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Júlia Susana C. Reis (Geógrafa) e Maria Teresa Caiado F. Correia (Juiz de Direito)
Rua Dr. Vasco Moniz, Edifício Varandas da Lezíria I, Bloco 2, 3º D, 2600- 273, Vila
Franca de Xira, 964497482, teresaescoural@gmail.com ou matasdesousa@hotmail.com
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VI Congresso da Geografia Portuguesa
Lisboa, 17-20 de Outubro de 2007
Foi sobretudo a partir dos anos 60 do século XX que se assistiu a uma explosão na
ocupação do solo para fins urbanos, reflexo do extravasar dos centros até então existentes,
fruto da necessidade de obtenção de habitação própria de uma vasta camada da população,
numa época em que a oferta imobiliária não era suficiente, nem cobria as exigências de
todas as camadas sociais.
Se os bairros clandestinos dos anos 40 e 50 ofereciam alojamento barato, constituindo-se
como uma alternativa à construção em barracas (fenómeno que ocorreu principalmente na
margem norte de Lisboa) os loteadores ilegais dos anos 70 e 80 ofereceram a alternativa de
uma moradia com quintal e jardim construída pelos próprios proprietários.
Os clandestinos de “primeira geração”1 instalaram-se e cresceram por “falta de uma
política de habitação social que respondesse às necessidades do crescimento demográfico
e à instalação de população imigrante de baixos rendimentos”2. Os de “segunda geração”,
dominados pela casa própria, consolidaram-se por não haver uma “política urbanística
global que responda a um modelo de habitat eleito pela classe média com uma capacidade
de auto-investimento acrescida.”3
A urbanização clandestina é um fenómeno de transformação social, envolvendo diversos
estratos sociais da população, desde os grandes proprietários fundiários, aos
intermediários, aos pequenos empresários e construtores, à pequena burguesia urbana,
largamente associada ao clandestino do lazer e à segunda habitação junto às praias, aos
operários dos centros industriais e à população rural deslocada em busca de referências que
recriassem o seu modelo de habitat.
Esta forma de urbanização marginal surgiu como resposta a três aspectos fundamentais:4
Procura de terrenos para investimento de pequenos capitais e poupanças familiares,
proporcionando o acesso à propriedade urbana como garantia face à desvalorização da
moeda, fruto do processo inflacionário que ocorria na década de 70.
Procura de alojamento por parte dos estratos sociais de menor capacidade económica,
proporcionando casas de renda acessível, reduzindo o desfasamento entre o poder
1
O termo clandestinos de “primeira e segunda geração” é utilizado por BRUNO SOARES, Jorge Luís
(1997) “Transformação Informal do Território. Situação na Área Metropolitana de Lisboa”, in A Cidade em
Portugal: Onde se Vive, Colecção Povos e Culturas, n.º 2, pp. 345 a 351, Centro de Estudos dos Povos e
Culturas de Expressão Portuguesa, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa;
2
Idem;
3
Ibidem;
4
Ibidem;
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Retirado de GUERRA, Isabel; MATIAS, Nelson (1997) “Elementos para uma análise sociológica do
movimento clandestino” in A Cidade em Portugal: Onde se Vive, Colecção Povos e Culturas, n.º 1, pp. 335 a
355, Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, Universidade Católica Portuguesa,
Lisboa;
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“De facto a divisão de um ou vários prédios em lotes destinados à construção não esteve, entre nós, sujeita
a qualquer regulamentação jurídica autónoma até à publicação daquele diploma legal. Dúvidas existem,
contudo, sobre a questão de saber qual era o regime que vigorava antes deste diploma. Uns defendem que
vigorava a regra da liberdade (neste sentido, cfr. Osvaldo Gomes, Manual dos Loteamentos Urbanos
Coimbra Editora, 1983, p.35 a 37), outros que, após o Código Administrativo de 1936, o governo passou a
proibir tacitamente a realização de urbanizações particulares [posição defendida por Fernando Gonçalves,
“Evolução Histórica do Direito do Urbanismo em Portugal (1851-1988), in Direito do Urbanismo, INA,
1989, p. 2519]. No entanto, não obstante as dúvidas que perante as disposições do Código Administrativo se
colocaram quanto à respectiva legalidade, a verdade é que a iniciativa dos particulares no fraccionamento
da propriedade não foi, antes de 1965, impedida, desde que fossem respeitados os preceitos legais
aplicáveis. cfr. António Duarte de Almeida, Legislação Fundamental de Direito do Urbanismo, Lisboa, Lex,
p.502” Retirado de CARVALHO, Jorge; OLIVEIRA, Paula (2003) “Perequação Taxas e Cedências –
Administração Urbanística em Portugal” pp.15 a 18, Livraria Almedina, Lisboa;
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assim o DL n.º 289/73, de 6 de Junho, que vem tentar impor algumas regras,
