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CERIMONIAL E LITURGIA

Prof. Luiz Adell - 94944734/ adellreis@ig.com.br

INTRODUÇÃO
A palavra liturgia (do grego "serviço" ou "trabalho público") compreende uma
celebração religiosa pré-definida, de acordo com as tradições de uma religião em particular;
pode incluir ou referir-se a um ritual formal e elaborado (como a Missa Católica) ou uma
atividade diária como as reuniões dos muçulmanas. No dicionário é definido como: Conjunto
das cerimônias e preces ordenado pela autoridade espiritual competente; ritual: liturgia
romana.
A liturgia é considerada por várias denominações cristãs, nomeadamente o Catolicismo
Romano, a Igreja Ortodoxa, a Igreja Presbiteriana, a Igreja Batista, a Igreja Metodista, muitas
Igrejas evangélicas e alguns ramos (Igrejas Altas) do Anglicanismo e do Luteranismo, como um
ofício ou serviço indispensável e obrigatório. Isto porque estas Igrejas cristãs prestam
essencialmente o seu culto de adoração a Deus (a teolatria) através da liturgia. Para elas, a
liturgia tornou-se, em suma, no seu culto oficial e público.
Na liturgia, é preciso executar determinadas ações, fazer certos gestos, portar-se de
uma maneira adequadamente disposta. Chamamos a tais procedimentos ações cerimoniais,
pois se executa, por eles, uma dada cerimônia. Em alguns momentos, deve-se sentar, em
outros ajoelharem-se ou ficar de pé. É necessário, igualmente, juntar as mãos ou elevá-las,
falar em voz alta ou baixa, segurar objetos, ler, etc.
Cada uma dessas ações cerimoniais reveste-se de fundamental importância para a
correta celebração litúrgica, de vez que são permeadas de forte carga simbólicas. Mas, deve-
se observar que o centro da liturgia é Jesus Cristo, não o homem.
A cada ato de culto público temos atividades teocêntricas, nunca antropocêntricas. E,
como é o Senhor quem está no centro e no fim da liturgia, importa a Ele agradar pela adoração
“em espírito e verdade” (Jo 4,23), e não satisfazer nossas paixões ou gostos particulares.
A liturgia não é algo do dia-a-dia, comum, porém um sair da normalidade, do ordinário: é
criar o céu na terra, é sair da habitualidade e colocar-se diante do trono do Altíssimo e do
Cordeiro, é refletir a adoração celebrada na corte celestial, é fazer presente o descrito no
Apocalipse, é unir a Igreja Militante à Triunfante.

1 A HISTÓRIA DA LITURGIA
A palavra “liturgia” deriva-se da palavra grega leitourgia que significa “serviço público”.
Os cristãos a adotaram para referir-se ao público ministério de Deus. A liturgia, portanto, é
simplesmente uma ordem de serviço ou uma ordem pré-escrita de adoração.
A liturgia ou Leitourgia referia-se entre os antigos gregos ao serviço público cuja
execução era confiada às classes mais altas: o equipamento das trirremes (embarcação a
remo), a organização dos espetáculos públicos, ao desempenho de uma exibição pública
anunciada aos cidadãos da Velha Atenas, etc. A liturgia dos gregos era plena de obrigações
civis.
Na chamada Bíblia dos Setenta (LXX), tradução grega da Bíblia, o vocábulo "liturgia" é
utilizado para designar somente os ofícios religiosos realizados pelos sacerdotes levíticos no
Templo de Jerusalém. Depois da destruição de Jerusalém no ano 70 d.C., o cristianismo
judaico minguou em número e em poder. O cristianismo gentílico dominava, e a nova fé
começou a absorver a filosofia e os rituais greco-romanos. Por isso, no princípio, a palavra
liturgia não era utilizada para designar as celebrações dos cristãos, que entendiam que Cristo
inaugurara um tempo inteiramente distinto do culto do templo. Mais tarde, o vocábulo foi
adaptado, com um sentido cristão.
De onde vem a liturgia do culto protestante? Esta tem suas raízes principais na
Missa Católica, lembrando que até 1517 só havia um cristianismo, após a Reforma se divide
entre católicos e protestantes. A Missa não teve origem no NT e isso é significativo. A Missa
saiu do antigo Judaísmo e do paganismo. Segundo o famoso historiador Will Durant, a Missa
Católica foi “baseada em parte no culto do Templo Judaico, e em parte nos místicos rituais de
purificação dos gregos, o sacrifício substituto, e a participação...”.
A Missa Medieval é uma mescla de elementos Romanos, Galeses e Franceses. Os
aspectos cerimoniais da Missa, tais como incenso, velas e arranjos do edifício foram adotados
da corte cerimonial dos Imperadores Romanos. Os cristãos do século I nada sabiam sobre tais
coisas.
Gregório O Grande (540-604) é o homem mais responsável pela formação da Missa
Medieval. Gregório foi um homem incrivelmente supersticioso, cujo pensamento foi influenciado
pelos conceitos mágicos dos pagãos. Ele personificou a mente Medieval, que era uma mistura
de paganismo, magia e cristianismo. Não é uma casualidade quando Durant descreve Gregório
como “o primeiro homem completamente Medieval”.
Quando as mais variadas denominações protestantes nasceram, todas ajudaram a
reformar a liturgia católica contribuindo com um único elemento.
Depois que Gregório estabeleceu a Missa no século VI, esta permaneceu praticamente
intacta, com poucas variações durante mais de mil anos. Mas essa água parada da liturgia
experimentou sua primeira revisão quando Martinho Lutero entrou em cena (1483-1546).

