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EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE CULTURAL: DIÁLOGOS POSSÍVEIS ENTRE

AS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO E A ABORDAGEM FREIREANA PARA O


ENSINO RELIGIOSO

Adriana Guilherme Dias da Silva Figueirêdo1

Ricardo Jorge Silveira Gomes2

Resumo: Ao refletirmos sobre a educação e o desafio na efetivação da diversidade


cultural no âmbito do Ensino Religioso, buscamos identificar as aproximações entre a
abordagem educacional de Paulo Freire, partindo da análise social da cultura que
permeia sua obra, e as contribuições das Ciências da Religião, na construção de uma
rede de incentivo ao diálogo, visando subsidiar os estudos em religião de forma
acadêmica e não confessional, na construção de uma rede de incentivo à diversidade e
ao diálogo.
Palavras-chave: Diversidade Cultural, Paulo Freire, Ensino Religioso.

Introdução

O fenômeno religioso, parte inerente da cultura de um povo, é imprescindível


para compreendermos a história de uma sociedade, de modo que, pensar a formação
humana dentro de uma perspectiva integral, envolve a promoção de uma educação
capaz de fomentar uma cultura de respeito à dignidade humana, fundamentada nos
valores da igualdade, liberdade, justiça, solidariedade, cooperação, tolerância e paz.
Segundo Fleuri (2015, p. 41), a construção da democracia e da justiça social, passa pela
formação de cidadãos capazes de viverem solidariamente, o que necessariamente
implica em dar visibilidade à cultura dos sujeitos histórica e socialmente oprimidos e
excluídos por meio da sua própria palavra que é criadora de cultura, conforme a
conceituação de Paulo Freire (1987. p. 18).

Partindo do diálogo centrado na perspectiva de superação da contradição básica


entre oprimidos e opressores, Paulo Freire se propõe a problematizar a educação para o
desenvolvimento de uma ação transformadora da realidade, capaz de dar vez e voz aos
“esfarrapados do mundo”(FREIRE, 1987.p. 23), por meio da ação-reflexão que se

1
- Pedagoga, especialista em Administração escolar e Planejamento Educacional, e Mestranda em
Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco – Recife/PE. E-mail:
dricapresbi@gmail.com
2
- Historiador, especialista em Metodologia do Ensino da História e Mestrando em Ciências da Religião
pela Universidade Católica de Pernambuco – Recife, PE. Docente da Faculdade José Lacerda Filho de
Ciências Aplicadas/FAJOLCA. Ipojuca/PE. E-mail: ricardojorgesg@hotmail.com
processa na prática educacional dialógica, cuja ação está centrada nos problemas da
realidade, a fim de promover o reconhecimento da situação desumanizante em que os
sujeitos oprimidos se encontram ( FREIRE, 1987. P. 30-31).

Reconhecendo a “ação cultural” como sendo o papel da ação política junto aos
oprimidos, Paulo Freire (1987, p. 53) propõe a construção de uma educação para a
liberdade, situação na qual os oprimidos podem vislumbrar o rompimento da cultura do
silêncio que lhes é imposta pela estrutura social opressora, que os aliena, domina, e por
fim, os coisifica. Desta forma, vemos o quanto a cultura é um elemento chave para
repensarmos a educação com vistas a promover a superação de tal situação.

Quando pensamos a respeito do Ensino Religioso e na sua longa trajetória até


então, verificamos que a despeito das inúmeras reformas educacionais já realizadas, o
desafio de concretizar uma educação neutra, laica e que contemple o fenômeno religioso
de modo isento histórica, filosófica, antropológica e socialmente falando, ainda se
constitui no maior obstáculo à prática docente nesta disciplina, o que dificulta o pleno
alcance de uma educação integral e que seja capaz de promover os valores necessários
ao desenvolvimento de uma convivência solidária e respeitosa.

Por meio da aproximação entre ciência e religião, conforme proposto por Lana
Fonseca (2015, p.217), é possível estabelecer relações que promovam o diálogo entre
os inúmeros tipos de conhecimento elaborados e acionados pela humanidade na
construção da realidade, de modo a desenvolver um modelo que leve em consideração
as fronteiras, bordas e paralelos metodológicos, partindo da compreensão de que
existem questões que, embora se encontrem nos limites da ciência, não podem ser
respondidas por esta.

