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Sociologia da Comunicação

João Pissarra Esteves | 1º Semestre | Ciências da Comunicação | Ano Lectivo de 2015-2016

2ª LIÇÃO – COMUNICAÇÃO PÚBLICA, OPINIÃO PÚBLICA E ESPAÇO PÚBLICO

Em Sociologia da Comunicação importa adquirir conhecimentos fundamentais sobre o fenómeno da


comunicação em termos sociais, propondo-se a adoptar uma perspectiva compreensiva e original sobre a
realidade social no seu conjunto. A primeira grande temática de estudo reside na "Comunicação Pública:
Opinião Pública e Espaço Público".

As noções de comunicação pública, espaço público e opinião pública são noções basilares características
das sociedades modernas onde nos planos da vida política, cultural e social faz-se referência a um espaço
público de ordenamento da vida colectiva e da evocação de uma opinião pública representativa traduzida
numa comunicação pública, constituindo-se como problemáticas relevantes para o estudo da Sociologia.

A comunicação pública é a comunicação constituída a nível do espaço público e veiculada pela opinião
pública, exercendo um efeito estruturante sobre a generalidade das práticas comunicacionais e simbólicas.

O fenómeno da comunicação em termos sociológicos e a nível do espaço público e opinião pública tem em
vista o cumprimento de dois objectivos principais que são o contributo para o conhecimento mais
sistemático destas instâncias do público nas suas diferentes dimensões e a compreensão do seu papel na
constituição da modernidade bem como a abordagem do fenómeno da comunicação a partir da sua
dimensão pública, ou seja, é a comunicação pública numa perspectiva abrangente que procura dar conta
da enorme variedade de recursos e práticas comunicacionais que se apresentam no quotidiano, não
esquecendo o seu papel na formação das nossas sociedades e na estruturação da vida social.

Desta forma, importa estudar a comunicação que é feita no quotidiano, nomeadamente relativa aos
modernos processos de mediação simbólica, as suas repercussões na emergência e desenvolvimento das
sociedades modernas, as principais conexões com a dinâmica e os processos fundamentais das sociedades
tais como o capitalismo, a democracia e a cultura de massa.

O espaço público e a opinião pública enquanto temas de estudo centrais vão ser abordados dentro de uma
perspectiva integrada que permite observar as suas diferentes dimensões tais como a publicidade, a crítica
e o debate, servindo este percurso para a explicação da emergência de uma nova forma de sociabilidade,
os públicos, bem como a consagração do espaço público e da opinião pública em termos institucionais.
Público vs. Multidão – características, evoluções e divergências; Públicos e Modernidade

 A multidão enquanto grupo colectivo e atraente dos seus espectadores exerce uma ligação
prestigiada sobre o leitor contemporâneo, sabendo que alguns autores são levados a designar por
este termo ambíguo todas as espécies de agrupamentos humanos.
 Apesar de poder suscitar confusão, a verdade é que não podemos confundir multidão com público
visto que são vocábulos susceptíveis de diversas acepções.
 A própria Idade Moderna marca a invenção da imprensa e motiva o aparecimento de um público
totalmente diferente que não cessa de aumentar e cuja indefinida extensão acaba por caracterizar
a dada época. Pretendemos saber a origem do público: como nasce e se desenvolve bem como as
suas variedades, não esquecendo as relações com os seus líderes e com a multidão, corporações,
estados e ainda o seu poder para o bem e para o mal aliado às suas maneiras de agir.
 A multidão apresenta algo de animal na sua consistência dado que nas sociedades animais
inferiores, a associação consiste sobretudo num agregado material, sabendo que à medida que
subimos na árvore da vida, a relação social torna-se mais espiritual, o que não acontece se os
indivíduos se afastarem, deixando de se encontrar associados.
 Mas nem todas as comunicações espírito a espírito exigem necessariamente uma proximidade
física que acaba por ser uma condição cada vez menos preenchida quando nas nossas sociedades
civilizadas desenham-se correntes de opinião edificadas sobre rios sociais.
 Enquanto indivíduos sofremos inconscientemente um contágio invisível do público que fazemos
parte devido à actualidade e à nossa capacidade de identificação devido à proximidade desses
factos, progredindo a actualidade com a sociabilidade.
 Esta impressão na proximidade é um factor facilitador da impressão à distância bem como os
hábitos de vida social, uma vez que ainda mesmo em criança começamos por nos aperceber do
olhar dos outros (e do público), exprimindo-se nas nossas ideias, atitudes, juízos e acções.
 A adesão de um grande número de pessoas aos nossos juízos pressupõe que o julguemos no
mesmo sentido, pelo que a formação de um público supõe uma evolução mental e social muito
mais elaborada do que a formação de uma multidão.
 A questionabilidade ideal desta multidão espiritualizada e o contágio sem contágio supostos por
este ajustamento abstracto e no entanto real enformou-se através de muitos séculos de vida social
mais artesanal e rudimentar.
 Enquanto na Idade Média não existia um público propriamente dito, a invenção da imprensa no
século XVI contribuiu para a implantação do público, onde a própria leitura da Bíblia assumiu
grandes repercussões sociais no quotidiano, traduzidas numa sensação de formação de um novo
corpo social separado da igreja.
 O público no reinado de Luís XIV era composto por uma elite esclarecida e restrita que lia
sobretudo um conjunto restrito de livros escritos para um pequeno número de leitores
concentrados maioritariamente na corte em Paris.
 Já no século XVIII assiste-se a um crescimento e fragmentação desse público enquanto na 2ª
metade deste século dá-se o nascimento do público político que absorve o público literário,
filosófico e científico, adquirindo o público uma importância pela vida da multidão e pela animação
extrema dos salões e cafés que estimulavam o convívio social.
 A Revolução Francesa em 1789 é aquela que marca o nascimento do jornalismo (e a consecutiva
proliferação e difusão dos jornais) e principalmente do público que a tornou célebre pela
capacidade efusiva, imbatível e atormentadora que possuía.
 A própria vida nos clubes e cafés desempenhava um importante papel durante o período
revolucionário.
 Nesta altura, a inexistência de comunicações rápidas constituía um obstáculo inseparável à
intensidade e à larga propagação da vida do público afectando a sensação de actualidade e a
consciência de uma unanimidade simultânea visto que o público não se encontrava uniformemente
actualizado e esclarecido relativamente aos temas da vida social.
 Apesar de podermos pertencer a vários públicos simultaneamente, podemos pertencer apenas a
uma multidão. A multidão era entendida como o mais antigo dos grupos sociais assente na
intolerância, cepticismo, e no facto de estar mais sujeita às forças da natureza e propensa a
similitudes étnicas bem como no esbatimento dos ângulos de individualidade e no facto do
indivíduo ser tomado na sua totalidade, não esquecendo o dado de ser menos homogénea e por
isso, expandir-se continuamente.
 O público é o grupo social do futuro e indefinidamente extensível pressupondo não só uma vida
social cada vez mais intensa devido a três grandes invenções (que são a imprensa, os caminhos-de-
ferro e o telégrafo) como também confundindo aquilo a que chamamos mundo com o mundo das
letras e o mundo político onde os indivíduos trocam ideias e pontos de vista. É também objecto de
uma homogeneização dos gostos e costumes reflectidos relativos à compra dos mesmos jornais e
produtos, estabelecendo entre os indivíduos uma relação social que supõe certas afinidades.
 Existem dois tipos de públicos: o público estável e consolidado e o público flutuante e instável.
 Falamos no agrupamento social em públicos quando oferece aos indivíduos as maiores facilidades
de se imporem e às opiniões individuais as maiores felicidades de se expandirem, dado que a
divisão de uma sociedade em públicos corresponde a diversos estados de espírito, exprimindo-se
por um desejo crescente de sociabilidade que torna necessária a comunicação regular entre os
associados através de informações e incitamentos comuns.
 Apesar das divergências e multiplicidade dos públicos, eles parecem formar conjuntamente um só
público que pelo seu acordo parcial em alguns aspectos, conduz-se àquilo que chamamos de
"opinião".
 Se por um lado observamos a diminuição das multidões, por outro assistimos ao crescimento dos
públicos. Apesar das suas diferenças, têm em comum que a relação estabelecida entre os
indivíduos consiste na reflexão recíproca, na co-fusão das suas similitudes inatas ou adquiridas,
resultando um potente uníssono e detentor de uma força extraordinariamente maior no público
que na multidão, dado que se organizam uma comunhão de ideias e de paixões que abre um
caminho para as diferenças individuais de cada um.
 Considerando o factor sexual, podemos classificar os públicos tal como as multidões sob pontos de
vista diversos sendo que temos os públicos masculinos e femininos assim como multidões
femininas e masculinas.
 Os públicos femininos são compostos por leitoras de romances ou temas de mosa, tendo uma
importância numérica diferente e uma natureza mais inofensiva, apesar de na história enquanto
grupo terem apresentado também uma natureza mais revolucionária e protestante.
 As multidões mais jovens têm mais importância que os públicos mais jovens enquanto os públicos
mais idosos reagem ao mundo dos negócios onde as multidões idosas não têm lugar, visto que são
extremamente raras. A tendência para nos agruparmos cresce da infância até à plena juventude,
decrescendo depois dessa idade até à velhice.
 A própria acção dos agentes físicos sobre a formação e o desenvolvimento de um público é quase
nula enquanto é soberana sobre o nascimento e progresso das multidões, não excluindo a
influência da raça na formação destes grupos.
 Contudo, a diferença mais importante entre os vários públicos e multidões resume-se na natureza
do seu fim e da sua fé. Por exemplo, as pessoas que passam numa rua tratando cada uma dos seus
assuntos podem formar uma massa completa mas não passam de uma turba confusa até ao
momento em que uma fé os revolte ou os solidarize, ou seja, limitam-se a agrupar pacificamente
como uma multidão. Do mesmo modo, quando os leitores habituais de um jornal cingem-se apenas
aos anúncios e às informações práticas que dizem respeito aos seus assuntos particulares não
formam público. É a partir do momento em que os leitores de uma mesma publicação convencem-
se pela ideia ou paixão que a motivou que passam efectivamente a fazer parte de um público.
 Assim, podemos definir as multidões crentes e desejosas que diferem pela natureza da corporação
a que estão ligadas enquanto os públicos crentes e desejosos são agudos, déspotas, dogmáticos,
agudos, menos excedidos, procedendo inclusive de grupos sociais organizados (transformação
inorgânica).
 Podemos elucidar um conjunto de características sobre as multidões tais como o facto de ser
amotinada num seio de um grupo social mais vasto de onde sai um membro que faz mover essa
mesma multidão; têm uma prodigiosa intolerância e orgulho grotesco bem como uma
susceptibilidade nascida da ilusão da omnipotência aliado a uma perda total de sentimento
mutualmente exaltado e um desejo de imortalidade divina alicerçado numa comunhão de crenças e
vontade.
 Existem 4 maneiras de ser das multidões: expectantes, abertas, manifestantes e actuantes.
 Enquanto as multidões expectantes partilham uma curiosidade colectiva e são mais pacientes
devido ao contágio mútuo de sentimentos, os públicos expectantes dependem mais do veredicto e
do decreto, sendo menos pacientes.
 As multidões atentas comprimem-se à volta da cátedra de um pregador ou professor, sabendo que
a atenção é mais forte e perseverante do que seria se cada um dos indivíduos que as compõem
estivesse só, confirmando-se este poder de atracção da multidão traduzido num simbolismo
expressivo.
 Os públicos tornam-se manifestantes pela influência absorvente que exercem sobre os que os
puseram em movimento e que já não conseguem reter.
 Os públicos actuantes representam a opinião dos seus condutores que preservam essa opinião em
movimento, mas uma vez revolto esse poder, são os condutores que por ele são conduzidos por
caminhos imprevistos.
 Assim, a acção dos públicos é uma acção completamente espiritual que, quando inspirado no amor
tem uma eficácia produtiva directa porque é mais ponderada e calculada. O próprio bem que ela
opera suscitou algumas boas leis de assistência mútua e piedade (ao contrário das multidões),
traduzindo-se num apaziguamento das lutas e numa construção social mais pacífica e tolerante.
3ª LIÇÃO – O Carácter Simbólico dos Públicos

