Você está na página 1de 10

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/271821219

Leptina e grelina na produção de ruminantes Leptin and ghrelin in ruminant


production

Article  in  Revista de Ciencias Agrarias · October 2014

CITATIONS READS

0 965

6 authors, including:

Luciana Helena Kowalski Paulo Rossi Junior


Impextraco Latin America Universidade Federal do Paraná
34 PUBLICATIONS   41 CITATIONS    80 PUBLICATIONS   324 CITATIONS   

SEE PROFILE SEE PROFILE

Jovanir Fernandes
Universidade Federal do Paraná
49 PUBLICATIONS   257 CITATIONS   

SEE PROFILE

Some of the authors of this publication are also working on these related projects:

Fenomics of fetal programming effects on beef cattle production: a systemic approach View project

Study of sustainable productivity and conservation of wild animals on a farm in the Pantanal View project

All content following this page was uploaded by Luciana Helena Kowalski on 04 February 2015.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


Leptina e grelina na produção de ruminantes
Leptin and ghrelin in ruminant production
Luciana H. Kowalski1, José A. Freitas2, Sergio R. Fernandes3, Paulo R. Junior4, Jovanir I. M. Fer-
nandes5 e Marina G. Berchiol da Silva6
1
Universidade Federal do Paraná - Campus Palotina; Rua Pioneiro, 1509, Palotina - PR, Brasil; 85950-000. E-mail: lucianahelenak@gmail.com, author for correspondence
2
Universidade Federal do Paraná - Campus Palotina; Rua Pioneiro, 2153, Jardim Dallas, Palotina - PR, Brasil; 85950-000. E-mail: freitasjaf@ufpr.br
3
Universidade Federal do Paraná- Campus Curitiba-PR. Rua Professor Ewaldo Schiebler, 1200, Jardim Social, Curitiba-PR, Brasil;
82530-160. E-mail: srfernandes83@gmail.com
4
Universidade Federal do Paraná- Campus Curitiba-PR. Rua dos Funcionários, 1540, Juvevê, Curitiba-PR, Brasil; 80035-050. E-mail: parossi@ufpr.br
5
Universidade Federal do Paraná- Campus Palotina. Rua Pioneiro, 2153, Jardim Dallas, Palotina- PR, Brasil; 85050-000. E-mail: jovanirfernandes@gmail.com
6
Faculdade Eduvale/Avaré-SP., Av. Prefeito Misael Eufrásio Leal, 347, Jardim América, Avaré-SP; 18705-050. E-mail: gabiberchiol@hotmail.com

Recebido/Received: 2013.10.03
Aceitação/Accepted: 2014.10.15

RESUMO
A leptina e a grelina são hormonas peptídicas que foram estudados primeiramente em humanos, devido aos problemas de obesidade e
diabetes. Estas hormonas estão presentes em vários mamíferos, incluindo os animais domésticos. As funções conhecidas da leptina em
ruminantes estão relacionadas com a regulação do consumo alimentar, a sinalização da condição corporal para a função reprodutiva
e ao estímulo da resposta imune. Os polimorfismos do gene da leptina favorecem a seleção de animais com melhores características
produtivas, pois estão associados a características qualitativas do leite (teor de gordura e proteína) e da carcaça (espessura de gordura
subcutânea e marmoreio). A grelina foi bastante estudada em humanos, havendo poucas funções da grelina descritas em animais de
produção. Porém, a grelina atua juntamente com a leptina na regulação do consumo alimentar, e existem evidências de que as duas
hormonas regulam, também, a reprodução. Nesse contexto, o objetivo desta revisão consistiu em relatar as funções conhecidas da
leptina e da grelina em ruminantes, e a influência destas hormonas nas características produtivas destes animais.