Dessa forma, nos propomos a refletir criticamente sobre como efetivar uma
educação para todos, abrangendo a diversidade cultural e religiosa no âmbito do Ensino
Religioso, na perspectiva da concretização de uma educação para todos, a partir do
diálogo entre a abordagem freireana, e o campo epistemológico das Ciências da
Religião, de modo a estabelecer relações que possibilitem o repensar crítico desta
disciplina, tendo em vista que esta tarefa, consiste num exercício existencial:

É um ato de criação. Daí que não possa ser manhoso instrumento de


que lance mão um sujeito para conquista do outro. A conquista
implícita no diálogo é a do mundo pelos sujeitos dialógicos, não de
um pelo outro. Conquista do mundo para a libertação dos homens.
(FREIRE, 1987. p. 79).
Neste sentido, compreendemos que o estudo do fenômeno religioso a partir de
uma perspectiva antropológica, desenvolvido no campo das Ciências da Religião,
apresenta grandes possibilidades de avanço para a potencialização deste exercício
dialógico tão necessário para a construção de uma educação pautada na diversidade
cultural religiosa, característica da formação histórica do povo brasileiro.

2. Metodologia

Objetivamos, apresentar as contribuições das Ciências da Religião para a


efetivação de uma educação pautada na diversidade cultural e religiosa, no âmbito do
Ensino Religioso, a partir do diálogo estabelecido entre os autores que discutem esta
temática, tais como Gilbraz Aragão (2015), Frank Usarski (2013) e Eduardo Cruz
(2013) e a abordagem da cultura expressa na obra de Paulo Freire, tendo como base a
contradição expressa na relação entre oprimido e opressor, conceito basilar que permeia
a sua obra e constitui-se como pano de fundo sobre o qual ele analisou o contexto
social onde se dá a produção desta.

A pesquisa foi realizada com o uso de fontes bibliográficas que abordam a


temática estudada, ancorada na leitura de algumas das obras de Paulo Freire e de autores
ligados ao campo epistemológico das Ciências da Religião, bem como assuntos
relacionados ao tema estudado. Apresentamos inicialmente, as principais abordagens do
Ensino Religioso que marcam os debates neste campo do conhecimento na atualidade.

3. As abordagens do Ensino Religioso

A separação oficial entre o Estado e a Igreja oficial (católica), aconteceu desde a


Constituição de 1891 no período republicano brasileiro, no entanto, a presença desta
tradição se manteve ainda por muitas décadas, fato pelo qual o Ensino Religioso oscilou
entre estar sob a tutela da Igreja e a do Estado. Esta realidade pode ser constatada nas
sucessivas revisões legais a partir das discussões que sempre marcaram a presença desta
disciplina na grade curricular (DINIZ; LIONÇO, 2010.p. 39).
Como exemplo, citamos o que ocorreu durante o período da reforma
constitucional de 1926, quando reacenderam os debates sobre o Ensino Religioso de
tradição católica e, mesmo sem mudanças quanto ao que estava previsto até então,
quanto a instituição da laicidade que alterou a antiga política educacional e, mesmo
assim, vários estados passaram a legislar de forma independente, em desacordo com as
normas constitucionais numa tentativa de retorno ao antigo modelo confessional, a
exemplo do estado de Minas Gerais, que neste período, voltou a assegurar um Ensino
Religioso de base católica. Posteriormente, a Reforma Francisco Campos promoveu
novas alterações na política educacional e trouxe de volta o Ensino Religioso católico
para às escolas públicas, ainda que de forma facultativa, o que foi atualizado somente 50
anos depois com a LDB (DINIZ; LIONÇO, 2010. p. 40).

Atualmente, ainda de oferta obrigatória, mas de matrícula facultativa, é possível


observar que o Ensino Religioso carece de maior regulamentação e fiscalização no
sentido de assegurar sua vivência em consonância aos princípios da laicidade e
promoção da diversidade cultural e religiosa, e boa parte das discussões que o cercam,
versa justamente sobre as fronteiras a serem estabelecidas de modo a assegurá-lo desta
forma, o que ainda se mostra um grande desafio.

A compreensão da laicidade a partir do conceito de pluriconfessionalidade, ao


invés de neutralidade confessional, explica boa parte dos debates atuais acerca desta
temática no Brasil, uma vez que, de acordo com a categorização proposta por Diniz e
Lionço (2010, p. 38), o primeiro prevê a convivência com os símbolos religiosos a
partir da compreensão do fato religioso como anterior ao pacto político que regula a
vida em sociedade, enquanto o segundo parte do princípio que, embora o Estado não
deva restringir a liberdade de consciência de seus cidadãos, também não deve
constrangê-los com símbolos religiosos que não integrem as diferentes comunidades
morais.

