foram


obtidos com base em uma análise estatística de relatórios horários históricos e reconstruções de
modelo de 1 de Janeiro de 1980 a 31 de Dezembro de 2016, disponível no site Weather Spark,
onde o mesmo mostra as condições meteorológicas características da cidade de Pemba.

De modo a adquirir uma imagem do estado de conservação da estrutura, elaborou-se uma ficha
de avaliação tipo, onde se descreve patologias verificadas em elementos de betão, junta de
dilatação e elementos secundários (guarda-corpos), recorrendo sobrebretudo a registos
fotográficos.

1.2 Enquadramento geográfico

O Porto de Pemba (com coordenadas Latitude -12-56’-60’S e Longitude 40°30’0’E) localiza-


se na província de Cabo Delgado, na região Norte de Moçambique. Situado na baia do mesmo
nome, vulgarmente considerada a terceira maior do mundo, distanciando-se em linha recta, a
1666 km (2450 km através de rodovias) a Nordeste da capital Moçambicana, Maputo e a 200
km a Norte do Porto de Nacala.

1.3 Definição e Caracterização da zona em estudo

1.3.1 Definição da zona de estudo

O CFM tem sido directamente responsável pela operação e gestão do Porto. O Porto de Pemba
está devidamente protegido na parte interna da Baia de Pemba e tem uma profundidade de água
de cerca de 20 m, incluindo o canal de acesso ao porto.
A Ponte-Cais do Porto de Pemba é uma estrutura de acostagem do tipo Pier (literatura Inglesa),
e em termos de configuração em planta apresenta uma solução em Cais continuo, com duas
frentes de acostagem, em paramento aberto.

1.3.1.1 Instalações Portuárias

O porto de Pemba tem uma área de armazenagem de 20.000 metros quadrados, com um único
armazém de 1.800 metros quadrados. O terminal é servido por um pórtico de 25 toneladas, 7
empalhadeiras, cujas capacidades variam entre 2,5 a 28 toneladas e 2 tractores. Não há nenhum
guindaste de cais instalado.
Além disso, a Bolloré, uma das empresas que actua na exploração offshore de gás, construiu
uma Ponte-Cais para os barcos de serviço que trabalham para os equipamentos de
perfuração/plataformas offshore (com 120m de comprimento e 40m de via de acesso) (PEDEC,
2015).

Figura 1: Instalações Portuárias (Google Earth, 2018)


1.3.1.2 Descrição Geral da Ponte-Cais

A Ponte é constituída fundamentalmente por dois ramos distintos: o ramo de acesso com
12,40m de largura e 77,5m de comprimento, e o ramo de acostagem, com 17m de largura e
182,5m de comprimento. Esta Ponte-Cais possui uma configuração em “T” (em planta T). Tem
abas diferentes, uma com cerca de 134,05m e outra 28,90m.

Estruturalmente a Ponte-Cais é na sua totalidade materializada por elementos de betão armado,


que perfazem um conjunto um conjunto de pórticos que suportam a laje de pavimento. Na zona
do ramo de acesso, os pórticos encontram-se espaçados de 4.5m, exceptuando os vãos de
extremidade que são de 3.9m. O perfil transversal do ramo de acesso é constituído por quatro
(04) pilares de secção transversal constante de 34x34cm e apresentam de forma simétrica uma
inclinação de 5° com o eixo vertical (Figura 64), sobre os quais se apoiam vigas transversais de
secção transversal de 55x95cm, que por sua vez, confere simultaneamente suporte a laje de
pavimento e as vigas longitudinais de secção transversal 40x60cm. A laje tem uma espessura
definida em projecto de 25cm. Entretanto, em obra observa-se inclusão de uma camada de
reforço em betão com 30 cm de espessura, o que confere uma altura de 55 cm.