Palavras-chave: bovinos, características qualitativas, consumo alimentar, reprodução

ABSTRACT
Leptin and ghrelin are protein hormones which were studied first in humans due to diseases as obesity and diabetes.
These hormones are present in various mammals, including domestic animals. The known functions of leptin in the ru-
minant production are related to feed intake regulation, body status indication to the reproductive function and immune
response stimulus. The polymorphisms of leptin gene can be used in the selection of animals with better productive
traits, because they are associated to milk qualitative traits (fat and protein content) and carcass (backfat thickness and
marble score). Ghrelin was widely studied in humans, and few functions of this hormone were reported for domestic
animals. However, ghrelin is associated to leptin and both hormones have important function on feed intake regulation,
and some evidences indicate that also affect reproduction. In this context, the objective of this review was to report leptin
and ghrelin functions in ruminants and the influence of these hormones on productive traits of these animals.
Keywords: cattle, feed intake, qualitative traits, reproduction

Introdução dos com leptina e grelina (Zhang et al., 1994; Kojima


et al., 1999).
Desde a descoberta das hormonas leptina e grelina Há grande interesse no estudo da leptina em huma-
que houve considerável avanço na pesquisa sobre nos, pois esta hormona pode ser utilizada no trata-
suas funções em animais e humanos (Kojima et al., mento da obesidade, assim como pode ser respon-
1999; Negrão e Licino, 2000). Porém, as funções sável pela predisposição à obesidade (Hervey, 1959;
mais estudadas e elucidadas estão relacionadas à Zhang et al., 1994; Campfield et al., 1995). Outra fun-
regulação do consumo alimentar e à diminuição de ção importante e muito estudada em humanos está
peso corporal, que foram o foco dos primeiros estu- relacionada com a ação da leptina na reprodução.

Revista de Ciências Agrárias, 2014, 37(4): 375-383 375


Esta hormona atua como sinalizador da condição dos camundongos db/db. Concluiu-se nesses ensaios
corporal e regula a cascata hormonal que dá início que os camundongos normais e db/db produziam
à pulsatilidade da hormona libertadora de gonado- leptina, enquanto os camundongos ob/ob apresenta-
trofinas – GnRH (Hausman et al., 2012). vam falha na produção deste hormona. Assim, com
Os estudos iniciais com a grelina tiveram foco na a circulação interligada, os camundongos ob/ob pas-
função desta hormona no estímulo da hormona do savam a ter leptina circulante, o que originava na
crescimento (GH). Posteriormente, estudos demons- diminuição do consumo de alimentos e na perda de
traram que a grelina atua em conjunto com a leptina peso. Já os camundongos db/db apresentavam uma
na regulação do consumo de alimentos. A partir daí, provável falha na expressão do receptor da leptina
esses duas hormonas tornaram-se foco de estudos (Houseknecht et al., 1998). Portanto, apesar de ha-
sobre controle da obesidade na medicina humana. ver leptina circulante nos camundongos db/db, estes
Nos animais, várias pesquisas têm sido direciona- permaneceram obesos devido à falha no receptor,
das para compreender a função da leptina e grelina na sinalização e interpretação pelo sistema nervoso
na regulação do consumo alimentar. Estudos mos- central (SNC).
traram que esses duas hormonas atuam, também,
na reprodução (Sirotkin e Meszarosová, 2009), e que Regulação do consumo alimentar e do metabolis-
