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Análise Sociológica
Sociedade e Ambiente
Tema 1
De entre as actividades humanas exercidas num dado território começamos por destacar a
agricultura, pecuária e silvicultura, actividades económicas que ocupam maior área
territorial e que manifestam maior dependência ao meio biofísico.
A leitura do território que se segue dá maior atenção a estas actividades económicas
particulares. Não se dirige a outras que têm lugar nos territórios rurais e competem com a
agricultura e floresta na utilização do espaço, como a actividade extractiva (extracção de
areias, caulino), a construção civil e obras públicas (rede viária, habitação, etc.) ou o
turismo.
Neste sentido quando nos referimos ao meio biofísico pensamos principalmente no meio
agronómico e/ou florestal
O meio agronómico e/ou florestal é caracterizado pelo conjunto interdependente de
componentes relacionadas com as propriedades intrínsecas do solo, a sua situação
topográfica, o sub-solo que condiciona a profundidade das raízes e a circulação dos
fluidos, a meteorologia, o regime das águas, a flora e a fauna espontâneas.
Quando falamos de meio social referimo-nos às formas como os homens se relacionam
entre si, aos valores sociais que orientam as suas escolhas, aos conhecimentos que
dispõem, aos modos como os agentes económicos se regulam entre si. Aspectos como a
propriedade da terra, a sua distribuição pelas unidades produtivas, a tecnologia a que os
agentes económicos têm acesso, os mercados e as políticas públicas que regulam a
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actividade dos agentes são de maior importância na compreensão daquelas actividades
económicas. Uma definição de meio social,
O meio social é o conjunto interdependente de sistemas económico, político e
cultural/ideológico que estruturam a organização e o funcionamento das
comunidades/sociedades.
Certamente que na nossa análise o meio biofísico e o meio social não são variáveis
independentes uma da outra. Desde já sublinhamos a forte interacção existente entre
meio biofísico e meio social.
EXEMPLO DO SOLO
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entre o cultivo da terra agrícola e o aproveitamento de terrenos incultos. A bouça (mata, floresta)
e/ou o baldio (terra comunitária) forneciam, respectivamente, o mato (leguminosas/ azoto) para as
camas dos animais e o pasto para estes. A incorporação dos estrumes, fabricados com os matos
utilizados nas camas dos animais, e o pastoreio directo nos terrenos agrícolas tornou-os ricos em
matéria-orgânica, assegurando a retenção de água e a fixação dos nutrientes.
A zona agrícola (limitada aos solos menos pedregosos e situados abaixo do monte para terem a
possibilidade de serem regados), e a sua fertilidade, dependem da captação de recursos num
espaço muito maior que engloba bouça e baldio.
O regime de propriedade, com a presença importante da parceria, acentuava, pelas rendas
elevadas que lhe estavam associadas, a necessidade de obter mais produção por hectare (maior
fertilidade).
Em contrapartida, nos campos do Sul, num contexto em que era reduzido o rácio entre a mão-de-
obra e as disponibilidades de terra, praticava-se o sistema cereal-pousio. A reprodução da
fertilidade dependia exclusivamente do próprio espaço agrícola. O pousio destinava-se a quebrar
o ciclo das infestantes e a disponibilizar azoto. As grandes mobilizações do solo tinham por
objectivo o estilhaçar dos restolhos. No conjunto, o sistema conduziu a um menor investimento
na fertilidade do solo.
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1.2. Trabalho Prático 1 – Factores de localização das produções agrícolas no
Alentejo
1
Gabinete de Planeamento e Política Agro-Alimentar (2002), Portugal Rural: Territórios e Dinâmicas,
Lisboa, Ministério da Agricultura e do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
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Numa exploração agrícola podem existir uma ou várias actividades agrícolas, pecuárias e
florestais. Por actividade entende-se uma “dada quantidade unitária de certa produção
obtida segundo determinada técnica” (Barros, H. e Estácio, F. (1972), Economia da
Empresa Agrícola, Nova Lisboa, edição da Universidade de Luanda.
Uma exploração que produza carne de bovino e cereais (trigo, cevada ou aveia) pode
ficar classificada na OTE Herbívoros e culturas arvenses.
Uma exploração especializada é classificada, por exemplo, na OTE Viticultura, desde que
essa actividade contribua em mais de 2/3 para a sua margem bruta total.
A margem bruta total de uma exploração agrícola é igual ao somatório das margens
brutas das diferentes actividades aí desenvolvidas, sendo um resultado económico da
exploração.