Figura 2: Perfil transversal do ramo de acesso


Os pórticos do ramo de acostagem estão igualmente espaçados de 4.50m e nos tramos de
extremidade e junto às juntas, apresentam vãos de 3.25m. O perfil transversal do ramo de
acostagem é constituído por quatro pilares (04) centrais inclinados (cerca de 20°) de forma
simétrica (Figura 65), Os quatro pilares suportam na zona central uma viga transversal de secção
variada entre 115cm e 155cm. Nas extremidades da viga transversal, esta prolonga-se em
consola na vertical, com a função estrutural de dissipar forças horizontais dinâmicas (energia
de acostagem), decorrentes de atracagem de navios de médio e grande porte. Longitudinalmente
o ramo de acostagem apresenta quatro vigas centrais suportadas pelas vigas transversais e duas
vigas nas extremidades suportadas igualmente pelas vigas transversais, mas com os vãos
reduzidos por introdução de dois pilares deslocados dos alinhamentos dos pórticos. Este aspecto
faz com que as cargas horizontais introduzidas pela atracagem de embarcações sejam
redistribuídas por todos os pilares sem comprometer os pilares da extremidade.

Figura 3: Perfil transversal ramo de acostagem

Em relação aos de dispositivos de acostagem e amarração, o porto de Pemba é constituído por


sistemas de defensas de borracha do tipo buckling com configuração rectangular e flutuante do
tipo pneumático (Figura 66 e 67), sendo a amarração de navios realizado por cabeços de
amarração do tipo T-head.
Figura 4: Sistema de defesa flutuante do tipo pneumático

Figura 5: Sistema de tipo buckling com configuração rectangular


1.3.2 Caracterização da zona em estudo

1.3.2.1 Regime de ventos


Sendo o vento é uma condicionante importante da dinâmica marítima, importa frisar que, neste
caso específico, os ventos preponderantes são de rumo Sul, com uma percentagem máxima de
82%, como é possível observar na figura 68.

Pode-se verificar que é o mês de Julho que se verifica maior intensidade do vento, sendo de
21,4 km/h de velocidade horaria media do vento (Figura 69).

Figura 6: Direcção do vento


(recuperado em 9, Dezembro, 2018, de https://pt.weatherspark.com/y/101529/Clima-característico-em-Pemba-
Moçambique-durante-o-ano)
Figura 7: Velocidade média do vento
(recuperado em 9, Dezembro, 2018, de https://pt.weatherspark.com/y/101529/Clima-característico-em-Pemba-
Moçambique-durante-o-ano)

1.3.2.2 Temperatura

A temperatura máxima média é 31 ° e a mínima média é de 25 °C. Em Junho e Agosto


verificam-se as temperaturas médias mais baixas, rondando os 22 °C em Novembro a mas alta,
numa média de 31°C (Figura 70).

Figura 8: Temperaturas máximas e mínimas médias


(recuperado em 9, Dezembro, 2018, de https://pt.weatherspark.com/y/101529/Clima-característico-em-Pemba-
Moçambique-durante-o-ano)
1.3.2.3 Regime de marés

Os dados das alturas das marés registados do Porto de Pemba são referente aos anos 2016, 2017
e 2018. Neste tipo de análise, o esperado seria a obtenção de dados registados no período de 5
a 10 anos.
Com base nas tabelas de marés (Anexo C), a preia-mar máxima atingiu a cota de +4.50 m (Z.H),
enquanto a baixa-mar mínima atingiu cora de +0.20 m (Z.H).

1.4 Avaliação de estado de conservação da Ponte-Cais

A avaliação do estado de conservação da Ponte-Cais foi mediante a análises relativamente à


degradação que a estrutura/elementos apresentam, abordando os principais factores
responsáveis por essa degradação que possam afectar a sua estabilidade, durabilidade e
capacidade de serviço.
Das visitas efetuadas e através de inspecção visual foi possível classificar o tipo de anomalia e
o estado geral da estrutura. Para uma melhor compreensão das anomalias encontradas em
estruturas marítimas, o caso da Ponte-Cais do Porto de Pemba, seguiu-se o princípio mostrada
na Figura 71.
Figura 9: Condições de exposição e mecanismos de deterioração num ambiente marítimo (Costa,1997) citado
em (Rodrigues, 2011)

Na zona atmosférica (ZA), o principal mecanismo de deterioração nesta zona é a corrosão das
armaduras por acção dos cloretos transportados via aérea, sendo normalmente uma zona
bastante afectada.

