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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DE SÃO GOTARDO

FACULDADE DE CIÊNCIAS GERENCIAIS DE SÃO GOTARDO

ISABELLA BARCELOS RESENDE

HISTÓRIA DO DIREITO

SÃO GOTARDO
2022
ISABELLA BARCELOS RESENDE

HISTÓRIA DO DIREITO

Trabalho apresentado à disciplina de História


do Direito, sob a orientação da profa. Gisella
Gonzales.

SÃO GOTARDO
2022
Bloco 1:
1. O que é justiça para Aristóteles? 

A questão da justiça é discutida por Aristóteles no seu livro V da Ética à Nicômaco,


a justiça para ele é o principal fundamento da ordem do mundo, por sua vez, todas as
virtudes estão subordinadas a justiça. Como veremos no presente artigo a justiça em
Aristóteles é indissociável da polis, ou seja, da vida em sociedade. As relações com os
cidadãos da polis que estabelecerão os conceitos de ética e justiça, que por sua vez, serão
internalizados pelos indivíduos.
É em Aristóteles que conheceremos o conceito de equidade e sua importante
utilização como meio de interpretação/aplicação das normas ao caso concreto no momento
de deficiência da norma jurídica devido ao seu grau de universalidade.
Para Aristóteles o homem é um animal político, sendo assim, não vive separado
da polis. A polis grega encarnada na figura do Estado é uma necessidade humana, cuidando
da vida do homem como o organismo precisa cuidar de suas partes vitais. “O homem que
vive completamente sozinho, não é humano: ou é um animal ou é um Deus”, diz Aristóteles.
Contudo para regular a vida em sociedade é necessário a lei, obedecendo aos
critérios de justiça e equidade. Como dizia o Direito Romano, os preceitos jurídicos são
viver honestamente, não lesar a ninguém e dar a cada um o que lhe pertence.
No âmbito jurídico, as primeiras noções de justiça são apresentadas por Aristóteles.
Ele parte do contexto da polis, para definir e conceituar as relações do direito e da lei na vida
social.
No seu livro “Ética a Nicômaco”, Aristóteles desenvolve uma madura teoria da
Justiça, precisamente no Livro V, servindo de base e influencia para muitos juristas até os
dias atuais. Ele correlaciona a justiça com a sua antítese, a injustiça, elaborando assim a
eqüidade, que para ele é a melhor espécie de justiça.

  A justiça e a justiça são relacionadas com o cumprimento e o não-cumprimento


respectivo da lei. “O homem justo é aquele que se conforma à lei e respeita a igualdade;
injusto é aquele que contraria a lei e a igualdade”.
Segundo Aristóteles os atos de bondade estão prescritos na lei, por sua vez, os atos
que vão de encontro a esta, os vícios, é o que se deve repudiar.

-BLOCO 2
5. Qual a estrutura da fórmula? Como funcionava o processo formulário? 

Em Roma, surge um novo modo de impedir as controvérsias entre particulares. Nos


processos privados se empregava o sistema caracterizado pela fórmula. A fórmula é o
escrito, redigido pelo magistrado ”in jure”, com a indicação da questão que o juiz deve
resolver. Neste período, a “actio” pode ser definida como o direito de perseguir pela
fórmula o que nos é devido.

O processo formular assinala um momento culminante na história da vida judiciária


romana, porque só agora a figura do pretor se impõe, para resolver com auxílio da
equidade os casos concretos, antes submetidos ao frio e desumano rigorismo das
formalidades.Ao contrário do sistema anterior, o sistema das ações da lei, caracterizado
pelo excesso de formalismo, agora, diante do magistrado, as partes expõem o que
pretendem, sem palavras determinadas para pronunciar, sem gestos simbólicos para
executar.

É um processo muito mais rápido, menos formalista e escrito.Por causa do excesso de


formalismo, segundo informa Gaio, as ações da lei eram odiadas por todos, sendo, por esse
motivo, substituídas pelas fórmulas.“Litis contestatio” define-se, portanto, como o ato
mediante o qual as partes concordam em submeter a controvérsia, nos termos da fórmula,
ao julgamento de um terceiro.