a leptina influencia a produção e a qualidade do lei- mo energético
te em bovinos (Chilliard et al., 2001; Sadeghi et al., A leptina tem ação periférica e no SNC (Salman e
2008; Cano et al., 2009), a imunidade (Agarwal et al., Costa, 2006). Em conjunto, estas duas ações regulam
2009) e a qualidade de carcaça (Geary et al., 2003). o consumo alimentar, a mobilização de gordura e a
Perante as descobertas recentes sobre a ação da lep- captação de glicose (Ceddia et al., 1998; Chilliard et
tina e da grelina nos animais, principalmente em al., 2001).
animais domésticos de produção, o objetivo desta A leptina é produzida no tecido adiposo. À medida
revisão em sintetizar as funções da leptina e da gre- que o peso corporal aumenta ocorre aumento na de-
lina em ruminantes, e a influência destas hormonas posição de tecido adiposo, o que leva ao aumento da
nas características produtivas destes animais. quantidade de adipócitos e, portanto, da síntese e
liberação de leptina. Essa condição fisiológica afeta
o consumo de alimento, que é regulado pela ação da
Leptina leptina no núcleo arqueado do hipotálamo. O au-
mento da concentração plasmática de leptina sina-
Histórico liza a saciedade, levando à diminuição do consumo
As primeiras descrições da leptina foram feitas por de alimento. Esta queda no consumo alimentar leva
Hervey (1959) e Coleman (1973), que realizaram ex- à redução da concentração plasmática de leptina
periências de parabiose (união fisiológica de dois (Schwartz et al., 1996; Friedman e Halaas, 1998; Fi-
organismos) com camundongos. Esses autores rela- gura 1).
taram a existência de um fator circulante que levava No núcleo arqueado do hipotálamo existem duas
camundongos obesos a emagrecer. populações de neurónios: os orexígenos, que secre-
No início da década de 1990, Zhang et al. (1994) re- tam o neuropeptídeo Y (NPY) e a agouti related pro-
alizaram a clonagem do "fator circulante" descrito tein (AgRP); e os anorexígenos, que secretam o trans-
anteriormente, que pela primeira vez ficou conhe- crito regulado por cocaína e anfetamina (CART)
cido e foi nomeado como leptina, onde leptos deriva e o peptídeo de melanocortina (alfa-MSH), que é
do grego e significa magro. Conforme esses autores, derivado da propriomelanocortina (POMC). Esses
a leptina é uma hormona proteico formada por 146 receptores são capazes de regular a ingestão ou pri-
aminoácidos, com massa de 16 quilodáltons (kDa) e vação de alimentos e o gasto energético. O aumento
que apresenta expressão génica nos adipócitos, sen- da concentração plasmática de leptina, e a ligação
do sintetizada e armazenada no tecido adiposo. desta hormona aos neurónios orexígenos inibe a ati-
Posteriormente, outros estudos de parabiose foram vidade dos mesmos, o que diminui a liberação de
realizados com camundongos das linhagens ob/ NPY e AgRP. Nessa condição, a leptina estimula a
ob e db/db (obesos) e normais (Zhang et al., 1994). atividade dos neurónios anorexígenos, o que leva ao
Quando a circulação sanguínea dos camundongos aumento da libertação de alfa-MSH e CART, levan-
ob/ob foi ligada com a dos camundongos normais e do à diminuição do consumo alimentar. Quando há
db/db, observou-se que os primeiros emagreceram. diminuição na concentração plasmática de leptina,
Além disso, os camundongos normais emagrece- os neurónios anorexígenos não são estimulados e os
ram quando tiveram a circulação sanguínea ligada a neurónios orexígenos deixam de ser inibidos, oca-