Ligeiramente mais abaixo pode identificar-se a zona de rebentação (ZR). Nestas secções, o
betão encontra-se sujeito a ciclos de molhagem e secagem, situação ideal para o
desenvolvimento acelerado de mecanismos de corrosão devido ao gradiente de temperatura e
humidade constante (Liu, 1991).
Pode-se verificar que nessa zona o principal mecanismo de deterioração é a corrosão de
armaduras e a erosão, tornando um meio fácil para a reduzir o recobrimento nessa zona.

Na zona de maré (ZM), verificam-se igualmente ciclos de molhagem e secagem, no entanto o


tempo de molhagem é bastante superior ao de secagem. Neste caso, e uma vez que o betão se
encontra saturado durante grande parte do tempo (maré alta mais significativa que a maré
baixa), a corrosão das armaduras não é tão acentuada. Por outro lado, e uma vez que o betão se
encontra submerso durante diversas horas, podem manifestar-se sinais de ataque químico e
biológico do betão (da Silva, 2007).
Os sinais de ataque biológico podem ser facilmente observados nos pilares (estacas) da Ponte-
Cais.

Por último, na zona submersa (ZS), o betão encontra-se saturado, isto é, sem acesso a oxigénio,
é normalmente de desprezar o mecanismo de corrosão (Vale e Stewart, 2003).
A ausência de oxigénio controla a taxa com que a corrosão se vai desenvolver.

1.4.1 Descrição das manifestações patológicas encontradas

A seguir, são apresentadas através do levantamento fotográfico as manifestações patológicas


verificadas na estrutura, representados em fichas de anomalias, onde será feita a descrição das
causas possíveis e consequências.

Figura 10: Mapa das principais patologias verificadas na Ponte-Cais (LEM, 2017)
1.4.1.1 Anomalias (Classificação)

Tabela 1: Anomalias verificadas

A-A. ELEMENTOS EM BETÃO


A-A1 destacamento
A-A2 fissura
A-A3 manchas de corrosão
A-A4 ataque biológico no betão (Incrustações)
A-B. ARMADURAS
A-B1 varão à vista (descasque do recobrimento)
A-B2 varão corroído
A-B3 varão com diminuição de secção
A-C. JUNTAS DE DILATAÇÃO
A-C1 corrosão do metal
A-C2 inexistência de protecção
A-C3 ausência parcial da protecção
A-C4 desgaste na face inferior
A-D. ELEMENTOS SECUNDÁRIOS
A-D1 corrosão do guarda-corpo
A-D2 diminuição da secção dos perfis metálicos

FICHA DE ANOMALIA
TIPO: ARMADURAS
FICHA: A-B3
DESIGNAÇÃO: varão com diminuição de secção
DESCRIÇÃO: varão de armadura ordinária colocado à vista por
descasque do recobrimento e apresentando perda de secção transversal
CAUSAS - recobrimento insuficiente
POSSÍVEIS: - corrosão da armadura
- carbonatação
- áreas demasiadamente expostas
- presença de iões de cloro
CONSEQUÊNCIAS - fendilhação; destacamento do betão; estética afectada
POSSÍVEIS: - perda de aderência do varão; colapso de estrutura
FICHA DE ANOMALIA
TIPO: ELEMENTOS EM BETÃO
FICHA: A-A1
DESIGNAÇÃO: destacamento
DESCRIÇÃO: caracteriza-se pela perda localizada do betão do
recobrimento
CAUSAS
POSSÍVEIS: - corrosão da armadura
- carbonatação
- penetração de cloretos
CONSEQUÊNCIAS - perda de aderência do varão
POSSÍVEIS: - colapso de estruturas
- estética afectada