nomeadamente a necessidade de identificação do número e data do alvará de loteamento
para o registo dos actos ou negócios jurídicos relativos a terrenos com ou sem construção
(ver a este propósito o art.º 27º que impede a celebração dos negócios jurídicos acima
referidos. Deste modo parecia estar vedada a possibilidade de constituição de direitos sobre
parcelas concretas de terrenos.7
De facto, com a publicação deste diploma, deixou de ser possível vender parcelas de
terreno rústico como lotes para construção urbana (em m2), no entanto as propriedades
rústicas passaram a ser vendidas em parcelas de avos indivisos. A venda em avos
processava-se da seguinte forma: por exemplo, um prédio rústico de 100.000 m2 era
vendido em tantas parcelas quanto possíveis, até atingir o valor da propriedade (100.000
m2) – 350/100.000 avos, 500/100.000 avos, 1.000/100.000 avos, etc, registando assim os
compradores o seu direito na competente Conservatória do Registo Predial em regime de
compropriedade.8
A venda em avos não implica o destaque do prédio inicial, ou seja, não é vendida uma
parcela de terreno, mas sim um direito em comunhão com os outros compradores, porque
como não pode ser vendida uma fracção de terreno, vende-se uma fracção do direito ao
terreno, constituindo a escritura em avos a comunhão do direito indiviso.
Embora constitua um princípio do direito civil - ninguém ser obrigado a permanecer na
indivisão - este princípio encontrou-se limitado pelo referido art.º 27º do DL n.º 289/73, de
6 de Junho, pois quer a divisão se efectuasse por partilha judicial ou extra-judicial seria
7
Este diploma integra uma reforma da legislação urbanística ocorrida no principio da década de 70 marcada
também pelos DL n.º 166/70 de 15 de Abril relativo ao licenciamento de obras particulares, DL n.º 576/71 de
24 de Novembro, que aprovou a lei dos solos e DL n.º 506/71 e DL n.º 561/71, ambos de 17 de Dezembro,
que legislam sobre planos de urbanização, gerais e parciais, planos zonamento, planos de áreas territoriais,
planos de conjunto que abrangiam vários centros urbanos e zonas territoriais intermédias e envolventes e
planos de pormenor.
8
Muitos loteadores chegaram a vender a totalidade da propriedade rústica incluindo a área necessária aos
arruamentos que entretanto tinham “aberto” no terreno, deixando numa situação muito complicada os
compradores de direitos indivisos. Acontecem igualmente situações em que os compradores se localizam
num determinado prédio, e lá edificaram a sua construção, e encontram-se com o seu direito inscrito noutro
prédio rústico, demonstrando uma total falta de preocupação do loteador com os aspectos de natureza
registral e cadastral aquando da venda das parcelas, essencial, aliás, para a posterior concretização da divisão
da coisa comum no âmbito do processo de reconversão. Esta situação, entre outras de igual complexidade
que interessaria noutro âmbito também desenvolver, têm constituído obstáculo à celeridade dos processos e à
emissão dos títulos de reconversão.
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Seria muito interessante dispor de dados sobre a concretização destas declarações de nulidade, no sentido de
avaliar sobre a sua aplicabilidade, no entanto, não dispomos desses elementos.
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Durante estes anos os Municípios, com recurso à imaginação, foram procurando alcançar resultados
experimentando soluções em face do apertado quadro legal, tentando ultrapassar a rigidez dos
procedimentos, que se revelaram muito úteis no quadro do surgimento do regime legal em apreço.
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VARELA, Antunes; LIMA, Pires de (s.d.) “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª Edição, Coimbra Editor
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nesta matéria é especialmente útil, pois quando perante os desafios que a reconversão
apresenta, não se encontra, nem mesmo na Lei das AUGI, solução expressa, é possível
encontrar solução por recurso à referida forma de interpretação legal.
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Atente-se, a este propósito, ao feixe das relações que ocorrem, isolada e/ou
simultaneamente, entre os proprietários, entre estes e as respectivas comissões eleitas, entre
estas e as respectivas autárquicas, nomeadamente os eleitos locais, entre os eleitos e o
corpo técnico que dirigem, entre os técnicos das autarquias e os técnicos da AUGI, entre o
corpo técnico municipal e o corpo técnico dos diferentes organismos da administração
central, entre os diversos organismos da administração do estado entre si, e por aí fora, na
demanda pela concertação dos diversos interesses envolvidos.
