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4.

OS PROCESSOS DE INFLUÊNCIA SOCIAL

O Suicídio-Massacre da Guiana, Jim Jones e o Templo do


povo

Quando as autoridades americanas e soldados chegaram a


Jonestown, três dias depois do suicídio em massa, o cenário não
podia ser mais terrível. Dante Alighieri teria ficado impressionado
com a visão do Inferno em que se transformou a bucólica colónia
agrária do reverendo Jim Jones. Cerca de nove centenas de
corpos, entre homens, mulheres e crianças, em estado de
putrefação, espalhavam-se por toda parte. A maioria encontrava-
se estendida no chão, fora das casas, com o rosto voltado para a
terra.
Muitas famílias estavam unidas num derradeiro abraço. Vários
corpos já tinham sido mutilados por famintos animais selvagens.

Quem foi Jim Jones?


«James Warren Jones, a quem em criança chamaram Jonesie, nasceu em
Lynn no estado de Indiana – EUA. Era filho de um ferroviário que lutara na
Primeira Guerra mundial e de uma dona de casa. A sua cidade natal não era
uma fonte de bons exemplos: Lynn sofria grande influência da Ku Klux Klan,
da qual o pai de Jim era fiel seguidor. Em Lynn, praticamente não existiam
negros. Segundo o próprio Jones, “havia uma lei tácita de que os negros não
podiam deixar que o Sol se pusesse sobre suas cabeças”. Falando sobre si, Jim
Jones afirmou que a sua vocação para ajudar as pessoas começou quando
ainda frequentava o primeiro ciclo do ensino. Nessa altura teria travado um diálogo com um vagabundo
que parara próximo da sua casa e, vendo que o mesmo estava sem esperança e com vontade de se
suicidar, tentou ajudá-lo. Com o auxílio da mãe, Lynetta Jones, conseguiu-lhe roupas, deu-lhe comida e
arranjou-lhe um trabalho. Jones casou-se aos 18 anos com uma enfermeira, Marceline Baldwin, logo
depois de sair da escola secundária. Hesitou entre seguir a carreira médica e a clerical. Estudou para
pastor em Indianápolis e, aos 21 anos, abriu uma pequena igreja ecuménica em 1953, a Assembleia
Cristã da Igreja de Deus. Dez anos mais tarde, mudou o nome da igreja para Igreja do Evangelho do
Templo de Deus. O casal teve oito filhos, sendo sete adotivos, dos quais um negro e um coreano.
Aos trinta anos, quando o «movimento» dos negros nos Estados Unidos começava a ganhar muita
força, Jones foi nomeado diretor da Comissão de Direitos Humanos de Indianápolis. O seu prestígio
cresceu rapidamente. Tornou-se notícia e a sua influência nos meios político, civil e religioso foi
assinalável. Recrutava negros para a sua igreja, pregava a igualdade racial, além de distribuir refeições
para os necessitados.
Durante os anos de 1961 a 1963, Jim Jones mudou radicalmente a sua forma de vida, optando por
um estilo missionário. Mudou-se para Belo Horizonte, no Brasil, onde organizou orfanatos e uma missão
religiosa.
De volta à sua terra natal, em 1964 foi ordenado ministro da Igreja Cristã, uma seita importante, com
cerca de um milhão e 300 mil seguidores.
Insistiu na possibilidade de holocausto nuclear e indicou a cidade de Ukiah, no norte da Califórnia, e a
de Belo Horizonte, no Brasil, como os lugares que estariam a salvo da radiação. Em Ukiah, comprou uma
igreja e alguns terrenos. A partir daí, estendeu a sua influência a São Francisco e a Los Angeles.
Conquistava cada vez mais adeptos. A partir destas cidades, organizava excursões para a “terra
prometida” (Ukiah) que lhe rendiam milhares de dólares por semana. Mas nem só as excursões eram