O Ritualismo
É interessante que a maioria dos edifícios das igrejas modernas possui cadeiras
especiais para o pastor e seus auxiliares situadas sobre a plataforma atrás do púlpito. Assim
como no caso do trono do Bispo, a cadeira do pastor geralmente é a maior. São vestígios da
basílica pagã.
J.D. Davies escreve, “Quando os cristãos começaram a construir suas grandes
basílicas, eles tomaram a Bíblia como guia e aplicaram tudo o que foi dito sobre o Templo de
Jerusalém para seus novos edifícios, aparentemente ignorantes do fato de que fazendo assim
eles estavam se comportando contrariamente à perspectiva do NT”. Davies afirma que o culto
aos santos [veneração aos santos mortos] e sua definitiva penetração nos edifícios da igreja
finalmente marcaram seu selo na perspectiva da igreja enquanto lugar santo “para o qual os
cristãos deveriam adotar a mesma atitude que os judeus adotaram para com o Templo de
Jerusalém e os pagãos para com seus santuários”.
Também foi adotado o costume romano de iniciar o culto com músicos profissionais.
Para este propósito, corais foram treinados e trazidos para a igreja cristã. O culto tornou-se
mais profissional, dramático e cerimonial. Todas estas características foram copiadas da
cultura greco-romana e diretamente inseridas nas atividades da igreja cristã.
Os cristãos do século I eram avessos ao mundo e evitavam qualquer contato com o
paganismo. Tudo isso mudou durante o século IV quando a igreja emergiu como uma
instituição pública no mundo e começou a “absorver e cristianizar ideias e práticas religiosas
pagãs”. Como disse certo historiador, “o edifício da igreja substituiu o templo; o patrimônio da
igreja substituiu as terras e os tesouros dos templos”. Sob Constantino, todas as propriedades
da igreja eram isentas de impostos.

