Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
de formação de associação de
escolas dos concelhos de ílhavo,
vagos e oliveira do bairro
COMPETÊNCIA(S)
LEITORA(S)
‘‘
ficha
técnica
colaboração neste número
MARIA DE FÁTIMA ALBUQUERQUE, DINA CAMELO, ISABEL ANÇÃ,
ISABEL RIBAU ESTEVES, MARIA GORETE RAMOS
direção
MANUEL PINA
coordenação
ALCINA MENDES, MARIA DE FÁTIMA ALBUQUERQUE
conceção gráfica
ANTÓNIO NEVES
edição
CFAECIVOB
CFAECIVOB@GMAIL.COM
WWW.CFAECIVOB.PT
ISSN 2182-1658
ficha
técnica
‘‘
conteúdos
01
apresentação
02 NOTA INTRODUTÓRIA
A L C I N A M E N D E S , C O N S U LTO R A D E F O R M A Ç Ã O D O C FA E C I V O B
fundamentação
03 COMPETÊNCIA(S) LEITORA(S)
MARIA DE FÁTIMA ALBUQUERQUE, FORMADORA
práticas
09 DOSSIÊ A
GORETE RAMOS, ISABEL ANÇÃ, FORMANDAS
21 DOSSIÊ B
DINA CAMELO, ISABEL ESTEVES, FORMANDAS
recursos
42 BIBLIOGRAFIA COMENTADA
MARIA DE FÁTIMA ALBUQUERQUE, FORMADORA
conteúdos
02
cadernos
competência(s)
leitora(s)
apresentação
‘‘
nota
introdutória
TEXTO: ALCINA MENDES
03
O segundo número de Concede-se sempre particular
“Cadernos” dá continuidade ao importância ao contributo
projeto editorial do CFAECIVOB - concetual do(s) formador(es),
Centro de Formação de pois trata-se de um elemento
Associação de Escolas dos contextualizador e orientador.
Concelhos de Ílhavo, Vagos e Por um lado, possibilita-se uma
Oliveira do Bairro, que foi introdução formadora para
iniciado em 2011 com o seu aqueles que aqui encontrem um
primeiro número dedicado à discurso de novidade. Por outro
temática da educação em lado, orienta-se a leitura e
ciências. possibilita-se a compreensão dos
trabalhos dos formandos.
Este número dois é dedicado à
temática da leitura e da escrita,
Tratando-se de uma tema
particularmente às questões horizontal, que se entrecruza nas
didáticas que envolvem a práticas de ensino dos docentes
promoção de competência de todas as especialidades,
leitora. desafiamos os leitores a
explorarem o percurso formativo
O projeto editorial “Cadernos”
que este segundo número de
assume-se como um instrumento
“Cadernos” propõe.
de divulgação de boas práticas
formativas, pelo que Desejamos que esta publicação
formador(es) e formandos são fomente a reflexão e o debate.
autores e atores do acervo Esperamos que os testemunhos
documental que se publica. se configurem como
instrumentos de auto e hetero
Neste sentido “Cadernos”
formação, permitindo aprofundar
assume uma identidade
conhecimentos em competência
organizacional que
leitora.
intencionalmente se ajusta à
identidade do programa de
formação que cada número
desvenda.
fudamentação
Foto: prateleira com livros
Fonte: www.longislandwins.com
‘‘
competência(s)
leitora(s)
TEXTO: M A R I A D E F Á T I M A A L B U Q U E R Q U E *
04
* Maria de Fátima Albuquerque foi Falar do sistema de ensino em da Língua Materna, que
Professora da Universidade de Aveiro
durante mais de trinta anos. Doutorou-se
Portugal é evidenciar a consideram que a competência
em Metodologias de Ensino do importância da leitura e da leitora é uma capacidade
Português com uma tese sobre a escrita escrita como promotores de fundamental para todos e
e a leitura. Em qualquer dos campos tem sucesso educativo dos alunos. quaisquer alunos, através da
numerosas publicações em revistas Qualquer aluno, em qualquer qual se ultrapassa o simples
nacionais e estrangeiras, além de
múltiplas participações em congressos e disciplina do Ensino Básico, ou reconhecimento dos símbolos
ações de formação. Secundário, ou Universitário, só gráficos da escrita, se transpõe a
Além da docência, desempenhou vários obtém aproveitamento se ler mera compreensão das ideias
anos a função de Coordenadora dos manuais e textos de consulta, se veiculadas pelo texto, atingindo
Estágios pedagógicos das Licenciaturas dominar a técnica dos trabalhos um plano mais profundo,
em Ensino da Universidade de Aveiro: ou testes escritos, se souber retirando do lido uma lição de
essa experiência de contacto com a vida. Logo, a competência leitora
formação de professores de todos os
compreender, analisar,
graus de ensino e de todas as áreas fundamentar e criticar material permite a cada e a todos os
científicas fez-lhe sentir a importância escrito em geral, lendo e alunos que, através duma dada
prioritária em todas as disciplinas da escrevendo com facilidade e leitura, encontrem respostas para
competência leitora dos alunos, como adequação. os problemas individuais,
elemento facilitador do sucesso escolar.