Como o nome indica e como afirma o erudito Festo, “contestari litem dicuntur duo aut
plures adversarii quod, ordinato judicio, utraque pars dicere solet: testes estote“ (“diz-se
que dois ou mais adversários contestam a lide, quando ordenada a fórmula, ambas as
partes costumam dizer: eis as testemunhas”). De simples fase de apresentação de
testemunhas, depois de organizada a instância, a “litis contestatio” passa a ser a aceitação
pelo réu. Trata-se de verdadeiro contrato judiciário em que o autor dá conhecimento ao réu
da fórmula (edere judicium), lendo-a em voz alta ou remetendo-lhe uma cópia, ao mesmo
tempo que o réu concorda em aceitar o conteúdo transmitido (accipere judicium).

Os meios das provas de que se socorrem as partes são, antes de tudo, as testemunhas, já
conhecidas no antigo direito e conservados no direito clássico. Depois a confissão –
“confessio in judico” - e o denominado “juramento probatório”.Depois de avaliar as
provas fornecidas pelas partes o juiz forma sua convicção e enuncia sua sentença.

O juiz romano difere-se do juiz moderno, funcionário nomeado pelo Estado, dentre
pessoas especializas, que conhecem o direito. Em Roma, o julgador é um particular que,
não conseguindo formar uma ideia exata sobre a controvérsia, pode excluir-se do
julgamento.A sentença é, enfim, o momento culminante da vida jurídica. Nela vai o juiz
dar a cada um o que é seu.

O juiz romano está preso a fórmula, do mesmo modo que o juiz atual está preso à lei. Os
termos da fórmula orientam o juiz, em Roma, podendo-se, nesse sentido, dizer que o
processo formular é ainda um processo formalista.Regra geral, o julgamento compreende
uma decisão do juiz sobra a existência do direito do autor – “pronuntiatio” - seguida de um
cálculo estimativo, em dinheiro – “litis aestimatio”- mas, em caso de confissão, já se passa
a uma “estimatio”, sem julgamento.Decretada a sentença, encerra o juiz sua missão, deixa
mesmo de ser juiz, mas a decisão vai produzir os respectivos efeitos jurídicos.

No moderno direito, a coisa julgada traz em si a presunção de verdade, fazendo lei entre as
partes, desde que haja identidade de coisa e de pessoas. Tal princípio de autoridade da
coisa julgada, essencial em nossos dias, impede que uma questão, decidida pelo juiz, seja
outra vez examinada, o que não se dava no direito romano.

No período republicano, em princípio, não se conhecem recursos, tendentes ao reexame


das decisões proferidas, conhecendo-se, porém, certos meios excepcionais dirigidos contra
a sentença. Entre eles, conheciam os romanos a “intercessio”, a“revocatio in duplum” e a
“restitutio in integrum”.Pela “intercessio”, um magistrado da mesma categoria ou superior
àquele que decretou a sentença impedia, por meio de veto, que o ato fosse executado.

Pela “revocatio in dupum”, o réu condenado podia tentar anular a sentença. Se o pedido de
anulação fosse rejeitado, o recorrente teria de pagar o dobro da quantia em que fora, antes,
condenado.Pela “restitutio in integrum”, pedia a parte prejudicada que as coisas voltassem,
inteiramento, ao estado em que se achavam antes do julgamento.

A fórmula, que definimos como o escrito redigido pelo magistrado “in jure”, com
indicação da causa que o juiz deve resolver, é composta de duas partes: uma parte
principal, que é fixa, a mesma para todos os casos; uma parte acessória, móvel, que varia
segundo os casos. Qualquer alteração na primeira parte anula a fórmula, porque atenta
contra o princípio formalista.

Mediante o “imperium”, poder de ordenar ou de proibir certos atos, têm magistrados


romanos a faculdade de intervir nos litígios entre os particulares. Podem aplicar interditos,
ordenar que se celebrem estipulações pretorianas, interferir nos casos de “restituciones in
integrum”.“Estipulações pretorianas” são as promessas verbais impostas pelo pretor que
deseja fazer nascer um vínculo de obrigação entre duas pessoas, num certo número de
hipóteses previstas pelo edito.“Missio in possessionem” é a ordem dada pelo pretor a uma
pessoa para que tome posse de coisas pertencentes a outra pessoa. Encontramos exemplos
de “missio in possessionem”, em matéria de citação e de execução como medida de
precaução destinada a evitar que o devedor dilapide o patrimônio em detrimento do credor.