De acordo com o princípio da laicidade, baseada na Lei nº 9.475/1997 e nos


Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso elaborado pelo FONAPER 3,
vemos que o Ensino Religioso não deve ser entendido como ensino de uma religião ou
das religiões na escola, mas como componente curricular que proporcione o
conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, valorizando a
diversidade cultural e religiosa presente na sociedade (CECHETTI, 2015), o que requer
3
Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso.
dos educadores envolvidos na área, a reflexão sobre como conduzir as atividades que
envolvem sua execução, a saber, o planejar, selecionar e apresentar conteúdos de forma
a promover tais princípios. No entanto, segundo Lana Fonseca (2015), dentre as
inúmeras formas de exclusão presentes em nossa sociedade, as que envolvem a
expressão religiosa de seu povo, é uma que está extremamente arraigada a inúmeros
preconceitos historicamente construídos, que podem ser explicados pela “cientifização”
da sociedade, cujas repercussões no espaço escolar, acabou por gerar violências nem
sempre sutis por meio de uma hierarquização dos campos de saber: “ Essas marcas nos
campos de conhecimento nos revelam uma hierarquização em que conhecimentos
considerados válidos emergem e subalternizam outros tantos que circulam nas escolas
brasileiras (p. 209).

Diante disto, urge repensarmos sobre as formas de superação deste cenário,


rumo a construção de uma educação em consonância com os princípios legais previstos
nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação básica, cuja concretização da
educação passa pela relação indissociável entre currículo e cultura, um campo
conceitual, perpassado pelo conflito vivenciado na produção desta, com embates
envolvendo tanto as pessoas, como as concepções de mundo, conhecimento e
aprendizagem (FONSECA, 2015.p. 210).

4. Educação para todos: Paulo Freire e a abordagem da diversidade cultural

Ao propor em sua obra a construção de uma educação libertadora, Paulo Freire


apresenta uma prática focada a partir dos oprimidos e na problematização das relações
destes com o mundo, por meio de uma ação cultural que se constrói na ação dialógica e
de forma humanizada, como alternativa ao que ele classifica como concepção bancária
da educação, que sufoca o diálogo ao pressupor que o educador detém de forma
exclusiva o saber, cabendo aos educandos apenas recebê-lo passivamente (FREIRE,
1987).

Ao optar pelos excluídos, tanto histórica quanto socialmente, Freire construiu


uma narrativa que lançou o foco na questão chave a ser levada em consideração para a
construção de uma nova práxis educacional, capaz de humanizar e libertar os homens
por meio da ressignificação do mundo a sua volta: “ Não há educação fora das
sociedades humanas e não há homem no vazio” (FREIRE, 2000. p. 43). Desta forma, a
educação a ser praticada com os homens e por eles, é sobretudo uma educação popular e
cultural, com foco nas relações tipicamente plurais, visando a superação das situações
de opressão. tão inerentes à vida social e humana. Ao identificar e problematizar as
situações de opressão, Torres (1988) nos mostra que, além de apontar a dominação,
agressão e violência tão características do contexto social, Paulo Freire desvelou os
mecanismos de opressão em várias esferas:

Ele salientou que o racismo, o sexismo e a exploração social são as


formas mais evidentes de dominação e opressão, mas também
reconheceu que a opressão pode ser gerada em crenças religiosas4,
filiações políticas, e atitudes face a naturalidade, idade, tamanho e
deficiências físicas e intelectuais (p. 50)
Desta forma, Paulo apresentou como alternativa a este estado de coisas, a
construção de uma prática educativa transformadora, que libertasse os homens por meio
do diálogo, levando em consideração a pluralidade inerente ao conceito das relações da
esfera puramente humana, uma vez que as relações que os homens travam entre si, no
mundo e com o mundo, são pessoais, impessoais corpóreas e incorpóreas, o que faz com
que esta relação seja objetiva e possível de ser conhecida por ele (FREIRE, 2000, p.47).
Logo, vemos que para ele, os seres humanos criam a cultura na medida em que
se integram às condições de seu contexto de vida, ressignificando-o por meio de suas
ações, de modo que uma educação verdadeiramente voltada para a totalidade das
pessoas5, precisa valorizar e respeitar as diferenças culturais assim como os saberes e as
experiências de vida dos sujeitos tendo em vista que é por meio de suas diversas
produções culturais que eles, os oprimidos, expõem sua rebeldia contra os opressores.
Ressaltamos ainda que, ao lançar o olhar para a capacidade de transcendência do
homem, Paulo Freire nos revela uma percepção que a muitos poderia passar
despercebida sobre os aspectos relacionados ao fenômeno religioso, mas que está
presente em sua obra, não somente pelo reconhecimento das situações de opressão e
exclusão envolvendo questões religiosas, mas sobretudo pela compreensão do homem
na sua relação com esta dimensão transcendental e religiosa de sua existência:
A sua transcendência está também, para nós na raiz de sua finitude.
Do ser inacabado que é e cuja plenitude se acha na ligação com seu
Criador. Ligação que pela própria essência, jamais será de dominação
ou de domesticação, mas sempre de libertação. Daí que a Religião –
religare - que encarna este sentido transcendental das relações do
homem, jamais deva ser instrumento de sua alienação. Exatamente
porque ser finito e indigente, tem o homem na transcendência, pelo
amor, o seu retorno à Fonte, Que o liberta (FREIRE, 2000. P. 48).