lucrativas. Segundo ex-membros da seita, Jones apoderava-se frequentemente dos bens dos seus fiéis,
além de arrecadar generosas contribuições. Só em cheques da Assistência Social, o Templo do Povo
arrecadava 65 mil dólares por mês. Os fiéis deveriam contribuir inicialmente com um quarto do seu
salário, depois 40% e, finalmente, entregavam tudo o que possuíam. O negócio era tão lucrativo que
teve de ser distribuído por 15 contas separadas. Também, segundo afirmações de ex-seguidores,
possuía cerca de 10 milhões de dólares em contas na Europa, Guiana e Califórnia. Após o suicídio em
massa na Guiana, encontraram-se centenas de milhares de dólares em dinheiro e cheques junto do
cadáver de Jones.
Em 1971, Jones comprou uma antiga sinagoga em São Francisco e uma segunda igreja em Los
Angeles. As obras de beneficência de Jones atraíam a imprensa nacional, e a sua fama parecia não parar
de crescer.
Em 1973, Jones enviou uma expedição à Guiana com o objetivo de encontrar o lugar apropriado à
criação de uma colónia agrícola para os jovens dos guetos. Em 1974, negociou com o governo da Guiana
o arrendamento de 27 mil acres na selva, a norte da pequena cidade de Porto Kaituma. Por essa altura,
ocorrera um incêndio na igreja de São Francisco, e Jim Jones começara a sentir-se perseguido por
“forças malignas” nos Estados Unidos, as quais supunha pretenderem destruir a sua vida e a dos seus
fiéis.
Como acontece frequentemente, começaram a aparecer os primeiros dissidentes da seita, que o
acusavam, não só de expoliação, mas também, de se aproveitar de uma terrível dependência emocional
e servidão religiosa que conseguira incutir nos seus seguidores. Apontavam o caso de filhos, irmãos e
irmãs que simplesmente abandonavam e repudiavam os seus familiares para cegamente seguirem o
reverendo. Além destas acusações, apareciam outras ligadas à exploração sexual, inclusive
homossexual, as quais seriam organizadas pela sua secretária. Não faltavam também as múltiplas
denúncias de espancamento e de humilhação, aplicados como pena aos infratores e aos que queriam
abandonar a seita
Em 1976, iniciou-se o processo de Grace e Tim Stoen contra Jones. Aproveitando-se de momento de
insanidade do casal que seguiu cegamente as suas orientações, Jones conseguiu que lhe dessem
legalmente a guarda do seu filho, John-John. Acusaram-no desse aproveitamento e de óbvia
manipulação. Jones criava John-John como se fosse seu próprio filho e, talvez, o preferido. A um
repórter chegou a dizer que na verdade John-John era seu filho natural, pois Tim Stoen tinha pedido
para que tivesse relações sexuais com a sua esposa.
Criou-se na Califórnia a associação dos “Parentes Preocupados”, que tinha como objetivo denunciar
as manipulações de Jones, além de maus-tratos (secções de espancamentos), prisão e alienação dos
seus seguidores.
Em junho de 1977, Jim Jones mudou-se com toda a sua família para a colónia agrícola da Guiana,
Jonestown. Acreditava que o isolamento na selva faria com que se livrasse dos seus inimigos nos
Estados Unidos. Fez o possível para manter uma certa aproximação com o governo da Guiana, a fim de
que lhe fosse garantido o apoio político deste país.
Nos Estados Unidos, o congressista Leo J. Ryan, da Califórnia, assumiu a liderança nas investigações
sobre as denúncias dos “Parentes Preocupados”, iniciando uma cruzada contra Jones.