A concertação de interesses é, para o território, essencial, pois este é o palco onde actuam a
maioria dos agentes sociais que querem ver satisfeitas as suas pretensões e anseios, nem
sempre coincidentes espacial e temporalmente.
A Lei das AUGI veio, neste aspecto específico, regulamentar a participação dos
interessados no processo de reconversão, orientando-a no quadro do regime da
administração dos prédios integrados em AUGI. Os interessados têm, no âmbito deste
diploma legal, a faculdade de intervirem de forma activa e responsável, nos diferentes
estádios do processo de reconversão, que vão desde a elaboração da proposta de
recuperação, determinante para a posterior divisão da coisa comum, até à aprovação da
mesma por parte das diversas entidades da administração local e/ou central, por via das
Assembleias de Proprietários e Comproprietários, onde podem discutir, entre outros
assuntos a proposta de regeneração urbana, alterá-la e posteriormente aprová-la, nos
termos da Lei, numa participação empenhada, na procura de soluções e não apenas na
inventariação dos problemas. Aos interessados a Lei não faculta a possibilidade de
participar, antes os obriga a fazê-lo, impondo sanções, num exercício de cidadania
responsável que interessaria, em moldes semelhantes, alargar a outras áreas de actuação
que não as AUGI.12
12
Seria, sem dúvida, muito interessante estudar o comportamento destas Assembleias de Proprietários e
Comproprietários no quadro da participação, no processo de planeamento, na Sociedade Portuguesa, pois,
malogrados os casos, constituem exemplos muito curiosos, pese embora o tipo de ocupação possuir as
contingências aliadas à sua génese marginal.
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Delimitação da AUGI
A delimitação da AUGI é a primeira etapa no processo de reconversão urbanística,
podendo a iniciativa partir da Câmara Municipal ou ser efectuada a pedido dos
interessados (cfr. art.º 1º conjugado com art. 35º da Lei das AUGI). Assim, qualquer
interessado poder tomar a iniciativa para a reconversão do seu prédio.
Podem ser delimitados como AUGI:
- Os prédios que, sem o respectivo alvará de loteamento, foram objecto de operações
físicas de parcelamento destinadas à construção, até à data de entrada em vigor do DL
n.º 400/84 de 31 de Dezembro (até Março de 1985);
- Os prédios que se encontram classificados no Plano Municipal de Ordenamento do
Território (PMOT) em vigor como espaço urbano ou urbanizável. Existe a
possibilidade de integrar áreas com outros tipos de classificação, desde que cumpram
os requisitos impostos pela Lei das AUGI na sua redacção actualizada (cfr. art.º 5º)13;
- Os prédios ou conjuntos de prédios parcelados anteriormente à entrada em vigor do DL
n.º 46.673 de 29 de Novembro de 1965, quando predominantemente ocupadas por
construções não licenciadas.
13
Este artigo possibilita que áreas parcialmente classificadas no PMOT em vigor como urbanas ou
urbanizáveis possam ser delimitadas como AUGI, desde que a maior parte da área esteja abrangida pelas
classificações referidas e a área não classificada esteja maioritariamente ocupada com construções destinadas
à habitação própria, e que preencham as condições de salubridade e segurança previstas na Lei das AUGI,
bem como se encontrem participadas na respectiva matriz à data da entrada em vigor da presente Lei. Refere
ainda este artigo no seu n.º 2 que as áreas abrangidas por reserva ou servidão possam ser desafectadas, até ao
estrito limite do necessário à viabilização da operação de reconversão, desde que não ponham em causa o
conteúdo essencial ou o fim da reserva ou da servidão, impondo nestes casos sempre a alteração ao PMOT
em vigor.
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Estas três condições base expressas na legislação visam abarcar o maior número possível
de situações nascidas na ilegalidade.14
A delimitação do perímetro das AUGI é feita com recurso a qualquer meio gráfico,
cadastral ou registral que identifique com clareza a área delimitada, podendo integrar um
ou mais prédios contíguos, pese embora um dos elementos base para a delimitação sejam
as plantas cadastrais que se apresentam extremamente desactualizadas.