 Os públicos enquanto uma (nova) forma de sociabilidade


 O público define-se por um conjunto de pessoas que estabelece relações de interdependência e
que possuem uma capacidade de transformação relativamente àquilo que se encontra à sua volta,
na medida que intervêm na sociedade como actores sociais capazes de transformar o social,
sabendo que Gabriel Tarde é o grande pioneiro nesta estratégia de análise que formula sobre o
facto de os públicos constituírem-se como uma (nova) forma de sociabilidade das sociedades
modernas contrastando com as formas de sociabilidade e os padrões de reconhecimento social das
sociedades tradicionais (multidão).
 Os públicos no contexto dos novos meios e formas de comunicação e informação
 Gabriel Tarde vem salientar o contexto eminentemente comunicacional e de desenvolvimento das
sociedades modernas que contribuiu para a emergência dos públicos, nomeadamente através da
criação pela imprensa de uma complexa estrutura de redes de fluxos de informação e comunicação
bem como pelo surgimento do comboio (que facilitava a distribuição da imprensa e a circulação de
pessoas) e do telégrafo que permitiu uma maior velocidade na transmissão de mensagens
contribuindo para o aumento da intensidade das redes e fluxos de comunicação bem como para
esta ideia de "contágio sem contacto".
 Contrariamente às formas de sociabilidade tradicionais que eram marcadas em termos físicos e
materiais e de carácter obrigatório e predeterminado, os públicos enquanto nova forma de
associação assentam em motivações mentais, num reconhecimento da individualidade dos sujeitos,
ou seja, das suas idiossincrasias e afinidades electivas bem como na tolerância onde qualquer
membro pode participar nos diferentes públicos ou reconsiderar livremente as suas filiações.
 As características (originais) dos públicos enquanto forma de sociabilidade
 Os públicos como agentes sociais possuem um conjunto de características originais que lhes
podem conferir relevo sociológico tais como a modalidade da acção (que dota os públicos de um
poder de influência superior, tornando-se impulsionadores da modernidade), a maior
homogeneidade e durabilidade da sociabilidade dos públicos (habilitando-os a que se constituem
como sujeitos colectivos de acção, referindo-se Tarde a uma excitação intelectual que origina uma
acção orientada, criteriosa e simbolicamente suportada devido ao poder, à força pragmática e
capacidades performativas dos públicos), a reflexividade (revestindo uma acção incisiva,
contundente e calculista, se bem que para Gabriel Tarde é uma acção mais persistente, tenaz e
calculista, traduzindo-se numa maior propensão para a formação e participação em associações do
tipo público), a dimensão pragmática (que é o meio para a poderosa performatividade dos públicos
enquanto agentes de acção e com uma capacidade de mudança na vida colectiva e na
reorganização da estrutura das sociedades) bem como os traços da modernidade a nível social tais
como a tendência para uma divisão puramente simbólica da sociedade (que promove novas
segmentações sociais, reconfigurando as divisões tradicionais) aliado à agonística social onde os
conflitos e as lutas sociais passam a assumir uma dimensão predominantemente simbólica.
 Assim, a originalidade dos públicos assenta nestes aspectos relativos à sua dispersão física pelo
facto dos públicos organizarem-se em agrupamentos de sociabilidade extensos que dispensam a
co-presença física bem como neste seu carácter simbólico dada a coesão interna de ordem
espiritual que é mobilizadora da atenção e dos interesses dos participantes, na medida que estes
trocam opiniões e juízos que os separam e unem, traço fundamental da identidade específica dos
diferentes públicos concretos.
 A performatividade dos públicos: os públicos como atores sociais e o seu (novo)
padrão de acção social
 A performatividade dos públicos explica a interpretação do indivíduo enquanto agente social dado
que os públicos têm uma capacidade de influenciar o social, originando consequentemente a
comunicação pública aliado à complementaridade dos públicos enquanto forma de sociabilidade
que permite a obtenção de uma imagem mais completa dos mesmos.
 Os públicos só são actores sociais quando cumprem determinadas funções sociais dependendo de
certas condições de sociabilidade.
 1) A performatividade dos públicos enquanto forma mais básica confirma a existência de um
público concreto num dado contexto ou matéria (ex. bibliografia pessoal) e a capacidade que este
pode ter de influenciar a mesma, promovendo uma acção que pode criar novas condições, se bem
que podem-se constituir novos públicos que possuem acções divergentes.
A capacidade de acção dos públicos vai-se relacionar com aquilo que pode vir a constituir-se no
espaço público bem como na possibilidade de se abrir ao exterior, introduzindo-se na lógica da
comunicação.
 2) A acção conjunta dos públicos (influenciada por uma colectividade inerente) responde a um
programa comum dos públicos enquanto forma de sociabilidade, na medida que os públicos têm
um efeito transformador e global sobre a sociedade que permite compreender a relação com a
modernidade, ou seja, o público tem efectivamente um poder de aprofundar a modernidade
enquanto agente social que contribui para uma mudança social.
 Os públicos no seu conjunto foram um factor que contribuiu para as condições de sociabilidade e
para o aprofundamento da modernidade dentro de uma lógica social, constituindo-se como
actores sociais quando se revestem num clima de excitabilidade intelectual de ordem simbólica
que não é uma condição obrigatória da existência dos públicos, opondo-se inclusive a uma
excitabilidade física.
 A acção que resulta daqui possui características próprias que trazem um novo padrão da acção e
uma nova forma de agir, confirmando a grande inovação social dos públicos, sabendo que o
carácter reflexivo da acção dos públicos traduz-se numa acção simbolicamente sustentada e
estruturada na base de determinadas ideias que foram consolidadas.
 Os públicos ao cumprirem estas condições originam uma acção não só mais poderosa que advém
de uma base de sustentação sólida com efeitos que podem prolongar-se no tempo de forma
sistemática bem como mais calculada e persistente, equacionando os fins que pretende alcançar e
calculando os meios mais adequados para o seu fim, sabendo que os públicos são responsáveis por
trazer para a vida social uma acção com características originais.
 Os públicos criam condições para generalizar estas características relativas à acção que conduzem à
constituição da modernidade, existindo uma propensão na constituição dos públicos por parte dos
sujeitos em idade adulta dado que pelas suas características facilmente associamos os públicos a
uma maior maturidade ao contrário das multidões com características mais instintivas e
emocionais.
 O carácter comunicacional dos públicos: a dinâmica dos processos de opinião;
Significado e valor da opinião dos públicos sobre o seu carácter vinculativo (na base
de universos comuns de discurso);
 O estatuto do indivíduo no âmbito dos públicos: a condição de interlocutor
comunicacional
 Traçamos então um caminho para a comunicação pública uma vez que os públicos apresentam já
um conjunto de características comunicacionais que favorecem a comunicação, podendo olhar
para eles enquanto forma de sociabilidade e enquanto actores sociais, aliado ao facto da própria
excitabilidade intelectual ter de assentar numa base comunicacional forte, pelo que os públicos são
importantes para a comunicação pública, tal como o inverso.
 O carácter simbólico dos públicos é revestido por um profundo significado comunicacional dado
que toda a espiritualidade dos públicos circula numa certa comunhão de ideias inseridas num
contexto de um processo de comunicação permanente, fomentado pela troca comunicacional que
os membros dos públicos estabelecem entre si à volta de um certo interesse comum partilhado que
singulariza e aproxima os membros do público entre si, favorecendo o estabelecimento da
comunicação pública.
 Nesta medida, as relações de interdependência dos públicos são relações comunicacionais, ou seja,
dependem da comunicação que (não só) é a base simbólica para as pessoas se ligarem entre si bem
como constitui uma condição substancial da relação.
 A importância da comunicação para os públicos é um elemento constitutivo fundamental,
organizando-se em três planos associados a momentos diferentes das dinâmicas dos públicos.
 1º PLANO: Tem que ver com a constituição dos próprios públicos favorecida pela presença forte da
comunicação, ou seja, a simbolicidade dos públicos é fornecida através da comunicação onde as
pessoas interrelaciona-se, existindo um interesse comum numa dada matéria. Assim, só existe
simbolicidade e visibilidade social se existir comunicação, que é um factor primordial na
constituição dos públicos.
 2º PLANO: Reside no funcionamento normal do público onde se existir um dado assunto, o público
vai trabalhá-lo, trocando ideias e opiniões que são medidas por excelência dos públicos, ou seja, as
relações de interdependência traduzem-se em trocas comunicacionais.
 A própria opinião também é uma dinâmica essencial à comunicação dos públicos na medida que o
espaço de comunicação dos públicos é preenchido por uma troca de opiniões como um trabalho de
comunicação colectivo onde os seus membros se encontram envolvidos.
 3º PLANO: Relaciona-se com o desidrato dos públicos pelo facto das pessoas envolverem-se nos
públicos para que exista uma evolução social, ou seja, é reconhecer a presença de uma motivação
para chegar a algum nível de conhecimento superior onde as pessoas são capazes de constituir um
entendimento mútuo (ligado à excitabilidade intelectual) sobre algum tipo de assunto, sabendo
que o processo de opinião no interior dos públicos é um processo agonístico dado que coloca em
confronto uma diversidade de opiniões que se encontra aberta à livre participação individual dos
membros do público ainda que esta seja uma questão controversa e delicada pois em termos
concretos, este entendimento é difícil de se obter. Contudo, apesar da controvérsia, o único meio
para os públicos chegarem a este entendimento e a uma opinião de ordem superior vinculativa é
através da comunicação, reconhecendo-se uma motivação geral para a procura de um consenso
assente numa perspectiva cognitivista presente nos públicos.
 A comunicação é assim um factor de excelência para a formação dos públicos e consecutivamente
para a institucionalização da comunicação pública.
 Quando falamos sobre individualidade, sabemos que as formas de sociabilidade do passado
assentavam num apagamento da individualidade dos seus elementos, pelo que os públicos vêm
romper com esta tradição, na medida que se afirmam como uma entidade colectiva que
reconhece, fomenta e promove a individualidade dos seus elementos constituintes, afirmando-se
os públicos como expressão de uma individualidade e da capacidade dos seus membros de
desenvolverem uma singularidade própria, constatando-se assim a dinâmica gloriosa dos públicos
no aprofundamento da modernidade.
 A afirmação da modernidade e o seu processo de desenvolvimento assentam numa tensão
permanente entre Público e Privado, constituindo a base de sustentação da superioridade que
estas sociedades podem reivindicar relativamente às formações sociais do passado dado que se
tratam de sociedades de um carácter mais espiritual onde imperam um maior cepticismo, uma
menor segmentação e condições de um relacionamento social mais pacífico, permitindo aproximar
a liberdade individual e a vontade colectiva.
 Gabriel Tarde comete algumas oscilações de terminologia e ainda certas hesitações de análise
relativamente ao fenómeno dos públicos envolvendo a sociabilidade de massa, termo que já utiliza
enquanto conceito mas que parece ainda não dominar, sabendo que a expressão surge associada
aos públicos mas também às multidões.
 Públicos e Massa – semelhanças e diferenças entre duas formas de sociabilidade da
época moderna
 A confusão frequente entre público e massa acontece pelo facto das formas de sociabilidade terem
características comuns como a dispersão física em larga escala e a ausência de necessidade de um
espaço propriamente dito para que se estabeleçam relações de interdependência entre os
indivíduos, se bem que a confusão decorre da própria dinâmica de desenvolvimento dos públicos a
partir da qual se deve compreender a noção de massa.
 Existe uma espontaneidade inerente que subjaz à formação da massa no sentido da constituição
de um agrupamento elementar de indivíduos que ocorre de forma exterior à sua vontade, tal como
a própria forma de organização rudimentar característica da massa que se torna mais evidente na
sua capacidade de acção mais consistente e articulada onde a dimensão intelectiva e racional típica
dos públicos cede lugar na massa a um comportamento reactivo baseado numa estimulação de
impulsos a partir de determinados motivos capazes de orientar a acção dos indivíduos.
 Hannah Arendt alerta para esta incapacidade de acção da massa que significa a negação do seu
próprio carácter de sociabilidade sustentando a sua tese a partir da formação dos totalitarismos do
século XX pelo facto de dependerem menos da falta de estrutura de uma sociedade de massa do
que das próprias condições de uma massa atomizada e individualizada.
 A posição do indivíduo na massa (distintamente do público) conta como unidade/número mas não
como individualidade pois o registo de funcionamento que prevalece é o anonimato através de
seres em situações de profundo desenraizamento cultural e físico bem como estados mentais de
uma grande confusão (ansiedade, inquietação, insegurança) dado que este desenraizamento é
consequência do desenvolvimento das sociedades modernas e das transformações adjacentes da
intensa vida urbana e industrial que explica a anulação da individualidade na massa (assumindo a
forma paradoxal de um egocentrismo exacerbado) que se estabelece com a cidadania como
evidencia o processo de comunicação dos media em que o público se vê transformado numa
audiência.
 Massa e Público são ambas formações de sociedades modernas distintas com traços sociais e
culturais antagónicos como também estruturas comunicacionais distintas. Apesar disso, qualquer
uma das formas de comunicação em causa tem a sua incidência e relevo próprio nas instâncias
sociais do público, mas nem sempre da mesma forma ao longo do tempo nem em todas as
situações, como por exemplo no seu papel a nível dos media sob forma de audiências, uma vez que
são os próprios media que concebem as audiências como números.
 Por este tratamento numérico, as massas não definem uma interacção entre os seus membros e
por isso, não alcançam uma experiência simbólica comum, tornando-se numa simbolicidade pobre
que tenderá a assumir um carácter autoritário que os indivíduos recebem a partir do exterior e
alheio à sua vontade sem um verdadeiro estímulo à individualidade, quer em termos mentais
(pensamento) ou em termos simbólicos (cultura).
4ª LIÇÃO – (2) Público e Privado nas Sociedades Modernas