- Bloco 3
5). Qual a relação entre a lei e o Direito, para Santo Tomás de Aquino?
Assim como Santo Agostinho, São Tomás de Aquino acreditava na existência de uma
Lei advinda de Deus e outra advinda dos homens. Dessa forma, para o autor, a divisão de
Leis seria a seguinte:

Lei eterna: É a lei de Deus, sendo perfeita e eterna. O homem, por ter cometido o
pecado original, não teria acesso à essa lei. Contudo, Deus, por seu caráter misericordioso,
nos daria duas formas de conhecer a lei eterna, sendo:

Leis Divinas: São os textos sagrados que contém a palavra de Deus. Devem ser
interpretadas para se chegar à lei eterna.

Lei Natural: são leis descobertas pela razão. Raciocinar corretamente é chegar à lei
Eterna. A lei natural é a participação do ser racional na lei eterna.

Leis Humanas: São as leis criadas pelos humanos para viver em sociedade. Entretanto,
para serem minimamente justas, devem refletir, de certa forma, a lei eterna.

São Tomás de Aquino acredita que tudo tem um fim, e do ponto de vista do cidadão, o
fim é a vida política (devemos lembrar que Aristóteles dizia que o fim do ser humano era a
felicidade, obtida através da vida política). Entretanto, Aristóteles, por ser pagão, não
percebia que o fim com relação ao cidadão não era o único. Dessa forma, São Tomás dizia
existir o “fim” do ponto de vista da pessoa. Esse fim seria a salvação, a vida eterna. Assim,
para São Tomás de Aquino, o fim do cidadão é um meio para o fim da pessoa, pois um
cidadão justo merece a vida eterna.

BLOCO 4:

4. Quais críticas ao conceito de lei natural são feitas por Rousseau? 

É a tradição do direito natural que Rousseau combate. A justiça, como já foi dito, não é para
o genebrino natural. Ele divide em duas partes a sua objeção. A primeira parte do argumento
emana diretamente da premissa rousseauneana da falta de sociabilidade do homem: porque a
razão não pode ser desenvolvida sem a sociedade e a linguagem, o homem natural e solitário
não podia conhecer absolutamente nenhuma lei racional da natureza, nem ser submetido a
nenhuma lei deste gênero. Se Rousseau afirma que não há lei natural no estado de natureza,
isto é, código moral obrigatório no qual os homens poderiam e deveriam conscientemente se
submeter, ele sustenta, porém, que há um direito natural, qual seja, um modo natural de se
relacionar uns com os outros, mediante o qual os homens se conformam cega e
instintivamente.

Nesse sentido, de suas inclinações fundamentais à sua própria conservação e à piedade, os


homens naturais obedeciam, sem saber, ao que Rousseau chama a "máxima da bondade
natural" ("Fais ton bien avec le moindre mal d’autrui qu’il est possible"). Mas o
desenvolvimento da razão, aumentando as paixões e enfraquecendo a piedade, destrói o
direito natural. Além disso, mesmo que concedêssemos a Pufendorf que o homem era
sociável e plenamente racional no estado de natureza, a dificuldade permaneceria. Para
Rousseau, os modernos só reconhecem como lei uma regra prescrita a um ser moral, isto é,
inteligente, livre e considerado nas suas relações com os demais seres, limitando
consequentemente ao único animal dotado de razão, isto é, ao homem, a competência da lei
natural; definindo, porém, esta lei cada um a seu modo, estabelecem tudo sobre princípios
tão metafísicos que há, mesmo entre nós, muito poucas pessoas em situação de compreender
esses princípios, em lugar de poderem encontrá-los por si mesmos.

De forma que todas as definições desses homens sábios, aliás em perpétua contradição entre
si, concordam unicamente quanto a ser impossível compreender a lei da natureza e,
consequentemente, obedecê-la, sem ser grande pensador e profundo metafísico. Tal coisa
significa, precisamente, que os homens tiveram de utilizar, para o estabelecimento da
sociedade, luzes que só se desenvolvem com muito trabalho e para poucas pessoas, no
próprio seio da sociedade.

