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Sociologia geral

AUTORIA
Flávio Donizete Batista
Bem vindo(a)!

Olá, prezado e prezada, estudante.

Com alegria convido você a realizar um interessante estudo de Sociologia, que


ajudará a conhecer um pouco mais da sociedade em que vivemos.

O objetivo é aproximar você das investigações, re exões e teorias das Ciências


Sociais, que nos ajudam a entender um pouco do dos elementos que constituem
nosso cotidiano vivido em sociedade.

Vamos abordar os antecedentes do estudo da sociedade, buscando conhecer um


percurso histórico que preparou o surgimento da Sociologia no nal do século XIX.

Buscaremos conceituar a Sociologia, a partir daquilo que seus pensadores principais


apontaram ser seu objeto especí co de estudo.

Trataremos de um importante tema que é a cultura, mostrando seu signi cado e


sua rica diversidade, mostrando a necessidade de aprendermos a valorizar a nossa
cultura e a daqueles que são diferentes de nós.

E, por m, vamos estudar sobre a política e o poder, tão necessários para a


manutenção desenvolvimento de nossa vida.

Obviamente não será possível abordar todos os itens que envolvem a vida em
sociedade e que são estudados pela Sociologia. Mas será uma importante
oportunidade para iniciarmos nossos estudos sociológicos, e nos despertará para
novas leituras e pesquisas, cientes de que sempre há ainda muito a aprender.

Um excelente estudo a todos! Grande abraço.


Sumário
Essa disciplina é composta por 4 unidades, antes de prosseguir é necessário que
você leia a apresentação e assista ao vídeo de boas vindas. Ao termino da quarta da
unidade, assista ao vídeo de considerações nais.

Unidade 1 Unidade 2
O pensamento sobre a sociedade: O pensamento clássico e
breve resgate histórico contemporâneo da sociologia

Unidade 3 Unidade 4
Cultura e sociedade Política e poder
O pensamento sobre a
sociedade: breve resgate
histórico

AUTORIA
Flávio Donizete Batista
Sumário
Introdução

1 - A Sociologia: antecedentes na história

2 - O Renascimento e as novas formas de pensar a sociedade

3 - O Iluminismo e o Liberalismo

4 - O positivismo de Auguste Comte e a Sociologia

Considerações Finais

Introdução
Todos nós vivemos em sociedade, e até o mais remoto ermitão é um ser humano que
já foi socializado e optou pelo isolamento da sociedade. Entretanto, isolamento
individual não é isolamento da sociedade. O mero ato de pensar é um ato social;
aprender a linguagem é uma ato social. Embora qualquer um de nós venha ao
mundo com a capacidade de aprender línguas, só as aprendemos em contato com o
mundo social. Essa constatação simples, “vivemos em sociedade”, deu origem a
muitas re exões sobre o lugar do indivíduo no mundo.

Desde o m do século XIX, essas re exões têm sido sistematizadas em ciências,


denominadas Ciências Sociais. A proposta nesta unidade é convidar você a conhecer
alguns aspectos que antecederam na história essas ciências, nos ajudando a
aumentar nossa compreensão sobre o que signi ca conhecer a vida em sociedade.

Plano de Estudo:
1. A sociologia: antecedentes na história
2. Os gregos e as origens do pensamento cientí co
3. O Renascimento e as novas formas de pensar a sociedade
4. Maquiavel e a emergência da Ciência Política
5. O iluminismo e o liberalismo
6. O positivismo de Auguste Comte e a Sociologia

Objetivos de Aprendizagem:
1. Conhecer os precursores do pensamento sobre a sociedade.
2. Compreender o processo de desenvolvimento histórico da ciência social.
3. Estabelecer relações entre os momentos históricos e a forma de pensar a
sociedade.
A Sociologia: antecedentes na
história
A Sociologia resultou de um movimento de ideias que teve início com os gregos
antigos e foi retomado no Renascimento. Segundo Costa (2016), grandes mudanças
na sociedade ocidental - desenvolvimento do capitalismo, do colonialismo, das
ciências e da tecnologia - levaram os pensadores a se afastar da visão religiosa do
mundo da época e a analisar crítica e objetivamente a vida social. Escreve a autora:

Embora, desde os primórdios da humanidade, as forças sociais tenham


agido sobre o comportamento humano, nem sempre tivemos
consciência da maneira pelas quais elas se constituem e atuam sobre
nós. Como nas demais ciências, as explicações sobre a sociedade e o
modo como convivemos com ela foram regidas por crenças de base
religiosa ou mítica. As ciências vão se constituindo à medida que as
crenças adotadas se tornam incapazes de resolver nossos problemas
(COSTA, 2016, p. 16).

O fato de o homem relacionar as forças da natureza com as ideias religiosas e vê-las


como deusas ou deuses não foi su ciente para responder às perguntas importantes
sobre a vida ou para resolver os problemas concretos que as sociedade enfrentavam
no dia a dia. Diante de questões como essas, era preciso estudar a natureza e a vida
de forma objetiva para obter respostas humanas sobre os problemas humanos. Assim
se desenvolveu o pensamento cientí co, que, ao longo dos séculos, tentou substituir
as explicações religiosas.

O mesmo ocorreu com as Ciências Humanas. As explicações puramente losó cas ou


religiosas mostraram-se inadequadas para atender certas necessidades de ação
sobre o homem e sobre a sociedade. Vimo-nos obrigados a, por meio de métodos
mais adequados, desenvolver o pensamento cientí co sobre a sociedade. Foi assim
que surgiu a Sociologia - o pensamento cientí co sobre como o “eu” e os “outros”
interagem, interferindo em nossa maneira de pensar em nosso comportamento,
permitindo diagnosticar situações, descrever tendências, prever atitudes e superar
obstáculos.

Os gregos e as origens do pensamento


cientí co.
Os gregos antigos, habitantes de uma península que se abria para o Oriente, foram
um povo original - comerciantes, navegadores e viajantes que aprenderam a conviver
com diferentes povos e culturas, dos quais receberam inúmeras in uências e
conhecimentos. Além disso, desenvolveram o apreço pela re exão, dedicando-se à
Filoso a. Tinham um estilo de vida urbano e um agudo apreço pela vida pública. Os
gregos não formaram impérios como os egípcios e os mesopotâmios, mas
desenvolveram uma cultura diversi cada, cuja principal unidade eram as cidades-
Estado. Cidades como Atenas, Esparta, Tebas e Corinto, entre outras, eram
independentes entre si e cada qual criou suas leis, a sua organização sociopolítica e as
suas tradições. Entretanto, compartilhavam a mesma língua, mitologia e tradições,
denominada helenística. Essa cultura, posteriormente, foi apropriada pelo Império
Romano, que a difundiu pela Europa e pelo Oriente.

O crescimento econômico das cidades gregas, promovido pela expansão comercial e


colonial, com base no trabalho escravo, permitiu o surgimento de uma elite livre das
tarefas e do trabalho, com tempo e recursos para o exercício e a intensa prática da
re exão sobre a própria cultura e daquelas advindas dos povos com quem conviviam
e comerciavam. Isso lhes permitiu desenvolver as artes, a Filoso a e o pensamento
racional. Foram capazes, então, de organizar sistematicamente diferentes áreas do
conhecimento, como a Geometria, a Filoso a e a Política. Deram grande importância
ao espírito público e à participação política, sendo responsáveis pela criação de um
regime político único, com base na participação de parte dos cidadãos na vida
pública: a democracia.

Costa (2016) acrescenta que o pensamento cientí co não se desenvolveu entre os


gregos antigos, como viria a se realizar na Europa, séculos mais tarde. Isso porque o
conhecimento helênico e as teorias ainda tinham a in uência de uma concepção
metafísica da realidade. Entretanto, foi essa herança grega de um pensamento
losó co capaz de conceber a vida pública e a importante ação do homem sobre a
coletividade que, resgatado na Europa a partir do século XV, lançou as bases do que
viria a ser o pensamento sociológico.
O Renascimento e as novas
formas de pensar a sociedade
O Renascimento é o período da história da Europa que se inicia por volta do século
XIV, quando, depois de quase mil anos de feudalismo - sociedade marcada pela
propriedade rural, produção agrária e servidão, assim como pelo domínio da Igreja
Católica -, desenvolve-se um novo modo de vida social com base no comércio, na vida
urbana e no poder laico. Vale destacar o que escreve Costa:

O controle das pestes que assolaram a Europa na Idade Média, a


invenção do arado, entre outros instrumentos agrários, as Cruzadas e a
descoberta de rotas comerciais como Oriente permitiram a ascensão da
burguesia, uma nova classe social que se desloca do meio agrário e
passa a se dedicar ao comércio. Aos poucos, essa atividade, inicialmente
subsidiária, ganha impulso e, sediada nas cidades, promove o
Renascimento comercial e urbano. As navegações marítimas se
intensi caram e o colonialismo se expande por outros continentes,
formando-se os Estados Nacionais, como Portugal e Espanha. O
comércio se expande e o lucro que ele possibilita se torna, cada vez mais,
o principal objetivo das atividades econômicas (2016, p. 19).

Essas condições são elementos de um sistema econômico renovado, o capitalismo,


alicerçado na propriedade privada e no trabalho assalariado: inicialmente por meio do
comércio, depois, por meio da indústria.

Para que esse novo sistema tivesse pleno desenvolvimento, era preciso transformar a
sociedade europeia, ainda presa aos princípios feudais, promovendo uma cultura
voltada à prosperidade material, à felicidade terrena e à vida pública, princípios que
regiam algumas sociedades da Antiguidade. Por isso, os pensadores renascentistas
buscaram no passado as suas fontes de inspiração para a nova cultura, especialmente
na cultura antiga e na herança greco-romana. Nesta cultura antiga, seriam
encontrados elementos contrários à cultura medieval - calcada na religião e numa
mentalidade conservadora do ponto de vista moral e social, a qual dividia os seres
humanos em linhagens, regiões, dinastias e relações servis. Isso explica por que esse
período foi chamado de renascimento pelos historiadores, pois promoveu o renascer
do comércio e da vida na polis.

Maquiavel e a emergência da Ciência


Política
O Renascimento revelou autores como Nicolau Maquiavel, que se destacou por sua
obra O Príncipe, considerada pioneira no desenvolvimento do pensamento político.
Em seu texto, Maquiavel analisa o exercício do poder, mostrando as condições sociais
necessárias para que um governante conquiste, mantenha e governe seu reino,
acreditando que das qualidades de liderança desse governante dependeria a
felicidade de seus governados.