 Dos Públicos ao Espaço Público (Opinião Pública e Comunicação Pública): o Público


dos públicos
 O início da comunicação pública moderna procura explicar certas questões das sociedades
modernas e da sua realidade, sabendo que entramos no objecto de estudo da 1ª parte do
programa, ou seja, a formação dos públicos decorre de uma opinião pública, espaço público e
comunicação pública.
 A ideia de um espaço público basilar na constituição das sociedades aparece associada à ideia de
uma opinião pública que é um elemento transitante nas sociedades de hoje, ligando-se por sua vez
à ideia de uma comunicação pública como forma de comunicação por excelência que ocorre nestes
contextos e no âmbito dos espaços públicos, servindo primordialmente para a constituição de uma
opinião pública que conduz à formação dos públicos, correspondendo a uma transição social
importante e dinamizante das sociedades modernas actuais.
 Esta realidade partiu da dinâmica de afirmação dos públicos e de um espaço público pujante onde
os públicos que se formam rapidamente no processo social acabam por generalizar-se nas
sociedades ocidentais (ex. Portugal, Grã-Bretanha, Alemanha) constituindo-se como formas sociais
por excelência. Também se deveu à própria expansão dos públicos em termos de espaço e
participantes com um maior número de públicos como também por uma multiplicação dos seus
participantes aliado a uma realidade urbana confinada a uma realidade social abrangente dos
grupos sociais, ou seja, a dinâmica dos públicos é uma realidade de ordem superior.
 Este espaço público (espaço onde as questões de senso comum são alvo de uma problematização),
ou melhor dizendo, este “público dos públicos” constitui uma entidade que reúne e congrega os
múltiplos públicos que se foram constituindo de forma disseminada pela sociedade, pelo que
podemos falar numa permeabilidade dos públicos assente na necessidade de relacionamento entre
os membros para originar o espaço público que é assegurado pelas características dos públicos
como a tolerância que permite a participação de todos os intervenientes numa espécie de interesse
comum que é o interesse da sociedade.
 A comunicação pública (ex. debates, discussões e pronunciamentos) constrói a opinião pública
para questões de interesse público, sendo um trabalho constante e inerente, por forma a obter um
resultado atingível e visível.
 A experiência moderna como mediação simbólica de Público e Privado (Como é que
estas novas entidades funcionam?)
 Cada uma das entidades é constituída por uma certa organização nos domínios dos públicos e
privados, definindo uma singularidade da época moderna baseado numa resemantização dos
conceitos com um significado próprio e distinto.
 As sociedades do século XVIII tornam-se numa realidade social que é uma revolução nas sociedades
ocidentais, destacando-se Kant como um filósofo teórico que vai pensar sobre estes problemas com
designações diversas.
 A Modernidade marca de forma muito nítida uma fronteira entre aquilo que é o domínio do público
e aquilo que é do domínio do privado, como duas novas realidades que se relacionam com uma
certa mediação.
 A mediação entre público e privado pressupõe a criação de deslocamentos distintos mas que são
fundamentais para a constituição de cada um deles, referindo Gabriel Tarde o facto de existir uma
proto-estrutura que se divide em espaço público e privado quando se pronuncia sobre o
agrupamento social em públicos que oferece aos indivíduos as maiores facilidades de se imporem e
às opiniões individuais as maiores felicidades de se expandirem, dado que a divisão de uma
sociedade em públicos corresponde a diversos estados de espírito, exprimindo-se por um desejo
crescente de sociabilidade que torna necessária a comunicação regular entre os associados através
de informações e incitamentos comuns.
 Breves considerações sobre Público e Privado na história ocidental: a Antiguidade
Grega (agora/koinos e oikos) e as sociedades tradicionais (Público e Privado como
figuras de poder e numa lógica de dominação)
 Apesar de afastada historicamente, a Antiguidade Clássica faz uma recuperação e uma
resignificação dos conceitos de espaço público e espaço privado (oikos), trazendo-os para a
modernidade ao recuperar algum sentido original das suas questões, se bem que o fundamental é
delimitar estes termos como domínios de experiência distintos.
 A ideia de distinção da Antiguidade Clássica remonta à Grécia Antiga e às suas cidades (polis) onde
se discutiam os assuntos da sociedade, sabendo que o espaço público era constituído pela ágora
(padrão por excelência nas relações sociais com base na igualdade) onde os sujeitos discutem os
diversos assuntos e o espaço privado pelas casas (oikos déspotas) onde existe uma figura do poder
que é o chefe de família e as relações são baseadas na superioridade.
 *Quando Habermas em A Transformação Estrutural da Esfera Pública afirma “A posição na polis
baseia-se numa posição de oikos déspota” refere-se a uma espécie de esquizofrenização do
indivíduo, realçando-se uma dictomia estrutural entre ágora e oikos, dado que na primeira falamos
de liberdade e poder (economia e política) enquanto na segunda falamos de necessidade e
dominação, contrariando-se um domínio por excelência da liberdade (ágora) com um domínio por
necessidade (oikos).
 Se por um lado e relativamente ao poder, só o espaço público o pode produzir constituindo-se
como a força do colectivo na forma como cada sociedade organiza o destino da sua nação, por
outro lado, a dominação relaciona-se com o domínio do privado, não dizendo respeito à vida dos
cidadãos mas sim ao pleno poder do oikos déspota em relação aos restantes elementos da sua
casa.
 O público e privado na Antiguidade Clássica constitui uma diferenciação ao contrário da época
contígua das sociedades modernas que são as sociedades tradicionais.
 Nas sociedades tradicionais a distinção entre público e privado perde força e validade, sabendo que
a perca de importância na mecânica social e o esbatimento entre a distinção dos conceitos
contribui para assimilação do público pelo poder, sabendo que o público nas sociedades medievais
traduz-se no domínio do senhor, ou seja, pela importância de um poder crescente nos poderes
feudais que se sobrepôs a esta estrutura, existindo uma apropriação que é contrária ao domínio
restrito do privado onde poucos elementos da sociedade têm acesso, confirmando-se esta
limitação de individualidade enformada pelos senhores feudais, ou seja, à perca de força e ao
esbatimento do poder dos conceitos.
 A mediação Público-Privado na modernidade: a distinção e articulação dos dois
domínios de experiência
 Segundo Habermas, o espaço público de representação serve para demonstração e encenação do
poder, tal como verificado nas cortes onde o poder se exacerbava por uma lógica da dominação
sobre os súbditos, glorificada por Versalhes como apogeu desta representação dado que para além
do quotidiano, o privado abre-se ao público fazendo da intimidade do rei uma encenação pública
importante para a encenação do poder.
 Isto vai em contraposição com a mediação do público/privado, apesar de ser na base desta
demonstração que as sociedades modernas olham para a Antiguidade Clássica, com o intuito de
proporcionar algo de diferente.
 Também para Habermas, se nas sociedades tradicionais, o público é associado ao poder e à razão
de Estado, sabendo que as sociedades deixam de ser regidas pelo princípio da autoridade,
passando a ser regidas pelo princípio da verdade, nas sociedades modernas, o público e o privado
são autónomos, mas interdependentes, ou seja, não há público sem privado, funcionando ambos
como estrutura da experiência.
 A plena afirmação de uma destas esferas depende sempre da sua relação com a outra, ou seja, nem
o Público pode assumir-se sem individualidade, nem o Privado sem a experiência da vida em
comum, pelo que devido à sua mediação constante, a fronteira entre ambas as esferas não são
estáveis, revelando-se fluidas ao longo dos tempos e alterações sociais (ex. feminismo), de modo
que separar o público e o privado pode criar uma base da dominação e também a ilusão de que é
apenas esta mediação que caracteriza a vida.
 Um conceito original (moderno e individualista) de Liberdade
 Com a resemantização dos conceitos de público e privado na sociedade moderna através de novos
pensadores, um novo conceito de liberdade (conceito estruturante da Antiguidade Clássica)
associa-se a um significado individualista na medida que estes conceitos adquirem uma dupla
estrutura de público e privado.
 Esta situação conduz à alteração no estatuto do espaço público das sociedades modernas na
medida que já não constitui um poder como também já não é um espaço público oposto ao
privado, estabelecendo uma relação de mediação com este que contribui para a emancipação de
um espaço de comunicação social da sociedade em relação ao poder (permeabilidade do espaço
público ao privado)
 Este jogo de significados entre o espaço público e privado nas sociedades ao longo do tempo
permite identificar três formações distintas do espaço público:
 1) Espaço público de emancipação na medida que a sociedade ganha uma voz.
 2) Forma distinta do espaço público nas sociedades tradicionais associado à existência de um novo
conceito de liberdade original
 3) Espaço público diferente da Antiguidade Clássica onde existia um espaço de ostentação e agora
existe uma glorificação do cidadão.
 A relação Público-Privado no desenvolvimento das sociedades modernas: breves
apontamentos sobre economia e política
 O público inicialmente estava circunscrito a um espaço público literário, mais artístico ou cultural,
de modo que esta lógica da escrita e da leitura atinge depois uma dimensão política. A
universalização do sistema económico demonstra esta supremacia do privado, visto que se atingiu
uma economia mundial que depois cria uma internacionalização das relações políticas, pelo que as
dimensões políticas e económicas encontram-se assim desequilibradas, o que não pode ser
dissociado da crise económica actual.

5ª LIÇÃO - Contextualização da nova estrutura da experiência do Público/Privado:


economia, estrutura social e um novo modelo de família

 As mudanças sociais ocorridas no público e no privado originaram transformações sociais