Dinamiza ações sobre este tema nas
enriquecendo o seu próprio
Esta familiaridade com o escrito/
suas várias vertentes desde 1992. percurso vital.
lido permanece como uma
competência horizontal em todo Nesse sentido, a competência
o currículo escolar, pois mesmo leitora é uma capacidade
para as outras disciplinas que fundamental e incontornável do
não são Língua Materna, o crescer, que nos permite
desenvolvimento da competência transformar o aprendido em
leitora dos alunos é importante todas as disciplinas, como a
para concretizar os objetivos Física, as Ciências Naturais, a
gerais de cada área disciplinar. História e o Português, em
De outro modo, acabamos por conhecimento fundamental, que
entrar numa espiral em que os não se põe de lado – ou se deita
alunos, porque não conseguem fora! – com o encerrar do ano
decifrar os textos, não têm letivo. Competência leitora é
aproveitamento às disciplinas, então, no plano pedagógico,
mas também porque não mais do que um saber-estar, ou
compreendem as matérias, não saber-fazer; é o saber tout court,
se dedicam à leitura… como base de aquisição de todo
o conhecimento, como
É essa interligação entre forma e
competência geradora da
conteúdo, entre a mera
interiorização do aprendido.
descodificação dos grafismos e o
significado desse mesmo texto, O desenrolar desta ação
que me leva a recorrer à assentou em diversos
definição ultimamente adotada pressupostos que passo agora a
pelos especialistas de Didática enumerar:
fundamentação
05
1. A competência leitora é então níveis de ensino, a
uma capacidade essencial à compreensão, o aprofundamento
aprendizagem de qualquer das das aprendizagens científicas ou
disciplinas ministradas, que só linguísticas?
pode ser melhorada através de
De entre as possíveis,
um trabalho partilhado entre os
selecionámos para esta ação de
professores das diferentes
formação algumas essenciais,
matérias. Como se irá ver, tal
tendo em vista variáveis externas
não significa uma visão
- a realidade das escolas, a
unificadora e redutora das
idade dos alunos e a formação
diversas atividades. A diferença
dos professores -, assim como
entre os dossiês que me irão
variáveis internas,
servir de exemplo, documentam
nomeadamente a limitação do
bem as possibilidades múltiplas
tempo do decurso da própria
de leituras do mesmo
ação (25 horas).
documento;
Para melhor operacionalizar o
2. Todas as disciplinas de
conteúdo da ação e para esta se
qualquer grau de ensino ganham
refletir nas práticas docentes
muito com atividades de leitura e
utilizámos algumas estratégias
interpretação de texto, quer estes
globais que passo agora a referir:
sejam recreativos, quer
artísticos, quer científicos. Aliás, 1. Partimos sempre de um
tendo em conta o número de modelo que a formadora
alunos que mostra relutância apresentava como ponto de
perante a leitura, cabe ao partida e que servia de
professor ler em voz alta, em exemplificação concreta, para o
aula, ajudando os alunos a exercício a desenvolver pelos
refletir e interpretar os textos formandos;
selecionados. 2. Os formandos trabalhavam em
pares, sendo um deles de
Então que estratégias de
Português (ou áreas afins) e o
possíveis explorações outro de qualquer das outras
multidisciplinares se devem áreas disciplinares, quer
desenvolver para que se atinjam científica, quer artística;
competências leitoras mais
3. Todos os textos apresentados
completas? Que diversidade de
nos dossiês finais eram
modelos de leitura utilizar com os produzidos em espaço de aula.
alunos para uma melhor Após um primeiro momento de
exploração dos diferentes tipos reflexão dos elementos do grupo
de texto? Que operacionalização de que resultava uma planificação
aplicar nas práticas educativas da tarefa, passava-se à redação,
para consolidar, em conjunto e depois a uma leitura de partilha
com os alunos dos diferentes com os colegas presentes.