376 Revista de Ciências Agrárias, 2014, 37(4): 375-383


Figura 1 – Mecanismo de ação da leptina na regulação do consumo alimentar.

Figura 2 – Controle da leptina pelo sistema nervoso central (SNC) na regulação


do consumo alimentar e do metabolismo energético (Ribeiro et al., 2007).

sionando o aumento do consumo alimentar (Ribeiro reações hormonais em que o NPY é o principal agen-
et al., 2007; Figura 2). te destas reações. Nessa condição, a leptina é consi-
Portanto, a leptina não tem ação direta na regulação derada um sinalizador da condição corporal.
do consumo alimentar, mas age por uma cascata de

Kowalski et al., Leptina e grelina na produção de ruminantes 377


Figura 3 – Cascata hormonal estimulada pela leptina quando o animal possui condição
corporal adequada para a reprodução. Adaptado de Monteiro et al. (2010)

Reprodução Imunidade
A maioria dos estudos que relacionam a leptina com A função da leptina na imunidade ainda não é total-
a reprodução foi realizada em humanos e camun- mente compreendida. Acredita-se que os receptores
dongos. Sabe-se que a leptina atua na sinalização da da leptina sejam da família das citocinas de classe I,
condição corporal, o que acarreta no início ou não que estão relacionadas com o aumento da atividade
da puberdade ou do ciclo reprodutivo. As funções fagocitária dos macrófagos. Além de regular a ativi-
desta hormona na reprodução de ruminantes ainda dade dos macrófagos, a leptina induz a proliferação
são pouco conhecidas. e diferenciação das células do sistema imunitário
O início da puberdade está intimamente ligado à (Matarese et al., 2005; Agarwal et al., 2009).
ingestão de alimento, taxa de crescimento e adipo- Indivíduos com baixa quantidade de tecido adi-
sidade (Williams et al., 2002). Esses três fatores estão poso apresentam, consequentemente, baixas con-
relacionados à concentração plasmática de leptina. centrações plasmáticas de leptina. Nessa condição,
A principal função da leptina na reprodução é sina- pode haver redução na resposta imune das células
lizar a condição corporal (Monteiro et al., 2010). Em Th1, o que aumenta a susceptibilidade a infecções.
animais com condição corporal inadequada, o GnRH Indivíduos obesos apresentam elevadas quantida-
apresenta pulsos de baixa frequência e de baixa am- des de tecido adiposo e, assim, altas concentrações
plitude, levando à falha no atraso da puberdade em plasmáticas de leptina, o que leva à diminuição da
animais jovens e no ciclo reprodutivo de animais responsta à leptina. Nestes indivíduos podemos en-
adultos. Animais magros apresentam baixa quanti- contrar resposta imune desregulada, com alteração
dade de gordura corporal, o que leva à baixa síntese do balanço de células Th1/Th2, o que pode acarretar
e libertação de leptina no plasma. Esta aumenta à uma maior susceptibilidade a infecções e respostas
medida que ocorre aumento da deposição de tecido inflamatórias anormais (Matarese et al., 2005).
adiposo e do tamanho e/ou número de adipócitos. Qualidade de carcaça
O NPY é o mediador primário da leptina no hipo- Devido aos mecanismos de ação da leptina e ao seu
tálamo, onde altas concentrações de leptina inibem local de produção, alguns estudos têm procurado
o NPY e estimulam a Kisspeptina (Kiss 1), ocasio- correlacionar a concentração plasmática deste hor-
nando a secreção de GnRH com maior frequência e mona com características de qualidade de carcaça.
amplitude (Negrão e Licino, 2000; Quintero e Cortez, Segundo Geary et al. (2003), a concentração plasmá-
2008; Monteiro et al., 2010; Figura 3). tica de leptina tem correlação positiva com escore de

378 Revista de Ciências Agrárias, 2014, 37(4): 375-383


marmorização, espessura de gordura subcutânea, com a deposição de gordura. Segundo Buchanan et
grau de deposição de músculo , gordura renal, pél- al. (2003), o alelo T tem relação com o aumento da
vica e cardíaca, sendo indicada para prever a qua- deposição de gordura corporal. Porém, sabe-se que
lidade de carcaça em bovinos. Porém, num estudo o maior depósito de gordura corporal tem correla-
realizado por Gillis et al. (2004) com bovinos de cor- ção com a quantidade de gordura no leite, princi-
te mostrou que a concentração plasmática de leptina palmente em vacas no início de lactação. Os mes-
não tem correlação com as características qualitati- mos resultados foram observados por Sadeghi et al.
vas da carcaça como: gordura subcutânea, área de (2008), onde houve acréscimo de gordura e proteína
olho de lombo, gordura renal, pélvica ou cardíaca. no leite nos animais com homozigose para o alelo T
Nesse estudo, os autores não indicaram a concen- do gene da leptina (Quadro 1).
tração plasmática de leptina como parâmetro para Outra função da leptina na melhoria da qualidade
prever a qualidade da carcaça. do leite é sua ação sobre a contagem de células so-
Nkrumah et al. (2005) avaliaram dois tipos de poli- máticas (CCS). Segundo Bernotiene et al. (2006), há
morfismo do gene da leptina (UASMS2 e UASMS3) um aumento da leptina circulante quando o animal
em bovinos de corte. Os animais com o polimorfis- se encontra em processos inflamatórios e/ou infec-
mo foram divididos de acordo com os genótipos ciosos. Por este motivo, Kulig et al. (2010) pesquisa-
que possuíam, sendo eles TT, CT e CC. Observou-se ram a influência da leptina na CCS, pois sabe-se que
correlação entre os genótipos de leptina e caracte- o aumento da CCS indica mastite. Nesta pesquisa os
rísticas qualitativas da carcaça. Segundo os autores, autores relataram que os polimorfismos nos genes
animais com genótipo TT dos polimorfismos de lep- R4C CC e Sau3AI TT da leptina levaram à diminui-
tina apresentam qualidade de carcaça superior aos ção da CCS em vacas Jersey, o que originou melho-
animais com genótipos CT ou CC. Os animais TT ria da qualidade do leite.
apresentaram valores 39% superiores em concen-
tração plasmática de leptina, 31% a 39% superiores
em espessura de gordura e 9% a 13% superiores em Grelina
escore de marmoreio.
Qualidade do Leite Estudos envolvendo produção animal e grelina são
A melhoria da qualidade do leite mediada pela lep- praticamente inexistentes. Porém nesta revisão vale
tina também depende da seleção de animais com abordar o tema, pois a grelina tem papel importante
polimorfismos desejáveis. Dentre estes polimor- na regulação do consumo alimentar, uma vez que
fismos, sabe-se que os genótipos C e T têm relação age em conjunto com a leptina.