representativas da modernidade e das sociedades modernas tendo sido influenciadas por diversos
factores que estão intimamente ligados de acordo com a proposta de Habermas.
 1) Alteração económica significativa das sociedades modernas através da criação de condições
para o aparecimento do capitalismo que estimulou o desenvolvimento do comércio e da
actividade mercantil, elemento fundamental na vida económica das sociedades que proporcionou
uma reconfiguração das noções de público e privado (ex. nas estruturas sociais do passado como na
Antiguidade Clássica decorria uma economia autónoma baseada no privado ao contrário da
economia das sociedades modernas que é baseada no controlo público sobre toda a actividade).
 Também se registaram outros factores como o surgimento do capitalismo financeiro e comercial
(séc. XVIII) e do comércio de longa distância através de grandes feiras, rotas comercias e mercados,
o desenvolvimento de técnicas financeiras capitalistas e o aparecimento das bolsas tal como o
tráfico epistolar das notícias (desde o séc. XV), o aparecimento de uma fase mercantilista do
capitalismo que propiciou a formação das economias nacionais e territoriais consolidantes do
Estado moderno, aliado à abertura de companhias comerciais, o processo de nacionalização da
economia urbana como acelerador da política mercantil e também a objectivação da esfera do
poder político através da consolidação do poder público em oposição ao privado e àqueles que se
encontravam excluídos da participação nesse poder.
 2) Formação e afirmação da burguesia enquanto nova classe social que anteriormente era um
grupo restrito ligado às manufacturas até ao desenvolvimento da economia mercantil que permitiu
o crescimento e a afirmação da classe como uma referência nas sociedades modernas. O próprio
estilo de vida burguês permitia que os indivíduos tivessem o seu próprio ethos, hábitos de vida e
padrões sociais característicos do grupo social, conduzindo à própria mudança do público/privado
que ganha contexto nesse estilo de vida, levando à criação de uma nova estrutura de referência e
de novas experiências que fundaram e restruturaram estas noções.
 3) Estrutura familiar da família burguesa como um modelo de referência para as sociedades
modernas e ocidentais que surge no âmbito da classe social, devido a um conjunto de aspectos
responsáveis pela universalização deste modelo familiar.
- Extensão da família restrita dado que pela primeira vez a ideia de família é um núcleo reduzido de
indivíduos da mesma forma como hoje se concebe (ex. casal com dois filhos), tendo-se tornado
numa revolução autêntica e numa contraposição aos modelos das famílias nobiliárquicas e famílias
rurais.
- Reconhecimento de uma autoridade claramente identificada na família (chefe de família) que foi
determinante para a criação de uma dinâmica importante das famílias, tendo sido essenciais para a
noção de público e privado, ao contrário dos outros modelos onde se regista uma autoridade
difusa.
A dinâmica destas famílias consta na questão da reprodução social onde a sociedade tem de
garanti-la (aspecto físico) ainda que isso não signifique totalmente a sobrevivência das sociedades
bem como na responsabilidade social repartida pelas organizações sendo a família uma unidade
fundamental para os processos de produção social.
 A família burguesa e os processos de reprodução material da sociedade
(racionalidade teleológica e a organização da economia)
 As mudanças que ocorrem na comunicação pública devem-se ao papel pioneiro que as famílias
burguesas têm nos processos de reprodução social, relacionando-se com aspectos económicos, ou
seja, pelo conjunto de actividades na qual a sociedade produz bens para a sua auto-suficiência bem
como na reprodução simbólica, questionando-se até que ponto as sociedades ocidentais estão num
processo de desconfigurarão conferindo espaço à hegemonia de actuais sociedades, sabendo que
no interior da família burguesa vão ocorrer um conjunto de mudanças que de uma forma
diferenciada e convergente contribuem para a alteração da estrutura do público e privado.
 O modelo familiar marca os seus membros pelo facto de colocar maiores exigências em termos de
racionalidade, funcionando para os processos de produção material e simbólica que só se tornam
possíveis com a racionalização da actividade económica e do próprio início de um processo de
racionalização que potencia o modelo ao permitir a passagem de uma economia mercantil para
uma economia capitalista que incentiva à troca de bens e à livre iniciativa.
 Assim, origina-se esta ideia de uma sociedade civil baseada na valorização e no domínio privado
que se estabelece com o domínio do público, na medida que está em equação um bem comum
bem como a consciência que se desenvolveu na sociedade civil que era necessário assumir um
posicionamento político que incita ao desenvolvimento da iniciativa privada, operando-se um
conjunto de mudanças na família burguesa que reconfiguram as noções de público e privado.
 A família burguesa e os processos de reprodução simbólica da sociedade
(racionalização da esfera da cultura: processos de socialização, de integração social
e de reprodução da cultura)
 A família nuclear começa por ter um efeito sobre os seus membros, para depois alargar influências
a toda a sociedade, sabendo que estas alterações caracterizam-se por processos de reprodução
material de que é exemplo a expansão da actividade mercantil com a figura central do patriarca e
da racionalidade, a organização de empresas e a concentração de capital, afirmando-se assim os
mercados autónomos de bens, capitais e trabalho.
 A sociedade civil ganha uma força, comandando a economia, fruto de uma maior reflexividade, da
relação assalariado/capital como também de melhores estruturas produtivas e do padrão de
conduta do novo modelo familiar, aliado ao facto do mercado tornar-se a instituição social nuclear,
e a troca o próprio regulador das relações sociais, surgindo também o panorama político do
liberalismo onde o Estado ocupa uma posição secundária face ao mercado.
 A maximização das trocas e lucros de toda a organização das actividades económicas respeitou o
pressuposto de uma maior racionalidade teleológica, ao contrário das economias tradicionais que
não reagem aos fins mas sim aos factores externos.
 Também a associação da família burguesa aos sistemas de saber e conhecimento bem como aos
processos de socialização, integração social e produção cultural regeu-se pela ideia de
racionalização e de valorização do indivíduo e de cada um dos membros do agregado familiar,
sabendo que a família burguesa contrapõe-se a uma maior homogeneização cultural em prol da
satisfação dos seus membros.
 A estrutura da casa burguesa e o aparecimento dos quartos ligados à ideia de privacidade e de um
espaço da intimidade propicia condições para que o sujeito se abra ao exterior (ex. salão burguês)
existindo uma partilha pública de motivos de interesse de carácter público bem como a valorização
das questões de ordem culturais e artísticas, marcadas por esta ideia da individualidade, dado que a
arte é um médium através do qual cada um consegue-se descobrir a si mesmo.
 Aliado ao Romantismo e ao romance autobiográfico, sabendo que a arte faz da individualidade o
seu próprio objecto de construção (lado da fruição e criação cultural) ligando-se também ao culto
dos objectos pessoais, ou seja, à valorização dos padrões do quotidiano explicativos do
exacerbamento da individualidade.
 Também a troca epistolar através do envio de cartas (meio através do qual cada um se olha para si
mesmo, partilhando a sua interioridade) constituiu uma manifestação subjectiva radical onde o
quarto é o espaço por excelência, proporcionando condições especiais de isolamento e
interioridade, como também acaba por ser uma escrita partilhada com o indivíduo, tornando-se
num estilo literário predominante e relevante para a criação de uma certa consciência pública, pelo
que a racionalidade encontra-se ao serviço da individualidade, envolvendo uma preparação dos
membros para a vida pública, tornando a família nuclear na mais sólida base do privado.
 Público e Privado como meios de racionalização da existência e o telos da
Emancipação: diferenciação de ideias de mundo, autonomização de esferas de
valor, individualização de pretensões e critérios de validade
 Entende-se como privado o núcleo interno da vida familiar que se projecta para o exterior,
delimitando o público àquilo que é comum aos cidadãos, diferenciando-se dois tipos de ideias de
mundo: o mundo interior (subjectivo, núcleo do privado por excelência) e relacionado com a arte e
o mundo exterior ligado ao objectivo (coisas e seres), à ciência, ao social (relações humanas) e à
política.
 Cada mundo e esfera de valor possuem um conjunto de critérios de validade próprios: uma
validade cognitiva como critério de verdade do mundo objectivo, uma validade normativa como
critério do justo do mudo social e uma validade expressiva como critério da autenticidade do
mundo interior subjectivo, sabendo que estas estruturas assumem um carácter público, apesar de
funcionarem à base de participações subjectivas (privado).
 Existe uma acção intercompreensiva que regula este quadro de experiência, de modo que a
comunicação é o médium desta acção que pretende concretizar o espaço público onde os
indivíduos comunicam e manifestar os pontos de vista para chegarem a um entendimento mútuo
sobre o que os rodeia e os une, sabendo que a exteriorização do modelo familiar torna o privado
numa força política actuante e o público como um responsável pela organização geral da
sociedade.
 Assiste-se assim a uma relação entre Público e Privado através de esferas que delimitam fronteiras
uma à outra mediante as suas acções, aliado ao facto da liberalização do Estado ter removido
obstáculos ao desenvolvimento e afirmação dos indivíduos, mas não da forma clássica, da estética e
do discurso para a glorificação do indivíduo.
 O público e o privado ganham um novo contexto fora da órbita do poder, constituindo-se como
uma contestação ao Estado bem como uma disputa com a corte sobre o centro de produção e da
vida cultural, trazendo não só para a cidade a vida cultural e confirmando a rivalidade existente
entre vários grupos sociais bem como esta dinâmica da família burguesa, de modo que esta
precisou de criar não só um entendimento para se estabelecer bem como de um espaço público
nas sociedades, não esquecendo o tratamento dos assuntos dos públicos ligado a uma dinâmica
privada assente na individualidade, pelo que a comunicação pública é o resultado de uma complexa
experiência entre o domínio distinto articulado com o domínio público.
 O público e privado desenvolvem-se até ao seu estado moderno por influência desta nova vida da
classe burguesa que designa o espaço público de "espaço público burguês", demonstrando esta
expressão o papel desta classe em modelar este espaço público e criar um estilo de vida que
influenciou todo o Mundo.

6ª LIÇÃO - Função Política e Dimensão Ética e Moral do Espaço Público e Opinião Pública

 A Opinião Pública enquanto desideratum do Espaço Público (dimensão normativa e


realidade empírica)
 O espaço público atinge a maturidade quando assume a sua função política, reivindicando por um
estatuto ético-moral. O espaço público e a opinião pública estabelecem normas e valores sociais
em conformidade com a vida colectiva e individual que a política deve respeitar no seu acto de
governação.
 Este facto relaciona-se com o ideal de democracia que obriga à constante produção de razões para
sustento do que é deliberado, de modo que o conceito de democracia deliberativa pretende criar
uma noção de cidadania o mais ampla possível, numa perspectiva trans-histórica, sabendo que as
democracias modernas têm influência destes modelos regidos sobre os termos ético-morais,
aspectos importantíssimos do espaço público e opinião pública.
 O fenómeno social divide-se assim numa dimensão fáctica (empírica), e dimensão normativa
(ideal). Gabriel Tarde introduz uma forte ideia de evolução social na concepção dos públicos, ou
seja, uma ideia de superioridade enquanto forma de sociabilidade.
 Características ético-morais da Opinião Pública como esteio do Espaço Público –
valores e regras sociais como motivo de inspiração da democracia moderna e a sua
atual forma paradoxal
 A dimensão ético-moral do espaço público reflecte-se na sua constituição em torno de valores e
regras sociais, sabendo que o objectivo de emancipação face ao poder constitui-se em função de
normas e valores que procuram um diferente ordenamento da sociedade onde o objectivo era
questionar as bases de exercício do poder arbitrário e incontestável.
 Esta dimensão ético-moral pode ser uma prática social bem como um exercício cívico com o
objectivo de formar vontade política, pelo que os princípios ético-morais servem como referências
orientadoras para possíveis alterações futuras, pelo que o facto desta dimensão ético-moral se
inscrever na dimensão fáctica e na dimensão normativa, chega a ser paradoxal fruto da relação
tensional entre ambas.
 Habermas confirma esta ideia de maturidade do espaço público moderno que precisa de tempo
para se afirmar, algo que acontece com a assunção de uma função política que é a essência do
espaço público moderno nunca revogada, traduzindo-se num espaço público moderno político.
 Habermas apelida-a de espaço público literário, um espaço público cultural e matérias que
despertam os primeiros interesses comuns num contexto de vida de salão-discussão das obras.
 A cultura é a primeira configuração de interesse comum do espaço público, sendo que a mediação
dessa discussão pública tinha na escrita e na leitura o seu principal meio de promoção literário,
sendo que há depois uma evolução para um espaço público político desde a consciência que se
ganha desse interesse comum, existindo regras que determinam a vida colectiva.
 A plenitude da comunicação pública é atingida aquando da regular comunicação política.
 A função política do Espaço Público (vigilância e controlo do Estado)
 Com a afirmação do espaço público sempre houve um esforço do poder de se apoderar dele,
reagindo a sociedade ao criar uma censura social quando sente que a dimensão ético-moral é
violada, nomeadamente pelo poder, aliado a uma preocupação geral dos intervenientes na
comunicação pública de contribuir para um melhor ordenamento da vida colectiva em torno de
melhores valores e normas.
 O espaço público moderno, atingindo a maturidade, assume uma função política concreta sendo
que a própria sociedade civil forma-se a partir da consciência de um interesse, rege-se muito pela
motivação de uma auto-regulação (contestação da actividade do Estado) por parte de um
movimento liberal em termos económicos, devendo-se a ela uma dinâmica política do espaço
público ao qual se deve reconhecer a capacidade de definição dos critérios gerais que devem reger
a sociedade.
 “A forma como a função política é cumprida passa por uma presunção de legitimidade por parte da
opinião pública”, de modo que a opinião pública é a instância que controla, vigia e orienta o poder
político do Estado, podendo reclamar uma acção legítima.
 A afirmação ambígua do Espaço Público – legitimidade e racionalização da
dominação: a dupla relação com o Estado (de exterioridade e de interioridade)
 Deve ser a sociedade a definir as linhas gerais quanto à sua organização, sabendo que a dimensão
ético-moral do espaço público traduz-se no reconhecimento de uma função de legitimidade face
aos actos de governação, dado que é no espaço público que se ajuíza o poder que agora é
constituído não em função da autoridade mas na base de uma legitimidade racional onde o
governo deve justificar-se em nome de valores e normas sociais.
 A legitimidade que lhe é exigida funciona como uma dominação, não para que a política funcione
de forma arbitrária mas para que siga uma racionalidade esforçada, procurando justificar as suas
acções.
 Nestes termos, o espaço público aparece como uma força exterior ao Estado, separando-o da
sociedade civil. Contudo, ao assumir a legitimidade para o seu sucesso, isto deu origem a uma
participação directa no poder partilhando-a com o Estado, pelo que esta ambivalência assume-se
paradoxal: o espaço público e a opinião pública que legitimaram a acção política e lhe atribuíram
sucesso acabaram por se integrarem nas forças estatais, o que fez colapsar a base ético-moral.
 Desta forma, ou temos um espaço público como força da sociedade civil autónoma ao poder,
controlando-o e vigiando-o com uma relação poder e estado exterior, ou temos um espaço público
como órgão político com funções de poder e participação relativamente directa, dentro de uma
posição interior na relação entre poder e Estado, sendo esta é uma das principais discussões que
colocam em causa as democracias vigentes.
7ª LIÇÃO - Função Política e Dimensão Ética e Moral do Espaço Público e da Opinião Pública (conclusão)