fudamentação
‘‘
guia
para a leitura dos
trabalhos
TEXTO: M A R I A D E F Á T I M A A L B U Q U E R Q U E
06
Sessão
introdutória
(motivação):
a atividade da A leitura, feita pelo professor ou
por um dos alunos, é passível de
“leitura para os processos de avaliação pelo
outros” resto da turma, tendo em conta o
Este tipo de atividade, muito ritmo, a cadência, a correção e a
prezada pelos pedagogos articulação, entre outros
ligados à leitura e escrita, parte parâmetros. Depois, recorre-se a
de um conto curto – neste caso outras tarefas orais ou escritas,
“O Pai que se tornou mãe” de J. explorando os sentimentos das
E. Agualusa –, para ensinar os personagens, ou a evolução do
alunos a concentrar-se e dar enredo, ou o começo e o fim da
José Eduardo Agualusa atenção à forma e aos conteúdos história, ou mesmo o sentido do
Foto de Jorge Simão título.
dum texto.
Objetivos a atingir
- comprovar que os alunos compreenderam o lido;
- verificar o grau de atenção dos alunos;
- avaliar a sua capacidade crítica perante o desenrolar da intriga;
- incentivar os alunos a uma atitude criativa perante um texto.
fundamentação
Lobo Antunes no Salon du livre de
Paris, 2010
Foto: Georges Seguin
Fonte:http://en.wikipedia.org/wiki/
07
Unidade 1:
necessidade de respeito formal pelas normas
do texto escrito – a correção ortográfica
Como modelo para esta unidade utilizámos a crónica de António
Lobo Antunes “Esta que se acina Gabriela”, (Público Magazine,
16/10/94), onde se apresenta uma carta escrita por uma
personagem de fraca instrução.
Objetivos a atingir
- sentir o erro de ortografia como um sério impedimento à
compreensão do texto;
- valorizar a ligação entre classe social e erro ortográfico;
- perceber a ambiguidade criada na frase pela ausência de
pontuação ou de acentuação gráfica, e mesmo por construções
sintáticas erradas.
Unidade 2:
variações
conteudísticas
do texto
escrito
Exemplificação através de
explorações múltiplas do conto:
para tal, usámos a história do
“Capuchinho Vermelho”,
conhecida por todos, e lemo-la e
interpretámo-la em diversas
versões.
fudamentação
Objetivos a atingir
- relembrar o conto tradicional e a sua estrutura interna;
- adaptar o conto tradicional aos tempos modernos, integrando no
imaginário textos paralelos, pastiches, paródias ou adaptações
livres;
- perceber a possibilidade de converter qualquer texto narrativo em
texto poético ou texto dramático;
- criar textos não-literários, com uma grande carga funcional, como
textos jornalísticos, depoimentos ou outros.
Unidade 3:
a relação entre o
texto escrito e as
outras linguagens,
com especial
relevo para a
imagem
Como modelo/ ponto de partida,
procedemos a um estudo de
declarações de vários
ilustradores sobre o seu papel
como descodificadores do texto
escrito que ilustram.
João Caetano
Fonte: http://www.kalandraka.com Objetivos a atingir
- organizar uma rápida História da ilustração como forma de
enriquecimento do texto escrito;
- tomar conhecimento da função do ilustrador como leitor primeiro;
- refletir sobre as relações entre o criador do texto escrito e o criador
da imagem ilustrativa;
- perceber a imagem como uma fonte inesgotável de criação de
texto linguístico.
09
Enquadramento reflexivo dos exercícios
executados
Ao longo da realização desta Esta dupla competência é
ação de formação reinou a ideia fundamental para que os nossos
da possibilidade de brincarmos alunos compreendam e tirem
com as palavras sem nunca inferências, pois tudo o que se lê
esquecer as regras das altera a nossa vida, através
“Competências Leitoras”. E, só duma aprendizagem
dessa maneira, teremos todo o interiorizada. Logo, ao
direito ao desfrute da leitura dos procedermos ao exercício da
livros, mas agora com um olhar “leitura para os outros” temos de
mais crítico e mais atento em ter o cuidado de verificar se os
relação ao próprio texto que nos nossos alunos têm tempo de
chega às mãos, e em relação ao entender, assimilar e
que ele indicia. acompanhar o texto. Deste
modo, permitimos que possam
Sessão após sessão, os nossos
avaliar e discutir a leitura.
horizontes abriram-se para a
imensidão da exploração textual, Aplicámos esta atividade na
nas suas mais diversas escola, partindo do conto de J. E.