O Púlpito
Os primeiros sermões foram proferidos da cadeira do Bispo (a cátedra), situada atrás do
altar. Posteriormente o ambo (uma mesa alta ao lado do santuário) diante da qual as lições
bíblicas eram ministradas, tornou-se o lugar onde os sermões passaram a ser proferidos. O
ambo (mesa lateral) foi tomado da sinagoga judaica. Porém, suas velhas raízes remontam às
mesas e plataformas de leitura da antiguidade greco-romana. João Crisóstomo (347-407)
destacou-se por tornar o ambo o lugar da pregação.
Já em 250 d.C. o ambo foi substituído pelo púlpito. Cipriano (200-258) menciona colocar
o líder da igreja em função pública no pulpitum. Nossa palavra “púlpito” deriva da palavra latina
pulpitum que significa “palco”. O pulpitum, ou púlpito, situava-se em cima de uma plataforma no
local mais elevado da congregação.
Pelo fim da Idade Média, o púlpito tornou-se bem comum nas igrejas paroquiais. Com a
reforma, este chegou a ser a mobília central do edifício da igreja. O púlpito simbolizava a
substituição da centralidade da ação ritualista (a missa) com uma instrução verbal dos clérigos
(o sermão).
Nas igrejas luteranas, o púlpito foi movido para frente do altar. O púlpito dominou nas
igrejas reformadas e o altar finalmente desapareceu sendo substituído pela “mesa da
comunhão”.
O púlpito ocupa uma posição central na Igreja Protestante. Tanto que um famoso pastor
em conferência patrocinada pela Associação Evangelística de Billy Graham disse: “Se a igreja
vive é porque o púlpito vive — se a igreja está morta é porque o púlpito morreu”.
A liturgia de Lutero variava bem pouco da Missa Católica. Em suma, as maiores
mudanças duradouras feitas por Lutero na Missa Católica foram as seguintes: (1) Ele realizou a
Missa na linguagem do povo. (2) Deu ao sermão uma posição central na reunião. (3) Ele
introduziu a música na congregação. (4) Ele eliminou a idéia de que a Missa era um sacrifício
de Cristo. (5) Permitiu que a congregação participasse no pão e no vinho (em vez de limitá-los
exclusivamente ao sacerdote como faz a prática católica.) Aparte destas diferenças, Lutero
manteve a mesma liturgia como se vê na Missa Católica.
Agora segue a ordem da adoração elaborada por Lutero. Você deve conhecer bem este
resumo geral, por ser a principal raiz do culto dominical ou até mesmo parecido com o modelo
da Santa Ceia (Música; Oração; Sermão; Anúncios à Congregação; Santa Ceia (Em dia de
Ceia); Música; Oração depois da Comunhão; Despedida (Bênção).
Os reformadores João Calvino da Alemanha (1509-1564), João Knox da Escócia (1513-
1572), e Martin Bucer de Suíça (1491-1551) alongaram o formato litúrgico. Estes homens
criaram suas próprias ordens de adoração ou liturgias entre os anos 1537 e 1562. Embora
suas liturgias fossem seguidas em diferentes partes do mundo, elas eram praticamente
idênticas. Eles simplesmente fizeram algumas modificações na liturgia de Lutero. A mais
notável foi a coleta de dinheiro após o sermão.