 A aproximação iluminista à nova realidade das instituições do Público na filosofia


de I. Kant (o "uso público da razão")
 A crítica na filosofia kantiana é relativa ao uso público da razão e de uma vontade colectiva que é
uma construção e uma prática solidária da publicidade, tendo como função conferir credibilidade
ao ideal iluminista de um progresso ilimitado da razão preconizado pelo Iluminismo.
 A crença no valor da razão humana como motor de progresso rapidamente extravasou o campo
científico para se aplicar à reflexão sobre o funcionamento das sociedades em geral, de modo que
acreditava-se que o uso da razão, livre de preconceitos e outros constrangimentos, conduziria ao
aperfeiçoamento moral do Homem, das relações sociais e das formas de poder político,
promovendo a igualdade e a justiça, sabendo que a razão seria a luz que guiaria a Humanidade.
 Kant foi um dos filósofos que pensou sobre estas questões, de modo que segundo ele a
comunicação pública segue um princípio de racionalidade, de acordo com ideais anti-absolutistas,
republicanos e pacifistas, visto que a sua consagração é fruto de uma colectividade e que através
do Iluminismo o homem poderia sair da sua menoridade de que ele próprio é culpado.
 Sentidos diversos de "Vontade Colectiva"
 A opinião pública e a noção de vontade geral surgem, com Kant, desligadas de um contratualismo
naturalista tal como abordava Rousseau que preconiza dizendo que este contratualismo é imposto
de forma natural aos indivíduos, o que apesar de ser uma visão da democracia republicana, coloca
limites à comunicação de forma radical, se bem que é óbvio que a perspectiva de comunicação
constante se adequa melhor ao funcionamento do espaço público uma vez que este é objecto de
uma construção e aperfeiçoamentos recorrentes através de um exercício sistemático da razão.
 Esta construção da vontade colectiva fez uso da comunicação como seu médium, com práticas
como a publicidade, a crítica e o debate que regulam o exercício e qualificam moralmente as
práticas do espaço público e opinião pública.
 Publicidade – sobre o conceito (a sua vinculação subjectiva e racional)
 Crítica – controlo pragmático de validade dos enunciados (dos valores às normas)
 Sobre Publicidade e Crítica nos processos sociais e na organização da sociedade:
censura, segredo de Estado, parlamentarização da vida política
 Relativamente às características da publicidade podemos dizer que ela tem uma componente e
uma circulação relacional e subjectiva, repetindo-se na crítica que supõe algum exercício racional
para a conferir de sentido pois ela não se exerce sobre o vazio e sobre o nada, mas sim sobre
alguma outra razão. No que toca à componente subjectiva o exercício da crítica é individual,
envolvendo um compromisso subjectivo que tem em conta o uso público da razão dado que
quando se critica, existe uma exposição, ou seja, o acto de crítica pressupõe uma entrega subjectiva
daquele que a executa envolvendo um esforço pessoal, para além de esta ser indissociável de um
juízo subjectivo e possuir uma dimensão publicística, dado que ela própria tem um papel
fundamental no uso público da razão que é indispensável para a construção da vontade colectiva.
 A crítica confere também um carácter vinculativo a essa mesma opinião colectiva sendo fiel da
legitimidade ao permitir um reconhecimento da vontade geral como a expressão da vontade, aliado
ao facto de ela ser um mecanismo de controlo pragmático da validade dos enunciados (Habermas),
pelo que no âmbito da comunicação pública, os enunciados vão valer todos o mesmo, ao contrário
das opiniões que não têm a mesma validade, podendo nós dizer que a crítica é o controlo
pragmático da validade dos enunciados.
 Para que a opinião pública seja uma opinião de ordem superior relativamente às restantes é
necessário esta triagem para que não comprometa a validade dos enunciados sendo a opinião
pública o resultado desta triagem executado pela crítica dos seus membros no espaço público,
ganhando uma expressão mais relevante em termos sociais através de alterações fundamentais
das sociedades ocidentais nesta época (século XVIII):
 Fim da censura de modo que esta não deve estar alicerçada na sociedade tendo sido resultado do
efeito do exercício da crítica, a limitação drástica das práticas do segredo de estado ampliando-se
extraordinariamente as condições para o exercício da crítica na medida em que a motivação para a
sociedade se envolver é muito maior. O terceiro aspecto relaciona-se com a parlamentarização da
vida política onde o papel assumido pelos parlamentos constitui-se como um lugar proeminente na
vida política, formando-se como uma instituição por excelência para o exercício da crítica, sabendo
que a relação dos parlamentos com o uso público da razão mescla com o conjunto de mudanças
irreversíveis ligadas à construção da noção de cidadania que procura promover o envolvimento dos
membros na sociedade através do debate que é uma prática que permite uma dimensão ético-
moral do espaço público afirmado e constituído.
 Actualmente são os cidadãos politizados que “impõem a si próprios (...) a tarefa de limitar a
autoridade do Estado e de influenciar o processo de decisão política”, sabendo-se que com o fim da
censura e das práticas de segredo de Estado, está provada a consagração institucional da crítica e
da publicidade, ambas preconizadoras de alterações sociais e políticas.
 Debate: sobre o processo de validação (racional) das normas sociais
 O acto do debate não se reduz à publicidade e à crítica pressupondo um encadeamento dos
mesmos para que ela se legitime, onde a própria formatação da publicidade da crítica encontra-se
num permanente e constante entrelaçamento, detalhe crucial para a definição de comunicação
pública e para a modelação das práticas decisivas, dado que quando falamos de comunicação
pública vem-nos à memória a ideia de debate de ideias e de opiniões, constituindo uma prática que
confere uma dinâmica de continuidade à publicidade crítica.
 O debate define um modo de estar nos espaços públicos tornando-se na forma normal de vida
política de modo que a institucionalização do debate (indiscutível do ponto de vista ideal) é um
mecanismo importante para o funcionamento das sociedades.
 O debate concede uma forma final à comunicação pública, surgindo a partir de novas formas de
associação dos indivíduos que possibilitam a sua realização mas também através da
refuncionalização de outras associações, como salões e pubs, chegando ao espaço público devido
ao seu enraizamento nos públicos e pelo seu denso padrão regular de funcionamento.
 Os espaços sociais – físicos e simbólicos – de (e para o) debate público
 A imprensa teve um papel determinante na afirmação desta prática da comunicação, uma vez que
o seu desenvolvimento fulgurante “projectou o debate a uma escala que nenhum dos outros
espaços físicos alcançou”. O debate permanente caracteriza agora a comunicação pública, na
medida que a imprensa congrega à volta de uma motivação política e do debate de ideias os
espíritos inquietos dos leitores. Os próprios nomes dos jornais sustentam esta ideia do debate
(Critic, Herald, Tribune) e de clarificação (Sun, Star), de modo que a sua função política afirmou-se
quando esta se assumiu como um verdadeiro quarto poder, tornando a comunicação pública
essencialmente racional ao estabelecer pontes entre os diversos pólos do espaço público,
articulando com a própria comunicação.
8ª LIÇÃO - Estrutura e Processo da Comunicação Pública Moderna – Idealização e
Ambivalências

 Dimensão comunicacional do Espaço Público e da Opinião Pública - uma breve


perspectiva (trans)histórica
 Algumas considerações de ordem epistemológica (sobre Teoria da Comunicação e
Teoria Geral da Sociedade)
 As práticas comunicacionais e do uso público da razão organizam-se num conjunto diversificado de
espaços públicos (com uma dimensão própria) onde elas passaram a estar presentes, sabendo que
a partir de um certo momento existe um envolvimento dinâmico da crítica e da publicidade.
 Papel dos salões - Os salões são um espaço físico que consubstancia o espaço público tal como são
locais por excelência para a crítica, debate e a filosofia, se bem que apesar da distribuição dos
lugares onde eles existem não ser homogénea, há um traço comum dado que existem em todos
estes práticas comunicacionais, ou seja, a presença de uma comunicação pública.
 Assistimos também a uma refuncionalização dos espaços com locais de convívio e de divertimento
(pubs do século XVIII) que possuem públicos específicos bem como de espaços físicos que
funcionam como espaços públicos de um grande espaço público.
 A imprensa também se afirmou como outro dos espaços por excelência do espaço público sendo
uma imprensa comprometida politicamente com as próprias mudanças sociais e aberta para um
forte exercício da publicitação da crítica e da publicidade enformada numa imprensa de opinião
onde o principal objectivo não é o lucro mas sim permitir a possibilidade das pessoas encontrarem
um veículo para publicitarem as suas ideias e opiniões, estimulando-se o pluralismo e o exercício da
crítica e do debate (para Rhye Mills o debate assume um papel como prática comunicacional
responsável pela publicidade e crítica).
 Habermas define alguns conceitos:
 Esfera Pública: público raciocinante dos cidadãos onde se chega a acordo a respeito de assuntos
comuns, sendo que esta publicidade politicamente activa converte-se no princípio organizador do
Estado Liberal de Direito.
 Esfera Privada: a sociedade burguesa constitui-se como esfera de autonomia privada onde a
liberdade dos homens coincide com a igualdade.
 Consenso Público: mecanismo de controlo pragmático da verdade e de uma esfera pública que
unifica todas as consciências empíricas.
 Função da Esfera Pública: manter a política solidária com a moral.
 Estrutura da comunicação pública - A relação da comunicação com o espaço público é um
elemento constante e permanente mas não invariável dado que não assume sempre a mesma
forma e intensidade pelo que a relação só é intensa se o espaço público for verdadeiramente
relevante em termos sociais, ou seja, enquanto existir comunicação pública existe espaço público,
sendo através da oratória que cada indivíduo se assume enquanto orador relevante em termos do
espaço público.
 Que função cumpre a comunicação relativa ao espaço público?
 Relação Espaço Público/Comunicação no contexto da modernidade: função cognitiva da
comunicação, esclarecimento e emancipação
 Cumpre uma função cognitiva, na medida que existe uma motivação que percorre o funcionamento
do espaço público envolvendo uma participação dos seus membros que trocam ideias que fazem
aumentar um conhecimento superior que ainda não lhes está adquirido, fazendo jus à ideia de
opinião pública.
 Nas sociedades modernas, a relação entre espaço público e comunicação faz sentido na função
política do espaço público e na dimensão ético-moral, conduzindo ao que Habermas vai chamar de
um espaço público maduro onde existe uma comunicação pública plenamente assumida, sabendo
que no contexto desta relação, a forma que a comunicação assume é de construção de uma
legitimidade baseada na comunicação pública, dado que é por via dela que os membros se
constituem como cidadãos que têm oportunidade de dar expressão aos seus valores e construir
regras para a comunicação como interlocutores da comunicação pública.
 Este sentido de prática de cidadania faz-se através da intervenção ao nível da comunicação pública
pelo envolvimento nos debates que dão vozes às suas ideias, podendo-se afirmar que não há
maneira de pensar uma participação no espaço público sem pensar o campo de afirmação de uma
comunicação pública.
 Estrutura da Comunicação Pública I: as práticas comunicacionais
 Características da comunicação dos públicos (que se revelam como axiais da comunicação pública):
 1) Carácter agnóstico da comunicação relacionando-se com as lutas sociais, diversidade de
opiniões e o que constitui a comunicação pública sabendo que a Agonística significa submeter em
termos práticos uma opinião contra a outra, ou seja, uma comunicação feita pela diversidade de
opiniões.
 2) Carácter argumentativo que constitui uma resposta para a Agonística e por isso, um caminho
para ultrapassar a diversidade de opiniões e realizar um juízo sobre a validade dos enunciados.
 Esta ambivalência (ocorrência perturbadora) inebriada no espaço público que se afirma como uma
instância superior ao Estado, exercendo um controlo de legitimidade vai ser um aspecto
determinante para o desenvolvimento do espaço público, na medida que se começam a ser
pensadas de uma forma homogénea certas dinâmicas sociais espontâneas relacionadas com
correntes de pensamento que se constituem como uma novidade para as sociedades modernas.
 Citação de Kant: "É difícil a cada homem desprender-se da menoridade que para ele se tornou
natural, mas é perfeitamente possível que um público se esclareça..."
 Citação de Hegel: "A opinião pública serve para ser desprezada", revelando um espírito auto-
reflexivo traduzido numa crítica sobre a modernidade.
 As diversidades teóricas à volta das questões do espaço público encontram-se associadas às
ambivalências que se constituem sabendo que a diversidade de opiniões em relação a um objecto
deve-se à própria complexidade que o objecto passou a assumir.
9ª LIÇÃO – Estrutura e Processo da Comunicação Pública Moderna – Idealização e Ambivalências
(conclusão)