Ora, Rousseau afirma que nas etapas ulteriores do estado de natureza a razão é efetivamente
desenvolvida, desenvolvimento concomitante com o aumento dos desejos e a constituição da
sociedade não política. Teoricamente, porém, os homens estão na posição de elaborar uma
concepção racional da justiça ou do bem comum. Todavia, constatamos "que o progresso da
sociedade abafa a humanidade nos corações, despertando o interesse pessoal, e que as noções da
lei natural (...) não começam a se desenvolver senão quando o desenvolvimento anterior das
paixões torna impotentes todos os seus preceitos".

Uma vez alcançado o pleno desenvolvimento da razão, o estado de natureza de Rousseau torna-se
essencialmente o mesmo de Hobbes, um "estado de guerra absolutamente horrível"; e neste
ponto, a sua objeção à lei natural é igualmente a mesma do pensador inglês. Rousseau imagina o
homem no estado de natureza assim descrito: Com a voz abafada pelo sábio, o indivíduo
independente diz: ‘Tenho consciência de que trago horror e confusão à espécie humana, mas é
preciso que eu seja infeliz se evito fazer com que os outros o sejam, e ninguém me é mais caro do
que eu próprio. Em vão tentaria conciliar o meu interesse com o dos outros. Tudo o que ouço sobre
as vantagens da lei social estaria bem se, quando a observassem escrupulosamente com respeito
aos outros, tivesse a certeza de que todos a observariam com relação à minha pessoa.

Mas, que garantia disso posso ter? E haveria pior situação para mim do que me expor a todos os
males que os indivíduos mais fortes poderiam fazer-me sem ousar compensar-me com relação aos
mais fracos? Se não tenho uma garantia contra todas as ações injustas, não se pode esperar que
deixe de praticá-las também. Em vão me dizem que ao renunciar aos deveres imposto pela lei
natural desprezo ao mesmo tempo os seus direitos; que a minha violência justificará todas as
violências que os outros poderiam praticar contra mim. Estou propenso a concordar, mas não
posso entender de que forma a minha moderação poderia proteger-me. Além disso, deverei fazer
com que os fortes se aliem a mim, compartilhando com eles os despojos dos fracos, o que seria
melhor do que a justiça, tanto em termos de vantagem como de segurança’.

É naturalmente prejudicial conformar-se às regras de "justiça", pois são regras desprovidas de toda
sanção natural. Por conseguinte, estas regras não são nem obrigatórias, nem válidas. Em última
instância, Rousseau rejeita o compromisso da lei natural adotado por Pufendorf, Diderot e outros
autores. Segundo este compromisso, a justiça é natural e o Estado é artificial. Rousseau mostra que
a pretensa lei natural conhecida e observada no estado de natureza "é uma verdadeira quimera;
pois as condições são sempre desconhecidas ou impraticáveis, e que é preciso necessariamente
ignorá-las ou infringi-las".

Nesse sentido, a crítica de Rousseau realmente alcança, de maneira bastante mordaz, a literatura
contratualista moderna. Não se pode deduzir algo de nada. O papel dos projetos abstratos é muito
menor, e o dos projetos empíricos controversos muito maiores, do que os teóricos desse campo
estão dispostos a admitir. Nunca houve um contrato social, e aqueles que recorrem a uma ideia de
homem natural ou pré-político como criador das instituições políticas expressa, invariavelmente,
uma versão da falácia que Rousseau atribuía a Hobbes: a de reificar aspectos do comportamento e
das instituições aceitos de sua época, atribuindo-os ao homem "natural".

BLOCO 5

1) Quais as mudanças no modo de pensar e de ver o mundo que se operaram no


contexto
dos séculos XVII e XVIII? Descreva, de uma maneira geral, as transformações
ocorridas no pensamento científico, no meio político e na concepção da ideia de
homem e de sociedade (como o homem passou a se ver, e como a sociedade passou a
ser entendida).