4
Grifo nosso
5
Entendida sobretudo como a classe popular.
Assim, a educação proposta por ele, visa promover por meio do diálogo, os
múltiplos aspectos da existência humana, a saber, o transcender, discernir, e dialogar,
lançando os homens no domínio da cultura e da História que lhes são próprios, numa
dinâmica que lhes humaniza, ao contrário da ação antidialógica que desumaniza e
coisifica os homens, retirando-lhes o protagonismo e a voz, por meio da mitificação e da
invasão cultural, que visa a dominação e não a libertação (FREIRE, 1987.p.65-67).

Ao considerar o processo de libertação como algo plural e ao mesmo tempo


complexo, dentro de uma perspectiva que abrange as múltiplas dimensões que marcam
o ser humano, tais como a classe, o sexo, a raça e a cultura, é possível estabelecermos
paralelos entre a abordagem de Paulo Freire sobre a diversidade cultural, e as
possibilidades de construção de uma prática pedagógica a ser desenvolvida no âmbito
do Ensino Religioso tendo em vista que a escola, sobretudo pública, é um espaço
privilegiado para o trato das questões envolvendo a diferença, contribuindo assim para
a construção de uma sociedade mais democrática e com respeito às diferenças.

Neste sentido, ressaltam-se ainda os esforços empreendidos pelo campo


epistemológico das Ciências da Religião, para o subsídio às práticas pedagógicas a
serem desenvolvidas no âmbito do Ensino Religioso, dentro do sistema laico de
educação, como alternativa ao modelo catequético e eclesial que predominou durante o
período colonial brasileiro, cujos vestígios ainda se fazem presente nas escolas
brasileiras.

5. Ciências da Religião: Contribuições para uma nova abordagem do Ensino


Religioso

Segundo Frank Usarski (2013, p. 51), existe a necessidade de fomentar o


debate, não apenas acerca do modelo de Ensino Religioso a ser desenvolvido no país,
mas também a respeito dos parâmetros epistemológico e metodológico que devem
nortear os estudos no campo religioso. Vários programas de graduação e pós-graduação
em Ciência(s) da(s) Religião(ões) – nomenclatura esta que varia de acordo com o
Programa, segundo atesta Eduardo Cruz (In: PASSOS; USARSKI (Orgs.), 2013, p. 37)
–, vêm desenvolvendo um trabalho em cima da perspectiva transdisciplinar para o
Ensino Religioso.

Tendo em vista que, o termo Ciência da Religião, alude a um empreendimento


acadêmico norteado pelo interesse de um conhecimento específico, sua orientação está
firmada num conjunto de teorias específicas que se dedica de modo não-normativo ao
estudo das religiões, tanto histórica quanto sistematicamente, com o foco em suas
múltiplas dimensões, manifestações e contextos socioculturais. Isso significa, que não
existe uma perspectiva de instrumentalização de seus objetos em prol de realizar a
apologia de uma determinada crença, tendo em vista que a Ciência da Religião, defende
um ideal epistemológico baseado na indiferença diante do seu objeto de estudo de tal
forma que:” [...] o cientista da Religião exclui de sua agenda a questão da ‘última
verdade’ e não se permite avaliar aspectos religiosos em comparação com as normas de
outra religião ou com quaisquer outros critérios ideológicos.(USARSKI, 2013. p. 51).

Tal postura, também chamada de “ateísmo metodológico” ou “agnosticismo


metodológico, contribue para que este campo do conhecimento venha se firmando ao
longo do tempo, promovendo o contato com as mais diversas tradições religiosas e
fomentando positivamente na quantidade e na qualidade do conhecimento sobre o
“outro”, em meio ao avanço tecnológico que vivenciamos na atualidade (USARSKI,
2013. p. 51).