concretizações – utilitárias, Agualusa “O Pai que se tornou
criativas, jocosas, científicas – Mãe”, que foi lido e depois
que fomos explorando e que nos acompanhado de uma proposta
foram revelando uma caminhada de exercício em que os alunos
aliciante e mesmo uma respondiam a um questionário
verdadeira descoberta. sobre detalhes do texto. A reação
da turma em geral foi tão positiva
Na sessão inicial falámos da
que voltámos a repetir o
exploração oral de textos e do
exercício, agora enfatizando os
modo como a descodificação das
momentos afetivos,
formas linguísticas servia para
fundamentais para o
aprender os conteúdos mais
desenvolvimento da história e
profundos desses mesmos
que os alunos teriam de
textos. Para tal, foi evidenciada a
identificar.
importância de educar a atenção
dos leitores, de fazê-los ouvir e Na sessão seguinte
interpretar o escutado. Do confirmámos, uma vez mais, a
mesmo modo, foi-nos recordada importância de compreender o
a importância da memória, como que se lê e o modo como uma
ativadora das ligações entre as correta ortografia era
diferentes partes do texto e como fundamental como facilitadora da
facilitadora da interpretação do interpretação mais profunda do
que acabou de ser ouvido. texto. Foi esta a ideia que
práticas
Foto: sala da biblioteca George Peabody
Fonte: http://www.library.jhu.edu
práticas
Escrita
Fonte: http://www.fanpop.com/spots/writing/images/27456811/title/writing-photo
Unidade 1
13
Tarefa: reescrever a crónica “Esta que se
acina Gabriela” de António Lobo Antunes, de
acordo com a norma ortográfica portuguesa
Dona Graciete:
Obrigadíssima.
práticas
Tarefa: redigir uma página de diário, ou uma
carta trocada entre duas das personagens
intervenientes
CARTA DE CABÉ A GABRIELA
Minha loirinha
Cá recebi a tua carta que me fez muito feliz. Até me senti melhor da
saúde.
Passei pelo Salão e não te vi. Fiquei triste por não te ver e entregar-
te estas letras pessoalmente.
Passei o resto do dia muito calado e até a minha mãe perguntou se 15
eu estava pior das minhas maleitas. Acabei por confessar que não te
tinha encontrado no trabalho. Ela voltou a dizer para ter cuidado com
o teu marido, que brutamontes como é, podia tratar-me da saúde. E
tu bem sabes que a minha saúde já anda mal. Mas mesmo assim, lá
me foi dizendo que eu até podia escrever um bilhete e deixar lá no
Salão.
Tenho saudades tuas, de estar contigo e das coisas que me fazes.
Falta tanto tempo para chegarmos a março e matarmos saudades.
Até lá, vou lendo as tuas cartas e olhando o teu retrato.
Para a minha loirinha
Beijos
Cabé
PS – Se por acaso, o veado for de serviço a Beja antes de março,
manda-me um bilhete pela nossa amiga Rosinha. Beijos.
práticas
desconhecida, onde acabou por E depois… depois ficou sem
ficar encalhado. Num momento nada ver. Dos olhos do monstro
de calmaria, o rapaz desceu do tinham saído uns raios
barco e, movido pelo bichinho da luminosos, cintilantes e
curiosidade, pôs-se a caminho à amarelos, que o tinham deixado
descoberta daquele sítio aonde cego e paralisado.
tinha aportado. Precisava de
Estes pormenores foram
saber onde estava!
narrados a Charles pelo rapazito
Caminhou, caminhou, e durante de há pouco (ainda se lembram
todo o percurso não encontrou dele?), que entretanto se tinha
vivalma. escondido perante a
aproximação do monstro e que
De repente, ouviu um barulho
tudo tinha testemunhado. Pois foi
quase indiscreto e sentiu-se
este mesmo valente menino que, 17
observado. Virou-se de súbito e
erguendo a sua espada, se
deu de caras com uma longa e
lançou sobre o monstro, ferindo-
afiada espada, empunhada por
o nos olhos.
um rapazito com aspeto
ameaçador. E foi assim que conseguiu que
Charles, o seu novo amigo,
O menino até era parecido com
recuperasse a visão perdida e
ele, mas assim armado de
que voltasse a caminhar.
espada, era preciso ter cuidado!