O conhecimento humano estava muito atrelado ao modo de concepção da vida que a


religiosidade propagava. A ciência, por sua vez, estava muito atrelada à Filosofia e possuía
suas restrições. Mas o florescer de novas concepções a partir do século XV permitiu uma
reformulação no modo de se constatar as coisas. A nova forma de pensar, comprovar e,
principalmente, fazer ciência prosperou-se intensamente em um período que se prolongou
até o fim do século XVI.
A Revolução Científica tornou o conhecimento mais estruturado e mais prático, absorvendo
o empirismo como mecanismo para se consolidar as constatações. Esse período marcou uma
ruptura com as práticas ditas científicas da Idade Média, fase em que a Igreja Católica ditava
o conhecimento de acordo com os preceitos religiosos. Embora na época tenha havido
grande movimentação com a divulgação de novos conhecimentos e novas abordagens sobre
a natureza e o mundo, o termo Revolução Científica só foi criado em 1939 por Alexandre
Koyré.

Diversos movimentos sociais, culturais e religiosas prestaram suas valiosas contribuições


para o incremento da Revolução Científica. Aquele era o período do Renascimento, uma
fase que pregava a volta da cultura Greco-romana e propagava a mudança de orientação do
teocentrismo para o antropocentrismo. Outra característica era o humanismo, uma corrente
de pensamento interessada em um pensamento mais crítico e, principalmente, valorizava
mais os homens. Tais abordagens mudaram muito o pensamento humano.

A ciência ganhou muitas novas ferramentas. Passou a ser mais aceita e vista como
importante para um novo tipo de sociedade que nascia. As comprovações empíricas
ganharam espaço e reduziram as influências das influências místicas da Idade Média. O
conhecimento ganhou impulso para ser difundido com a invenção de Joahannes Gutenberg,
a imprensa. A capacidade de reproduzir livros com exatidão e espalhá-los por vários lugares
foi fundamental para a Revolução Científica na medida em que restringia as possibilidades
de releituras e interpretações equivocadas dos escritos.

O modo místico da Igreja Católica de determinar o conhecimento perdeu ainda mais espaço
com a Reforma Protestante. Os reformistas eram favoráveis à leitura da Bíblia em todas as
línguas e também acreditavam que as descobertas da ciência eram válidas para apreciar a
existência de Deus.
Em meio a toda essa efervescência favorável à Revolução Científica, o hermetismo também
apresentou sua parcela de contribuição para o progresso do conhecimento. Usando idéias
quase mágicas, apoiava-se e incentivava no uso da matemática para demonstrar as verdades.
Com um novo horizonte, a matemática ganhou espaço e se desenvolveu com grande
relevância para o desenvolvimento de um método científico mais rigoroso e crítico.

BLOCO 6

7) É correto afirmar que o sistema de Súmulas (do STF e do STJ) tem raiz na ideia de
fixação de precedentes do sistema Common Law?

Como se sabe, o Brasil, assim como os demais países de origem latina e germânica, desde os
primórdios deteve um sistema judicial baseado no Civil Law, que se caracteriza pela
aplicabilidade de uma norma positivada através de processo legislativo em decisões
judiciais. Neste tipo de sistema não há uma preocupação de que decisões judiciais gerem
efeitos vinculantes a casos futuros, revestindo-se, tais decisões, tão somente em fonte
secundária de aplicação em julgamentos posteriores.

É bem verdade que a adoção do Brasil pelo sistema de Civil Law não é estritamente
vinculante e, com o passar dos anos, laços cada vez mais íntimos têm aproximado o
ordenamento jurídico brasileiro e o sistema Common Law. Há um bom tempo, especulações
são ventiladas no meio jurídico no sentido de que nosso direito pátrio caminha a passos
largos em direção ao sistema de Common Law, sendo este, sistema judicial baseado,
fundamentalmente, na aplicação de precedentes jurisprudenciais, adotado em países de
colonização inglesa.

Neste "caminho", com o passar do tempo, medidas legislativas foram implementadas no


ordenamento jurídico brasileiro, como a possibilidade de edição de súmulas vinculantes do
Supremo Tribunal Federal introduzidas ao texto constitucional em 2004, e a previsão de
julgamento de recursos pelos tribunais superiores com repercussão geral reconhecida, nos
moldes dos artigos 543-B e 543-C do Código de Processo Civil/73, em 2006.

De se ressaltar que desde a edição de mencionados atos normativos, súmulas vinculantes e


julgamento de recursos com repercussão geral, muitas polêmicas se acumularam em
discussões de juristas e magistrados, como por exemplo afirmações de que sua utilização
impactaria em eventuais violações ao princípio do livre convencimento dos magistrados.
Discussões que permeiam debates atuais, pelo menos em círculos acadêmicos.