Tal perspectiva quando transposta para o Ensino Religioso, promove a


construção de práticas que promovam não somente o necessário diálogo entre a ciência
e a religião, conforme colocado por Lana Fonseca (2015), mas também a promoção do
conhecimento numa perspectiva integral, além de fornecer subsídios a uma prática de
ensino focada na diversidade cultural religiosa. Lidar com as particularidades,
aproximações e divergências, bem como a polifonia e polissemia típicas do cenário
religioso brasileiro no contexto educacional, requer o repensar de uma prática de
respeito ao outro, por meio de uma proposta plurimetodológica transdisciplinar, onde o
conhecimento se dá entre e além das mais diversas áreas do conhecimento, uma vez que
conforme Gilbraz Aragão: “ os tempos atuais nos mandam ‘sinais’ que apontam para a
exigência da abertura de novos horizontes e perspectivas” (2015, p. 16).

Assim, a metodologia transdisciplinar surge com um novo modelo de


compreensão científica a partir da física quântica, propondo a revisão dos modelos de
operação do saber, para além da lógica até então estabelecida sobre o verdadeiro e falso,
para incluir a lógica do terceiro termo incluído, na qual a conceituação da realidade
passa pela multidimensionalidade e considerando vários níveis de realidade: micro e
macro, interior e exterior, natural e social, histórico e interpessoal, permitindo que o
fenômeno das religiões passe a abrigar as contradições que surgem do seu pluralismo,
contribuindo para a formação de uma nova ética, pautada no amor enquanto vivência,
local onde a diferença pode ser afirmada para além das divergências que separam e
excluem.
Deste modo o desenvolvimento da necessária neutralidade e observância ao
princípio da laicidade, é fomentado de modo a atender às exigências do contexto atual,
promovendo o respeito por todas as tradições, e até pela ausência de crença em
quaisquer delas, de tal forma que, o acesso as diversas tradições religiosas se torna
objeto de estudo, na promoção da informação necessária à uma educação que possibilite
a todos uma tomada de decisão sobre o sentido de suas crenças, ritos e interditos, ou
seja, uma fé esclarecida e que se construa de forma mais solidária e em respeito às
outras (ARAGÃO, 2015. p. 12).

6. Resultados

A partir da revisão teórica realizada, foi possível estabelecermos ligações entre


os pressupostos da abordagem educacional de Paulo Freire no que diz respeito a
necessidade de materializar uma educação para todos a partir dos sujeitos que
constroem a cultura em suas ações diárias, e os propostos no campo de estudos das
Ciências da Religião, no que diz respeito ao desafio de materializar uma proposta
educacional que inclua a todos de forma indistinta, por meio de uma abordagem focada
na diversidade de tradições culturais e religiosas que foram o tecido social brasileiro.
Ao afirmar que uma postura autossuficiente é incompatível com o diálogo, tendo
em vista que impede a pronúncia do mundo, realizada em comunhão, na qual todos
aprendem por meio do encontro com o outro na caminhada rumo ao saber, (FREIRE,
1987. P. 81), a abordagem de Paulo Freire propõe o fundamento no amor e na
humildade, baseada na fé nos homens onde o diálogo materializa uma relação de
horizontalidade e confiança mútua, dialogando com o que está colocado por Gilbraz
Aragão (2015, p. 21) quando nos desafia a pensar na possibilidade de ultrapassarmos o
entendimento do diálogo somente como estratégia para o convencimento, rumo ao
encontro e a troca entre as pessoas, visando o esclarecimento e enriquecimento mútuo
entre as pessoas e suas respectivas mensagens sobre o mundo e o humano e mesmo o
divino.
Ambos trazem à tona, as possibilidades de uma educação na perspectiva integral,
cujos desdobramentos podem ser traduzidos no âmbito do Ensino Religioso, como a
concretização de um espaço marcado pela aproximação entre as pessoas, suas tradições
religiosas e culturais, potencializando sua conexão, com o divino com o transcendente,
não em uma postura alienadora ou domesticação, mas de libertação dos homens.
Portanto, na busca de concretizar a justiça social, é preciso promover o espaço
de convivência plural onde haja espaço para as diferenças, compreendendo que estas se
constituem na raiz da diversidade conforme nos aponta Wellington Sanchez (2015, p.
145), contribuindo para o desenvolvimento de um espaço escolar que não subalterniza
os saberes ou hierarquiza os homens, antes, lhe permite a palavra numa relação
dialógica, cuja ação educacional visa promover a chamada síntese cultural que: [...] não
nega as diferenças entre uma visão e outra, pelo contrário, se funde nelas. O que ela
nega é a invasão de uma pela outra. O que ela afirma é o indiscutível subsídio que uma
dá a outra” (FREIRE, 1987. p. 181).

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