Maquiavel pensava realisticamente


as relações de poder. Ele procurava
desvendar suas condições e
variantes. Identi cava nelas
diferentes categorias sociais
envolvidas - a nobreza, o clero, os
ministros, os militares, o povo - e
mostrava como o príncipe deveria se
relacionar com cada um. Não deixou
de mostrar que o governo também
depende das ações nem sempre
meritórias, como a manipulação, as
barganhas e o uso oportuno e
estratégico da violência. Em síntese,
Maquiavel receitava doses bem
medidas de persuasão, seja pelo
convencimento e eventuais
benfeitorias, seja pela força bruta das
armas. Maquiavel expressava ideias
pertinentes sobre a sociedade, o
poder e as relações sociais.
@wikimedia

Costa (2016) destaca que a obra de Maquiavel é considerada pelos especialistas o


primeiro estudo sistemático da Ciência Política, ou de Filoso a Moderna, mas por
causa da crueza que demonstrou ao descrever as condições de exercício do poder, foi
indevidamente considerado defensor da doutrina de que os “ ns justi cam os
meios”, ao aconselhar os poderosos a assassinar, mentir e bajular, quando necessário,
para conquistar ou manter o poder. O seu livro é muito mais aprofundado do que tais
classi cações. Em razão desse pragmatismo em relação aos objetivos dos poderosos,
passou-se a chamar de maquiavélico todo pensador ou governante que age, a
qualquer custo, para a conquista e manutenção do poder. Maquiavelismo é o nome
que recebeu a prática dessa visão pragmática e pouco ética da política. No entanto,
Maquiavel não pensava em objetivos escusos, visava apenas assegurar a ordem social,
a prosperidade e a governança dos reinos. Como cientista moderno, ele analisou a
sociedade como objeto, de forma isenta de partidarismos e paixões.

Assim, o Renascimento, impulsionado pelo despertar do desenvolvimento capitalista,


lançou as bases de um pensamento laico voltado a analisar a sociedade em suas
particularidades, por meio de uma atitude crescentemente objetiva, mas distanciada
dos dogmas religiosos.
O Iluminismo e o Liberalismo
À medida que o capitalismo se desenvolvia, estimulando o avanço da ciência,
acentuava-se na sociedade ocidental a prevalência da racionalidade e do
pensamento laico. Costa (2016) escreve que cada vez mais se acreditava na
capacidade do pensamento racional poder desvendar a natureza do mundo em suas
diferentes instâncias e aspectos. Paralelamente, as nações também se
transformavam e, com elas, o nacionalismo, esse sentimento de pertencimento a um
território governado por um poder que o administra. Os anseios por prosperidade,
justiça e bem-estar se intensi cavam e o Estado era conclamado a criar as condições
necessárias para isso. Novas aspirações, novos valores e uma atitude diferente diante
da sociedade e da realidade circundante provocaram o surgimento de um
movimento losó co conhecido por Iluminismo.

Esse movimento de ideias era impulsionado pelo crescimento das descobertas e


avanços dos métodos e instrumentos cientí cos de investigação da realidade, da vida
urbana e também pelo colonialismo, que permitia aos europeus conviverem cada vez
mais intimamente com culturas diferentes da sua, algumas vezes de forma tensa,
outras vezes com maior capacidade de diálogo, embora sempre com uma tentativa,
por parte das potências europeias, de estabelecer trocas assimétricas e lucrativas. E se
por um lado havia o anseio por progresso, por outro também crescia a consciência de
que a sociedade europeia apresentava problemas e injustiças de difícil solução. A
Igreja Católica, em particular, era questionada, e já não se acreditava no poder da fé
ou da religião na solução dos problemas sociais.

SAIBA MAIS

Diversos pensadores se dedicaram ao estudo da sociedade, das relações


políticas e econômicas, como Montesquieu (1689-1755), Voltaire (1694-
1778) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Este último, na obra Do
Contrato Social, desenvolve a tese de que a vida política resultaria de
uma decisão coletiva pela qual os membros de uma sociedade abrem
mão de sua liberdade em prol do bem comum - seria a origem, assim, da
organização do Estado tal como o pensador formulou.

A expansão do comércio e da manufatura capitalista, bem como do assalariamento


do trabalhador, exigiam uma atitude mais contundente contra a monarquia
absolutista e as relações servis, resquícios do período medieval. Esses anseios se
traduziam por um desejo cada vez maior por liberdade, que se tornou um dos
principais objetivos do Iluminismo. Não se defendia simplesmente a liberdade de
decisão do cidadão na sua vida cotidiana, mas, principalmente, a liberdade da nação
em relação aos poderes absolutos do rei; do trabalhador em relação aos laços de
servidão; e do comércio em relação às restrições impostas ao livre funcionamento do
mercado. Os lósofos procuravam defender esses princípios compondo uma
tendência losó ca e política a que se deu o nome de liberalismo.

Rousseau, por exemplo, considerava a liberdade um dom natural, próprio da


dignidade humana - à capacidade de cada um de nos de se autodeterminar em
função de uma ideia, de um ideal ou do bem comum -, um princípio de liberdade
humanista e que corresponde a um estado interior de autonomia e independência. É
dessa liberdade que o homem só abriria mão, em parte, para a criação das
instituições políticas que passaram a governar as nações em nome da coletividade.
Esse era o contrato social que exigia um Estado livre e democrático.

Adam Smith, considerado o pai da Economia Moderna, defendia um princípio de


liberdade diferente do de Rousseau - uma liberdade que pertence à regulamentação
natural das relações humanas, especialmente as econômicas. Dando origem ao
liberalismo econômico, essa noção de liberdade justi cava a defesa do livre
funcionamento das leis de mercado, de oferta e procura, sem a intervenção de
medidas econômicas reguladoras, como taxas ou impostos. Ao Estado caberia apenas
defender a livre operação dessas leis e a adequada transação de mercadorias, fossem
elas trabalho, matéria-prima, produtos ou moedas. O liberalismo econômico
expressava os anseios dos capitalistas, cujos lucros passaram a advir principalmente
da expansão comercial local e internacional, do aumento da produção manufatureira
e do trabalho assalariado. O liberalismo política e a defesa da democracia também
faziam parte desse ideário e foram tema de autores como Montesquieu. Embora
fossem diferentes os princípios de liberdade que esses pensadores defendiam, as
teorias desenvolvidas revelam a importância do tema no meio intelectual da época.

ATENÇÃO

Tendo essas ideias como foco, o Renascimento e o Iluminismo


prepararam o terreno para que, no século XIX, a Sociologia se
desenvolvesse como ciência social e campo do saber.
O positivismo de Auguste Comte e
a Sociologia
Os avanços da ciência, os aumentos dos lucros e da produtividade zeram com que o
racionalismo e a con ança no conhecimento objetivo fossem alçados no posto de
princípios quase inquestionáveis.

A doutrina da Igreja Católica perdia espaço na sociedade em transformação, pois não


acompanhava a evolução da ciência nem era capaz de orientar a nova vida social, que
se distanciava cada vez mais das velhas tradições e concepções da moral e virtude
valorizadas pela Igreja. A ideia de que o conhecimento cientí co era seguro e de que
suas leis eram con áveis deu origem a um movimento losó co que se tornou
conhecido como positivismo. Inspirado pelo sucesso alcançado pelas Ciências Físicas
e Biológicas, o positivismo dedicou-se a estudar o comportamento humano e a
sociedade. Concebia o mundo social como um organismo vivo, constituído de partes
integradas e em funcionamento. O adepto mais importante dessa tendência foi o
francês Auguste Comte, o primeiro a propor a Sociologia como uma ciência. Foi ele
também que, percebendo que o combate às crenças religiosas deixava a população
desamparada e descrente, resolveu criar uma “religião cientí ca”, na qual os cientistas
ocupariam o lugar dos sacerdotes.

Costa (2016) lembra que foi assim que, depois de séculos de re exão losó ca e de
um mundo convulsionado por intensas transformações, chegamos à formação de um
campo de conhecimento que tem por objeto de estudo a vida em sociedade.

Propondo-se a um estudo
sistemático das relações humanas
em coletividade, a Sociologia
permite identi car aquilo que, além
das circunstâncias físicas e naturais,
além do caráter ou da psiquê dos
interagentes , in uencia o
comportamento dos seres humanos
em sociedade.

@wikimedia

Araújo (2013) escreve que o último século apresentou profundas e intensas


transformações no modo de viver em sociedade. Fronteiras e alianças entre países se
alteram, as grandes potências econômicas tentam manter sua posição dominante,
muitos povos e nações clamam por paz e justiça, avanços tecnológicos surpreendem,
a quantidade e a variedade de informações aumentam, artistas buscam ser ouvidos,
vistos ou lidos. As estruturas familiares se diversi cam, instituições tradicionais da
política ora ganham, ora perdem credibilidade, a economia se torna mundialmente
interligada. Regimes políticos entram em colapso; mobilizações sociais convergem e
divergem sobre os problemas e soluções para os problemas de seu tempo.

Para completar, é neste contexto que as Ciências Sociais

apresentam-se para analisar e tentar explicar que está acontecendo no


âmbito político, econômico, cultural e social da realidade complexa que
existe sob a aparência das mudanças sociais. As Ciências Sociais
indagam constantemente sobre o que se altera e o que permanece, o
que rompe com estruturas antigas e o que se constitui como novo na
sociedade (ARAÚJO, 2013, p. 11).

SAIBA MAIS

A Sociologia se desenvolveu durante o período histórico que


denominamos Modernidade, que se inicia no século XV, na Europa, com
o renascimento urbano, comercial e cultural, e se estende até os últimos
vinte e cinco anos do século XX. Diversos autores consideram que a
Modernidade termina quando o m da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (1991) possibilita a comunicação mais efetiva e relações mais
estreitas entre os países, antes divididos pela oposição entre dois
impérios - o estadunidense e o soviético.

Uma nova realidade geopolítica e a chamada III Revolução Tecnológica


(revolução informática), segundo esses autores, entre os quais o
sociólogo Pierre Levy (1956-), teriam posto m à modernidade,
desencadeando um período histórico conhecido como Pós-
Modernidade.

A nova conjuntura têm obrigado os sociólogos a repensar as relações


nacionais e internacionais e a rever conceitos e metodologias. Estudar as
novas con gurações sociais da sociedade globalizada e analisar as
consequências do desenvolvimento tecnológico sem precedentes são os
grandes desa os da atualidade.
REFLITA

“O progresso não é mais do que o desenvolvimento da ordem.” (Augusto


Comte)

A expressão é o lema político do positivismo, forma abreviada do lema


religioso positivista.

Fonte: CHAUÍ, Marilena. Convite à loso a. São Paulo: Ática, 1994, p. 59.

Livro
Filme

Web
O pensamento clássico e
contemporâneo da
sociologia

AUTORIA
Flávio Donizete Batista
Sumário
Introdução

1 - O que é Sociologia e qual seu objeto?

2 - Émile Durkheim

3 - Karl Marx

4 - Max Weber

5 - Teorias sociológicas contemporâneas

Considerações Finais

Introdução
O que é essa coisa chamada “o social” que os sociólogos estudam? Podemos dizer
que o social é o ponto de partida. Muitas pessoas preferem ver a vida humana como
algo biológico, individual, econômico ou religioso, mas para os sociólogos, o ponto de
partida sempre está em tudo o que é ser social. Essa é uma ideia com vários
signi cados. E queremos em nosso estudo aprender como a Sociologia encara e
relaciona esses mesmos signi cados para, ao nal, compreender como o homem vive
em sociedade.