Os constantes fraccionamentos e destaques de prédios rústicos contribuíram para que ao
longo dos anos se sedimentasse o actual sistema de descoordenação entre as instituições
intervenientes no processo.15 Como é óbvio, os loteadores clandestinos não tinham o
interesse de participar às entidades competentes o fraccionamento ilegal que praticavam,
para estas procederem à sua actualização. Tal situação conduz a uma complexa tarefa na
identificação dos limites das propriedades e da sua titularidade. A delimitação das AUGI
deve pois ser uma responsabilidade partilhada entre quem propõe e quem aceita.
14
Para as áreas insusceptíveis de reconversão urbanística (art.º 48º) a Lei prevê mecanismos de resolução que
passam pela reafectação das parcelas ocupadas aos usos previstos no PMOT em vigor, complementadas com
os meios que actualmente as autarquias dispõem no âmbito dos processos de realojamento, ou em alternativa
através da atribuição ao município de prioridade nos concursos municipais de habitação a custos controlados
para venda, ou ainda por via da aplicação do regime constante no DL n.º 226/87 de 06 de Junho, e legislação
complementar, para arrendamento em regime de renda apoiada. Este é um dos artigos constantes da Lei das
AUGI de mais difícil aplicação. De acordo com a nossa experiência profissional em matéria de reconversão,
o presente artigo não teve aplicação, permanecendo as áreas insusceptíveis de recuperação urbanística
imutáveis. Seria interessante procurar saber da experiência dos diversos municípios nesta matéria, porquanto
nos foi igualmente dado a perceber, em sede de troca de experiências, no decurso da actividade profissional,
que as dificuldades na aplicação deste artigo eram do foro comum e não exclusivas de um determinado
município.
15
O DL n.º 224/2007 de 31 de Maio visa constituir, cfr. se pode ler no texto introdutório do diploma legal
“…a viabilização de um sistema de informação predial único que condense, de forma sistemática , a
realidade factual da propriedade imobiliária com o registo predial, as inscrições matriciais e as informações
cadastrais.” Este diploma visa aprovar o regime experimental da execução, exploração e acesso à
informação cadastral visando a criação do Sistema Nacional de Exploração de Informação Cadastral,
abreviadamente designado por SINERGIC, cujos objectivos são, entre outros, assegurar a identificação
unívoca dos prédios mediante a atribuição de um número único de identificação, de utilização comum a toda
a Administração Pública, possibilitando a criação da informação predial única. A sua aplicabilidade será de
grande utilidade nas mais diversas esferas da sociedade e determinante no futuro desenvolvimento dos
instrumentos de gestão territorial, porquanto, frequentemente, quem procura desenvolver estudos na área do
planeamento e ordenamento do território se vê enredado na difícil tarefa de articular informação cadastral,
registo predial e fiscal.
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Dever de Reconversão
Na reconversão urbanística ao abrigo da Lei das AUGI, direitos e deveres encontram-se
interligados, pois do cumprimento do dever de reconversão depende o sucesso da mesma,
sendo condição indispensável à recuperação do solo, à legalização e ao licenciamento da
construção, assim como, na impossibilidade de legalização, na atribuição do estatuto de
manutenção temporária da construção e usufruto de infra-estruturas16.
O dever de reconversão (cfr. art.º 3º da Lei das AUGI) constitui a obrigação de actuar em
prol da reconversão, de conformar os prédios que integram a AUGI no respeito pelas
regras urbanísticas estipuladas pelos instrumentos de ordenamento e gestão do território,
nomeadamente o derrube e alinhamento dos muros mal implantados e respectiva cedência,
quando for o caso, para os arruamentos, o cumprimento dos afastamentos mínimos
previstos na Lei para implantação das novas construções ou legalização das existentes,
cedências para zonas verdes ou equipamentos, entre outros. O dever de reconversão inclui
igualmente o dever de comparticipar nas despesas e em todos os custos necessários à
concretização da reconversão, entre os quais a execução das infra-estruturas e dos espaços
de utilização colectiva, bem como dos respectivos projectos.
Importa ter presente que a Lei prevê sanções para os incumpridores que podem passar, no
que diz respeito à intervenção do Município, pela aplicação aos devedores, do corte dos
abastecimentos às redes de infra-estruturas já em funcionamento, nomeadamente a ligação
às redes de água e electricidade17 ou pelo recurso ao embargo e demolição da construção
clandestina (art. 52º do mesmo diploma). No que diz respeito às sanções aplicáveis pela
16
Esta figura deriva do DL n.º 804/76 de 6 de Novembro, actualizado pelo DL n.º 90/77 de 9 de Março,
conjugada com a Lei das AUGI.
