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2- A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO POR MEIO DE ADPF E O PRINCÍPIO DA

SEPARAÇÃO DE PODERES

A separação de poderes é o argumento mais usado pelos defensores da


impossibilidade da descriminalização do aborto através do controle concentrado de
constitucionalidade. Na ADPF 442 esse princípio foi usado como óbice à descriminalização
pela via judicial tanto pela Câmara, quanto pelo Senado, AGU e PGR., bem como pelos
amici curiae admitidos contrários ao pedido. Em razão disso, mister é a análise desse
princípio para poder concluir se é constitucionalmente adequada a descriminalização da
interrupção voluntária da gestação no Brasil por meio de uma declaração de não recepção dos
artigos 124 e 126 do Código Penal.

Sistematizada por Montesquieu, a Teoria da Separação de Poderes, foi delineada


através do estudo empírico sobre a evolução constitucional da Inglaterra no século XVIII.
Antes disso, no entanto, Aristóteles e Locke já haviam teorizado sobre o tema. Na prática,
visto que o poder do Estado é indivisível, a separação delineada foi de funções com o intuito
de enfraquecer o Estado. A justificativa encontrada era evitar abusos e restrições às
liberdades individuais.
Conforme observa Dallari:

Foi a intenção de enfraquecer o poder do Estado, complementando a


função limitadora exercida pela constituição, que impôs a separação
de poderes como um dos dogmas do Estado Moderno , chegando-se
mesmo a sustentar a impossibilidade de democracia sem aquela
separação. p.(217)

A incorporação dessa teoria no constitucionalismo ocorreu com o surgimento do


Estado Moderno. O poder absoluto do rei causava diversos inconvenientes. Além dos
desmandos e arbitrariedades, preocupava também à burguesia à intervenção econômica. O
absolutismo, útil ao desenvolvimento da economia no mercantilismo, por meio do subsídio de
empresas, companhias de navegação e fomento do comércio, no novo arranjo tornava-se
óbice ao desenvolvimento econômico. A consolidação do modo de produção capitalista e a
necessidade de liberdade quase irrestrita sua máxima expansão foi o estopim para a
implementação da separação de poderes. Percebeu-se que o monarca poderia frear o
desenvolvimento econômico ao criar políticas públicas e limitações à exploração do trabalho,
por exemplo.(BONAVIDES, data, p. 146). Assim, a autoridade real foi posta no mesmo nível
hierárquico que o parlamento, garantindo a independência dos juízes e reservando a cada um
dos dois primeiros funções diferentes.
A divisão das funções originalmente foi concebida de maneira rígida. Ao Poder
Executivo caberia o cuidado “da paz e da guerra, envia e recebe embaixadores, estabelece a
segurança e previne as invasões” (BONAVIDES, DATA, p.149). Logo, nessa concepção as
funções do executivo se esgotariam em cuidar das políticas externas.
Ao Judiciário apenas caberia a faculdade de punir e julgar as controvérsias cíveis. E
por fim, ao Legislativo foi dada a tarefa de elaborar leis temporárias e permanentes e
promover a modificação ou revogação das já existentes.
Ao engessamento que essa teoria deu ao Estado recaíram diversas críticas. Para Dalari
a eficiência estatal foi preterida em favor da consecução de maior liberdade individual. Nas
palavras dele:
“(...) é óbvio, dando atribuições tão restritas ao Estado Montesquieu
não estaria preocupado a assegurar-lhe a eficiência, parecendo-lhe
mais importante a separação tripartida dos poderes para assegurar a
liberdade individual(...) Essa preocupação com a separação de
poderes visando a proteger a liberdade refletiu-se imediatamente em
todo movimento constitucionalista”. p.217

Com o tempo, e devido às dificuldades causadas pela rigidez da separação de funções,