As pessoas vivem juntas, ou seja, em sociedade. E os cientistas sociais são os


interessados em entender como acontece essa vida em sociedade. Quais são as
formas de convivência entre as pessoas? Que relações são fundamentais em uma
sociedade? Como funciona uma sociedade? Por que as pessoas, em geral, fazem
coisas muito parecidas? Como as sociedades mudam? Por que a vida em sociedade
produz diferenças tão grandes entre seus membros? Quais os fatores diferenciam
grupos ou sociedades? Por que algumas são tão exploradas, subjugadas e até mesmo
escravizadas?

Vejam quantas perguntas. Talvez não demos conta de todas nesse estudo. Mas é esta
busca pela compreensão cada vez maior de nossa própria vida em sociedade que
estamos dando continuidade na unidade que se inicia. E que busquemos sempre
mais conhecimentos sobre nossa vida em sociedade.

Tenhamos todos um bom estudo.


Plano de Estudo:
1. O que é sociologia e qual seu objeto?
2. Émile Durkheim: fatos sociais, solidariedade mecânica e orgânica
3. Karl Marx
4. Max Weber
5. Teorias sociológicas contemporâneas

Objetivos de Aprendizagem:
1. Compreender o conceito de Sociologia.
2. Conhecer qual seu objeto a partir de seus teóricos.
3. Conhecer o pensamento dos clássicos e dos contemporâneos da Sociologia.
O que é Sociologia e qual seu
objeto?
Sociologia é a ciência que estuda as relações sociais, as instituições sociais e a
sociedade. É, pois, uma ciência social que dispõe de um conjunto acumulado de
conhecimentos e que se propõe a fornecer respostas acerca do ser humano. Gil (2011)
acrescenta que a Sociologia não estuda a ação das pessoas isoladamente, mas trata
das atitudes e dos comportamentos das pessoas como situações coletivas, que
podem ser explicadas pelas relações que estabelecem entre si.

O interesse da Sociologia são as situações cujas causas não são buscadas nas
personalidades individuais, mas sim na sociedade, nos grupos sociais ou nas relações
que se estabelecem entres seus membros. Assim, o objeto da Sociologia - ou seja,
aquilo que ela estuda - são as relações que as pessoas estabelecem entre si na
sociedade: cooperação, competição, con ito, interdependência.

Os sociólogos não se interessam, portanto, pelo estudo das pessoas isoladamente,


mas enquanto membros dos diferentes grupos, organizações ou comunidades que
compõem a sociedade. Podemos, portanto, de nir Sociologia como o estudo da
sociedade. Esta de nição, no entanto, mostra-se muito ampla já que não possibilita
caracterizar com precisão o conceito de sociologia. Todo comportamento humano se
dá em algum tipo de sociedade ou é in uenciado por fatores sociais. Não é por
ocorrer numa sociedade que um fato se torna objeto da investigação sociológica. Um
fato é realmente entendido como sociológico quando se procura entendê-lo no que
diz respeito às relações que se estabelecem entre os seres humanos e as
circunstâncias sociais que os afetam. Mas não há consenso entre os principais autores
quanto ao objeto da Sociologia. Para um autor como Émile Durkheim, este objeto é
constituído pelos fatos sociais. Para Max Weber, é a ação social. Para os sociólogos
que se apoiam nas ideias de Karl Marx, são as relações de produção.

Quanto a essa di culdade de se de nir seu objeto, Gil escreve:

Podemos admitir que a Sociologia, como qualquer ciência jovem, tem


um problema relacionado à precisão conceitual. Assim torna-se razoável
também admitir que não haja um consenso entre os diversos autores
acerca de seu objeto. E que essas divergências entre os autores não são
insuperáveis, já que podem ser explicadas em virtude de
corresponderem a abordagens do mesmo objeto sob perspectivas
diferentes (GIL, 2011, p. 27).

A principal fonte de divergência entre os autores refere-se à objetividade do


conhecimento sociológico. Para alguns autores, o conhecimento sociológico é
objetivo, exterior aos indivíduos, cabendo ao sociólogo manter-se neutro na
investigação dos fatos sociais. Estes autores tendem a privilegiar o papel das
instituições sociais que obrigam os indivíduos a adotarem comportamentos que são
exteriormente de nidos. Para outros autores, a sociedade é uma construção social,
que depende dos signi cados atribuídos pelos indivíduos. Estes autores tendem a
privilegiar o papel ativo dos indivíduos nas escolhas sociais. Para outros autores, por
m, o aspecto mais evidente da sociedade é a desigualdade e a dominação de alguns
indivíduos por outros. Estes autores tendem a privilegiar o estudo dos con itos que se
veri cam na sociedade. Esses três enfoques derivam principalmente da in uência de
Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx, que dá origem às principais vertentes
teóricas da Sociologia.
Émile Durkheim
Para esse sociólogo a sociedade prevalece sobre o indivíduo. Ela deve ser entendida
como um conjunto de normas de ação, pensamento e sentimento que não existem
apenas nas consciências individuais, mas que são construídas exteriormente. Gil
(2011) lembra que, na vida em sociedade, os seres humanos se defrontam com regras
de conduta que não foram diretamente criadas por eles, mas que existem e devem
ser seguidas por todos, pois sem elas a sociedade não existiria.

Fatos sociais
Durkheim acredita que o objeto da Sociologia é o fato social, que ele de ne como
formas de agir, pensar e sentir que são externas ao indivíduo e a ele se impõem, mas
que orientam seu comportamento, muitas vezes sem que ele perceba que está sendo
in uenciado. Falar o idioma de um país onde nascemos é, por exemplo, um fato social
- não depende de nossa escolha nem de nossa vontade e impõe-se à nossa maneira
de agir, com uma força externa a nós.

Para explicar melhor, Costa (2016) escreve que aprender o idioma e nos expressarmos
por intermédio dele, resulta do poder coercitivo dos fatos sociais sobre nosso
comportamento e nossa forma de ser. Da mesma forma, os hábitos alimentares e a
maneira de se vestir, em dada sociedade, impõem-se a nós, independentemente de
nossa vontade. Já encontramos esses fatos formulados ao nascer e a ele nos
adaptamos. Para compreender como as forças sociais atuam, o sociólogo precisa
analisar as manifestações e as regularidades dos fatos sociais, pois, em si mesmos,
eles são inapreensíveis. Daí a importância das estatísticas, que são uma forma de os
fatos sociais se tornarem evidentes ao pesquisador.
Durkheim a rma que os fatos sociais
são uma força exterior ao indivíduo.
Gil (2011) lembra que as maneiras de
agir e sentir são exteriores às pessoas,
pois constituem herança própria da
sociedade, que são transmitidas de
geração para geração e atuam sobre
elas independentemente de sua
adesão consciente. O exemplo acima
do uso de um idioma também se
refere a essa característica dos fatos
sociais.

A generalidade, bem como a


coercitividade e a exterioridade, é
outra característica dos fatos sociais.
Trata-se da repetição dos fatos sociais
em todos os indivíduos de uma
sociedade ou grupo, pelo menos, na
maioria deles. Em decorrência dessa
generalidade, os fatos sociais
manifestam sua natureza coletiva ou
um estado comum à sociedade ou
grupo, como, por exemplo, os tipos
de vestimenta, as formas de
relacionamento, as crenças, os
princípios morais.
@ wikimedia

Durkheim distingue a consciência individual da consciência coletiva. Esta última


resulta da união das consciências particulares que agem e reagem umas sobre as
outras e dão origem a uma realidade nova, mais rica e desejável do que a condição
individual de cada identidade particular. Assim, o social transcende o individual e
propicia integração, equilíbrio e bem-estar. A consciência coletiva era entendida
como o sistema de representações coletivas numa determinada sociedade. Exemplos
dessas representações coletivas seriam a linguagem, as crenças religiosas ou um
conjunto de práticas de trabalho encontradas em determinada sociedade.
Solidariedade mecânica e solidariedade
orgânica
Gil (2011) escreve que a de nição da natureza dos fatos sociais constitui a maior
contribuição de Durkheim à Sociologia. Mas ele dedicou-se também a estudos
comparativos da sociedade procurando apreender seu desenvolvimento e as
tendências de sua evolução. Buscava identi car fases que mostrassem as
transformações das sociedades ao longo do tempo ou das diversas fases históricas.

Fonte: https://pt.slideshare.net/98698999/mile-durkheim-54363064

Para ele, as principais forças da vida social estavam nas tradições e nos costumes que
alicerçam os deveres de uns para com os outros, como membros de uma mesma
comunidade. Três instituições colaboram para intensi car essas integrações: a família,
o Estado e as corporações pro ssionais, assim como as leis, que costuram e
legitimam direitos, deveres e reciprocidades.

Nesse contexto, os indivíduos desenvolvem relações de solidariedade cuja função


permite distinguir dois tipos de sociedade - as de solidariedade mecânica e as de
solidariedade orgânica.

A solidariedade mecânica é característica das sociedades pré-capitalistas e de alguns


grupos sociais do meio rural. Nelas, os indivíduos se relacionam principalmente por
meio da família, da religião e dos costumes. A divisão social do trabalho é simples ou
quase inexistente e a consciência coletiva tem forte poder de coerção sobre os
indivíduos.
Já a solidariedade orgânica é típica das sociedades capitalistas, do meio urbano e
industrial, em que os indivíduos se tornam interdependentes, unidos pela intensa
divisão social do trabalho e laços impessoais, que substituem a integração pessoal e
familiar das sociedades agrárias. Nessas sociedades, a consciência coletiva é
enfraquecida, pois, ao mesmo tempo que os indivíduos se tornam mutuamente
dependentes, cada um se especializa em determinada atividade, e dessa forma tende
a desenvolver maior autonomia pessoal. Ao contrário da solidariedade mecânica, a
diferenciação entre os indivíduos, e não a semelhança, é mais valorizada.

Por m, a in uência de Durkheim sobre a Sociologia contemporânea é muito


expressiva. Gil escreve:

As correntes sociológicas conhecidas como estruturalista, funcionalista e


estrutural-funcionalista fundamentam-se em suas ideias. Mas estas
também têm sido objeto de muitas críticas por muitos sociólogos. A
principal crítica refere-se ao caráter consensual e estático de suas teorias
que contribuiria para a manutenção do status quo (GIL, 2011, p. 29).
Karl Marx
Cristina Costa (2016) lembra que Karl Marx não se dedicou explicitamente à disciplina
de Sociologia. Inclusive nem esse nome aparece em suas obras. No entanto, está na
base de todo o desenvolvimento dessa ciência nos anos que se seguiram. Para
explicar a origem do capitalismo e a natureza da organização econômica, formulou
uma teoria abrangente e universal que procura dar conta de toda e qualquer forma
produtiva criada pelo ser humano em qualquer tempo e lugar. Os princípios dessa
teoria é que dão origem ao que ele mesmo de niu como materialismo histórico e
que constitui o principal método de análise dos sociólogos de orientação marxista.