Afinal, aquele monstro
- Todo o cuidado é pouco! –
assustador estava apenas a
exclamou o rapazinho. – Eu
guardar as árvores daquele
também vim aqui parar e já fui
lugar, pois davam umas folhas
vendo por aí sombras, que mais
milagrosas, com poderes para
parecem piratas a vaguear!...
curar enfermidades, moléstias e
Charles olhou à sua volta e ficou febres. Era este o grande
impressionado com beleza tão segredo!...
estranha e assombrosa. É que,
Mas estes dois pequenos
depois de tantas viagens e
aventureiros, ao contrário dos
aventuras passadas, não se
outros que tinham chegado
lembrava de ter encontrado uma
àquela ilha, iriam fazer bom uso
paisagem tão bela. Maravilhado,
daquela virtude, pois era
apenas conseguiu pensar: Que
importante para a proteção do
árvores fantásticas são estas?
ambiente e igualmente para o
E por um instante veio-lhe à futuro de todos.
memória o segredo que ouvira:
Chegou então o dia do regresso
não devia estar longe… seria
a casa: Charles despediu-se do
esta a Ilha de Gotapa?
amigo, que resolvera continuar
Encontrava-se entregue a estes
na ilha, e, com alguns sacos
pensamentos quando sentiu uma
cheios daquelas folhas, começou
pancada na cabeça que o fez
a sua viagem de regresso.
cair redondo no chão!...
Durante a jornada foi imaginando
Quando conseguiu recuperar os
o jantar em família que o
sentidos, avistou uma gigantesca
esperava, onde iria fazer a sua
figura peluda, com dois olhos
grande revelação. Aliás, eram
enormes e muito esquisitos, e
duas, pois esperava que a
com garras afiadas e
Margot também estivesse
pontiagudas. No preciso
presente e então poria fim àquele
momento em que os dois se
nó no estômago que sempre
olharam, Charles sentiu um
sentia quando pensava nela…
arrepio por todo o corpo e fica
paralisado, sem conseguir
levantar um dedo sequer, quanto
mais levantar-se do chão.
práticas
Tarefa: transformar um trecho narrativo em
texto teatral
Do “Chapeuzinho Amarelo” de Chico Buarque à nossa adaptação.
Unidade 3
Tarefa: reflexão sobre o contributo do
ilustrador para a criação do texto escrito
O mistério mais difícil de ilustrar
O mundo à nossa maneira será a ideia (na sua essência) do
imaginário ancestral, como é o
caso de algumas histórias
Será assim o mundo da africanas ou orientais. Ou ainda
ilustração dos livros, um mundo as que contêm outras vivências
fantástico? culturais dos Povos e que se vão
Um mundo em triângulo!... perpetuando através da
oralidade.
Na base estará a ideia que
conhecer e entender o texto não O culminar destas formas de
invalida a autenticidade do desenho será atingido no
ilustrador. E que dizer da sua conceito de Arte e na sua beleza
fidelidade? Também suprema, representada no
importante!... Mas, nesse jogo trabalho de alguns ilustradores.
entre as palavras e as imagens, E eis que nascem as melhores
o pequeno público deve ser histórias ilustradas: com a
sempre respeitado, o público a bênção dupla do Escritor e do
quem se destina o livro, sem Ilustrador em comunhão. É então
nunca esquecer de comunicar os que num desenho de uma folha
sonhos, as hipóteses e um certo de árvore se podem ler muitas
mistério a ser desvendado. palavras…
práticas
12
20
Ilustração de João Caetano para o livro
«A maior flor do mundo», de José Saramago
(pormenor)
21
Enquadramento reflexivo dos exercícios
executados
Dado que, atualmente, todos nós a essência teórica final, sintética,
vivemos num mundo cujo reflexiva e crítica sobre os
sucesso depende do domínio caminhos indicados, os
das competências da leitura e da conhecimentos adquiridos?
escrita, durante vinte e cinco Como sumarizar conclusões e,
horas tentámos treinar essas mais do que isso, fundamentar
competências, desenvolvendo opiniões e sugestões, avaliando
estratégias para possíveis as mais-valias obtidas,
explorações multidisciplinares da salientando os aspetos que mais
lectoescrita. ou menos foram valorizados por
nós, e que nos permitiram refletir
Assim, fomos construindo um e/ou intervir sobre essas nossas
espaço, um percurso formativo, próprias práticas? Como aplicar
com várias sessões de natureza as aprendizagens científicas à
teórico e/ou prática, onde, nossa própria sala de aula cheia
tratando de desenvolver as de alunos, à nossa realidade
nossas próprias competências educativa, ao nosso
leitoras de professores, oriundos enquadramento e contexto
de diversas áreas e pedagógico, com determinadas
especialidades disciplinares, com caraterísticas e especificidades,
diferentes conteúdos temáticos operacionalizando essas novas
(neste nosso caso de Ciências perspetivas de conhecimento, e
Naturais e de História), nos ainda tentando apontar novas
interessámos pelos conteúdos, pistas de intervenção futura?...