 Ambivalências comunicacionais na origem de um cepticismo generalizado em torno


do Espaço Público e Opinião Pública
 As teses de Hegel e Kant são diferentes formas de pensar a modernidade ainda que não sejam
perfeitamente contemporâneas, onde por um lado, Kant liga-se a um passado e Hegel às
ambivalências e ambiguidades.
 A citação de Hegel é perceptível à luz das questões de ambivalência que se constituem à volta das
instituições do público, sendo que o espaço público afirma-se como constituinte de uma voz da
sociedade civil superior ao Estado como instância crítica ao assumir posições de governação,
revelando a citação um cepticismo relativamente às capacidades de uma opinião pública que se
confunde com o poder e que dificilmente se assume na prática como algo que se reivindica como
instância crítica do poder.
 Hegel denota uma desvalorização da opinião pública bem como uma esfera pública constituída por
interesses particulares, se bem que a citação acaba por ser representativa de um pensamento
social mais moderno, contrastando Hegel as realizações da opinião pública com aquilo que assumia
como programa da modernidade.
 Já Kant através do uso público da razão (que é colectiva) detalha de forma desenvolvida as práticas
que traduzem esse uso público da razão (publicidade, crítica, debate) sendo possível interpretar o
seu cepticismo baseando-se nestas questões comunicacionais apesar do autor constatar as suas
insuficiências comunicacionais para a garantia da racionalidade dos seus resultados.
 Marx encara a opinião pública como uma falsa consciência e uma máscara dos interesses
burgueses onde o Espaço Público contradiz o seu próprio princípio de acessibilidade universal
sustentando na exploração do trabalho dos mais necessitados formando-se uma sociedade de
classes injusta e desrespeitadora dos princípios e dos direitos dos trabalhadores onde as
expectativas do trabalhador assalariado ascender são cada vez mais reduzidas.
 Para definir a comunicação pública em termos racionais, as práticas precisam de estar integradas se
quisermos pensar uma opinião pública racional, depois preenchida pelo linguistic turn.
 Estrutura da Comunicação Pública II: critérios formais (princípios ideais)
 A investigação de Habermas (anos 60) foi preparada para pensar este tipo de assuntos e problemas
baseando-se em princípios formais da comunicação que se constituíram como uma componente
essencial para definir a estrutura da comunicação pública, sendo esta composta por uma
diversidade de elementos divididos em duas categorias: as práticas e os critérios que coexistem de
forma articulada e integrada.
 Os critérios formais organizam formalmente a comunicação e balizam-na, constituindo-se sempre
como objectos para alcançar dois princípios básicos da modernidade (a liberdade e a igualdade).
 O critério da universalidade da comunicação pública consubstancia o princípio da liberdade de
comunicação, sabendo que a comunicação pública é uma forma de comunicação aberta a todos de
exercer a sua própria racionalidade.
 O critério da liberdade de discussão (reportando-se aos assuntos e não aos participantes)
confirmou um não fechamento temático e uma comunicação pública aberta à diversidade dos
assuntos reconhecidos como relevantes para o público.
 O critério da paridade argumentativa explica-se por uma comunicação pública como uma
comunicação entre iguais onde não existem diferenças de estatuto a priori entre os participantes
de modo que a comunicação pública deve funcionar como uma espécie de suspensão das
diferenças sociais onde cada indivíduo é capaz de produzir argumentos e opiniões.
 Do cepticismo à crise das instituições do Público – conflitos, contestação e lutas
sociais no quadro do desenvolvimento das sociedades capitalistas
 Todos estes critérios apresentam um potencial esclarecedor para a constituição da comunicação
pública se bem que a concretização plena dos mesmos apresenta problemas (ex. grupo social
segregado, desigualdade), pelo que podemos pensar as práticas comunicacionais organizadas de
uma certa maneira, confirmando-se a disparidade dos resultados das práticas do uso público da
razão.
 A estrutura da comunicação pública através do linguistic turn é a possibilidade de ela realizar o seu
próprio desígnio, garantindo uma certa racionalidade ao constituir-se como "pedra de topo",
sabendo que actualmente podemos ter uma interpretação comunicacional sobre as lacunas que ele
aponta relativamente às práticas comunicacionais, dado que na estrutura pública concretiza-se em
princípios diversos e não pelos princípios formais, ou seja, existem práticas comunicacionais que
não estão perfeitamente articuladas e integradas, resultando numa sociedade que não promove a
liberdade e a igualdade.
 A esfera pública portuguesa caracterizou-se pelo enaltecimento do papel revolucionário que a
burguesia teve na sua operacionalização da estrutura pública, encarando a esfera pública enquanto
exclusivo de uma classe social e uma categoria social predestinada a feitos privados, o que confirma
esse aspecto restritivo de uma valorização de um grupo em prol da exclusão de outros grupos, pelo
que podemos falar numa esfera pública plebeia como uma ideia sintomática que pode constituir-se
como um factor de desagregação da própria sociedade geral.
 O processo de desenvolvimento das sociedades modernas constitui uma ideia de emancipação do
espaço público e dos indivíduos, funcionando como premonição, traduzindo Habermas esta drive
como cisão de dois projectos das sociedades modernas que até determinada ocasião
permaneceram fundadas sob a ideia de um projecto ontológico que desmiuça a ideia de espaço
público bem como de realização da Humanidade e da sociedade no seu conjunto.
 O projecto ideológico associado ao espaço público transmite a visão do mundo que promove uma
certa visão social particular correspondendo a uma passagem de um sentido universalista da esfera
pública portuguesa para um sentido restrito que pensa nos seus interesses em oposição a outros
grupos sociais.
 Crise do Espaço Público a nível de comunicação: a falência dos critérios
formais/princípios ideais do discurso (a linguagem pública como deformação da
comunicação)
 O século XIX corresponde a uma generalização do cepticismo e a uma crise do espaço público que
esgotou o seu potencial revolucionário, existindo uma série de mudanças estruturais que têm o
espaço público como seu lugar, de que é exemplo o sentimento de crise caracterizado pela
desconfiança e contestação bem como o espaço público plebeu utópico como um sonho para
imensos outros grupos sociais que desejam afirmar-se e constituir-se como uma alternativa ao
espaço público burguês.
 Esta crise levou à mudança estrutural da esfera pública moderna em todos os seus aspectos,
articulada com um conjunto de transformações de ordem económica, política e social que
influenciam a comunicação pública.
 Nesta medida e relativamente à estrutura da comunicação pública, verifica-se uma desarticulação
entre as componentes das práticas comunicacionais e dos critérios ideais de comunicação,
constituindo um obscurantismo e um condicionamento das consciências, dado que em vez de
existir uma tendência para o ordenamento dos critérios formais (participação, discussão, estatuto
dos participantes) observa-se a um afastamento desses ideais que tendem a hipotecar uma
deformação sistemática da comunicação e das questões comunicacionais.
 Aprofundamento das ambivalências comunicacionais do Espaço Público e Opinião
Pública (vs Espaço Público Plebeu) – os factores estruturais de uma situação de
crise endémica da comunicação pública (no contexto da "Mudança Estrutural"
equacionada por J. Habermas)
 A Esta crise não foi destrutiva, apesar de ser persistente e duradoura, apoiando-se na tensão entre
facticidade e normatividade.
 Este processo foi possibilitado por certas alterações sociais das sociedades ocidentais, de modo que
apesar de toda esta pressão ideológica, a normatividade do espaço público e da opinião pública
permanecem quase como que inalterados, visto que persistem na actualidade como uma força
utópica e ainda vigente, preservando o lugar central destas estruturas do público.
 Apesar de uma persistência, a crise instala-se mas ainda assim conseguimos encontrar os pilares
formadores dessas estruturas no público de hoje, surgindo-nos o conceito de high modernity que
caracteriza os tempos modernos em que uma tensão política ou económica rege o processo social
global. Enquanto a democracia se instala no plano político, a economia é assolada pelo capitalismo
(crisis of man management), sabendo-se que a opinião pública contemporânea é o reflexo destas
tensões.
10ª LIÇÃO - Mass Media e Refuncionalização do Espaço Público

 Habermas em a Transformação da Esfera Pública dedica uma especial atenção ao facto do espaço
público ter decorrido de múltiplas transformações, nomeadamente pela sua transformação nas
sociedades modernas, sabendo que a sociedade de massas vai servir para pensar essa mudança
estrutural.
 Transformação estrutural do Espaço Público moderno – o quadro socio-político
desta alteração (capitalismo, democracia de massa e reticulação social)
 Podemos falar de duas mudanças sociais principais com maior incidência no espaço público:
 Mudanças políticas: consolidação de um modelo democrático das sociedades modernas sob o
termo "democracia de massas" que permitiu não só o sufrágio universal bem como o grande
alargamento da base eleitoral como também o direito de participação política aos indivíduos.
 Mudanças económicas: economia capitalista que se fez numa transição física (sociedades
ocidentais do século XX são diferentes das do século XVIII) alicerçada na importância da lógica das
redes na forma como organiza o social e o público, estimulando a circulação de produtos, pessoas e
redes de comunicação como também gestão dos interesses que foi um movimento tendente à
reticulação da sociedade, devido ao crescimento da rede e da vida social.
 Com o desenvolvimento de uma comunicação cada vez mais dependente destas redes de
reticulação, falamos também de um desenvolvimento de dispositivos tecnológicos de mediação
simbólica que transcrevem uma lógica dos media e de um estímulo à globalização tendo tudo isto
contribuído para uma estreita ligação com a mudança da estrutura do espaço público.
 Dois vectores de mudança: a expansão do Espaço Público e o seu enfraquecimento
(enquanto força política autónoma)
 Como é que estas mudanças repercutem a nível do espaço público?
1) Extraordinária agudização dos conflitos sociais onde o espaço público deixa de ser homogéneo.
2) Pulverização do espaço público (espaço público burguês vs. espaço público plebeu).
3) Expansão do espaço público com grupos sociais (cada vez maiores) implicados na vida do público.
4) Perca de força no sentido do espaço público edificado numa tendência contraditória, uma vez
que já não existe sob a mesma égide do esclarecimento e da verdade, encontrando-se
desarticulado e instrumentalizado.
5) Opinião pública instrumentalizada e o seu consecutivo enfraquecimento.
 As sociedades mudaram no que toca à construção de um espaço público tendo por base uma
disparidade de organizarem as suas funções básicas de uma maneira diferente, pelo que os
públicos surgem como uma condição de existência para a formação dos espaços públicos.
 A Massa como uma forma de sociabilidade emergente – dimensão física
(morfologia) e dimensão simbólica (socio-psicológica)
 Neste contexto e perante o desenvolvimento de uma nova forma de sociabilidade contígua e
confundível com os públicos origina-se não uma sociabilidade de públicos mas sim, uma
originalidade de massas que confirmou a atrapalhação na explicação de Gabriel Tarde, se bem que
ao contrário deste, Mills já apresenta o conceito como fundador na sociedade de massas.
 O conceito de massa surge para nos ajudar a perceber como é que as sociedades ocidentais criaram
condições básicas de vida para a mudança estrutural do espaço público, sabendo que sem uma
sociabilização de massa não conseguiríamos pensar uma forma de sociabilidade moderna.
 A base de sustentação do espaço público alterou-se para a sociedade de massas através de
alterações morfológicas nas sociedades modernas (industrialização, crescimento e concentração
populacional, fenómenos migratórios, constituição de grandes urbes) que promovem uma
concentração de grandes massas de indivíduos circundantes nas cidades, mas bastante
desenraizados física e culturalmente.
 Existe também uma dimensão simbólica na medida que os grandes aglomerados populacionais são
constituídos através de estados físicos, psíquicos e fragilidade, de modo que “a massa é como que o
resultado de uma certa desfiguração do público” que deixou de garantir os seus critérios de
funcionamento, constituindo-se assim uma massa de sujeitos isolados, sem ligações sociais e uma
afinidade simbólica bem como sem uma mediação da comunicação entre si, contrastando com os
públicos onde existia uma motivação individual essencial para a formação dos públicos enquanto
indivíduos dotados por uma singularidade autónoma (públicos vs. massas).
 Os processos dos Públicos e da Massa: critérios de diferenciação e antagonismos
 O comportamento do indivíduo é instintivo coexistindo com um consumo controlado que nos torna
como objectos, uma opacificação das normas que regem as relações sociais ao contrário da decisão
consciente dos públicos, sabendo que a maior parte das pessoas não as compreende e tem
interpretações fantasiosas como também é uma forma de sociabilidade exigente no que toca às
necessidades adaptativas e de integração dos seus próprios números, pelo que o sujeito de massas
foi reprogramado no que toca à sua função social, não controlando as normas e regras, mas sim
sujeito a adaptar-se aos valores.
 Gabriel Tarde tem uma dificuldade em explicar este novo fenómeno do ponto de vista da análise
social dado que ele é dotado de uma complexidade especial, ou seja, as massas constituíram-se
empiricamente a partir do interior dos públicos, concedendo-lhes uma escala e dimensão que os
tornou e transformou em massas.
 A sobreposição entre massas e públicos tornou mais difícil o discernimento na constituição de uma
nova forma de sociabilidade, se bem que os públicos ainda não desapareceram, coexistindo.
 Dinâmica de formação das massas (finais dos séculos XIX-XX): Esta dinâmica de formação está
profundamente entrelaçada com a dinâmica dos públicos, resultando esta confusão de uma
dinâmica de afirmação do número de públicos de tal modo que atingindo um certo nível, já não é
possível preservar a força dessa dinâmica.
 Para Wright Mills em A Sociedade de Massa, nos públicos havia uma harmonia de interesses
enquanto nas massas os interesses são devotados a uma lógica de interesses.
 Na sociedade dos públicos havia uma discussão racional entre os indivíduos, enquanto nas massas
era necessário um perito para validar as questões, a descoberta da racionalidade e da socialidade
condicionada.
 Também na sociedade de massas, as decisões tomadas não passam essencialmente pelos públicos,
que se tomam conhecimento das mesmas quando estas já foram tomadas de modo que a
transformação do público na massa foi uma das tendências das sociedades modernas e uma das
causas do colapso do optimismo liberal (individualismo) substituído pelas formas colectivas da vida
económica e política.
 No público, a mesma quantidade dá e recebe opiniões, sabendo que a comunicação pública é
organizada de modo que haja possibilidade imediata de responder à opinião do público,
encontrando-se uma forma de se manifestar na acção pública, como também as instituições não
penetram no público, que é autónomo.
 Já na massa, o número de pessoas que expressam opiniões é menor, sabendo que o indivíduo tem
dificuldade em responder imediatamente às questões levantadas dado que a colocação da opinião
é organizada pelas autoridades, pelo que a massa não tem autonomia em relação às instituições.
 Massa Vs. Público: as elites e a alteração dos laços sociais, a forma da acção e os
dispositivos de poder associados
 No público as diferenças eram reconhecidas, mas existia um esforço para a superação das mesmas,
enquanto na massa as diferenças são iludidas, o que as perpetua e as torna processos de
massificação elitistas.
 A base de funcionamento dos públicos é igualitária ao contrário da massa que funciona na base da
elitização, ou seja, a nível do consumo, que significa a existência de casos de massificação que
envolvem a participação de uma certa elite que comandava e orientava as massas num certo
sentido, ao contrário do que se sucedia com os públicos.
 As massas têm decisões mais centralizadas ao contrário dos públicos onde ela é mais
descentralizada, relacionando-se com a própria fenomenologia dos públicos e com o grau de
consciência dos participantes.
 O grau de consciência nas massas é bastante baixo, por vezes inexistente, o que divide ainda mais a
elite do resto dos indivíduos, sabendo que na massa não existe comunicação, mas sim processos de
informação, como que palavras-de-ordem, pois as práticas comunicacionais apenas são utilizadas
pela elite.
 Surgiram dois planos da vida social, a massificação do consumo e a massificação de âmbito político,
de modo que o sucesso da massa é operado pela elite, que tem de planificar e agir, utilizar o seu
poder em função dos seus objectivos, e indexar os indivíduos que não passam de estatística.
 A obliteração do indivíduo na Massa: mecanismos de anonimato e isolamento, fragilização dos
estados mentais, sentimentos de indiferença e apatia (atenção Vs. interesses)
 As massas são geridas de um ponto de vista estratégico tendo em vista uma questão do poder,
onde o estatuto do indivíduo na massa e o contraste que esse público tem nas formas de
sociabilidade e na sua estrutura conduziram à refuncionalização do espaço público.
 Enquanto no público a individualidade tinha valor, nas massas o indivíduo é obliterado,
predominando a apatia e a indiferença, estados que traduzem-se em posições reactivas e
meramente binárias (sim/não, favor/contra).
 O indivíduo já não é sujeito de acção uma vez que a massa gera o anonimato e isolamento,
assumindo-se um carácter radical de igualitarização, “uma cabeça é uma cabeça, um braço é um
braço, as diferenças entre elas carecem de pouca importância” (Canetti) que pode ter efeitos
diferentes de sujeito para sujeito. Apesar de todos agirem da mesma forma, a massa pode conduzir
ao totalitarismo.
 Para Mills A democracia de massas é a luta de grandes grupos de interesse e associações que se
colocam entre o Estado e a vontade do público. Por essas associações se encontrarem entre os dois
elementos têm grande importância para o indivíduo poder exercer o poder de que disponha.
 O público é alvo de tentativas de controlo, orientação, manipulação e intimidação, pela sua
influência (pelo menos numérica) nas decisões democráticas, sendo uma forma de legitimar o
poder económico, militar e político onde o eleitorado minoritário (das classes informadas e
educadas) é substituído pelo sufrágio universal.
 A elite que está no poder ou deseja estar possui assim instrumentos ímpares de controlo e
manipulação psíquicos como os meios de comunicação em massa e a educação universal
compulsória.
 Wright Mills - Apagamento da individualidade - "Ao mesmo que as associações voluntárias se
criavam tornavam-se inacessíveis ao indivíduo. Há medida que novas pessoas são atraídas à nova
política, estas associações (...) tornavam-se menos acessíveis (...)"