Em sua obra A Ideologia Alemã, de 1845, escrita em parceria com Friedrich Engels,
Marx sintetiza a dinâmica da vida em sociedade da seguinte forma: os homens
produzem suas representações e suas ideias sobre as relações sociais em que vivem
concretamente. Esse conjunto de relações de produção que os homens estabelecem
para sobreviver é a base econômica da sociedade sobre a qual se assenta o aparato
de relações de natureza política, jurídica, cientí ca, religiosa, etc.. É o que Marx
denomina modo de produção.

Essa é uma realidade histórica e, portanto, mutável. A forma com que os homens
produzem socialmente sua sobrevivência material se acha condicionada por
determinado desenvolvimento das forças produtivas e pelas relações que a elas
correspondem. Assim, o processo da história tem sido explicado como uma sucessão
de diferentes modos de produção - o primitivo, o asiático, o escravista, o feudal, o
capitalista -, cada qual com suas relações sociais. Marx dedicou-se ao estudo das
transformações sociais e econômicas de cada período histórico. Analisou a Revolução
Industrial e percebeu de que forma os artesãos, aos poucos, faliram, por causa da
concorrência com a produção em massa, que barateava os produtos e contava com
muitos recursos tecnológicos. Foram, então, obrigados a trabalhar nas manufaturas
que dominaram a produção de bens, ganhando salários cujo valor era vinculado não
à riqueza produzida pelo seu trabalho, mas ao tempo e à força de trabalho
despendidos na produção.

Karl Marx, escreve Araújo (2013), a partir da realidade estudada produz uma teoria da
acumulação tomando as características das relações de produção na sociedade
capitalista - entendida como relações entre proprietários e não proprietários dos
meios de produção. Basicamente, esta teoria explica como ocorre o crescimento do
capital na sociedade capitalista. Na medida em que o trabalhador aluga a sua força
de trabalho ao capital para produzir, ou seja, transforma os meios materiais de
produção em mercadorias com o seu trabalho, não recebe o que lhe é devido. Esse
“valor a mais” que ele produz é apropriado pelo capitalista. Assim, em contínuo
movimento, cresce o capital, o conjunto dos meios de produção, não só em volume,
mas também em nível técnico e tecnológico.

As contradições perpetuavam-se porque os capitalistas também passaram a ocupar o


governo, dominar as comunicações e pautar o desenvolvimento cientí co para que
ele pudesse contribuir cada vez mais com a economia. Todo esse processo colaborou
para o que Marx chamou de alienação do trabalhador, entendida com a situação de
desapropriação do trabalhador do fruto de seu trabalho e da consciência individual
de ser o produtor da verdadeira fonte de riqueza no mundo.
A história do homem, segundo Marx,
é a história da luta de classes. Gil
(2011) explica que entre as classes
existe um permanente con ito,
decorrente da luta constante por
objetivos opostos. Embora nem
sempre esse con ito se manifeste de
forma declarada, as divergências,
oposições e antagonismos são
inerentes a todas a relações sociais
que se manifestam nos mais diversos
níveis da sociedade, em todos os
tempos, desde o surgimento da
propriedade privada. Completa Gil:

Para Marx, todos os


con itos na história
têm sua origem na
contradição entre as
formas produtivas e as
relações de produção.
Dessa forma, a família,
a religião, as formas de
governo, as leis, as
ideias políticas e os
valores sociais,
constituem apenas
aspectos da
sociedade, cuja
explicação depende
do desenvolvimento e
do colapso dos modos
de produção (GIL, 2011,
p. 31).

@wikimedia

A Sociologia de inspiração marxista difere, portanto, da Sociologia fundamentada nas


ideias de Durkheim. Enquanto este vê a sociedade como integrada, formando um
todo coeso e mantido por regras de convivência, Marx acentua o con ito e a luta de
classes, colocando as relações de poder e de força como centrais para a explicação do
funcionamento da sociedade.
Max Weber
Cristina Costa inicia sobre Weber escrevendo o seguinte:

Com os olhos voltados para sociedades como a França e a Inglaterra,


política e economicamente estabelecidas, Marx e Durkheim pensaram a
sociedade a partir de suas estruturas. O primeiro, a partir das forças
produtivas e o segundo, enfatizando as instituições como a família e o
Estado. Max Weber, embora in uenciado por ambos, não privilegiou
essa visão macrossociológica assim como a ideia de um
desenvolvimento histórico comum a todas as sociedades, fosse ele o
materialismo histórico ou e evolucionismo positivista (COSTA, 2016, p.
47).

Para entendermos como Weber desenvolveu suas análises da vida social é preciso
dizer que, ao contrário de seus antecessores, ele não opõe indivíduo e sociedade, mas
os integra em uma ação social, um dos conceitos teóricos mais importantes de sua
obra. Para ele, uma ação social é uma ação orientada por um agente social (um ser
humano), que lhe dá sentido, ou seja, uma motivação subjetivamente elaborada. Essa
ação é orientada em função de alguém (outro ser humano) de que o agente espera
resposta ou reciprocidade. A motivação da ação encontra sua causa tanto no contexto
histórico em que se realiza como na subjetividade de que têm a iniciativa da ação.
Como se percebe, o indivíduo, agente de uma ação, é categoria relevante da ação
social. Buscar o motivo que guia a ação de uma pessoa é um dos principais objetivos
da investigação.

Por exemplo, explica Costa (2016), se uma pessoa se dirige a alguém na rua para
pedir-lhe informação, põe em prática uma ação social, cujo sentido é dado pela sua
motivação - obter orientação. Quando uma pessoa perguntada responde,
oferecendo-lhe para ajudar aquele que busca informação ou, ao contrário, negando-
se a orientá-lo, estabelece com ele uma relação social, ou seja, uma ação recíproca. Os
sentidos das ações e das relações sociais dependem do contexto. Ou seja, a rua pode
ser perigosa, fazendo com que o perguntado tenha medo de falar com estranhos. Em
outras palavras, a ação social e a relação social dependem de fatores pessoas e
externos, como a educação ou o medo de estranhos, além das circunstâncias
históricas.

Para Weber, há diferentes tipos de ação social, que podem ser classi cadas, de acordo
como o modo com que os indivíduos orientam suas ações, em:

Ação tradicional: determinada por um hábito ou costume arraigado;


Ação afetiva: determinada por afetos ou estados sentimentais;
Ação racional com relação a valores: determinada pela crença consciente num
valor considerado importante, independentemente do êxito desse valor na
realidade;
Ação racional relativa a ns: determinada pelas expectativas em relação ao
comportamento tanto das pessoas como dos objetos.
Nenhuma dessas ações envolve apenas o contexto social ou a subjetividade
individual, mas acima de tudo os integra, e pode desvendar a natureza da
personalidade do agente, assim como a dinâmica da vida social. Por outro lado, as
diversas ações sociais promovem ações em cadeia, isto é, o motivo de uma ação leva à
reação da pessoa, com quem o primeiro agente interage. O trabalho do sociólogo é
desvendar essas conexões e reciprocidades.

Gil (2011) lembra que, diferentemente


de Durkheim, Weber encara os fatos
sociais não como coisas, mas como
acontecimentos que o cientista
percebe e procura desvendar. Weber
não analisa as regras e normas
sociais como exteriores ao indivíduo,
mas como um conjunto de ações
individuais. Cabe ao cientista o
objetivo de

compreender o que
dá sentido à ação
social. O que implica
admitir que as ideias
coletivas, como
Estado, as religiões e o
mercado econômico,
só existem porque
muitos indivíduos
orientam
reciprocamente suas
ações num
determinado sentido e
estabelecem relações
sociais que são
mantidas
continuamente pelas
atitudes individuais
(GIL, 2011, p. 33).

@wikimedia

O contraste da abordagem de Weber com a de Marx ca bem evidente em sua


interpretação de classe social. Enquanto Marx vê as classes sociais como formações
determinadas por fatores econômicos, sobretudo pela posse dos meios de produção,
Weber admite que a noção de classe social refere-se não apenas aos aspectos
objetivos relativos à produção, mas também às percepções subjetivas de poder,
riqueza, propriedade e prestígio social. Dessa forma, numa pesquisa com o objetivo
de veri car a desigualdade entre grupos de classe alta e de classe média, conduzida
sob o enfoque weberiano, os pesquisadores teriam não apenas que veri car se as
diferenças existem em virtude do poder e da riqueza, mas também como as pessoas
em cada grupo sentem-se acerca do seu próprio poder e do poder dos outros.
Teorias sociológicas
contemporâneas
Silvia Araújo (2013) escreve que, ancoradas ou não nos autores clássicos, novas teorias
e abordagens das Ciências Sociais são concebidas no compasso das mudanças
sociais. Veremos algumas características gerais do pensamento de alguns sociólogos
mais representativos do século XX: o norte-americano Talcott Parsons (1902-1979), o
francês Pierre Bourdieu e os autores alemães da chamada Teoria Crítica,
denominada Escola de Frankfurt, na década de 1920. São representantes da Teoria
Crítica, em diversos momentos do século XX: Theodor Adorno (1903-1969), Max
Horkheimer (1895-1973), Walter Benjamin (1892-1940), Herbert Marcuse (1898-1979),
Erich Fromm (1900-1980) e Jürgen Habermas (1929-).

Fonte: alma prolixa Disponível aqui

A Sociologia mais recentemente produzida pensa a sociedade pela ótica de sujeitos


ativos em relações. Araújo (2013) lembra que, ao desenvolver, nos anos 1950, uma
teoria geral dos sistemas sociais, Parsons está pensando na inter-relação entre as
partes, numa ação humana que é individual e também coletiva. Quando a Teoria
Crítica elege a razão e a sociedade contemporânea como objeto de estudo, tece
críticas a uma concepção de mundo que não respeita a liberdade e a
autodeterminação. Bourdieu, com sua teoria das práticas sociais, mostra como os
atores sociais internalizam os valores, as normas e os princípios, na sociedade global.
Tal qual a produção dos clássicos, a Sociologia contemporânea enfoca a questão da
mudança social. Talcott Parsons pondera que um sistema social complexo não é
totalmente estável nem muda como um todo. Esse pensamento compatível com a
metodologia estrutural-funcional que ele desenvolve, ou seja, considera que o
sistema social é mantido pelas forças institucionais e padrões culturais.

Utilizando-se de conceitos como cultura, indústria cultural, Estado, legitimação, razão,


pós-modernidade, autoridade, crise, transformação, os estudiosos da Teoria Crítica
empregam a metodologia dialética que se vale da razão para resgatar o passado e
compreender as limitações do presente. Nesse caso, toda mudança social é
acompanhada de um saber histórico, concebido como lógica da contradição social.