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Raramente os Municípios cortam o acesso às redes de saneamento, quando estas existem, por motivos que
se prendem com a saúde pública.
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Os caminhos da Reconversão
O Titulo de Reconversão pode ser alcançado por uma das duas vias que a Lei das AUGI
coloca ao dispor dos interessados, a saber:
Modalidade de Reconversão por Iniciativa dos Particulares, através de operação de
loteamento, cujo Título de Reconversão será o alvará de loteamento – cfr. art. 4º conjugado
com o art. 17ºA e seguintes da Lei das AUGI e, subsidiariamente, pelas disposições do DL
n.º 555/99 de 16 de Dezembro com a redacção actualizada. Razão pela qual, é, entre outras
condições legalmente exigíveis, indispensável que cada projecto de loteamento se
conforme com o plano municipal de ordenamento do território (PMOT) superiormente
aprovado, sob pena do estudo de loteamento poder ser indeferido ou de vir a ser praticado
um acto administrativo nulo, com todas as consequências legais daí decorrentes.
Modalidade de Reconversão por Iniciativa Municipal, que pode ser desenvolvida com, ou
sem, o apoio da Administração Conjunta,18 através de operação de loteamento, cujo Título
de Reconversão será também o alvará de loteamento, depois de PMOT superiormente
aprovado, ou através de "PPR” - ao qual por mera simplificação de tratamento
chamaremos Plano de Pormenor de “reconversão” ou simplesmente “PPR”, cujo Título de
Reconversão será a certidão do plano, cfr. art.º 4º, conjugado com o 31º e seguintes da Lei
das AUGI e, subsidiariamente, pelas disposições do D.L. n.º 380/99, de 22 de Setembro, na
redacção actualizada. Quando a opção pela modalidade de reconversão recai sob a
iniciativa municipal, é necessário celebrar-se um Contrato de Urbanização (cfr. art.º 32º da
Lei), que define as atribuições e competências dos intervenientes no processo de
reconversão.
A opção por um ou outro caminho está sobretudo dependente de dois factores:
Da classificação da área de reconversão na Planta de Ordenamento do Plano Director
Municipal (PDM) respectivo, pelos motivos acima descritos;
Do grau de desenvolvimento da operação de reconversão à data da publicação da Lei das
AUGI e do contexto do seu desenvolvimento em face da legislação vigente.
18
À Comissão de Administração, de acordo com o art.º 15º da Lei das AUGI compete praticar, entre outros,
os actos necessários à tramitação do processo de reconversão, em representação dos titulares dos prédios e
donos das construções integradas em AUGI.
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O estudo de loteamento é a opção mais célere para alcançar a reconversão do solo quando
estamos em presença de um território, que embora apresente necessidades específicas em
matéria de ordenamento, não contraria figuras de planeamento em vigor, no entanto,
quando o território carece de uma visão mais estrutural do que aquela que decorre apenas
da concretização da divisão pré-existente, e no caso das AUGI em particular que
correspondem a espaços com necessidades de intervenção específicas, a opção deve, salvo
melhor opinião, passar pela elaboração de um plano municipal.
A figura do plano de pormenor carece de se tornar numa realidade no quadro dos
instrumentos de planeamento, no entanto, esta figura deve ser equacionada em moldes que
assentem no exercício da prática urbanística, que não se esgota na mera aplicação da Lei
alicerçada, frequentemente, em normativos abstractos que ignoram as especificidades de
cada lugar, as suas características biofísicas, sócio-económicas e jurídico-administrativas,
num processo formatado de acordo com especificações regulamentares, rígido e incapaz de
se adaptar às mudanças.