 11ª LIÇÃO - Instrumentalização da Opinião Pública I – a sociedade civil numa lógica


de interesses e ideologia
 Caracterização da comunicação de massas:
 1) Instrumentalização da opinião pública dada a intensificação dos conflitos da sociedade civil, o
alargamento do espaço público e a usurpação dos públicos patente no espaço público sobre a
forma de uma sociedade civil homogénea, organizando-se interesses particulares manifestados de
forma espontânea, se bem que no início a organização desses interesses é rudimentar, passando
depois a serem transformados devido à conflitualidade existente (concorrência).
 2) Complexidade empresarial crescente devido à preocupação com as questões da opinião pública,
na medida que se torna numa expressão de um nível superior de interesses na competição com os
seus rivais, sabendo que as pessoas usufruem da opinião pública coexistente que conduz à inversão
do espaço público pela complexidade de uma presença simultânea de vários registos.
 O que está em jogo nesta opinião pública já não é a construção de um consenso mas sim a
produção de um consentimento e de um esforço para determinar uma ideia, tornando-se a
instrumentalização da opinião pública um acto autoritário que se exerce de forma simbólica devido
ao surgimento de actividades comunicacionais que têm esse propósito (marketing, publicidade) e
que ainda hoje se encontram presentes na nossa sociedade, sendo fundamentais para a
constituição da opinião pública.
 Processos de comunicação como resultado da usurpação dos Públicos pela Massa:
os "veículos formais" (media) e os interlocutores enquanto recursos de mercado
 A imposição de mundovisões e a criação de condições favoráveis para os diversos interesses em
disputa, de um ponto de vista simbólico bem como um trabalho que passa pelos media tornaram-
se nos aspectos decisivos na mudança estrutural do espaço público.
 A discussão e argumentação desaparecem tal como os critérios que possibilitavam uma
comunicação livre e igualitária assentada no pragmatismo, onde também a comunicação adquire
critérios rígidos, tratando os indivíduos como recursos de mercado.
 Os media são fulcrais para as alterações registadas tornando a massa num mercado onde a
comunicação são meros processos informacionais, cuja força depende do poder da elite que
controla a rede de comunicação.
 Os públicos começam a cair na órbita da influência da massa, sabendo que não é o número que a
define mas sim os problemas de comunicação de que esta padece, de modo que a opinião pública
com carácter instrumental faz agora sentido, visto cair nos interesses dos particulares organizados
para dar sensação de poder e controlo ao resto da população.
 Hibridação da Opinião Pública – a ambivalência da sua forma contemporânea
(entre normatividade e facticidade)
 1) O modo como cada uma destas formas de comunicação se afirmam como posições formadoras e
receptoras de opiniões, permite que falemos de uma alteração radical do equilíbrio constituído
entre o número daqueles que emitem e o número daqueles que recebem opiniões a nível dos
públicos, respeitando a estrutura de comunicação pública de massas onde existe uma redução
daqueles que têm acesso à opinião e um aumento da massa de indivíduos receptores.
 2) A agilidade na formação de opiniões e na sua capacidade de resposta em relação às dinâmicas de
formação social, se bem que no público não são identificáveis convicções que constituem
obstáculos decorrentes daquilo que possa estar a acontecer.
 3) Consequências do processo da força performativa inerente à comunicação pública sabendo que
a performatividade da comunicação de massas (distinta dos públicos por ser pragmática e uma
força derivada da própria linguagem com a capacidade de originar um consenso) relaciona-se com a
instrumentalização da opinião pública, dependendo do juízo estratégico que lhe está inerente bem
como na capacidade de convencimento dos outros, procurando ambas uma intervenção na
realidade, só que através de formas diferentes sendo que a primeira é democrática
(performatividade) e a segunda é autoritária (totalitarismos).
 Instrumentalização da Opinião Pública II – Opinião Pública oficializada, Publicidade
Demonstrativa e a "refeudalização" do Espaço Público
 A refeudalização do espaço público e a publicidade demonstrativa são solidários, expressando de
uma forma contundente a ideia de mudança estrutural que estamos a analisar.
 A publicidade demonstrativa é um vector importante para podermos pensar no novo espaço
público refeudalizado e de uma publicidade enquanto prática comunicacional, típica de uma
opinião pública instrumentalizada e de uma comunicação pública de massas que não se orienta em
relação à procura de uma verdade dado que ela é constituída por uma verdade pré-constituída.
 Ela também é distinta da publicidade crítica, não se encontrando definida uma autoridade a priori,
apesar de determinada pelas lógicas de poder ao procurar desenvolver a superioridade de uma
verdade em relação ao poder bem como reforçar as suas posições.
 A refeudalização do espaço público é uma metáfora que recupera alguns traços do espaço público
tradicional como um espaço público de poder onde se torna evidente de como determinados
poderes ganham uma capacidade de representação, voltando o espaço público a cair na esfera do
poder. A segunda vertente relaciona-se com as mudanças que ocorrem a nível do Estado e que o
vão constituir como um actor de primeiro plano no próprio espaço público.
 Alteração do quadro político das sociedades ocidentais: o Welfare State e a
emergência de uma nova «Esfera Social» (entre Público e Privado)
 A O Estado é um dos elementos fundamentais presente na mudança decorrida nas transformações
estruturais da sociedade, apresentando-se como o produto da afirmação do espaço público
moderno para a própria constituição do estado liberal.
 As mudanças ocorridas na sociedade civil são extraordinariamente importantes para as
transformações do espaço público, sabendo que existiram um conjunto de condições políticas que
promoveram esta situação, dado que já no século XIX as alterações foram focadas no
desenvolvimento de políticas sociais uma vez que existia um conjunto de factores de instabilidade.
 O dito Welfare State (Estado Social) consolidado no século XX e no pós II Guerra Mundial forma-se
nas sociedades ocidentais em finais do século XIX vindo substituir o estado liberal burguês pela
deficiência das políticas sociais aplicadas, pelo colapso da economia concorrencial e pela falta de
capacidade de resposta do Estado face aos problemas da sociedade bem como na deficiência dos
meios que eram quase inexistentes, tendo provocado as crises económicas cíclicas (e posteriores
consequências como o desemprego, miséria, fome, prostituição, marginalidade, criminalidade) que
agudizam a conflitualidade social e as próprias diferenças.
 A desarticulação das instâncias do público e o seu conflito com o privado tornam o espaço público
numa opinião pública institucionalizada pelo Estado Social, perdendo a opinião pública uma
autonomia, ao submeter-se aos interesses particulares do Estado.
 Este surgimento de uma esfera social que partilha a vida das sociedades com o Público e o Privado,
aliada às massas, torna as formas de opinião pública em algo bastante complexo.
 A normatividade continua, por sua vez, intocável. Ainda assim, “o resgate dos públicos a partir da
experiência de massas é, pois, uma possibilidade que permanece em aberto”.
 12ª LIÇÃO - A Estrutura da Comunicação de Massa: Tecnologias, Sistemas de
Propriedade e Processos de Recepção
 A intervenção do Estado a nível da Opinião Pública
 No século XX assiste-se a um desenvolvimento de um novo modelo de Estado sustentado em novas
funções políticas que promovem o estabelecimento do espaço público associado às suas
responsabilidades e objectivos, associando-se o estado à criação de uma opinião pública,
confirmado nas seguintes características:
1) Surgimento e comprometimento do estado social de uma forma robusta na protecção dos
cidadãos e nas necessidades da sociedade edificadas em políticas funcionalistas e assistencialistas.
2) Prestação de um conjunto de serviços de utilidade pública (saúde, educação) assente numa
universalidade da oferta que respeita a lógica de assistência social, combatendo as limitações da
sociedade civil em termos económicos.
3) Solidificação da economia numa capacidade do Estado em ganhar controlo sobre todo o
processo económico, relacionando-se com as crises, ou seja, o estado social ganhou uma maior
capacidade de monitorização, pilotagem e controlo sobre os problemas económicos envolvendo a
utilização de certos mecanismos bem como de estruturas propícias ao desenvolvimento da
economia como a criação dos bancos centrais que se traduziram num aparato económico
significativo, rompendo com a separação entre a economia e o Estado.
4) Planeamento das grandes mudanças e tendências sociais que se geram no interior da
sociedade, relacionando-se com a cultura (factor impulsionador das mudanças sociais) de modo
que o papel das ideologias revolucionárias no século XIX pretendia encetar um conjunto de
transformações que constituíam um problema para o estado liberal que também não era munido
de mecanismos necessários para responder aos problemas, pelo que o planeamento destas
tendências sociais controlava as perspectivas sociais bem como os desejos, aspirações e opiniões
dos indivíduos, sabendo-se que a viabilidade só podia funcionar com uma reconfiguração do espaço
público e do próprio estado.
5) Intervencionismo do Estado que reforça o seu poder de intervenção, passando a ter uma
palavra no domínio público e privado, nomeadamente com a protecção social dos indivíduos,
sabendo que anteriormente os problemas eram considerados de carácter privado, envolvendo uma
redefinição das fronteiras do estado com a sociedade civil (princípio sagrado da afirmação do
espaço público moderno) com consequências no funcionamento do espaço público relacionadas
com a necessidade do estado em cumprir estas novas funções, constituindo-se como um próprio
actor do espaço público (passando para o seu interior) com o propósito de obter o seu bem,
consagrando a sua legitimidade política.
 O Estado tem de revestir a priori de uma legitimação que iniba as tensões e conflitos que podem
acontecer, ou seja, ele precisa da legitimidade para poder funcionar, buscando-a no espaço público
onde tem de ter um papel muito mais activo. O estado deve assim criar condições para a sua
legitimidade sob pena de tornar-se ineficaz relativamente aos compromissos que assumiu, ou seja,
é inerente ao modelo de funcionamento do estado social a criação de condições que contribuem
para uma aceitação colectiva dentro da própria sociedade, intervindo sobre as mentes dos
indivíduos que exige por si só um trabalho intelectual que influencia a opinião pública através da
criação dos aparelhos de estado que condicionam as próprias aspirações dos indivíduos.
 Todas estas características dizem assim respeito à intervenção do Estado na opinião pública.
 Como é que se faz esta intervenção? Quais os meios?
1) Surgimento dos meios de comunicação social (mass media) como instrumentos por excelência
da comunicação pública, monopolizando-a, existindo uma consecutiva desvalorização das formas
de entretenimento social do passado (ex. cafés, salões) e uma intervenção directa do estado nos
mass media dentro de uma filosofia de serviço público da comunicação pela aliança de interesses
entre ele e as grandes empresas mediáticas públicas e privadas, sustentada pela sua legitimidade.
 O Estado responde às necessidades de legitimidade através do apoio explícito por parte da
sociedade e sobre as políticas desenvolvidas bem como pela neutralização da sua capacidade de
contestação, sabendo que esta ampla neutralização da capacidade política crítica da sociedade
resume-se na despolitização dos media através do divertimento e sátira política, baixando as
exigências de legitimidade política.
 Democracias de baixo perfil cívico - sistema eleitoral e partidos políticos
 As democracias de baixo perfil cívico não apelam a uma consciência cívica.
 Os sistemas eleitorais enquanto registo exclusivo da vida política secaram tudo à sua volta no que
toca à participação dos cidadãos na vida política, de modo que as eleições não são qualificadoras da
consciência cívica dos cidadãos.
 O modo como o sufrágio foi acomodado no nosso sistema democrático contribui para um
esgotamento das energias cívicas do ponto de vista do seu funcionamento onde os próprios
partidos são cada vez mais organizações complexas de poder ao tornarem as suas estratégias
eficazes, sendo impenetráveis à influência da própria sociedade. O crescente fechamento dos
partidos sobre si mesmos (que confirmam estas democracias de baixo perfil cívico) obstaculiza a
participação dos cidadãos.
 Tudo isto compõe e espelha uma mudança estrutural do espaço público.
 A tecnicização da Opinião Pública (os planos da construção das sondagens e dos
usos estratégicos dos seus resultados)
 A tecnicização da opinião pública é um tópico relevante para a mudança estrutural constituindo
uma oposição com a forma anterior de uma opinião pública ética e moral.
 A opinião pública é construída em termos ético-morais, regida e orientada por valores e regras
fundamentais da vida social onde já não são os valores e as normas sociais o aspecto mais relevante
mas sim uma maquinaria desde a sua construção à sua utilização e na forma como é
operacionalizada, revestindo-se de uma série de características e técnicas prioritárias.
 As sondagens são um recurso fundamental de construção da opinião pública, revelando mas não
esgotando esse carácter técnico, se bem que existem ainda um conjunto de aparatos da opinião
pública que materializam essa tecnicidade, ou seja, um conjunto de práticas e técnicas que
gravitam em volta das sondagens como a estruturação de profissões da comunicação (relações
públicas, jornalismo, acessoria).
 No geral, assistimos a uma fabricação de uma opinião pública contrária a uma opinião espontânea,
não planeada e tecnicizada que culmina no dispositivo das sondagens.
 Da Opinião Pública ético-moral à Opinião Pública tecnicizada (das sondagens de
opinião): o divórcio da crítica e da opinião como transmutação da Publicidade
Crítica em Publicidade Demonstrativa
 Num primeiro plano falamos de construção, ou seja, nesta tecnicidade associada à construção de
uma opinião pública operacionalizada.
 O segundo plano aparece-nos mais associado à sondagem através da realização de inquéritos,
recolha de amostras e de informação bem como na conjugação das tecnicidades, ou seja, de
enunciados típicos da opinião pública (ex. os portugueses pensam que; a opinião mundial).
 Assim, falamos da utilização da opinião pública fruto do trabalho das profissões de comunicação
que é processado através das sondagens.
 O que se faz a esta opinião pública?
 Existe todo um planeamento estratégico e uma tecnicidade que envolve o procedimento da opinião
pública relativamente à sua divulgação e na forma como ela se faz, pelo que esta opinião pública já
não possui um carácter público mas sim privado devido ao facto de ela cair na esfera dos
interesses particulares, de modo que importa gerir uma agenda de assuntos prioritários que fixem a
opinião pública.
 O contexto da tecnicidade é propício a duas ideias fundamentais na mudança estrutural.
 1) Refeudalização da opinião pública pelo modo como esses agentes se posicionam, e também de
uma opinião pública resgatada na luta pelos interesses.
 2) Publicidade demonstrativa que já não é crítica mas sim constituída em função de uma ideia de
verdade formada à partida e incluída nos seus destinatários, com uma vontade que pretende
impor.
13ª LIÇÃO - A Estrutura da Comunicação de Massa: Tecnologias, Sistemas de Propriedade e Processos de
Recepção (conclusão)

