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ETANOL DE CANA X ETANOL DE MILHO

ETANOL DE CANA X ETANOL DE MILHO


Manoel L. de Almeida
Piracicaba Engenharia Sucroalcooleira Ltda.

Tem aumentado o interesse pela produção de etanol de milho no Brasil. Espero com este artigo de natureza técnica,
contribuir para clarear melhor este assunto.
Participamos da implantação da primeira planta-flex de etanol de milho do Brasil, instalada no município de Campos
de Júlio – MT, e estamos acompanhando o excelente trabalho que a USIMAT vem executando nestes 04 anos, no
desenvolvimento e aprimoramento de todo o processo e também no crescimento do empreendimento que iniciou com
processamento de 300 t/dia de milho e já em 2015/2016 deve processar 1.000 t/dia.

1 mol (162 g) de amido produz 1 mol (92 g) de etanol ou 92/0,7893 = 116,55 ml a 20º C (estequiométrico).
Considerando-se 1 ton de milho com 72% de amido em matéria seca e milho com 15% de umidade, teremos:

162 g amido ............................... 116,55 ml de etanol (abs.)

1.000.000 x 0,85 x 0,72 g ............ x ml  x = 440 L de etanol abs./ton de milho

ou 440/0,95562 = 460 L de EH/ton milho (estequiométrico).

Vantagens do Milho
 Pode ser armazenado por longos períodos – 2 a 3 anos ou até mais.
 Matéria prima cuja qualidade oscila pouco e praticamente isento de impurezas – o parâmetro mais importante é
o teor de amido.
 Tem alto rendimento – enquanto uma ton de cana produz 70 a 85 litros de etanol hidratado, uma ton de milho
pode produzir 370 a 410 litros deste mesmo álcool.
 Fácil de manusear – não necessita grandes instalações para movimentar o milho.
 Não gera subproduto, a não ser a vinhaça do processo de destilação – tudo do milho é aproveitado. Além do
etanol, produz a ração de alto valor protéico e óleo que depois de refinado é utilizado para consumo humano.
 Pode utilizar na planta, milho de baixa qualidade, muitas vezes refugado pelos grandes compradores.
 Processo industrial relativamente simples, mais fácil de ser conduzido e menos exigente que o da cana. Os
mesmos operadores que operam a planta de cana operam a planta de milho e com mais facilidade.

Desvantagens:

 O milho não gera biomassa para produzir a energia necessária ao seu processamento. Em uma planta-flex bem
projetada, esta desvantagem não existe.
 Oscilação de mercado – como imaginamos que o milho será adquirido de produtores locais, pode em certos
momentos se supervalorizar e ser direcionado para outros mercados mais atraentes. Mesmo que sejam feitos
contratos de longo prazo com os produtores, dificilmente a usina segurará um aumento significativo. Por
exemplo: a usina tem um contrato de compra dos produtores a R$15,00 a saca e neste momento o preço pode ir
a R$25,00 a saca. Será que o produtor honrará? A saída é a usina ter grandes depósitos para comprar na baixa e
armazenar ou fazer um hedge via contrato futuro.

Produtos do Milho:

 Milho com 70% de amido produz 370 a 400 litros de etanol hidratado/ton de milho. Dependendo do rendimento
e qualidade do milho, pode chegar a 410 L de EH/ton de milho.
 Óleo – 20 a 25 kg/t de milho. Este óleo, para consumo humano, precisa ser refinado.
 Ração seca (DDG) - 200 a 250 kg /t milho, com 10 a 12% de umidade e teor de proteína de 34 a 36%.

No Brasil, do ponto de vista técnico, dois tipos de plantas se mostram viáveis:

 Planta Autônoma de Produção de Etanol de Milho


 Planta Flex.

1. Planta Autônoma de Etanol de Milho

É uma planta construída para esmagar o milho durante todo o ano, e produzir o etanol e os outros dois produtos:
ração e óleo.
Uma planta autônoma tem como característica a necessidade total de um combustível externo, pois do milho tudo se
aproveita, diferente da cana-de-açúcar que produz o seu próprio combustível – o bagaço.
No presente momento não há nenhuma planta autônoma instalada no Brasil.

Uma planta autônoma deve ter as características principais:

 Produzir a sua própria energia elétrica;


 Produzir a sua própria energia térmica. A energia elétrica e térmica necessária ao processo industrial deve ter
uma fonte externa de combustível: gás natural, biogás, óleo combustível (BPF) ou quem sabe biomassas que
poderiam ser produzidas na própria indústria (capim elefante, lenha e outros), mas demandaria grandes áreas
para produzir estas biomassas.
Outra alternativa é a implantação em local onde existissem em abundância excedentes de biomassa (industrias de
beneficiamento de arroz, sobras de indústrias moveleiras, sobra de bagaço de cana de usinas e destilarias e outros) e,
obviamente, em local onde houvesse também farta oferta de milho, pois imaginamos que o milho não seria produzido
pela usina e sim adquirido de produtores locais.
Esta planta, instalada com tecnologia de ponta, produziria sua própria energia elétrica e térmica a ainda poderia
exportar energia elétrica, no processo chamado de cogeração.
Considerando-se um módulo de produção de 500 m3/dia de etanol hidratado, que acreditamos ser o mínimo viável e
considerando-se a planta funcionando 330 dias/ano, com 35 dias de parada geral para manutenção e aproveitamento
de tempo de 95%, teremos:

 Necessidade de milho .............................................. 424.000 t


 Produções anuais:
- Etanol hidratado ........................................... 159.000 m3
- Ração seca (DDG) .......................................... 93.000 t
- Óleo bruto de milho (não refinado) ............... 8.500 t
- Energia excedente (cogerada) ....................... 96.000 MWh

O custo de implantação de uma planta com estas características varia em função do combustível adotado. A biomassa
envolve equipamentos de movimentação e armazenamento, diferente do gás, que se recebido na Usina não demanda
estas necessidades.
Uma planta deste tamanho teria um custo de implantação de aproximadamente 200 a 250 milhões de reais.
A viabilidade econômica de uma planta com estas características dependerá obviamente, além do preço de
comercialização dos produtos, do preço da matéria prima, insumos e outros e principalmente do preço do combustível
que a nosso ver, tem grande influência na matriz de custos.

2. Planta Flex

Recebeu este nome porque pode produzir o etanol, processando a cana-de-açúcar ou o milho na mesma planta.
As plantas flex atuais existentes ainda não processam as duas matérias primas simultaneamente. O milho é
processado na entre safra da cana-de-açúcar.
Nas regiões sudeste e centro-oeste a safra da cana se inicia em abril ou maio e se estende até novembro. No Paraná
(região sul), se inicia um pouco mais cedo, normalmente em março. Portanto o período de entre safra é de 04 a 05
meses, tempo que as usinas de açúcar e as destilarias de álcool nada produzem. O trabalho na indústria se restringe à
manutenção. É aí que entra o processamento do milho.
Vantagens da Planta Flex:

A grande vantagem da planta flex é a produção do etanol na entre safra da cana quando a usina fica parada sem
produzir e, portanto, sem receita. Com a planta flex, a produção pode se estender por mais 03 a 04 meses, ficando um
mês para a manutenção dos equipamentos, principalmente da caldeira, que é o equipamento mais exigido. Se a usina
tiver 02 caldeiras, o tempo de parada pode ser menor.
Assim grande parte dos recursos necessários para se processar o milho, se utiliza da planta de cana. Vejamos:

 Vapor que é produzido pela caldeira existente;


 Energia elétrica, produzida pelo turbo gerador existente;
 Combustível utiliza-se o bagaço excedente da planta de cana;
 Destilação – utiliza-se o aparelho existente da planta de cana;
 Fermentação – utiliza-se o sistema existente, mas tem que ampliar e fazer algumas modificações;
 Sistemas de resfriamento de água também existente;
 Tanques de armazenamento de etanol existentes;
 Operadores – se utiliza os mesmos da planta de cana que são direcionadas para atender a planta de milho;
 Infraestrutura e serviços de apoio existentes – administração, oficinas, mecânicos, ajudantes, etc.

O potencial maior da instalação de plantas flex, atualmente, está nos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso,
Goiás e norte do Paraná, onde há grande produção de milho com alta produtividade e onde os preços deste cereal são
mais atraentes.
Etanol de Milho nas Destilarias de Etanol de Cana e nas Usinas de Açúcar

Como o etanol de milho não gera biomassa (combustível), o maior desafio é produzir este álcool somente com o
excesso de bagaço da planta de etanol de cana. Nas usinas de açúcar, praticamente todo o bagaço é consumido e não
gera excedentes suficientes para atender uma planta de milho anexa. Assim, até o momento, somente as destilarias
autônomas é que têm mostrado interesse nas Plantas Flex.
Mas, não devemos nos esquecer do grande potencial da palha de cana, que pode viabilizar a produção de etanol de
milho, inclusive nas usinas de açúcar.

Cogeração:
Nas usinas e destilarias que fazem ou pretendem fazer a cogeração com a utilização da palha de cana, o sistema é
ainda de melhor aplicação, pois a energia do vapor de escape dos turbo geradores é que irá alimentar a planta de
milho. Esta situação gera uma condição excelente nas destilarias autônomas, pois viabiliza a planta de milho
funcionando durante o ano todo e a exportação da energia elétrica, somente com o combustível da usina gerado pela
biomassa.

Plantas Atuais existentes:

1. Destilarias Autônomas
Em uma planta existente produzindo etanol hidratado, sem a utilização da palha, com melhorias no processo, é
possível gerar excedentes de bagaço para atender toda a entressafra processando o milho – vai depender também da
capacidade da planta de milho. O bagaço atualmente é armazenado solto, mas já há alternativas para que venha a ser
armazenado enfardado.
Se a destilaria resolver ampliar, deve instalar caldeira de alta pressão e turbo gerador, para viabilizar também a
cogeração. Neste caso, a utilização da palha da cana vem a ser muito interessante, podendo a planta de milho operar
durante o ano todo com a biomassa da cana e ainda comercializar energia elétrica.