A margem bruta total do território é igual ao somatório da margem bruta total das
explorações agrícolas que ocupam esse território.
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em estufa ou à produção de granívoros em explorações sem terra estão entre os mais
intensivos, com valores da margem bruta por hectare que podem ser 30 vezes superiores
aos dos sistemas extensiva de herbívoros.
A) Com base no Quadro 1 (Distribuição da margem bruta total por OTE em cada
território alentejano), calcular a percentagem da margem bruta total por grupos de
OTE mais ou menos intensivas de acordo com seguinte grelha (preencher
Quadro 2).
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B) No Quadro 2 proceda à identificação das OTE’s preponderantes em cada
território.
• Variáveis independentes – Meio biofísico e meio social
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Tendo em conta a importância do trabalho a tempo parcial e a inexistência de horários de
trabalho fixos para os trabalhadores familiares, recorre-se frequentemente a padrões ou
normas na quantificação do trabalho agrícola. Segundo a Commission Européenne (1996)
entende-se por Unidades de Trabalho Anual (UTA) –
“O trabalho a tempo completo deverá ser considerado de acordo com o número mínimo
de horas mencionado nos contratos nacionais de trabalho. Se nesses contratos não for
considerado aquele número de horas, deverão considerar-se 1800 horas anuais ou 225
dias de trabalho de 8 horas”2. No Recenseamento Geral da Agricultura de 1999, o
trabalho a tempo completo é considerado equivalente a “40 ou mais horas por semana, ou
220 dias ou mais por ano, ou 12 meses por ano incluindo um mês de férias”, ou seja, a
pelo menos 1920 horas/ano (INE, RGA, 19993).
2
Commission Européenne (1996), Structure des explotations: Methodologie dês enquêtes communautaires,
Luxemburgo, Office des publications officielles des Communautés Européennes.
3
Instituto Nacional de Estatística, Recenseamento Geral Agrícola – 1999, Lisboa.
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Grande disponibilidade de terra agrícola → cultura mecanizada e reduzida utilização
de mão-de-obra (ex. Cereais de sequeiro)
MB/ha menor (cultura extensiva)
Pouca disponibilidade de terra agrícola → cultura pouco mecanizada e elevada
utilização de mão-de-obra (ex. horticultura em estufa)
MB/ha maior (cultura intensiva)
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agrícolas que o seu serviço deverá incentivar os agricultores de diferentes territórios a
fazer. Aceita sem mais ou sugere alguma alteração à tarefa? No caso de sugerir
alguma alteração, diga qual?
NOTA:
Na resposta às perguntas tenha em atenção as seguintes críticas feita à carta de
capacidade de uso dos solos do SROA.
“O enquadramento de diferentes tipos de solos nas diversas classes (A, B, C, D e E) é
apresentado como tendo sido feito de forma não viciada não visando um tipo de
exploração que se tenha como padrão, considerando-se apenas as propriedades e
características dos solos. Mas de facto não é isso que na realidade tem sido feito ao
estabelecerem-se os conjuntos que constituem as diversas classes, pois para além de os
solos serem agrupados de acordo com a sua capacidade para suportarem as culturas
usuais, os esquemas culturais são os que têm em mira um determinado tipo de exploração
da terra. E esse tipo é o da exploração extensiva através da cultura cerealífera mecanizada
com altos subsídios ao produto final (trigo pago a valores muito mais elevados que os dos
mercados internacionais) e a factores variáveis (bonificação dos preços dos adubos e do
combustível, por exemplo)” Azevedo (1989:5-6).
Na definição da área recomendada para utilização agrícola, aquela carta não teve “em conta
as culturas arbóreo-arbustivas – vinha, pomar, olival, etc. [...] – nem as hortícolas nem
muitas outras”. “[...] confirmando-se assim que, quando na carta de capacidade de uso do
solo se diz uso agrícola, neste uso agrícola apenas se consideram algumas culturas
arvenses”(Azevedo, 1997:49-50).
Desta nota se conclui que os instrumentos de observação e de análise não devem ser
usados acriticamente.
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1.3. Conclusões: noção de “campo de possíveis”
EXEMPLO
Como a evolução tecnológica e outras mudanças do meio social alteraram a avaliação da
fertilidade de solos do litoral alentejano.