objetivos, atividades deste novo
processo formativo, tentando No princípio foi o verbo e o verbo
contribuir ativamente para os se fez escrita. No princípio,
trabalhos individuais e de grupo, desde que o homem articulou a
participando presencialmente de fala, desenvolveu-se um sistema
forma construtiva nas sessões de comunicação primário,
plenárias bem como nas tarefas baseado na linguagem oral. Com
não presenciais. o tempo, verificou-se uma
necessidade de fixar esse
Como condensar, com base no sistema primeiro de comunicação
nosso conhecimento profissional e surgiu um sistema secundário,
e nas nossas práticas, essa a linguagem escrita/ lida. A
experiência formativa vivenciada, escrita guarda o verbal, com um
tentando extrair de vinte e cinco conjunto de símbolos, com um
horas de trabalho, da sala de determinado grafismo,
aula da formação de professores, convenções, normas, regras de
práticas
ortografia, com determinadas continuar a analisar em sala de
formas linguísticas, que urge aula, o caso concreto da obra
respeitar. A escrita torna-se um “As vinhas da ira”, de John
código. A leitura com todas as Steinbeck, no sentido de chegar
competências leitoras, uma às aprendizagens científicas
forma de descodificação desse pretendidas, bem como, para
código. E aqui surge o primeiro uma faixa etária ainda mais
ponto de reflexão: se queremos jovem, a exploração do livro “Um
que essa capacidade de leitura, trono para dois irmãos”, de Isabel
de descodificação da escrita se Alçada e de Ana Maria
desenvolva, obviamente que Magalhães. Para esta última
teremos de trazer o livro com obra, construímos um projeto de
diferentes tipos de texto, possível exploração
suscetíveis de exploração, para a multidisciplinar, que vamos
12
22 vivência diária, não só nossa, continuar a enriquecer, no
como dos nossos alunos. sentido de transmitir aos alunos
os conteúdos programáticos, e
Uma primeira reflexão leva-nos neste caso, explorando não só
então a questionar sobre os os aspetos históricos, mas
diferentes tipos de texto que alargando o estudo a todas as
devem ser alvo de uma seleção disciplinas, com análise textual e
para uma posterior exploração atividades lúdicas, inseridas no
com os nossos alunos. âmbito de uma maleta
Antes de mais, esses diversos pedagógica, rica em diferentes
tipos de texto devem estar estratégias e métodos para
relacionados com a exploração desenvolver as competências
de diversas áreas, leitoras dos alunos. Pretendemos
especialidades disciplinares, continuar a alargar este tipo de
consoante os conteúdos estudo de textos, partindo para
temáticos que cada professor novas obras, estimulados
pretende partilhar. Dever-se-á também pela abertura de novas
fazer uma seleção cuidada para perspetivas sobre as de
que estes textos abordem as competências leitoras, sentidas
linguagens específicas de cada como uma fonte de discussão,
área que se quer veicular aos confronto, apresentação,
alunos. Não será difícil pesquisar divulgação, partilha, troca de
e encontrar obras literárias, como saberes, onde é possível
por exemplo as do Plano encontrar e desenvolver relações
Nacional de Leitura, ou outras, interdisciplinares, baseadas na
que estejam aptas a ajudar a complementaridade de diferentes
cumprir esses objetivos de explorações multidisciplinares.
exploração multidisciplinar, Um pressuposto/ ponto de
através de leituras partida leva-nos a relacionar os
diversificadas. No caso concreto diferentes tipos de texto a
das disciplinas de Ciências explorar com os alunos com os
Naturais e de História, abunda a respetivos conteúdos temáticos
quantidade de tipos diferentes de das áreas disciplinares
texto disponíveis. Em História, específicas. Por outro lado,
poder-se-ão analisar excertos de nessa exploração dos diferentes
obras clássicas e não clássicas, tipos de texto em sala de aula, se
incluindo as do novo modelo de pretendemos o desenvolvimento
literatura infanto-juvenil, textos das competências leitoras nos
históricos e historiográficos, e, alunos, uma nova reflexão se
porque não, convidar os alunos a impõe: Que textos selecionar?