Conhecer é desenvolver o espírito crítico e também a crítica social. O estudo das


Ciências Sociais nos revela os mecanismos de poder que nos fazem acreditar serem
“naturais” muitos fenômenos que caracterizam a sociedade. Por essa razão, Pierre
Bourdieu a rma que o conhecimento exerce um efeito libertador (ARAÚJO, 2013). Por
meio do conhecimento, a sociedade re ete, volta a olhar sobre si mesma, e seus
agentes sociais descobrem quem realmente são e o que fazem. Bourdieu embasa seu
pensamento na ideia da reprodução social, como as transformações culturais que
acontecem na educação e na sociedade de massa.

É importante descobrir-se como sujeito portador de uma herança social e perceber


que o indivíduo e sociedade são elementos que se in uenciam mutuamente. Essa é
uma das condições para os cientistas sociais produzirem ciência, o que implica
desenvolverem um conjunto de conceitos capazes de interpretar a realidade e
derivarem esse conhecimento de uma concepção de mudança que lhe é implícita.

Com um corpo organizado de saberes, a Sociologia procura dar entendimento à


condição de “estarmos no mundo”, e não prover certezas absolutas. Desse modo, o
conhecimento sociológico tem um compromisso com o desenrolar das ações
concretas, históricas, pelas quais o ser humano constrói a si e seu mundo social,
político, econômico, cultural (ARAÚJO, 2013).

REFLITA

“Na sala de aula, o professor precisa ser um cidadão e um ser humano


rebelde”.

Florestan Fernandes, um dos mais in uentes sociólogos brasileiros.


Livro

Filme
Web
Cultura e sociedade

AUTORIA
Flávio Donizete Batista
Sumário
Introdução

1 - Os sentidos da palavra cultura

2 - Cultura, Etnocentrismo e Relativismo cultural

3 - Diversidade Cultural

4 - Diversidade cultural na sociedade brasileira

5 - Mudanças culturais na sociedade global

6 - A sociedade do espetáculo: cultura de massa

Considerações Finais

Introdução
Olá, prezado estudante. Olá, prezada estudante.

Nesta unidade será apresentado o conceito de cultura como um conjunto de hábitos,


valores, formas de ver o mundo e comportamentos que variam no tempo e no
espaço, de acordo com a história e as condições existenciais de cada grupo social.
Trataremos sobre a diversidade cultural na sociedade brasileira, e veremos como a
identidade cultural envolve a experiência e a consciência de pertencer a um coletivo.

Todos produzem cultura, e os grupos minoritários produzem culturas próprias,


alternativas ou contra-hegemônicas. Desde que se rmou a sociedade de massas,
nossos hábitos culturais também passaram a ser in uenciados pelos meios de
comunicação de massa.

Que nosso estudo nos ajude a compreender e a valorizar as diferentes manifestações


culturais e tornar consciente a nossa própria identidade cultural.

Um excelente estudo para todos.

Plano de Estudo:
1. Os sentidos da palavra cultura.
2. Cultura, etnocentrismo e relativismo cultural.
3. Diversidade cultural.
4. Diversidade cultural na sociedade brasileira.
5. Mudanças culturais na sociedade.
6. A sociedade do espetáculo: cultura de massa

Objetivos de Aprendizagem:
1. Conceituar cultura e perceber suas variações.
2. Entender a diversidade cultural como sinal de riqueza das sociedades.
3. Promover a prática do respeito diante das muitas diferenças culturais,
superando todo preconceito e discriminação.
Os sentidos da palavra cultura
A palavra cultura vem do latim colere, que signi ca o cultivo da terra, ou seja, a
agricultura. Com o tempo, por força da capacidade metafórica da linguagem
humana, isto é, da capacidade de desprender-se do que é concreto e material para se
referir ao que é imaterial e abstrato, o termo cultura passou a designar aquilo que se
cultiva mentalmente, não mais semeando apenas a terra, mas também o espírito.
Assim, por exemplo, atividades de cunho religioso, como as preces, que se faziam
para obter uma melhor colheita, também passaram a fazer parte da cultura (COSTA,
2016).

Geralmente, quando falamos de cultura, a primeira ideia que nos vem à mente é algo
relacionado ao teatro, à música, à literatura, à pintura, à escultura e a outras áreas das
artes. Mas também são considerados como elementos culturais de grande relevância
as festas tradicionais, as lendas, o folclore e os costumes de um povo. Seu signi cado
abrange ainda os meios de comunicação de massa, como a televisão, o rádio, a mídia
impressa, a internet, o cinema, etc. cultura, portanto, não se resume só às
manifestações artísticas, às tradições e aos hábitos de uma dada coletividade. Na
Sociologia e na Antropologia, o conceito de cultura também está relacionado aos
conhecimentos, às ideias e às crenças de uma sociedade e/ou das diversas
sociedades.

Silvia Araújo (2011) escreve que o termo cultura foi aplicado em português por
bastante tempo como sinônimo de erudição, mas não existe diferença em termos de
importância entre a chamada “alta cultura” e as expressões culturais populares, pois
ambas (cada uma a seu modo) são criadas e cultivadas pela participação efetiva do
ser humano na sociedade. Assim podemos conceber cultura como a totalidade de
conhecimentos, crença e expressão emocional, à qual se somam as regras
estabelecidas, os hábitos, comportamentos e habilidades adquiridas no convívio dos
membros de uma sociedade.

Os nossos gostos não são, por exemplo, determinados antes do nascimento; ao


contrário, resultam das relações que estabelecemos com os outros indivíduos e com o
meio em que vivemos. Eles são construídos culturalmente no conjunto do processo
de interação social, o qual se dá pela comunicação e pela ação recíproca entre os
indivíduos e os grupos sociais. Assim, aprendemos a gostar de rock, de lmes de ação
com os amigos e até de consumir certos tipos de alimentos em vez de outros.

Alguns entendimentos são fundamentais para o estudo da cultura. Araújo (2011)


refere-se a três importantes axiomas desta esfera da vida em sociedade:

A cultura é uma característica do ser humano como ser social.


A cultura é adquirida, um comportamento aprendido, como um
patrimônio social.

Por meio da cultura se estabelece uma parte da relação ser humano-


sociedade-mundo.

A cultura é um nível particular da realidade social muito importante, pois suas


dimensões objetiva e subjetiva não se contrapõem, ao contrário, elas se
complementam e estão relacionadas numa organicidade vital. O fazer, o saber, o
conviver dos seres humanos produzem padrões particulares de estar na sociedade;
produzem cultura. Cultura, portanto, não se aplica a um grupo, ou a este ou àquele
segmento social, mas está em nível global, dada a amplitude do campo da
experiência existencial (ARAÚJO, 2013).
Cultura, Etnocentrismo e
Relativismo cultural
No nal do século XIX, o antropólogo alemão Franz Boas construía uma crítica à ideia
de civilização de teorias evolutivas muito fortes na época, que estabeleciam uma
hierarquia entre os civilizados europeus (e norte-americanos) e as demais populações,
que eram escalonadas entre mais e menos atrasadas (MACHADO, 2014).

Para Boas, as diferentes populações que existem no mundo têm diferentes culturas e
é praticamente impossível estabelecer entre elas qualquer tipo de hierarquia, uma
vez que cada povo tem sua história particular, preenchidas por interesses tão
diferentes, que qualquer comparação só seria possível se fosse utilizada uma medida
de análise, que seria sempre arbitrária. Ou seja, a comparação para estabelecer uma
hierarquia sempre deveria adotar algum critério, tomado de alguma população, e
nesse processo a própria comparação seria injusta.

CONCEITUANDO

Igor Machado (2014) lembra que assim, Boas inaugurava o que mais
tarde cou conhecido como relativismo cultural: uma tomada de
posição perante a diferença cultural, segundo a qual cada cultura deve
ser avaliada apenas em seus próprios termos. Portanto, é uma forma de
encarar a diversidade sem impor valores e normas alheios. Podemos
considerar o relativismo uma inversão do evolucionismo: se este escalona
as diferenças a partir de valores especí cos das sociedades ocidentais, o
relativismo evita qualquer tipo de escala, analisando as diferenças
segundo os termos da própria sociedade da qual fazem parte.

Tendência inversa ao relativismo cultural é o etnocentrismo, quando se julga outra


cultura segundo os próprios parâmetros culturais. Por exemplo, considerar uma
população indígena atrasada porque lhe faltam determinadas tecnologias é
etnocentrismo. Se adotarmos outros critérios, esse “atraso” pode ser questionado.
Levando em conta a capacidade de se manter estável ao longo do tempo (o que
chamamos de sustentabilidade), as sociedades que nos pareciam primitivas ganham
um estatuto muito mais “civilizado”, já que o nosso modelos de vida, baseado no
consumo intenso, não é sustentável a longo prazo (MACHADO, 2014).

O etnocentrismo é o mecanismo principal das classi cações evolucionistas, enquanto


o relativismo cultural é o motor de um pensamento não preconceituoso e
preocupado em romper com as classi cações hierárquicas. O conceito antropológico
de cultura não pode existir sem o relativismo cultural e a crítica ao etnocentrismo.

As Ciências Sociais, em especial a Antropologia, ao ampliar nosso conhecimento


acerca de outras culturas e suas expressões, nos ajudam a relativizar nossa visão de
mundo. Em outras palavras, fazem re etir sobre as diferenças entre as diversas
culturas e aprimoram a perspectiva por meio da qual percebemos e interpretamos a
própria cultura. Esse processo também nos ensina que muitos comportamentos e
visões de mundo que nos parecem “naturais” ou “biológicos” na verdade são produtos
da cultura, já que variam em diferentes grupos e sociedades.

Machado (2014) escreve que o reconhecimento da existência do outro, de culturas de


diferentes grupos, povos e sociedades (a alteridade), implica a experiência do contato
com outras culturas, a aceitação das diferenças. Essa é uma forma de desvendar
alguns aspectos da nossa cultura que antes passavam despercebidos.
Diversidade Cultural
A diversidade cultural diz respeito às distintas maneiras segundo as quais sociedades
e grupos sociais se organizam e se relacionam entre si e com a natureza. Vivências
em outras sociedades, leituras variadas, viagens, lmes retratando diferentes
costumes podem constituir em instrumentos que nos permitem re etir sobre o
quanto somos diferentes ou iguais em relação a outros povos e culturas. Constatada a
coexistência e a convivência de diferentes culturas, cabe às Ciências Sociais não
apenas estudá-las e compará-las de maneira a evidenciar as diferenças nos modos de
vida, mas favorecer a re exão sobre a própria sociedade, seus valores e costumes
(ARAÚJO, 2013).