 Falamos de um paradoxo da comunicação pública e de uma comunicação (pública) de massa


enquanto comunicação pública, sabendo que permanecem ao seu nível outras tendências que
recomendam um certo cuidado sobre juízos definitivos.
 No texto de Jean Marc Renny “As Transformações da Publicidade Política” faz-se uma abordagem
de uma comunicação pública que existe para além da comunicação pública tecnicizada, relacionado
com uma mudança estrutural.
 Este paradoxo é relativo a uma comunicação pública que se torna mais efectiva em termos sociais,
sendo muito mais presente, ou seja, falamos de uma comunicação de massa onde todos os
aspectos da vida humana se interligam nestes contextos, de modo que as redes de comunicação
pública são mais tensas e densas, originando uma comunicação que se robustece.
 Neste seguimento, o paradoxo é esta expansão da comunicação pública pelo lado das redes
coexistirem com uma deterioração das estruturas de comunicação associado ao papel dos media
que justifica uma abordagem crítica realizada nos estudos desta área (anos 30), relacionado com as
correntes de pensamento como também uma crítica sobre o efeito pernicioso dos media em
termos comunicacionais.
 Os pensadores da Escola de Frankfurt operacionalizaram e foram os preconizadores neste
pensamento crítico, afirmando-se outras escolas que seguiram o seu modelo, resultado do papel
que os media desempenham a nível da comunicação pública adjacente à sua importância.
 Que condições no universo dos media proporcionaram esta alteração das condições de
comunicação encetadas por eles na sociedade?
 A "mudança estrutural" no sector dos media (o caso exemplar da imprensa; o modelo
informativo-comercial dos media electrónicos)
 R: Imprensa. Passa-se de uma imprensa de opinião para uma imprensa virada para o lucro e que é
de uma grande tiragem virada para as audiências. Esta mudança acontece na conjugação de
pequenas mudanças que vão atingindo os jornais, contribuindo para a alteração da imprensa,
justificada por três aspectos.
 1) Publicidade (comercial) nos jornais como suporte de promoção de produtos, ou seja, uma
publicidade num sentido de publicitação e nas implicações nos objectos das publicações que
permitiram a sua configuração.
 2) Separação de dois centros de poder: redacção e direcção, contrário ao que se verificava no
século XVIII onde a mesma pessoa era proprietário, dono e redactor. Agora quem defende é a
direcção como uma nova forma de organização das publicações que precisam de ter uma estrutura
de decisão adaptada aos novos objectivos económicos.
 Limites da instrumentalização da Opinião Pública: sobre a natureza do bem específico produzido
e as condições da sua disponibilização pública – para lá da lógica de manipulação
 3) Conteúdo, onde segundo Habermas existe uma operação de facilitação psicológica dos
conteúdos tendo em vista a torná-los acessíveis para um maior número de pessoas, tornando-se a
informação um tipo de conteúdo ajustado a este objectivo que permite antecipar melhores
resultados de um ponto de vista da venda, de modo que facilita a materialização da informação do
conteúdo dos jornais onde as informações devem ser produzidas para que possam alcançar um
maior número.
 A publicidade comercial contamina o processo da opinião pública, na medida em que os media
passam a criar e explorar acontecimentos que atraem a atenção: o fait divers, factos que atraem a
atenção de todos sem relatarem nada de importante.
 O critério de racionalidade não existe no consenso criado pela manipulação sofisticada da opinião
pública, se bem que apesar de anteriormente a publicidade ter significado uma exposição da
dominação política diante do uso da razão, hoje existe uma inversão tal que se pode falar numa
refeudalização da esfera pública onde a opinião pública é controlada pelos poderes económicos e
políticos, pelo que o público tornou-se o alvo e não a origem da opinião pública, conduzindo a um
desvirtuamento da liberdade crítica dos indivíduos, do debate público e da convergência de
opiniões.
 Deste modo, fica traçado o trajecto de uma deterioração de uma comunicação pública no
contexto de desenvolvimento dos media.
 A própria história da imprensa é irregular e exemplar do desenvolvimento dos media nessa
conjuntura, de modo que quando surgem a rádio e a televisão afirmam-se socialmente já de acordo
com o novo modelo concorrencial, permitindo-nos falar dos media como um conjunto homogéneo.
 O desenvolvimento do espaço público nas sociedades ocidentais levou a um aprofundamento do
mesmo no contexto de uma mudança estrutural, exprimindo um contacto do autor com uma série
de sinais que expressam essa ambivalência, pelo que podemos falar de dois vectores distintos.
 As estruturas de resistência do Espaço Público: aprofundamento vertical (temático) e
aprofundamento horizontal (participação) da Opinião Pública - ainda dentro do contexto dos
media
 1) Aprofundamento horizontal relativo à forma como as tecnologias proporcionam condições de
recepção e de compreensão à generalidade dos indivíduos facilitadas por uma enorme diversidade
de mensagens difundidas no mundo e sobre ele.
 2) Aprofundamento vertical do espaço público na medida que foi ainda possível fazer um trabalho
de enriquecimento do espaço público, de modo que relativamente a algumas matérias ele é muito
mais maduro pela sua capacidade de discussão bem como pela profundidade sistémica dos
problemas e assuntos. Falamos assim de uma mediação generalizada com carácter quase
obrigatório que um certo número de problemas e assuntos adquirem na sequência da repercussão
que a eles é conferida pelos media, tratando-se da constatação dos limites que subjazem aos media
funcionais no que respeita a uma administração das temáticas presentes nos media, permanecendo
para esta em aberto circuitos que proporcionam uma ligação mais directa e espontânea dos media
à vida e à experiência quotidianas, bem como à subjectividade individual.
 Para Ferry, este aprofundamento traduz-se num espaço público político que é definido no interior
dos limites que não recortam o campo da comunicação política, se bem que existem outros
aspectos da comunicação política que não se integram no espaço público, pelo que podemos
distinguir uma comunicação política das massas e uma comunicação política das elites.
 A comunicação política das massas é directa, espontânea, ocasional e informal, enquanto na
segunda se está na posse de informação que não é destinada ao grande público.
 O campo da interacção entre os principais actores da comunicação política constitui o meio
significativo mais constante do espaço público político.
 Na periferia, há que ter em conta a cena social e a cena internacional sabendo que a primeira é
constituída pelas manifestações autónomas de uma opinião pública que se mobiliza através de
movimentos sociais, reagrupamentos de sindicatos ou associativos e a segunda traduz-se pelas
forças exteriores à colectividade nacional (estados estrangeiros, organizações internacionais,
grupos multinacionais).
 Dinâmicas de revitalização do Mundo da Vida: a Sociedade Civil e os novos movimentos e
identidades sociais
 É feita uma apropriação da comunicação pública e uma plebeização de um contexto histórico que
enriquecem sobre a nossa consciência, podendo nós falar em critérios de identificação dos
assuntos públicos, associando-se os media a este aprofundamento, observado também pela
amplificação dos mesmos no debate das questões ambientais, cívicas e outras preocupações.
 Os múltiplos círculos informais de discussão, os movimentos sociais autónomos, as novas
identidades sociais apresentam uma alta densidade comunicacional em função da possibilidade de
a partir deles se proceder a uma tematização e a uma discussão de novos assuntos, de novos
sujeitos ganharem uma acessibilidade ao discurso público bem como de novas linguagens que
alcançaram uma formulação expressiva.

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