Alguns solos de eleição para os cultivos hortícolas foram considerados como de capacidade não
agrícola na Carta de Capacidade de Uso do SROA, nomeadamente em virtude da fraca
capacidade de retenção de água no solo. Com o acesso a água de rega possibilitada pelo regadio
do Mira, a horticultura está em expansão na mancha de solos arenosos da plataforma costeira. O
aparecimento das técnicas de horticultura em estufa ou de produção pecuária sem terra permite a
expansão de produção agrícola em meios até aí considerados de reduzida aptidão agrícola, ao
restringir a importância das condicionantes do meio biofísico.
A inovação técnica é apenas parte da explicação. A disponibilidade de mão-de-obra
imigrante, abundante e barata, o alargamento dos mercados de hortícolas, com a redução
do custo dos transportes e o crescimento da procura de produtos frescos, entre outras
mudanças do meio social, contribuíram para o sucesso da actividade hortícola na região
do Mira e para a alteração na apreciação da fertilidade dos seus solos.
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EXEMPLO
A alteração do valor relativo das terras de encosta e do planalto frio de Montalegre, nos
anos 60, com o êxodo rural, a entrada da mecanização e a maior abertura aos mercados
dos produtos.
No caso de Montalegre a valorização relativa das encostas e do planalto mais frio alterou-se com
a entrada da mecanização.
A densidade demográfica era elevada nas zonas de encosta, de baixa altitude, mais quentes e com
mais água onde um vasto leque de culturas era permitido, como milho, oliveiras, laranjeiras.
Como eram zonas declivosas, o seu cultivo implicava a armação do terreno em socalcos e o
trabalho de enxada. Na montanha, pelo contrário, a densidade demográfica era mais baixa, e a sua
economia estava dependente do exterior para o abastecimento em vinho, azeite e fruta.
Esta situação desenrolava-se num quadro de autoconsumo e incipiente desenvolvimento dos
mercados: nos vales e encostas, muitos braços para trabalhar e bocas para alimentar; nos planaltos
montanhosos, menos bocas e menos braços e o amanho de maiores áreas com tracção animal.
Chegam os tractores, as vias de comunicação, os mercados e o padeiro. O que interessa é agora
mecanizar e produzir para o mercado o que tem mais saída. Os vales e encostas e os planaltos
viram-se para a pecuária. Mas aqui o planalto tem grande vantagem: Maiores parcelas para
pastoreio e , sobretudo, menor declive que possibilita a mecanização do cultivo do feno.
Os povoados de encosta entram em declínio demográfico mais cedo que os povoados do planalto
onde a mecanização era possível.
A evolução técnica, a alteração dos preços relativos dos produtos e dos factores de
produção nos mercados, as políticas públicas são algumas dimensões do meio social que
conduzem à escolha das actividades dentro do “campo de possíveis” definido pelas
restrições e possibilidades do meio biofísico.
EXEMPLO
A importância dos factores sociais na escolha das produções é evidenciada, por exemplo,
na conciliação que os agrónomos oitocentistas fazem entre aptidões do meio e opções
produtivas em Portugal.
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“A seu ver, se as opções culturais fossem reguladas exclusivamente pelos factores do meio,
"Portugal poderia abandonar, ou pelo menos restringir consideravelmente a cultura cerealífera,
para alargar a exploração de plantas lenhosas, incontestavelmente melhor adaptadas à natureza do
clima, quase por todo o lado quente, seco e variável como é o nosso". [...]"No entanto seria
preciso atribuir a motivos de ordem social e histórica, mais do que às indicações rigorosas do
clima, o facto da cultura dos cereais representar o factor característico, a base fundamental da
economia portuguesa"” (Radich, 2006:124-125)
Bibliografia
Azevedo, Ário (1997), Características e potencialidades edafo-climáticas de Portugal Continental,
em Ingenium, 2º(16), pp. 48-52.
Azevedo, Ário (1989), A defesa do recurso solo com especial incidência na produção agro-
alimentar, em Agricultura na estratégia do uso do solo, Coimbra, Ministério da Agricultura
Pescas e Alimentação, pp. 35-55.
Radich, Mª Carlos (2006), Meio físico e agricultura – uma questão oitocentista, em Ler História,
50, pp. 109-130.
Reboul, Claude (1989), Monsieur le capital et madame la terre: fertilité agronomique et fertilité
économique, Paris: EDI/INRA.
Santos, José (1992), Mercado, economias e ecossistemas no Alto Barroso: um estudo de sistemas
de aproveitamento de recursos naturais, Montalegre: Câmara Municipal de Montalegre.
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