proceder à leitura integral da Os alunos levam já a cabo no
obra donde os textos foram seu quotidiano particular, as suas
destacados. Nas nossas próprias leituras selvagens, fora
práticas, já analisámos e vamos da sala de aula. Dentro da sala
práticas
Livros em prateleiras
Fonte: http://alyoda.univ-lyon3.fr/index.php?option=com_content&view=article&id=53&Itemid=62
Tarefa:
Mulher a escrever - Pablo Picasso (1934)
Fonte: http://www.wikipaintings.org/en/pablo- escrever uma página do Diário de Gabriela
picasso/woman-writing-1934
Querido Diário
Ai que cuando abri a porta e me foi dado olhar sinhores com estes
que a terra áde comer querido diário açim de bandeja para aquela
mistura de sorrizo á trio Odemira muscalos como o morcão sinco
anos antes de se cazar e mãos compridas como o Cabé até á ora
de se apagar, fassa favor minha sinhora aci tem o seu xá e os seus
bizcoitos tão fino nos modos está bem muito obrigada deiche aí em
sima dessa meza que eu já lavou não lavei não senhor que eu já lá
vou. Não rezisti a dar dois dedos de converça a conciência a doer
enquanto olhava para a argola do guardanapo não metas o pé na
argola Gabriela da Conceição Filipe não arranjes nenhum trinta e um
acabamos por trucar os numeros de telemovel porque pelos vistos o
rapas istá a pensar ir viver para capital se lá incontrar meios de
çustento e eu atão porque nesta vida temos que çer mesmo uns
para os outros porque senão esta vida perdia a validade eu lá me
pus ao dispor do rapas para tudo o que ele tiver pressizão e
grassas a deus não foi desta que meti o pé na argola hoje não meti
o pé na argola palavra de Gabriela ispero é que o rapas nunca se
apersseba que na argola meti foi a mão que deus me perdoe que
até gosto sempre de faser este çinal da cruz para me protejer mas
amanhã é o dia dos inganos e a argolasinha do guardanapo com
aqueles brilhantesinhos que paressiam diamantes combinava tão
bem com a minha loussa da cristaleira da çala de jantar.
práticas
Unidade 2
Tarefa: elaborar um conto tradicional, de
acordo com as regras desta matriz narrativa
(1º modelo)
31
Serenela
Ilustração de Dina Camelo
Capacete vermelho
A cena passa-se entre uma avó e uma neta, no dia dos avós, num
Domingo à noite, num Centro de Acolhimento:
(A neta, de minissaia, top, phones, capacete vermelho, com uma
cesta na mão e a dançar, inclina-se para a avó)
NETA - Boa noite, avó, como passaste o dia?!... Beijinho!
(A avó recusa ligeiramente o beijo, embora o aceite)
AVÓ - Boa noite, não! Pelo contrário! Estou enervadíssima!…
Ninguém me liga! Estive todo o dia à sua espera e a menina não
apareceu… Fiquei aqui abandonada todo o dia sem ninguém dar
sinal de vida!...
NETA - O quê, avó?!... Sida?!... Ora, ora!... Não fales nisso agora!
Tens passado a vida a avisar-me para os males da época! Estou a
chegar tarde porque ontem à noite fui à Discoteca e acordei hoje há
pouco tempo, às seis horas da tarde…
AVÓ - Ora, ora?!... A orar estive eu!... A essa hora estava eu a rezar,
na minha hora do Angelus, rodeadinha dos meus santinhos todos, e
a pedir para que nada de mal lhe pudesse acontecer… Já era tão
tarde e a menina sem aparecer… Não é que eu não esteja
acostumada a isso, mas a esperança é sempre a última a morrer…
(A neta tira o computador da cesta que tem na mão e entrega-o à
avó)
NETA - O quê, avó?!... Tem de ser?!... Ah, pois tem! Trago-lhe aqui
nesta cestinha um computador portátil para quando a avó se sentir
assim muito abandonadinha, falar connosco no Messenger, pela
Internet!
(A avó leva as mãos à cabeça)
AVÓ - Oh, Deus! Interneta?!... Já tenho por aí ouvido falar dessa…
Mas eu para neta e para virtual já me basta a menina!... Que vem a
ser isso?!... Não domino! Preciso de alguém que me ensine…
NETA – O quê, avó?!... Assassine?!... Oh, avó, que pensamentos
tão macabros! Nem pense em tal! Se já há lares para que é precisa
a eutanásia?!...