Quadro 1 – Produção de leite, gordura e proteína no leite de vacas Holandesas com diferentes genótipos de leptina

Genótipos de Leptina
Características
TT (n = 29) TC (n = 56) CC (n = 49)

Produção de leite (kg) 517,9 ± 72,2 a 358,2 ± 52,9 b 277,5 ± 57,2 b

Produção de gordura (kg) 11,0 ± 1,5 a 6,9 ± 1,1 b 6,8 ± 1,2 b

Produção de proteína (kg) 10,4 ± 1,6 a 5,4 ± 1,2 b 6,6 ± 1,3 b

Médias seguidas por letras diferentes na mesma linha diferem pelo teste de Tukey-Kramer (P<0,05). Adaptado de Sadeghi et
al. (2008)

Kowalski et al., Leptina e grelina na produção de ruminantes 379


Histórico et al. (2004) avaliaram as concentrações plasmáticas
Os primeiros estudos com a grelina foram reali- de grelina em humanos com índice de massa corpo-
zados no final da década de 1990 por Kojima et al. ral (IMC) baixo (IMC<18,5), normal (18,5≤IMC<25)
(1999), sendo assim, sua descoberta é mais recente e elevado (IMC≥25). As concentrações de grelina fo-
que a da leptina. O nome grelina tem origem proto- ram elevadas em indivíduos com baixo IMC, apre-
-indo-européia, onde Ghre corresponde no inglês à sentando média de 340 pg/mL de grelina e baixa em
grow, crescimento. O nome deriva do importante indivíduos com elevado IMC, apresentando média
papel que a grelina exerce estimulando a hormona de 70 pg/mL de grelina. Comprovou-se assim que
do crescimento (GH), sendo esta a sua primeira fun- a grelina pode estimular e/ou inibir o consumo de
ção conhecida. alimento em função do tamanho corporal do indi-
A grelina é uma hormona proteica formada por 28 víduo.
aminoácidos e sintetizada principalmente na mu-
cosa estomacal pelas células GR, podendo ser pro- Secreção de GH
duzida em menor quantidade no sistema nervoso A grelina é um dos principais estimulantes da secre-
central, rins, placenta e coração (Kojima et al., 1999; ção de GH. Após ser produzida nas células da mu-
Gualillo et al., 2001). São conhecidas várias funções cosa estomacal (principal local de síntese), a grelina
da grelina em humanos, dentre elas podemos citar i) é libertada na circulação sanguínea e atinge a hipó-
a regulação de secreções de GH, lactotrófica e corti- fise. Nesta glândula, a grelina liga-se aos receptores
cotrófica; ii) o controle da atividade orexígena (estí- secretagogos GHS-R, estimulando a secreção de GH
mulo do consumo de alimento), do gasto energético, (Seoane et al., 2004).
da secreção gástrica e da motilidade gástrica; iii) a A maioria dos estudos que avaliaram a função da
influência na função endócrina pancreática, no me- grelina na regulação da secreção de GH foram rea-
tabolismo da glicose e nas ações cardiovasculares e lizados visando a medicina humana. Porém, é pro-
iv) o efeito antiproliferativo em células neoplásicas vável que esta função seja semelhante em animais e
(Caminos et al., 2002; Seoane et al., 2004; Vilande Jú- humanos.
nior et al., 2012).