a flexibilização ocorreu. No Brasil a Constituição da República de 88 trata o princípio como
fundamental (art.2°), com o status de cláusula pétrea (artigo 60§4°, II). A forma aqui
implementada segue a tendência inaugurada pela atualização ocorrida com a teoria
nortemaericana dos check and balances, em que embora haja a divisão do exercício do poder
estatal, há uma relativização de modo a corrigir e controlar a rigidez fazendo com que cada
um dos três poderes exerça funções típicas e atípicas, interferindo de certa forma um na
esfera de atuação do outro e limitando um o poder do outro.
Nesses termos FULANO QUE O NOME TÁ NA FOTO DO CELLULAR observa
que no Brasil a separação de poderes “Consiste numa predominância no desempenho desta
ou daquela função. Cada poder, em caráter secundário, colabora no desempenho de outras
funções , pratica atos teoricamente fora de sua esfera.” (Novais< data, p. 137).
Em sentido semelhante Dallari entende que a separação total nunca se concretizou em
nenhuma das ordens jurídicas em que foi implementada pois sempre houve grande
interpenetração (DALARI, data, p.218).
Sendo assim, no Brasil pelas inúmeras previsões de interferência de funções
delegadas é possível observar-se que a Separação de Poderes acolhida é maleável e tem
como objetivo evitar abusos com a descentralização do poder, resguardar as liberdades
individuais, Além disso ao atribuir a guarda de si ao Supremo, quis a constituição que a
separação de poderes servisse também ao resguardo e manutenção da sua observância e
hierarquia.
São funções típicas de um poder , aquelas atribuídas tradicionalmente à ele e as
atípicas são as que fogem à alçada original, mas foram delegadas pelo ordenamento jurídico.
As três funções do Estado exercem atividades típicas e atípicas. Em razão da natureza
específica deste relatório, apenas será mencionada a função atípica exercida pelo Supremo
no controle concentrado repressivo de leis e atos normativos anteriores à constituição, por
meio da adpf.

3- CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE


O controle de constitucionalidade é um conjunto de mecanismos que visa garantir a
observância, supremacia e a defesa das normas constitucionais de possíveis afrontas . Deve
ser tomado como a análise de conformidade de leis, atos normativos e do poder público, e o
preenchimento de requisitos formais e materiais que devem guardar em em relação a uma
Constituição (FERNANDES,2017, p.1421-1422).
Barroso entende o ordenamento jurídico brasileiro como um sistema íntegro de
normas, que, portanto, deve ser um todo harmonioso. Logo havendo anomalia nesse estado
de coerência é necessário que se proceda à retificação da norma ou ato normativo que dá
causa a esse transtorno. Nas palavras do autor:

Um sistema pressupõe ordem e unidade, devendo suas partes conviver de


maneira harmoniosa. A quebra dessa harmonia deverá deflagrar
mecanismos de correção destinados a restabelecê-la. O controle de
constitucionalidade é um desses mecanismos, provavelmente o mais
importante, consistindo na verificação da compatibilidade entre um lei ou
qualquer ato normativo infraconstitucional e a Constituição. (2011, p. 08)

Importante salientar também que, conforme o entendimento da doutrina clássica, além


da conformação com a constituição o controle de constitucionalidade deve também prever
uma punição ao ato inconstitucional, sob pena de não assegurar a normatividade e
superioridade hierárquica da constituição. isso porque “a ausência de sanção retira o conteúdo
obrigatório da Constituição, convertendo o conceito de inconstitucionalidade em simples
manifestação de censura ou crítica" (MENDES, 2017, p. 1008)

Dentre as ações de controle de constitucionalidade está a ação de descrumprimento de


preceito fundamental (ADPF) que possui caráter residual em relação às demais ações da
mesma espécie, ADI, ADC e ADO. Pode ser lançada como instrumento para reprimir leis
ou atos normativos e demais atos do poder público que violem preceitos fundamentais. Além
dos atos do poder público, é cabível também, por exemplo, contra leis municipais, e leis
anteriores à constituição.
Ainda paira divergência no que diz respeito à delimitação do que é um preceito
fundamental. Há quem entenda que o intuito foi introduzir um conceito aberto, apto á se
adequar à situações que possam ocorrer, e às mudanças sociais. Nos termos de Bastos (2000,
p.06), devem ser assim considerados:

a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais


do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político, a forma federativa de
Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos poderes
e os direitos e garantias individuais (arts. 1.º e 60, § 4.º, da CF/1988).

No procedimento, deve o relator da ação requerer informações do autor do ato que se


procura impugnar com a propositura da ADPF e em seguida, também são realizadas
audiências públicas para ouvir os amici curiae admitidos. A participação desses entes estatais
e entidades sociais são meios de democratizar a discussão, promovendo a oportunidade de
manifestação tanto das autoridades que emitiram o ato questionado, quanto de instituições
que representem também os interesses da sociedade (Procurar outra fonte que fla sobre isso)

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