FICHA DE ANOMALIA
TIPO: ELEMENTOS SECUNDÁRIOS
FICHA: A-D1
DESIGNAÇÃO: corrosão do guarda-corpo
DESCRIÇÃO: perfil metálico apresentando perda da secção trans-
versal
CAUSAS - condições de exposição (proximidade do mar)
POSSÍVEIS: - falta de protecção (pintura)
CONSEQUÊNCIAS - alteração das propriedades do metal
POSSÍVEIS: - alteração de geometria
- estética afectada
FICHA DE ANOMALIA
TIPO: JUNTA DE DILATAÇÃO
FICHA: A-C3
DESIGNAÇÃO: ausência parcial de protecção
DESCRIÇÃO: perda parcial do metal de protecção
CAUSAS - corrosão
POSSÍVEIS: - desgaste do metal
- acção do tráfego
CONSEQUÊNCIAS - remoção total da protecção
POSSÍVEIS: - degradação da junta
- má funcionamento

FICHA DE ANOMALIA
TIPO: ELEMENTOS EM BETÃO
FICHA: A-A2
DESIGNAÇÃO: fissuras
DESCRIÇÃO: fissura e manchas de corrosão no pilar (estaca)
CAUSAS - condições de exposição (proximidade do mar)
POSSÍVEIS: - corrosão
- penetração de cloreto
- despassivação das armaduras
CONSEQUÊNCIAS - destacamento
POSSÍVEIS: - delaminação
- armadura exposta
- deterioração da estrutura
- diminuição da capacidade resistente
- estética afectada
A figura abaixo mostra a localização das anomalias

Figura 11: Localização das anomalias verificadas na Ponte-Cais

1.4.2 Eventos Significativos

No mês Dezembro do ano 2017, um navio petroleiro referenciado como Apine Mathilde cuja
tonelagem bruta é de 29266 ton, dimensões de 183.21x32m e 7 de calado, embateu no ramo de
acostagem, como consequência disso, culminou com a rotura das consolas concebidas para
observar as forças resultantes das operações de atracagem, a viga de interligação das consolas,
incluindo a rotura de um pilar de suporte do tabuleiro (Figura 74).
Figura 12: Rotura de elementos estruturais em betão armado no ramo de acostagem.

Como pode-se observar na Figura 74, as armaduras das consolas ficaram totalmente expostas.
Outro aspecto importante a ser tomado em consideração e a inexistência de um sistema de
defesa convencional ao longo da faixa que ocorreu o acidente.
RECOMENDAÇÕES

 As estruturas de acostagem, como o caso das Pontes-Cais, o estudo da agitação marítima


é de capital importância, principalmente no aspecto concernente a altura da onda do
projecto, tendo em conta que esse parâmetro condiciona o dimensionamento destas
estruturas, em consequência disso resulta a resposta hidráulica resultante da interação
onda estrutura que pode por em causa a segurança e estabilidade da mesma. As acções
dinâmicas resultante da acostagem e amarração de navio devem consideradas na
verificação de segurança da estrutura. No entanto, desses aspectos são importantes para
complementar o trabalho.
 Maior parte das Pontes-Cais construídas em Moçambique se encontra em avançado estado de
degradação, o ambiente hostil em que a estrutura esta inserida e a combinação de outros factores,
como a falta de acções de manutenção que põe em causa a durabilidade e o bom desempenho
estrutural. Esta situação verifica-se também em diversas estruturas que não estão inseridas em
ambientes marítimas como obras de arte, edifícios onde justifica-se a realização da verificação de
segurança estrutural.
 Em Moçambique praticamente não existe literaturas na língua portuguesa especializada
que aborda sobre a concepção das Pontes-Cais e outras estruturas inseridas em
ambientes marítimos. Nesse contexto, este trabalho visa também a dar um contributo na
sistematização do conhecimento nessa área.
Apêndice
Inspeções visuais

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