Regulação do consumo alimentar Leptina e Grelina


O aumento da concentração plasmática de grelina A função de maior interesse na produção animal
ocorre principalmente antes da alimentação e/ou que envolve a leptina e a grelina é o consumo ali-
em condições de restrição alimentar, o que leva ao mentar. As duas hormonas apresentam funções an-
estímulo do consumo alimentar. Após a ingestão de tagónicas, dado que a grelina estimula os neurónios
alimento, estimulada pelo aumento da concentração orexígenos, principalmente o NPY, e a leptina depri-
plasmática de grelina, ocorre diminuição do gasto me os neurónios orexígenos e estimula os neurónios
energético e aumento das reservas energéticas, sen- anorexígenos. Desta forma, a leptina estimula a sa-
do assim considerado uma hormona anabólica (Vi- ciedade e a grelina estimula o consumo de alimento
lande Júnior et al., 2012). (Figura 4).
A grelina, assim como a leptina, atua no núcleo ar- A influência que estas hormonas exercem na re-
queado do hipotálamo afim de regular o consumo produção também é importante para a produção
alimentar. Conforme descrito anteriormente, exis- animal. Sirotkin e Meszarosová (2009) avaliaram a
tem dois grupos de neurónios, os orexígenos (NPY influência da leptina e da grelina nas células da gra-
e AgRP) e os anorexígenos (CART e alfa-MSH de- nulosa do ovário de porcas. Houve efeito antagóni-
rivado da POMC). Quando a concentração plasmá- co destas hormonas sobre a apoptose das células da
tica de grelina aumenta, os neurónios orexígenos granulosa, onde a leptina estimulou e a grelina ini-
são estimulados, principalmente o NPY, o que leva biu a apoptose. Já a proliferação de células e a secre-
o animal a alimentar-se. Além disso, o aumento da ção de progesterona foram estimuladas por ambos
concentração plasmática da grelina ocasiona a di- os hormonas. Concluiu-se que a leptina e a grelina
minuição das concentrações plasmáticas de leptina podem atuar em conjunto e apresentar papel impor-
e insulina. Portanto, a leptina e a grelina são hor- tante no desempenho reprodutivo dos animais.
monas que têm ações antagónicas na regulação do
consumo alimentar (Cummings et al., 2001; Tschöp
et al., 2001; Vilande Júnior et al., 2012). Considerações Finais
As concentrações plasmáticas de grelina apresen- Estudos realizados com ruminantes mostram que a
tam relação inversa com a massa corporal. Seoane leptina atua em funções importantes relacionadas

380 Revista de Ciências Agrárias, 2014, 37(4): 375-383


Figura 4 – Ação da leptina e da grelina na regulação do consumo alimentar

com as características de produção, como a quali- role of leptin in innate and adaptive immune
dade do leite e da carcaça, estímulo à reprodução responses. Arthritis Research & Therapy, vol. 8, p.
e melhoria na resposta imune. Além disso, os po- 217-226.
limorfismos do gene da leptina têm potencial para Buchanan, F.C.; Van Kessel, A.G.; Waldner, C.;
serem utilizados na seleção de animais com caracte- Christensen, D.A.; Laarveld, B. e Schmutz, S.M.
rísticas produtivas superiores. (2003) - Hot topic: An association between a lep-
Embora tenha sido pouco estudado em animais tin single nucleotide polymorphism and milk
domésticos, a grelina é uma hormona que atua em and protein yield. Journal of Dairy Science, vol. 86,
conjunto com a leptina na regulação do consumo p. 3164-3166.
alimentar e na reprodução. Ainda, a sua função re- Caminos, J.E.; Seoane, L.M.; Tovar, S.A.; Casanueva,
lacionada com o controle da secreção de GH torna a F.F. e Dieguez, C. (2002) - Influence of thyroid
grelina uma hormona de grande importância para status and growth hormone deficiency on ghre-
a fisiologia animal. Assim, os seus mecanismos de lin. European Journal of Endocrinology, vol. 147, p.
ação relacionados com estas três funções - consumo 159–163.
alimentar, reprodução e secreção de GH - devem Campfield, L.A.; Smith, F.J.; Guisez, Y.; Devos, R. e
ser esclarecidos em ruminantes, uma vez que este Burn, P. (1995) - Recombinant mouse OB protein:
conhecimento poderá viabilizar o desenvolvimento evidence for a peripheral signal linking adiposi-
de novas alternativas de criação que visem explorar ty and central neural networks. Science, vol. 269,
o potencial produtivo destes animais. p. 546-549.
Cano, M.P.G.; Van Nieuwenhove, C.; Chaila, Z.; Ba-
zán, C. e González, S. (2009) - Effects of short-
Referências bibliográficas -term mild calorie restriction diet and renutrition
with ruminant milks on leptin levels and other
Agarwal, R.; Rout, P.K. e Singh, S.K. (2009) - Leptin: metabolic parameters in mice. Nutrition, vol. 25,
a biomolecule for enhancing livestock producti- p. 322-329.
vity. Indian Journal of Biotechnology, vol. 8, n. 2, Ceddia, R.B.; William Jr., W.N.; Lima, F.B.; Carpi-
p.169-176. nelli, A.R. e Curi, R. (1998) - Pivotal role of leptin
Bernotiene, E.; Palmer, G. e Gabay, C. (2006) - The in insulin effects. Brazilian Journal of Medical and