Na esteira da evolução do sistema judicial brasileiro, com o advento do novo Código de


Processo Civil, lei 13.105/15, um amplo sistema de precedentes vinculantes instituiu a
obrigatoriedade de juízes e tribunais em observarem as decisões firmadas pelos tribunais
superiores (artigo 927 do NCPC), onde em última análise, o termo "observar" do
mencionado dispositivo poderá ser substituído pelo verbo "aplicar", dando contornos de um
sistema baseado em precedentes.

Uma percepção compartilhada atualmente por muitos operadores do direito é a de que em


um tempo não tão distante, meados da década dos anos 2000 mais precisamente, a
jurisprudência brasileira era construída sobre bases sólidas de um direito fundamentalmente
positivista e muito ligada ao que dizia a doutrina sobre determinado assunto. Já nos dias
atuais essa lógica se inverteu, passando a doutrina a se preocupar bastante com o que têm
decidido os tribunais.

Mas seriam estas medidas e sinais, de fato, esforços para transformar o sistema judicial
brasileiro em um sistema preponderantemente ou exclusivamente baseado no Common
Law?

O que se pode afirmar, com toda a certeza, é que os dispositivos já mencionados, foram
criados com o intuito principal de desafogar o sobrecarregado judiciário brasileiro, posto que
demandas cada vez mais repetidas forçam os tribunais superiores à julgarem, intermináveis
vezes, demandas idênticas, provocando trabalho contraproducente e gerando morosidade.

Pode-se dizer que no Common Law, o trabalho dos advogados, grosso modo, pode ser
resumido na tarefa de se demonstrar que o caso de seu cliente é análogo ao de um julgado
favorável dos tribunais superiores, ou, distinto, de modo que um julgado desfavorável não se
aplique. Diferentemente do Civil Law, onde a aplicação de precedentes é considerada, de
forma geral, secundária ou mesmo subsidiária a análise do conjunto de normas aplicáveis ao
caso.

Contudo, mesmo após as já mencionadas alterações legislativas e comportamentais dos


operadores do direito, ainda identificamos decisões conflitantes entre os tribunais superiores
nos julgamentos de recursos alcançados por repercussão geral.

No campo do direito previdenciário, por exemplo, podemos destacar o RESp 1.230.957/RS,


julgado em 2014 no rito do artigo 543-C do CPC/73 pelo STJ, restando sedimentado que a
Contribuição Patronal ao INSS não incide sobre determinadas verbas de caráter
indenizatório, caso do 1/3 constitucional de férias, aviso prévio indenizado e dos auxílios
doença e acidente pagos nos 15 primeiros dias de afastamento. Ocorre que o tema após anos
de discussão e aparente estabilização em nosso ordenamento jurídico, o tema voltou a
preocupar os contribuintes quando o Supremo Tribunal Federal, em março de 2017,  julgou
o RE 565.160, com repercussão geral reconhecida sob o tema de 20, onde procurou-se
delimitar o alcance da expressão "folha de salários".

A depender do que restasse decidido pelo STF, as verbas declaradas pelo STJ como não
integrantes da base de cálculo da contribuição patronal previdenciária, poderiam voltar a ser
consideradas tributáveis, por serem parte integrantes do termo "folha salarial".  O
julgamento, entretanto, acabou se resumindo, a afirmar que compõe a expressão "folha
salarial" aqueles proventos pagos habitualmente aos funcionários, o que, colateralmente, não
impactou o já estabelecido pelo STJ no REsp 1.230.957/RS.

Cabe então, a seguinte reflexão: "Supondo que o julgamento do STF entendesse que as
verbas excluídas da incidência da contribuição patronal ao INSS, pelo STJ, fossem
consideradas como integrantes do termo "folha salarial" e, por consequência integrasse a
base de cálculo da contribuição. Estaríamos diante de um conflito decisório de tribunais
superiores, qual das decisões se sobressairia?"