2. Usinas de Açúcar:
Anexar uma planta de milho em uma usina existente que não utiliza a palha é inviável do ponto de vista energético a
menos que haja outra fonte barata de combustível. Com a utilização da palha, o sistema pode ficar interessante, mas
isto precisa ser verificado, necessitando de uma otimização no processo industrial da usina.

Receitas Bruta e Líquida: Números de uma Planta Flex, baseados na USIMAT FLEX safra 2013/2014:

1. Produções e Receita Bruta:

a. Parâmetros Básicos:

 Capacidade da planta ...................... 600 t/dia


 Tempo de operação ......................... 150 dias
 Moagem do milho no período .......... 90.000 t

b. Produções:

 Etanol hidratado ............................... 34.200 m³


 DDGS .................................................. 18.000 t
 Óleo de milho ..................................... 1.800 t

c. Receita Bruta da Planta:

Receita com o etanol hidratado


R$51.300.000,00

Receita com o DDGS


R$8.100.000,00

Receita com o Óleo


R$4.500.000,00

Receita Bruta
R$63.900.000,00

2. Custo de Fabricação do Etanol na USIMAT FLEX R$/litro


Produtos / Custos R$/litro
Matéria prima (milho) = 0,6698
Produtos químicos: enzimas, fermento, antibióticos, etc. = 0,0700
Combustível: lenha e cavaco = 0,1500
Energia Elétrica e Vapor = 0,0500
Pá carregadeira p/ movimentar o bagaço = 0,0240
Salários e encargos = 0,0400
Combustível: bagaço de cana = 0,0460
Total = 1,0498

3. Receita Bruta x Receita Líquida (R$/L):

Custo de produção/litro de etanol = R$1,0498


Receita com o DDGS/ litro de etanol = R$0,2368
Receita com o Óleo/ litro de etanol = R$0,13
Custo final do litro de etanol = R$0,6830

Obs.: a. Preço da saca de milho de 60,0 kg a R$15,00 ou seja R$250,00/ton.


b. Preço de venda do DDGS de R$450,00/ton e óleo R$ R$2.500,00/ton.
Preços base no MT em Ago/Set – 2014.

Investimentos:
Conforme levantamentos que executamos em ago/2014, o custo de implantação de uma planta de etanol de milho, em
uma destilaria autônoma transformando-a em FLEX com capacidade para esmagar 800 ton/dia de milho é de
aproximadamente 30 milhões de reais.
Nestes valores não se inclui silos de armazenamento e possíveis melhorias na Usina.

Plantas Flex Novas:

1. Destilaria Autônoma: Em uma planta nova que fosse projetada para utilizar as duas matérias primas – cana e milho
- e com a utilização da palha de cana, se adotariam as mais modernas técnicas existentes em seu sistema energético.
Esta destilaria poderia operar o milho o ano todo somente com a biomassa (bagaço + palha) gerada pela cana.
Ademais, a cogeração é uma situação altamente positiva, pois geraria grandes excedentes de energia.

Assim os produtos finais são:

 Etanol da cana produzido durante 07 a 08 meses;


  Etanol do milho produzido praticamente o ano todo;
 Ração (DDG) produzida o ano todo;
 Óleo do milho produzido o ano todo;
 Energia elétrica excedente a comercializar produzida o ano todo.

Simulamos uma planta flex nova, com as mais modernas técnicas existentes e já consagradas no mercado, operando a
cana em conjunto com o milho e utilizando 80 kg de palha/t de cana.
Consideramos a planta da cana operando de maio a novembro e a planta de milho operando de maio a março, com o
mês de abril a planta parada para manutenção. Nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março, a planta de milho
opera sem a cana.
Na safra da cana + milho, a moagem da cana é de 2.000.000 de ton e do milho é de 200.000 ton. Na safra do milho
(dez a mar) se processará mais 114.000 ton deste cereal.

As produções serão de:

 Etanol da cana*................................................... 160.000 m3


 Etanol do milho* ................................................. 118.000 m3
 Ração (DDG) ......................................................... 69.000 t
 Óleo ...................................................................... 63,0 t
 Energia exportada ............................................... 100.000 MWh
*Etanol hidratado combustível.

2. Usina de Açúcar:
Tal como em uma destilaria, com as mesmas ideias de se implantar uma planta top de linha, uma usina de açúcar
poderia operar o ano todo processando o milho e fazendo a cogeração somente com a biomassa da cana. Neste caso,
tem que processar a palha.
A matéria prima seria a cana e o milho e os produtos finais seriam: etanol da cana, etanol do milho, ração, óleo,
energia exportada e mais o açúcar.
Uma planta que viesse a ser projetada nestas condições demandaria um estudo de viabilidade minucioso,
principalmente em relação à logística de todo o sistema: matéria prima, produtos produzidos e combustível.

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