O suicídio-massacre
Ryan conseguiu, em fins de 1978, a autorização do Governo dos Estados Unidos para empreender
uma investigação profunda sobre as denúncias dos “Parentes Preocupados”. Organizou uma comissão
para visitar Jonestown levando consigo repórteres e alguns dos "Parentes Preocupados", que tinham a
intenção de convencer os seus familiares a rejeitarem as pregações apocalípticas de Jim Jones e a
regressarem aos Estados Unidos.
Depois de dois dias de preparativos e negociações com as autoridades guianesas e representantes
do Templo do Povo, o congressista Ryan e a sua comitiva seguiram, no dia 17 de novembro, para
Jonestown, a colónia agrícola de Jones. A visita começou ao início da noite e variou conforme o humor
de Jones, que oscilou, indo de uma calorosa receção, com comidas e músicas, até à expulsão da comitiva
no final da noite.
No dia seguinte, 18 de novembro, regressaram para nova visita às instalações de Jonestown. Esta
visita foi marcada pela tensão, porque Ryan insistia em levar consigo os seguidores que desejavam
desistir da seita. Apenas no final da tarde a proposta foi aceite por Jim Jones, mas com as observações
de que os desertores o traíam sempre ao sair e inventavam terríveis mentiras sobre si e o Templo do
Povo.
À medida que se aproximava a hora da partida, e confirmadas dez deserções, a tensão aumentara
ao ponto de um seguidor de Jones tentar assassinar o deputado Ryan com uma faca. Ryan escapou do
atentado graças à intervenção de um membro da comitiva, Mark Lane, que acabou por sofrer
ferimentos ligeiros. Decidiram partir imediatamente, pois em breve estaria escuro, e o clima de tensão
sugeria que algo muito grave estaria para acontecer. Embarcaram um total de 16 pessoas no camião
para seguirem até a pequena pista de Porto Kaituma.
Chegaram à pista por volta das 16h e 25m, quando da outra extremidade da pista surgiram, a uma
distância de 300 metros, um camião e um trator, vindos da colónia de Jonestown. Os ocupantes das
viaturas de Jonestown começaram a disparar. Uma parte da comitiva conseguiu escapar por ter fugido
para a mata próxima, mas o rápido ataque causou cinco mortos, entre eles Leo J. Ryan. Outros três
ficaram gravemente feridos. Enquanto ocorria o ataque à comitiva, Jones dava início ao macabro ritual
de suicídio coletivo, ou "suicídio revolucionário", como ele pregara diversas vezes durante os vários
ensaios anteriores aos quais chamava Noite Branca.
Segundo o relato dos sobreviventes, Jim Jones ordenou que todos os seguidores fossem ao pavilhão
de reuniões, dispondo os guardas armados ao redor do pavilhão para evitar qualquer fuga. Explicou
incansavelmente que estava tudo perdido e que em poucos minutos uma força militar guianesa estaria
na colónia para os prender e castigar severamente. Argumentou que todos deveriam morrer com
dignidade bebendo um líquido que o seu médico preparara, uma mistura de sumo de uva com cianureto
e tranquilizante. Para garantir a obediência dos adultos, o sacrifício começou pelas crianças. No caso
destas, a dose de veneno era injetada na boca, deixando-as sem qualquer opção. Os adultos agruparam-
se em filas para receberem (alegremente, como narra um dos sobreviventes) as suas doses de veneno.
Quando muitos começaram a cair, contorcendo-se, espumando pela boca e sangrando pelas narinas,
houve um lampejo de sanidade que causou certo pânico entre os seguidores. Alguns tentaram fugir,
mas foram detidos pelos tiros dos guardas de Jones. Outros poucos seguidores conseguiram fugir para a
selva, ficando centenas de cadáveres espalhados pelo chão. Completada a chacina, o reverendo Jim
Jones suicidou-se com um tiro na cabeça. A contagem final dos corpos apurou um total de 913
cadáveres.»
http://histatual.blogspot.pt/2011/01/o-suicidio-massacre-da-guiana-jim-jones.html (adaptado).

1. O que é a obediência?

2. Dê exemplos de atos de obediência quotidianos.

3. Leia a descrição da experiência de Milgram sobre a obediência e procure determinar que situações ou
contextos, segundo o experimentador, fariam com que os participantes exibissem maior tendência
para obedecer?
4. Imagine-se numa situação em que lhe é exigida obediência para cumprir ordens imorais. Que
comportamentos preventivos julga que deve adotar para evitar o que considera indesejável?

5. No caso da tragédia de Jonestown, poderá dizer-se que estamos perante um caso de obediência
estrita? Por outras palavras, estaremos perante um caso em uma autoridade foi obedecida
simplesmente pelo facto de ser reconhecida como autoridade?
Podemos pensar que não supondo as seguintes razões:

6. Apesar do que foi dito na questão anterior, a verdade é que, segundo testemunho de sobreviventes,
muitas pessoas obedeceram a Jones. Que fatores podem explicar tal comportamento?
Entre outros, podemos salientar os seguintes:

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