É certo que o Código de Processo Civil de 1973 não dispunha sobre conflito de decisões
proferidas em recursos representativo de controvérsias ou repetitivos, e que o novo CPC/15
também não o faz em seu artigo 1.036.
Afim de confrontarmos sistemas judiciais, uma comparação entre o sistema judicial
brasileiro e o dos Estados Unidos se mostra pertinente. É que, naquele país, decisões
conflitantes em uma determinada corte estadual são raras e, uma vez demonstradas pelas
partes conflitantes, o tribunal tem o dever de diferenciar um caso do outro, ou ainda, como
exceção, justificar a mudança de posição da corte, inaugurando, desta feita, um novo
precedente.

De maneira distinta dos Estados Unidos, no Brasil, a judicialização de uma questão ou


conflito, muitas vezes, pode ser comparada a um jogo na loteria, tendo em vista que a
depender da vara ou sessão de tribunal a qual o processo for distribuído, ter-se-á uma
decisão favorável ou adversa. Nada é tão claro e previsível como no sistema norte-
americano e isso pode ser interpretado como prejudicial aos jurisdicionados, ao passo que a
previsibilidade, salvo melhor juízo, é capaz de transmitir segurança jurídica.

Uma crítica bastante presente em discussões acadêmicas sobre o sistema judicial brasileiro é
exatamente a falta de segurança jurídica na resolução de conflitos. Princípio constitucional
consagrado pelo artigo 5º de nossa Constituição Federal, por vezes, relativizado ao
constatarmos Tribunais de Justiça decidindo de forma diferente do Superior Tribunal de
Justiça e até mesmo Sessões de julgamento de um mesmo tribunal adotando decisões
distintas para casos semelhantes.

Sobre a segurança jurídica, nos ensina Tereza Arruda Alvim Wambier1, que, esta, está
intimamente ligada à previsibilidade, no sentido de produzir "tranquilidade e serenidade no
espírito das pessoas". É, portanto, a segurança jurídica, um dos maiores pilares de
sustentação de um Estado democrático de direito e indissociável da ideia de previsibilidade.

Novamente nos remetendo ao judiciário dos Estados Unidos, desta feita, traçando um
paralelo entre a atuação de nosso STF e a Suprema Corte Norte Americana, encontramos
uma abissal diferença entre as Cortes no que diz respeito ao volume de processos recebidos
anualmente para julgamento. A Suprema Corte Americana recebe aproximadamente 7.000
pedidos de reanalise de decisões dos Tribunais Inferiores, aceitando julgar cerca de 100 a
150 destes2, enquanto no Brasil o volume de processos atingiu, em 2017, 49.000 casos para
julgamento, segundo dados apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça no "Relatório
Justiça em Números", apresentado em 20183.

Essa grande diferença entre os números apresentados, passa pela aplicação, ou não, de
precedentes judiciais, pois em tese, não há de se julgar tema já julgado anteriormente. Não é
preciso destacar que o alto volume de demandas em trâmite no STF é proporcional nas
instâncias inferiores, pois chega ao tribunal para julgamento apenas parcela do volume de
ações distribuídas em todo o país.

A quantidade massiva de judicialização de conflitos no Brasil tem um custo muito alto aos
cofres públicos. Ainda segundo o mencionado relatório do CNJ, em 2017, as despesas totais
do Poder Judiciário somaram R$ 90,8 bilhões, 4,4% maior frente a 2016, ilustrando de
forma cabal o problema que o país enfrenta e a real necessidade da adoção de medidas reais
que visem o desestímulo à judicialização.

Sopesadas todas as considerações aqui expostas, podemos afirmar que no Brasil, de fato, as
práticas judiciais têm, com o passar do tempo, cada vez mais similitude as práticas adotadas
em um sistema de Common Law. Contudo, não é correto, ao nosso sentir, afirmar que o
ordenamento jurídico brasileiro (doutrina, legislação e jurisprudência) esteja em busca de tal
feito, mas sim que, ao buscar a previsibilidade na resolução de conflitos e, implicitamente, a
segurança jurídica, se aproxima cada vez mais deste sistema baseado em precedentes.

Por fim, respeitadas todas as diferenças práticas entre os sistemas aqui comparados, além de
diferenças culturais, históricas, estruturais e políticas entre o Brasil e os países de
colonização britânica que se utilizam do sistema Common Law, somos capazes de afirmar
que o Brasil utiliza-se de um sistema judicial híbrido com elementos característicos ora do
Civil Law, ora do Common Law.

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