Tantas são as culturas quantos são os povos, os grupos sociais e as etnias existentes.
Para além da diversidade de culturas, as relações entre as diferentes culturas são
marcadas pela desigualdade. Os interesses e as visões de mundo são distintos,
gerando tensões no âmbito das sociedades e certa hierarquização entre os povos e
nações decorrentes de disputas de fundo político e econômico. Essa diferenciação
social está explicitada, muitas vezes, na busca por emprego, nos diferentes locais de
moradia, na necessidade de povos se deslocarem e/ou se abrigarem em
acampamentos. Esses são apenas exemplos de con itos de interesses que podem
implicar a luta por espaço físico e cultural com os quais os grupos sociais se
identi cam culturalmente.

Em decorrência de processos históricos de dominação e migração, entre outros,


ocorrem também processos de interação social que implicam difusão e
recon guração da cultura, traços ou manifestações culturais especí cos. É como se
sociedades distintas convivessem no interior de um mesmo grande grupo social.

Araújo (2013) lembra que a interação social gera novas formas de identidade cultural.
A consciência de pertencer a determinado grupo social - seja por caracteres comuns
de gênero ou de origem étnica, seja por interesses especí cos, pro ssão, atividades
realizadas, crenças e costumes semelhantes - aproxima os indivíduos em
determinada sociedade, levando à formação de agrupamentos de diversos tamanhos.
Nesse sentido, a identidade cultural é aquela marca característica de um grupo social
que partilha um ideal, valores, costumes e comportamentos formados ao longo da
sua história.
É a partir de nossa identidade
cultural que construímos a ideia de
“eu”, “nós” e “outros” . A forma como
o fazemos muitas vezes constrói
fronteiras sociais ligadas à classe
socioeconômica, à raça, ao gênero,
ou mesmo a outros fatores como o
bairro onde moramos, os programas
de TV de que gostamos, ou tipo de
roupa que preferimos, etc. Por meio
destes e de muitos outros elementos
combinados, identi camos
“semelhantes” e “outros” nas pessoas
com quem compartilhamos a vida
social. Algumas dessas fronteiras
sociais, aliadas a tendências
etnocêntricas que reproduzimos até
hoje - embora tenham sido mais
populares antes do século XX -,
formavam as chamadas “teorias”
sociais racistas.
@ freepik

No decorrer do colonialismo do século XIX, emergiram diversas “teorias” racistas que


tomaram a forma de “teorias sociais”, uma vez que os países europeus precisavam do
aval da ciência para justi car suas ações imperialistas na África e na Ásia, bem como
as ações pregressas, durante a colonização das Américas, quando os europeus
subjugaram indígenas e negros, forçando-os ao trabalho escravo e na lavoura. Nestes
casos, as teorias sociais desobrigavam os grupos dominantes europeus de tratarem
como seres humanos os indígenas e negros escravizados, uma vez que não eram
considerados “semelhantes”, e sim “inferiores”. Essas teorias hoje são totalmente
rechaçadas e recusadas pelas Ciências Sociais, pois não têm validade cientí ca
alguma; declaravam-se teorias, mas sempre foram ideologias (ARAÚJO, 2013).
Diversidade cultural na sociedade
brasileira
O Brasil é uma nação pluriétnica e multicultural, composta por diversas formas de
organização social de diferentes grupos. Podemos observar essa diversidade e suas
variações, por exemplo, entre os proprietários de terras, os dirigentes e os
representantes políticos, os moradores das favelas nas grandes cidades, a população
jovem que cursa o Ensino Médio em escolas públicas. Neste país com indivíduos tão
diferentes entre si - pela cor da pele, pela classe social a que se integram, pela região
onde moram, pela geração a que pertencem, etc. - existem um racismo difuso e uma
discriminação velada, porém efetivos. Esses sentimentos perpassam as relações
sociais, seja no trabalho, seja na escola, e se expressam na intolerância e na não
aceitação da diferença, seja ela de cor de pele, de comportamento, de costumes e de
aparência (ARAÚJO, 2013).

Desconsiderar a diversidade cultural, muitas vezes, nos impede de perceber que a


desigualdade social e a discriminação restringem o acesso aos bens materiais e
culturais por amplos setores da população. Desencadeadas pelo preconceito e pela
concentração de renda (e de poder), novas formas de exclusão social derivam hoje do
desemprego, do trabalho precário, das exigências da tecnologia informacional,
próprias do moderno processo de produção capitalista.

Ainda que indivíduos e famílias pertencentes a grupos denominados minorias


estejam conseguindo galgar posições valorizadas social e economicamente pela
conquista de um emprego formal ou de melhores condições de vida, superando
preconceitos, barreiras econômicas e culturais, os dados estatísticos brasileiros
revelam a persistência da desigualdade social racial. Escreve Araújo:

O racismo é uma construção histórica que resiste no campo simbólico,


ou seja, nas ideias que as pessoas têm sobre “ser negro” e “ser branco”.
Os estudos sobre esse tema sugerem que o combate ao preconceito
precisa ser enfrentado pelo Estado por meio da educação e de políticas
a rmativas, com o objetivo de desenvolver a cidadania plena, isto é, com
todos os direitos sociais e políticos assegurados (ARAÚJO, 2013, p. 135).

Há, no mundo atual, intenso imbricamento cultural entre as realidades locais e a


global. O diverso e o diferente se ampliam para além das questões étnico-raciais. As
demais culturas estrangeiras, especialmente as europeias e a estadunidense,
in uenciam na constante transformação da cultura brasileira, seja pela presença do
imigrante em nossa história, seja pelo desenvolvimento do mercado de consumo -
moda, tecnologia, artes, conhecimentos variados - e dos meios de comunicação de
massa.
Mudanças culturais na sociedade
global
Como produtores e consumidores de cultura, os grupos socioculturais se diferenciam
e podem reproduzir simbolicamente as relações de poder vigentes, e até contestar
determinadas formas culturais no interior de sua comunidade e da sociedade. De que
modo distinguimos uma comunidade de uma sociedade, ainda mais quando as
relações entre as realidades locais e a global tendem a ser mais intensas e
interin uentes?

O desenvolvimento da sociedade moderna mostrou que as relações sociais tendem a


mesclar o que é comum (partilhado em pequenos grupos) com o que se apresenta
na extensão da sociedade. Comunidade também pode se referir, genérica e
idealmente, a um modelo de vida coletiva, não necessariamente delimitado no
espaço geográ co (caso das comunidades que não estão próximas, mas se apoiam),
que apresentam interesses comuns e ligações afetivas (ARAÚJO, 2013).

O processo de globalização, no que se refere às diversas culturas, apresenta uma


ambivalência: por um lado, pode representar algum risco para as identidades
culturais de variados grupos sociais locais quando em contato ou sob o domínio de
uma outra cultura (certa tendência de homogeneização); por outro lado, a
diversidade tende a se rea rmar também, seja pela via da resistência, seja pelo uso de
suas tecnologias (como a internet) para a difusão de suas manifestações.

De fato, com a globalização emergiu o debate sobre “a cultura global”. Alguns autores
consideram que a globalização levaria à homogeneização cultural. No entanto, as
relações em sociedade são mais complexas. Não podemos a rmar que há uma
cultura global de modo de nitivo nem que a globalização padronizou os povos
culturalmente, já que estes se apropriam da “cultura global” de várias formas. Sobre a
tentativa de homogeneização da cultura e os movimentos de resistência, Araújo
escreveu:

Na contramão das mudanças acarretadas pela globalização, alguns


grupos sociais tendem a criar resistências à homogeneização da cultura.
A questão da identidade desponta como um elemento-chave nesse
processo de a rmação. As minorias sociais alimentam a ideia de
identidade para buscar reconhecimento e inserção social quando
grandes transformações as atingem e menosprezam seus modos de
vida ou suas “comunidades” (ARAÚJO, 2013, p. 139).

As minorias sociais não são de nidas pela questão numérica, mas pelas di culdades
impostas a esses grupos no acesso às instâncias de poder e pela situação
discriminatória e excludente em que se encontram. Por exemplo, o número de
indivíduos que se consideram negros e pardos no Brasil, segundo o IBGE,
corresponde proporcionalmente à população que se diz branca. Entretanto, se
comparados aos brancos, apresentam reduzida presença em funções socialmente
mais valorizadas e com melhores salários. Colocadas em situações como essas,
sobretudo por fatores históricos, tais minorias enfrentam di culdades em manter ou
melhorar sua condição socioeconômica e em expressar suas tradições culturais.

CONCEITUANDO

Muitas manifestações culturais alternativas são consideradas contra-


hegemônicas, por serem reações à cultura dominante e à sua visão do
mundo. Hegemonia cultural é o conceito utilizado pelo cientista político
italiano Antonio Gramsci para designar a dominação de uma classe
social sobre a outra fundada na ideologia e, portanto, no convencimento
(e não na coerção) (ARAÚJO, 2013).
A sociedade do espetáculo:
cultura de massa
O desenvolvimento dos meios de comunicação, como a fotogra a, rádio, o cinema e a
televisão, deu um impulso enorme à indústria cultural, que acabou por ganhar cada
vez mais espaço na sociedade moderna, abalando a dominância da alta cultura na
sociedade. Além de se tornar um dos mais lucrativos setores da economia moderna,
principalmente no século XX, a indústria cultural se mostrou capaz de produzir
informação e reunir grupos de pessoas em torno de seus veículos de comunicação. E,
à medida que essa produção foi ganhando espaço, melhores tecnologias de difusão
de imagens, sons e textos desenvolveram-se, minimizando a experiência dos
indivíduos com a realidade e o contato com o outro. Os veículos de comunicação
passaram cada vez mais a dominar a produção cultural da sociedade e formam a
principal referência para o público em geral (COSTA, 2016).

Entretanto, apesar de seu sucesso, muitos autores viram com descon ança o poder
que os meios de comunicação e a indústria cultural conquistaram entre as pessoas e
passaram a questionar sua legitimidade. Cientistas sociais alertaram para os
malefícios de se deixar guiar pelo poder manipulador da cultura de massa. Costa
escreve que um deles, “Guy Débord, em suas críticas à indústria cultural, chamou a
sociedade contemporânea, na qual se dá sua máxima expansão, de sociedade do
espetáculo” (2016, p.179).
Hoje, o rádio, a televisão, o cinema e,
mais recentemente, a internet,
absorvem a atenção de todos, e
levam à decadência as famílias
circenses tradicionais, superando um
tempo em que o circo foi relevante
diante do pouco entretenimento nas
cidades mais distantes da capital e
representava a grande possibilidade
de consumo cultural.