Kowalski et al., Leptina e grelina na produção de ruminantes 381


Biological Research, vol. 31, p. 715-722. Acta Veterinaria BRNO, vol. 79, p. 237-242.
Chilliard, Y.; Bonnet, M.; Delavaud, C.; Faulconnier, Matarese, G.; Moschos S. e Mantzoros C.S. (2005) –
Y.; Leroux, C.; Djiane, J. e Bocquier, F. (2001) - Leptin in immunology. J. Immunol., vol. 174, p.
Leptin in ruminants. Gene expression in adipose 3137-3142.
tissue and mammary gland, and regulation of Monteiro, C.D.; Bicudo, S.D. e Toma, H.S. (2010) -
plasma concentration. Domestic Animal Endocri- Puberdade em fêmeas ovinas. PUBVET, vol. 4, n.
nology, vol. 21, n. 4, p. 271-295. 21, art. 856.
Coleman, D.L. (1973) - Effects of parabiosis of obese Negrão, A.B. e Licinio, J. (2000) - Leptina: o diálogo
with diabetes and normal mice. Diabetologia, vol. entre adipócitos e neurónios. Arquivo Brasileiro de
9, p. 294-298. Endocrinologia e Metabolismo, vol. 44, n. 3, p. 205-
Cummings, D.E.; Purnell, J.Q.; Frayo, R.S.; Schmi- 214.
dova, K.; Wisse, B.E. e Weigle, D.S. (2001) - Pre- Nkrumah, J.D.; Li, C.; Yu, J.; Hansen, C.; Keisler,
prandial rise in plasma ghrelin levels suggests a D.H. e Moore, S.S. (2005) - Polymorphisms in
role in meal initiation in humans. Diabetes, vol. the bovine leptin promoter associated with se-
50, p. 1714-1719. rum leptin concentration, growth, feed intake,
Friedman, J.M.; Halaas, J.L. (1998) - Leptin and the feeding behavior, and measures of carcass merit.
regulation of body weight in mammals. Nature, Journal of Animal Science, vol. 83, p. 20-28.
vol. 395, p. 763-770. Quintero, J.C. e Cortez, Z.T.R. (2008) - Efectos de la
Geary, T.W.; McFadin, E.L.; MacNeil, M.D.; Grings, leptina en el inicio de la pubertad en animales
E.E.; Short, R.E.; Funston, R.N. e Keisler, D.H. machos. Revista Colombiana de Ciências Pecuárias,
(2003) - Leptin as a predictor of carcass compo- vol. 21, p. 97-108.
sition in beef cattle. Journal of Animal Science, vol. Ribeiro, S.M.L.; Santos, Z.A.; Silva, R.J.; Louzada, E.;
81, p. 1-8. Donato Junior, J. e Tirapegui, J. (2007) - Leptina:
Gillis, M.H., Duckett, S.K.; Sackmann, J.R.; Realini, Aspectos sobre o balanço energético, exercício
C.E.; Keisler, D.H. e Pringle, T.D. (2004) - Effects físico e amenorréia do esforço. Arquivo Brasilei-
of supplemental rumen-protected conjugated li- ro de Endocrinologia e Metabolismo, vol. 51, n. 1, p.
noleic acid or linoleic acid on feedlot performan- 11-24.
ce, carcass quality, and leptin concentrations in Sadeghia, M.; Babaka, M.M.S.; Rahimia, G. e Javare-
beef cattle. Journal of Animal Science, vol. 82, p. mia, A.N. (2008) - Effect of leptin gene polymor-
851-859. phism on the breeding value of milk production
Gualillo, O.; Caminos, J.; Blanco, M.; Garcìa-Cabal- traits in Iranian Holstein. Animal, vol. 2, n. 7, p.
lero, T.; Kojima, M.; Kangawa, K.; Dieguez, C. e 999-1002.