AVÓ - Ah, sua mal educada! A menina não acha que com o frio que
está devia vir mais bem vestida?!...
práticas
Ilustrações de Gustave Doré para um conto
de Charles Perrault «Petit Chaperon Rouge»
Fonte:
http://commons.wikimedia.org/wiki/Gustave_
Dor%C3%A9
12
38
NETA – O quê, avó?!... Despida, eu?!... Então… É a moda! Trago
esta mini- saia que me tapa até às virilhas, mas, ontem à discoteca
levei um cinto…
(A avó gesticula muito e usa o indicador)
AVÓ - Olhe menina, eu cá… Também sinto muito… Mas até parece
que não lhe deram educação… Olhe, por acaso a menina pensa que
tudo, inclusivé a família, é tão descartável como essa chiclete que
ainda não parou de mascar avidamente desde que chegou aqui?!...
Olhe, e se a menina se limpasse como deve ser, que parece que já
não há raparigas limpas?!... Já reparou que está toda suja de óleo
da mota, no intervalo dessas suas tatuagens?!... E se a menina
fizesse o favor de parar de se abanar tanto ao som dessa sua
música secreta e tirasse esses inoportunos phones?!... E se
pendurasse com um fio uma nota com a lista dos seus deveres
nesse piercing que aplicou na língua, que é para não se lembrar só
dos seus direitos?!... E sobretudo, sobretudo, se a menina tirasse
esse horrível CAPACETE VERMELHO que a faz ainda mais
cabeçuda do que já está, esse capacete que lhe deve amparar bem
as quedas… Bem sei!!… Mas que junto com esses phones a põe
surda que nem uma porta e a impede completamente de ouvir aquilo
que eu já lhe disse e aquilo que eu ainda tenho como um espinho
atravessado na garganta para lhe dizer?!...
Unidade 3
12
42
ALARCÃO, Mª L. Motivar para a HARRISON, C. Readability in the
Leitura. Porto, Texto Editora, 1995. Classroom. Cambridge, Cambridge
Esta obra, apesar de ser uma obra University Press, 1982.
pioneira, apresenta algumas Um clássico incontornável para os
estratégias fundamentais para a professores que desejem melhorar o
motivação para a leitura a serem envolvimento dos alunos em relação
utilizadas em aula. aos materiais de apoio usados na
escola, nas diferentes disciplinas:
BACH, P. O Prazer da Escrita: manuais, fichas, testes de avaliação,
pedagogia da Narrativa. Rio Tinto, etc. O livro dá também pistas sobre
Asa, 1991. como relacionar um determinado livro
Relacionando o gosto pela escrita com alunos com um dado perfil.
com o conhecimento da organização
interna do texto, esta obra é um guia JAUSS, H.R. Pour une Esthetique de
fundamental para a exploração da la Réception. Paris, Gallimard, 1988.
competência leitora dos alunos. Esta obra sistematiza os mecanismos
mais comuns de identificação de leitor
CHOTE, E. Enseigner l'Oral en com o lido. Estes revelam-se como
Interaction. Paris, Hachette, 1995. facilitadores do desenvolvimento da
Como diz o título, esta obra é um competência leitora dos jovens.
excelente estudo para melhorar a
capacidade dos alunos em interagir MEDEIROS, J.B. Comunicação
com competência nas diversas Escrita. S. Paulo, Editora Atlas, 1998.
áreas disciplinares. Este autor, após apresentar critérios na
compreensão do escrito, tem uma
FRANCO, J.A. A Poesia como segunda parte da obra em que, através
estratégia. Porto, Campo das de exercícios, incentiva os alunos a
Letras, 1999. articular as propriedades e limites do
Abordando a poesia em sentido lato, texto com a linguagem em que este é
esta obra demonstra o modo como expresso.
ela se tem vindo a manifestar
noutros campos de conhecimento, PAYNE, Stanley. The Art of Asking
como outras áreas científico- Questions. Princeton, Princeton
pedagógicas, à medida que o texto University Press, 2008.
poético se converteu em prazer da Talvez a melhor obra existente sobre as
cultura. Defendendo a teoria de que técnicas de elaboração de perguntas. A
o aluno necessita de aprender em obra é incontornável para professores
Foto: Livros científicos na biblioteca do Merton
textos variados, o acesso regular a de todas as disciplinas que desejem
College, Oxford obras artísticas, científicas e melhorar a sua capacidade de
Fonte: literárias fundamentam descobertas perguntar e/ou de compreender melhor
http://gallery.spacebar.org/f/a/photo/viewpic/1/
519/1/ que conduzem ao prazer estético. as questões colocadas pelos alunos.
práticas
recursos