Esses meios de comunicação e


outros mais são representativos da
indústria cultural, um termo
empregado pela primeira vez em
1947, pelos sociólogos alemães Max
Horkheimer e Theodor Adorno, para
dizer que a produção artística e
cultural veiculada pelos meios de
comunicação de massa insu a o
consumo por ser transformada em
mercadoria. Os produtos culturais -
publicações impressas, DVDs e
lmes, obras de arte, composições
culturais, etc. - se assemelham assim,
de certa forma, aos produtos
industriais.
@freepik

A sociedade contemporânea institui uma cultura do lazer padronizada pelos meios


de comunicação de massa. Essa aproximação da cultura com o produto industrial
estimula o público a esperar por próximos lançamentos - de músicas, lmes,
equipamentos de som e imagem - que se tornam bens rapidamente obsoletos. Logo,
a cultura tem, na atualidade, sua face mais visível na forma de bens e serviços e,
muitas vezes, nem percebemos sua dimensão de uma produção acumulada,
transmitida e herdada socialmente (ARAÚJO, 2013).

Araújo (2013) diz ser a cultura fruto do empenho acumulado de diversas gerações e
de vários grupos sociais que dela participam de diferentes formas - produzem,
compartilham e reproduzem cultura, em seus aspectos materiais e imateriais. A
cultura é um trabalho de muitas gerações.
REFLITA

Assim falou Boas: “Como ser pensante, o resultado mais importante


desta viagem, para mim, está no fortalecimento do meu ponto de vista
de que a ideia de um indivíduo ‘culturado’ (culto) é simplesmente
relativa: o valor de um pessoa deve ser atribuído pela ‘cultura do coração’.
Esta qualidade está presente ou ausente entre os esquimós tanto quanto
entre nós”.

(MACHADO, Igor José de Renó. Sociologia Hoje. São Paulo: Ática, p. 49,
2014.).
Livro

Filme
Web
Política e poder

AUTORIA
Flávio Donizete Batista
Sumário
Introdução

1 - Política e poder

2 - Estado e sociedade

3 - Estado e governos

4 - Perspectivas teóricas acerca da política

5 - Poder e autoridade

Considerações Finais

Introdução
Prezados estudantes:

Nesta unidade estudaremos um campo especí co da sociedade humana: o das


relações de poder, por meio das quais somos capazes de interferir nos
comportamentos e nos sentimentos dos membros de grupos, sejam eles os
integrantes da família, os amigos ou a sociedade como um todo.

Essa sobre discussão sobre política e poder teve início há muitos séculos e continua
ainda hoje despertando em nós o interesse para conhecer como se dão essas
relações e como toda a sociedade é in uenciada pelos seus desdobramentos.

Vamos ao estudo. Um bom trabalho para todos. Aproveitem.

Plano de Estudo:
1. Política e poder
2. A liderança nos grupos humanos
3. O espaço público como uma construção grega
4. Sobre a liderança e o poder
5. Estado e sociedade
6. Concepções de Estado e sociedade civil moderna
7. O que é o Estado?
8. Estado e Governos
9. Partidos políticos e o quadro partidário no Brasil
10. Perspectivas teóricas acerca da política: funcionalista e do con ito
11. Poder e autoridade

Objetivos de Aprendizagem:
1. Conhecer as relações de poder existentes na sociedade.
2. Entender o que e o Estado moderno.
3. Estabelecer distinções entre Estado e Governo.
4. Compreender a importância do sistema democrático para nosso sistema
político.
Política e poder

A liderança nos grupos humanos


É possível que o poder que alguns seres humanos passaram a exercer sobre os
membros de seu grupo tenha obedecido a critérios existentes entre quase todos os
grupos de mamíferos, especialmente os primatas, nos quais o poder é exercido pelos
mais velhos e mais fortes. Mas, à medida que o ser humano começou a diferenciar-se
e a substituir o comportamento “natural” por normas ditadas pela cultura, outros
aspectos passaram a ser importantes. Entre eles, destacamos o exercício das funções
religiosas, uma vez que a crença na capacidade de que algumas pessoas pudessem
estabelecer uma relação com as divindades e fazê-las intervir na realidade em
momentos difíceis passou a ser importante (COSTA, 2016).

Assim como a religião, o desenvolvimento da cultura passou a dar voz de comando a


certos membros de um grupo. Os guerreiros mais hábeis, capazes de defender seu
grupo de animais ou de inimigos, também devem ter adquirido algum poder de
liderança.

À medida que os grupos humanos cresceram, espalharam-se pelos continentes,


desenvolveram estilos de vida peculiares, criaram novos idiomas e formas de viver -, é
presumível que a coesão entre os membros tenha se tornado maior que as lideranças
tenham passado a ser necessárias, perpetuando-se na defesa e da manutenção
desses grupos.

O crescente abandono da vida nômade e o avanço da agricultura também trouxeram


novas necessidades de defesa de territórios e de organização do trabalho. Isso levou à
divisão de tarefas, que foi facilitada com a instituição da vida coletiva e civil e a
incumbência de estabelecer regras de liderança e poder na vida comum.

A importância crescente das estruturas de poder, organizadas para a defesa dos


territórios e de suas populações, além de gerir e desenvolver a economia, fez com elas
se tornassem um tema importante para os lósofos sociais, antecessores dos
sociólogos. Desde a Antiguidade, na Grécia, os lósofos buscaram entender como
certas pessoas e grupos são capazes de fazer com que os outros se comportem de
acordo com o desejo deles e aparentemente abandonem seus próprios desejos e
interesses.

O espaço público como uma construção


grega
Os gregos, ao dedicarem esforços para entender como deveria ser organizada a vida
civil das suas cidades-estados, chamadas de pólis, acabaram por criar o termo
politiké, campo da ação humana que se destinava a bem administrar, com justiça e
legitimidade, as regras da vida pública (COSTA, 2016).
Em cada uma de suas cidades-estados, os gregos tinham suas próprias divindades,
leis e instituições. Essa independência assegurava a não existência de um poder
central grego, e a autonomia das cidades representava, para seus habitantes, o
espaço da identidade civil.

Diferente de outros povos antigos, os gregos desenvolveram um estilo de vida


participativo e exível. A cidadania, condição de que gozavam os homens livres, era
respeitada e apreciada, e a participação política ocupava espaço considerável na vida
civil da Grécia, dando origem à democracia, que signi cava, literalmente, poder do
povo.

A democracia grega, entretanto, não tinha ainda o signi cado que o regime veio a ter
na modernidade. Era um sistema no qual as decisões políticas eram tomadas pelo
voto direto dos cidadãos, conjunto formado por proprietários de terras, artí ces,
militares e comerciantes enriquecidos. Escravos, estrangeiros, camponeses e
mulheres estavam excluídos da cidadania. Por esse conjunto corresponder, na
realidade, a um pequeno número de pessoas (estima-se em cerca de 10% da
população), a votação podia ser direta - cada cidadão expunha oralmente suas ideias
e levantava a mão para votar nas assembleias populares.

SAIBA MAIS

A Ágora, parte central da cidade, era o centro da vida grega, o coração da


cidade, com a qual os cidadãos se identi cavam intimamente por
representar um espaço de deliberação política.

O pensador alemão Jürgen Habermas (COSTA, 2016) considera que o espaço público,
com o signi cado atual de espaço coletivo e compartilhado por todos, nasceu com a
democracia grega. Tal espaço distingue-se do espaço doméstico, privado e íntimo,
onde se dá o trabalho e a reprodução da vida. No espaço público, na Ágora, se dá a
práxis ou ação sobre a vida coletiva, os acordos, a luta e a guerra.

Sobre a liderança e o poder


Iniciamos dizendo que o estabelecimento do homo sapiens implicou dois aspectos
fundamentais: em primeiro lugar, o estabelecimento da vida coletiva e da
sociabilidade, obrigando os nossos antepassados a conviver uns com os outros de
forma próxima e estreita (COSTA, 2016).
Em segundo lugar, o abandono do comportamento guiado apenas por instintos em
favor de um tipo de ação baseado na cultura - espaço de articulação tanto das
relações da vida coletiva como das formas de representação simbólica, que organiza e
fundamenta essa sociabilidade. Nesse sentido, o poder, como a capacidade de
in uenciar o comportamento e as formas de interpretação simbólica (valores, ideias e
sentimentos) dos membros de um grupo, deixou de se manifestar apenas como
obediência ao princípio da força. Entre os humanos, o poder adquiriu formas mais
so sticadas de expressão e manifestação, criando espaços autônomos de
relacionamento e vida coletiva: as instituições especialmente destinadas a
estabelecer, legitimar e distribuir o poder.

Os gregos criaram formas novas de pensar, viver e instituir as relações de poder, ao


valorizar o espaço público como diferente do espaço da propriedade privada, como
uma instância da sociedade a ser compartilhada, diferente e oposta à vida familiar.
Nela, deveriam se dar, segundo determinadas regras, os embates e a disputa por
supremacia e dominação. Esse espaço adquiriu crescente importância e se tornou
independente da religião e da economia, embora continuasse a estabelecer relações
como esses campos da vida social. Assim, criava-se a política como área do
conhecimento e como forma de atuação na sociedade. Os membros que
compartilhavam essa vida pública e civil, em vista dessa nova condição das relações
sociais, foram considerados cidadãos e conclamados a disputar a possibilidades de
intervir nos acontecimentos e nas decisões.

Essa novidade não parou de crescer e constituiu uma das instâncias signi cativas das
sociedades moderna e contemporânea que, sucessivamente, revisitam o passado em
busca de transparência, legitimidade e justiça social (COSTA, 2016).
Estado e sociedade
Desde a Idade Moderna, o exercício do poder político legítimo é considerado em
nossa sociedade uma atividade própria do Estado. Um dos primeiros estudiosos a
fornecer as bases para essa concepção foi o historiador e diplomata italiano Nicolau
Maquiavel (1469-1527). Dando conselhos ao governante para que fosse temido pelos
governados, Maquiavel também adverte que ele não pode ser odiado. Vê-se então,
desde essa época, a ideia de que, para aceitar a dominação, a sociedade precisa
considerá-la legítima (ARAÚJO, 2013).

Hoje, pode-se a rmar que o Estado tem como função assegurar, por meio de políticas
públicas, certas condições de vida que a sociedade considera necessárias à
população. Não há, no entanto, unanimidade quanto ao papel dessa instituição social,
tampouco quanto às interpretações teóricas a respeito dele. É fato que esse é um
tema controverso.

Concepções de Estado e sociedade civil na


Idade Moderna
A primeira de nição de sociedade civil foi elaborada pelo lósofo inglês Thomas
Hobbes (1588-1679). Ele acreditava que, em seu estado natural, os homens lutavam
uns contra os outros pelo poder e por riqueza. Por isso, os indivíduos abrem mão da
liberdade e concebem regras de convivência a m de garantir condições mínimas de
estabilidade. Forma-se, assim, a sociedade civil - que, no pensamento de Hobbes, é
sinônimo de Estado.
Para o lósofo inglês John Locke
(1632-1704), a sociedade civil é mais
um aprimoramento do estado
natural do que uma solução para
ele . O homem, livre e igual por
natureza, precisa de um poder
imparcial e legítimo para mediar
con itos, garantindo os direitos que
já tinha no estado natural: direitos à
vida, à liberdade, à saúde e à
propriedade. Além da ideia de
igualdade no nascimento, o respeito
à propriedade como um direito
natural do homem está em
conformidade com os fundamentos
liberais da burguesia em ascensão na
Inglaterra do século XVII.
@wikimedia

Conforme a burguesia e o Estado moderno se consolidavam na Europa, a noção de


sociedade civil foi se distanciando da sociedade política. Durante a Idade Média, tanto
o poder como a propriedade eram hereditários. Na sociedade burguesa moderna,
esses dois aspectos se desvinculam: embora, na sociedade civil, a propriedade
continue sendo transmitida de pai para lho, o poder político passa a obedecer a
normas e leis próprias. Garante-se a democracia no âmbito da sociedade política,
desde que esta não inter ra na propriedade e na livre iniciativa econômica (ARAÚJO,
2013).