Casanueva, F. (2001) - Ghrelin, a novel placental- Salman, A.K.D. e Costa, R.B. (2006) - Ação hormonal
-derived hormone. Endocrinology, vol. 142, n. 2, da leptina em ruminantes. Documentos 107. Porto
p. 788-94. Velho-RO: Embrapa Rondônia.
Houseknecht, K.L., Heuvel, J.P.V., Moya-Camarena, Schwartz, M.W.; Baskin, D.G.; Bukowski, T.R.; Kui-
S.Y., Portocarrero, C.P., Peck, L.W., Nickel, K.P. jper, J.L.; Foster, D.; Lasser, G.; Prunkard, D.E.;
e Belury, M. (1998) Dietary conjugated linoleic Porte Júnior, D.; Woods, S.C.; Seeley, R.J. e Wei-
acid normalizes impaired glucose tolerance in gle, D.S. (1996) - Specificity of leptin action on
the Zucker diabetic fa/fa rat. Biochem. Biophys. elevated blood glucose levels and hypothalamic
Res. Commun., vol. 244, p. 678-682. neuropeptide Y gene expression in ob/ob mice.
Hausman, G.J.; Barba, C.R. e Lents, C.A. (2012) - Diabetes, vol. 45, n. 4, p. 531-535.
Leptin and reproductive function. Biochimie, vol. Seoane, L.M.; Lage, M.; Al-Massadi, O.; Diéguez, C
94, p. 2075-2081. e Casanueva, F.F. (2004) - Papel de la Ghrelina
Hervey, G.R. (1959) - The effects of lesions in the hy- en la fisiopatología del comportamiento alimen-
pothalamus in parabiotic rats. Journal Physiology, tario. Revista de Medicina de la Universidad de Na-
vol. 145, p. 336-352. varra, vol. 48, n. 2, p. 11-17.
Kojima, M.; Hosoda, H.; Date, Y.; Nakazato, M.; Sirotkin, A.V. e Meszarosová, M. (2010) - Compa-
Matsuo, H. e Kangawa, K. (1999) - Ghrelin is a rison of effects of leptin and ghrelin on porcine
GH releasing acylated peptide from stomach. ovarian granulosa cells. Domestic Animal Endocri-
Nature, vol. 402, p.656 – 660. nology, vol. 39, p. 1–9.
Kulig, H.; Kmieć, M. e Wojdak-Maksymiec, K. (2010) Tschöp, M,; Weyer, C.; Tataranni, P.A.; Devana-
- Associations between leptin gene polymorphis- rayan, V.; Ravussin, E. e Heiman, M.L. (2001)
ms and somatic cell count in milk of Jersey cows. - Circulating ghrelin levels are decreased in hu-

382 Revista de Ciências Agrárias, 2014, 37(4): 375-383


man obesity. Diabetes, vol. 50, p. 707-709.
Vilande Júnior, A.V.; Gomes, C.F.; Allgayer, N e
Lara, G.M. (2012) - A grelina e sua contribuição
para obesidade e diabetes mellitus tipo 2. Revista
Conhecimento Online, vol. 2.
Williams, G.L.; Amstalden, M.; Garcia, M.R.; Stanko,
R.L.; Nizielski, S.E.; Morrison, C.D. e Keisler,
D.H. (2002) - Leptin and its role in the central re-
gulation of reproduction in cattle. Domestic Ani-
mal Endocrinology, vol. 23, p. 339-349.
Zhang, Y.; Proenca, R.; Maffei, M.; Barone, M.; Le-
opold, L.; e Friedman, J.M. (1994) - Positional
cloning of the mouse obese gene and its human
homologue. Nature, vol. 372, p. 425-32.

Kowalski et al., Leptina e grelina na produção de ruminantes 383

View publication stats

Você também pode gostar