Um plano a que, por princípio teórico, não é permitido abertura e flexibilização, apenas
rigor e obediência subserviente, revela a incapacidade de olhar para o território como uma
expressão viva da vontade dos agentes que o titulam. Os planos devem ter margem de
manobra para reagir às mudanças e devem ser balizadores das iniciativas dos indivíduos
apostando na inteligência de interpretação e não na rigidez dos seus procedimentos. Por
sua vez um regulamento urbanístico não deve ser apenas o somatório de um conjunto de
comandos cegos, alheios ao fim a que se destinam, apenas para contentar quem não é
capaz de perceber que o urbanismo e a arquitectura não são, nem devem ser reféns de
espartilhos legais que condicionem a liberdade de expressão. 19
19
Sobre o processo de planeamento em Portugal, atente-se a intervenção do Sr. Secretário de Estado do
Ordenamento do Território e das Cidades, JOÃO FERRÃO, no II Congresso da Associação Nacional de
Municípios sobre o Tema “Ordenamento do Território e Revisão dos PDM”, na Covilhã a 25 de Outubro de
2006 que refere “É reconhecido por todos nós que o processo de planeamento territorial em Portugal tem
muitas virtudes, mas também vários defeitos. E é também reconhecido por todos que alguns desses defeitos
estão a afectar gravemente a eficiência e até a credibilidade do sistema de planeamento. (…). Do meu ponto
de vista (…) existem cinco factores principais que põem em causa o seu bom funcionamento. Em primeiro
lugar: complexidade, lentidão e burocracia. Para fazer face a este tipo de problemas temos que efectuar um
sério investimento na simplificação e agilização de procedimentos. Em segundo lugar: centralismo e
tecnocracia. A visão excessivamente tecnocrática revela-se em dois aspectos: ao nível da elaboração dos
planos, dado que os processos de concertação surgem apenas na fase final, situação tanto mais desadequada
quanto a concertação de interesses e valores constitui um desígnio essencial para o ordenamento do
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território; ao nível da apreciação dos planos pelos serviços públicos, já que por razões diversas,
predominam as verificações de conformidade legal em detrimento das avaliações da qualidade do plano. Em
terceiro lugar: “planocentrismo” recorrendo a uma designação utilizada pelo Director-Geral do
Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano. Quer isto dizer que o exercício de ordenamento do
território está muito centrado nos processos de elaboração dos planos, dando pouca importância à execução
(ou concretização) desses planos. Existe uma relação demasiado assimétrica entre a importância atribuída à
concepção do plano e a atenção dada à sua execução programada. É evidente que precisamos de planos e,
sobretudo, bons planos, mas não podemos descurar os processos e mecanismos de execução, que são, afinal,
o que permite alcançar os objectivos iniciais do processo de planeamento. O reconhecimento deste
desequilíbrio deve suscitar soluções inovadoras, nomeadamente no que se refere à participação dos
privados na elaboração do planos de pormenor e na execução de vários tipos de planos, o que implica um
debate alargado acerca de temas como as modalidades de contratualização ou o papel das parcerias
público-privadas neste domínio. Em quarto lugar: rigidez. Todos reconhecemos que os planos são rígidos e
que essa rigidez tem justificado o recurso generalizado a procedimentos de excepção - como a suspensão
parcial dos PDM – que infelizmente, por tão frequentes que são, quase se tornam “normais”. A esta rigidez
temos que contrapor com flexibilidade e diferenciação. Flexibilidade, para que, os planos possam acolher
dinâmicas de evolução sem alterar as orientações estratégicas assumidas nesses planos. E diferenciação,
porque não tem sentido exigir procedimentos e conteúdos idênticos para situações distintas, como sucede
hoje, por exemplo com os procedimentos de alteração ou revisão dos Planos, ou com os Planos de
Pormenor, sejam de modalidade simplificada ou não. Finalmente e em quinto lugar: fragmentação e
desarticulação entre planos. Uma maior coerência e articulação dos diferentes níveis de planeamento exige
vários tipos de iniciativas. Por um lado há que completar o edifício do sistema de planeamento aprovando o
Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território e os vários PROT – Planos Regionais de
Ordenamento do Território ainda em falta. Em simultâneo, é preciso consagrar o Plano Director Municipal
– PDM como um instrumento de âmbito municipal que concentre todas as disposições relativas à
classificação, à qualificação e às regras de uso do solo, o que pressupõe a integração obrigatória no PDM,
através de alterações simplificadas, quer das disposições dos Planos Especiais de Ordenamento do
Território, quer das orientações dos Planos Sectoriais e dos PROT. O PDM deve transformar-se numa
espécie de “balcão” único para os decisores - públicos e privados – e para os cidadãos em geral.”
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No discurso de abertura do II Congresso da Associação Nacional de Municípios sobre o Tema
“Ordenamento do Território e Revisão dos PDM”, na Covilhã a 25 de Outubro de 2006.
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Bibliografia
GUERRA, Isabel; MATIAS, Nelson (1997) “Elementos para uma análise sociológica do
movimento clandestino” in A Cidade em Portugal: Onde se Vive, Colecção Povos e
Culturas, n.º 1, pp. 335 a 355, Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão
Portuguesa, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa;
VARELA, Antunes; LIMA, Pires de (s.d.) “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª Edição,
Coimbra Editor
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