A influência na Pregação, Música e Reverência


Calvino enfatizou a centralidade da pregação durante o culto de adoração. Ele
acreditava que cada crente tinha acesso a Deus através da Palavra pregada que era
intensamente teológica (estudo sobre Deus) e individualista (dirigido ao pecador), uma
característica que nunca foi eliminada no Protestantismo.
Pelo fato dos instrumentos musicais não serem mencionados explicitamente no NT,
Calvino eliminou o órgão e os coros. Todo cântico era entoado sem instrumentos (a capela).
Alguns protestantes modernos como a Igreja de Cristo, por exemplo, segue o rígido estilo de
Calvino, sem instrumentos. Apesar disso, os Puritanos (seguidores de Calvino na Inglaterra)
continuaram no espírito de Calvino, condenando a música instrumental e o uso de coros.
Provavelmente, a característica mais nociva da liturgia de Calvino foi dirigir a maior parte
do culto de cima do púlpito. O cristianismo nunca se recuperou disso. Hoje, o pastor atua como
mestre de cerimônias e diretor executivo do culto dominical matutino, da mesma forma que o
sacerdote da Missa Católica.
Outra característica que Calvino acrescentou à ordem de adoração é a atitude sombria
que se ensinava à congregação ao entrar no salão. Ao início de cada culto, os Dez
Mandamentos eram lidos para criar um sentido de veneração. Desta mentalidade saíram
algumas práticas escandalosas. Por exemplo, um certo pastor Puritano Inglês ficou famoso
por multar as crianças que sorriam dentro da igreja. Agregue-se a isto a criação do “Homem
do Dízimo” que despertava com um grande bastão os paroquianos que dormiam no culto. Tal
modo de pensar é um passo atrás mesmo diante do velho pietismo Medieval.
Os Metodistas do século XVIII proporcionaram uma dimensão emocional à ordem de
adoração protestante. A congregação foi convidada a cantar com força, vigor e fervor. Desta
maneira, os Metodistas foram os precursores dos Pentecostais. Os cultos eram mais alegres.
Os Metodistas também popularizaram o culto de adoração aos domingos pela noite.
O descobrimento da lâmpada a gás permitiu a João Wesley (1703-1791) tornar esta inovação
popular. Hoje, muitas igrejas protestantes têm um culto dominical pela manhã e à noite.
Os séculos XVIII e XIX trouxeram os evangelistas fronteiriços que alteraram a meta da
pregação. Sua meta exclusiva era a conversão de almas. Dentro da cabeça do evangelista,
não havia outra coisa no plano de Deus a não ser a salvação. Esta ênfase teve sua origem na
pregação inovadora de George Whitefield (1714-1770).
Whitefield foi o primeiro evangelista moderno a pregar ao povo ao ar livre. Ele deslocou
a ênfase da pregação do plano de Deus para a Igreja, para a pregação do plano de Deus para
o indivíduo. A noção popular de que “Deus ama você e tem um plano maravilhoso para sua
vida” foi introduzida por Whitefield. A finalidade do culto já não era mais a simples adoração a
Deus, os crentes foram instruídos a ganhar novos crentes individuais. Os sermões
abandonaram a temática da “vida real” para proclamar o evangelho ao perdido. Toda
humanidade foi dividida em dois desesperados campos polarizados: perdido ou salvo,
convertido ou incrédulo, regenerado ou condenado.
Muitas igrejas protestantes iniciam seus cultos com calorosos cânticos para preparar
as pessoas para o sermão emocional dirigido aos perdidos. Mas poucos sabem que esta
tradição começou com os evangelistas fronteiriços há pouco mais de um século.
Em terceiro lugar, os Metodistas e os Evangelistas Fronteiriços deram luz ao “apelo (ou
chamado) ao altar”. Esta novidade começou com os Metodistas no século XVIII. Esta prática
de convidar pessoas que desejam orações a colocar-se de pé e vir à frente para recebê-las
surgiu de um evangelista Metodista chamado Lorenzo Dow. Mas, foi Charles Finney (1792-
1872) que elevou o “apelo ao altar” ao nível de convidar o pecador para ir à frente e ajoelhar-
se diante da plataforma para receber a Cristo. Além da popularização do apelo, também se
atribui a Finney a invenção da prática de orar nominalmente pelas pessoas e mobilizar
grupos de obreiros para fazer visitas nas casas. Além dos cultos rotineiros da igreja ele
efetuava outros cultos especiais à noite durante todos os dias da semana. Charles Finney é
aclamado como “o reformador litúrgico mais influente na história dos Estados Unidos”.
Com a invenção do clichê multicopista de Alberto Blake Dick (1856-1934), a liturgia
passou a ser impressa em boletins. Foi assim que nasceu o famoso “Boletim Matinal
Dominical”.
Zwinglio (1484-1531), o reformador suíço, aos poucos introduziu sua própria reforma,
que ajudou a desenhar a ordem de adoração de hoje. Ele substituiu a mesa do altar por algo
chamado “mesa da comunhão”, onde se ministrava o pão e o vinho. Ele também ordenou que
se levasse o pão e o vinho à congregação em seus bancos utilizando bandejas de madeira e
taças. Muitas igrejas protestantes tem tal mesa. A maioria leva o pão e o vinho à congregação
sentada em seu banco.
Para Zwinglio o pão e o vinho são meramente símbolos do corpo e do sangue de
Cristo. Como Lutero, Zwinglio enfatizou a centralidade do sermão pregavam catorze vezes
por semana. Os Puritanos Americanos, por exemplo, sentiram que o sermão era algo quase
sobrenatural. Eles chegavam a castigar os membros da congregação que faltavam ao
sermão dominical matutino. Os residentes da Nova Inglaterra que faltavam ao culto
dominical eram multados ou presos no tronco. Hoje ainda há alguns pastores que tem a
preocupação de repreender alguém por faltar ao culto

Considerações finais

Apesar da liturgia do culto ter sofrido influências diversas não podemos nos esquecer
que Deus é o centro da adoração. Pois, existem outros elementos que compõem o culto
cristão. No entanto, estes: a Palavra de Deus, a Oração, o Cântico, Comunhão e os
Cerimoniais, são essenciais. São elementos que fazem com que o nosso culto seja “bíblico”.
Há teologia na liturgia, por isso não nos esqueçamos do equilíbrio entre as partes. Algumas
igrejas enfatizam a oração, outras o cântico, outras a pregação e algumas parecem mais um
clube do que uma igreja ao priorizarem a comunhão. Somente quando houver equilíbrio nestas
partes essenciais é que o culto poderá ser edificante para aquele que dele participa. O
verdadeiro culto cristão tanto agrada a Deus como edifica a quem o presta, fazendo de cada
reunião um momento especial para glorificar a Deus, assim, como edificar a igreja.

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