Se Locke considerava a propriedade privada um direito natural, para o lósofo suíço


Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) ele era justamente a origem da desigualdade e da
corrupção moral. A sociedade civil, instaurada com a invenção da propriedade, seria
uma degeneração do estado de natureza, no qual os seres humanos eram bons, livres
e felizes. Para Rousseau, os indivíduos só recuperariam as qualidades perdidas
quando a sociedade civil se transformasse em sociedade política, na qual a vontade
geral do povo seria soberana - ou seja, na qual as regras e leis a serem seguidas
emanassem do próprio povo.

En m, o que é o Estado?
Não há uma visão única sobre a resposta a essa pergunta. Na interpretação do
lósofo alemão Friderich Engels (1820-1895), o Estado é um produto da sociedade e
seu papel é amortecer os con itos sociais, evitar os choques entre as classes e, de
certo modo, assegurar a reprodução do sistema social (ARAÚJO, 2013).
Já o lósofo político grego Nicos Poulantzas (1936-1979) pensa o Estado como uma
relação de forças, uma relação de poder entre as classes sociais e no próprio interior
delas. Para Louis Althusser (1918-1990), lósofo francês, o Estado é composto por
aparelhos ou instituições sociais (como é o caso do exército, da administração, do
sistema judiciário e do aparato da polícia) e tem por função a repressão, ou seja, a
manutenção da ordem social. Esta, por sua vez, é moldada por interesses da classe
dominante, que faz com que o Estado esteja ao seu serviço (ARAÚJO, 2013).

Na concepção do sociólogo Max Weber, o Estado só pode existir quando os seres


humanos se submetem à autoridade de um grupo dominante. Nesse sentido,
quando essa instituição se constitui, estabelece-se uma relação de “dominação do
homem sobre o homem”, um “monopólio da violência legítima”. Em outras palavras,
trata-se da obediência da população a um grupo dominante mediante uma violência
reconhecida e amparada legalmente (ARAÚJO, 2013).
Estado e governos
Ao mesmo tempo em que o Estado se revela necessário na sociedade atual, é
também foco de contradições e problemas de diversas ordens. Na
contemporaneidade, podemos observar, por exemplo, as disputas pelo poder estatal
entre as classes sociais e pelos grupos de diferentes partidos políticos (ARAÚJO, 2013).

Além da centralização da administração da coisa pública, um dos aspectos do


desenvolvimento do Estado moderno é seu vínculo mais característico com a
democracia - um regime político em que o poder é legítimo por se originar do povo e
se apoiar nele. Independentemente da forma e do conteúdo que o Estado possa
assumir historicamente, trata-se de uma instituição social arraigada, distinta do
conceito de governo. Os governos são formados pelos grupos que temporariamente
ocupam o aparelho de Estado para gerir o poder político; eles passam, mas o Estado
permanece.

As mudanças no Estado se relacionam em geral com os grupos que estão no poder e


com seus próprios projetos. Essa é a eterna contradição do Estado: teoricamente
existe para todos, mas muitas vezes serve apenas a alguns grupos econômicos, aos
mercados e às elites. Quando certos governos buscam cooptar o Estado e tendem a
se confundir com ele, resultam prejuízos para a cidadania. Assim o vê a Ciência
Política, a ciência social que estuda os fenômenos de natureza política, o Estado e
suas formas de organização, os processos de tomada de decisões políticas, os
sistemas e regimes políticos, e as instituições sociais destinadas a garantir justiça,
direitos e segurança aos cidadãos (ARAÚJO, 2013).

Os partidos políticos ou certos grupos sociais no poder podem conferir determinadas


características ao Estado. No Estado corporativo, por exemplo, organizam-se
corporações para representar politicamente os diferentes interesses econômicos,
industriais e pro ssionais. Com isso, muitas vezes, os interesses desses grupos sociais
misturam-se com os do aparelho público, como ocorreu no fascismo italiano entre
1922 e 1943. Outro exemplo de apropriação do Estado foi a República brasileira entre
1889 a 1930, chamada por alguns de “República dos coronéis” ou “dos fazendeiros”.
Esses colocavam o Estado a serviço de seus interesses particulares, e não da
coletividade e do povo, como prevê o termo república (em sua origem - res pública,
em latim, signi ca “coisa pública”).

Partidos políticos e o quadro partidário no


Brasil
Os partidos políticos são agrupamentos sociais em que se organizam as diferentes
correntes ideológicas, cada qual com a sua concepção de forma de governo, de
exercício do poder, de participação na política e de solução para os problemas de um
país (ARAÚJO, 2013).
Ainda que suas ideologias e propostas apresentem muitas semelhanças entre si, a
multiplicidade de partidos políticos têm sido uma das características da política
brasileira neste início de século. Em 2013, mais de trinta agremiações políticas de
diferentes tamanhos compunham o quadro partidário, mas apenas as bancadas de
quatro partidos concentravam a metade dos deputados do Congresso: PMDB, PSD,
PSDB e PT.

Os partidos políticos são importantes instrumentos da democracia, pois é por meio


deles que os cidadãos podem participar de um coletivo, discutir propostas, pensar
soluções para problemas sociais, escolher seu representantes para se candidatar nas
eleições de todos os níveis. No século XX, os partidos concentraram as aspirações
políticas dos cidadãos, ao propiciarem condições de participação e de militância
muitas vezes ligada a movimentos sociais.

O papel social dos partidos na formação política vem se alterando pela crise das
ideologias e pela fragmentação das classes sociais, entre outros fatores. Ainda assim,
é difícil imaginar uma democracia sem partidos.
Perspectivas teóricas acerca da
política
Algumas das mais antigas questões formuladas acerca da constituição das
instituições políticas são as que se referem a como o estado-nação se tornou uma
sociedade coesa e como uma nação desenvolve leis que unem sua população, criam
uma sociedade organizada, conferem autoridade ao governante e restringem a
necessidade do uso da força física. Respostas a essas questões têm sido oferecidas
por sociólogos vinculadas a duas perspectivas: à teoria funcionalista e à teoria do
con ito (GIL, 2011).

Perspectiva funcionalista
Para os funcionalistas, segundo Gil (2011), as sociedades se constroem com base num
sistema de valores. As democracias ocidentais, por exemplo, fundamentam-se em
valores como trabalho, realização, oportunidades iguais e liberdade de construir seu
próprio destino. Estes valores, por sua vez, são aprendidos pelas crianças no âmbito de
sua família e das demais instituições sociais e passados para as gerações seguintes.

Nas sociedades em que impera um sistema racional-legal de autoridade, os valores


sociais é que formam suas leis e políticas. Se a população valoriza a realização pessoal,
as leis protegem o direito de buscá-la. Se a população valoriza a liberdade, as leis a
protegem e as políticas encorajam a liberdade. Assim, em nossa sociedade ninguém
pode ser forçado a praticar determinada religião e o casamento é entendido como
uma questão de escolha pessoal. As instituições políticas passam leis e desenvolvem
políticas que re etem os valores da população. Assim, essas instituições têm como
principal função sustentar os valores da sociedade dominante e arbitrar os con itos
quando estes ocorrerem.

Perspectiva do con ito


A perspectiva do con ito, conforme apresentado por Gil (2011), difere radicalmente da
teoria funcionalista. Ela também assume que as sociedades são fundamentadas num
conjunto de valores, mas que são determinados pelas necessidades humanas. Alguns
grupos, no entanto, conseguem dispor de uma quantidade maior de recursos e
utilizam-nos para ampliar seu poder. Assim, como esses grupos contratam pessoas
para trabalhar para eles na esfera econômica, também usam seus recursos para
contratar pessoas para proteger seus interesses na esfera política. O capitalismo não
seria, portanto, um sistema essencialmente democrático, à medida que se
caracterizasse pela ampla concentração de riqueza e de poder. Os detentores do
capital utilizariam sua riqueza para in uenciar líderes políticos e provocar a queda de
indivíduos ou governantes que contrariassem seus interesses.
C. Wright Mills (1968), um sociólogo norte-americano associado à teoria do con ito,
cunhou o termo elite do poder para argumentar que nos Estados Unidos um
pequeno número de pessoas é que toma as decisões nas três mais importantes
organizações que dominam a sociedade norte-americana: governo, grandes
corporações e forças armadas. Assim, sociólogos vinculados a essa perspectiva
questionam o caráter democrático da sociedade norte-americana. Para eles, a
concentração de riqueza e de poder em tão poucas mãos é tão grande que impede a
manifestação dos segmentos médios da população e, por consequência, essa elite
não encontra real oposição (GIL, 2011).
Poder e autoridade
O poder é o componente fundamental do sistema político. Segundo Gil (2011), para
Weber o poder signi ca toda oportunidade de impor sua própria vontade, no interior
de uma relação social, até mesmo contra resistências. Assim, o poder pode ser
exercido tanto no âmbito de grandes organizações como no de pequenos grupos ou
mesmo numa associação íntima. O poder, por sua vez, pode manifestar-se por
in uência, coerção ou autoridade.

CONCEITUANDO

In uência é o poder de persuadir. Esta modalidade de poder pode


derivar de fatores como atração pessoal, prestígio ou riqueza. A coerção
ocorre quando o poder decorre de uma força superior que é imposta aos
outros. Todos os governos se valem da coerção, embora muitos
reconheçam que só deve ser utilizada como último recurso. A
autoridade, por m, refere-se ao poder que é institucionalizado e
considerado apropriado e aceitável por aqueles a quem cabe obedecer.
Trata-se, portanto, do poder legítimo. Pessoas conferem ao governante
ou ao administrador a autoridade para governar ou dirigir e obedecem-
no de bom grado, sem que se torna necessário o uso da força (GIL, 2011).

Vemos que o poder não pode ser compreendido como uma via de mão única. Ele
depende da legitimidade da dominação; ou seja, é preciso que esta seja aceita pelos
dominados para que se mantenha (ARAÚJO, 2013).

Em uma visão mais alargada, o lósofo francês Michel Foucault (1926-1984) destaca
que o poder se encontra em todas as relações sociais, e não apenas no Estado. Assim,
o poder está presente na microrrelações: na família (onde existe a autoridade do pai e
da mãe), na sala de aula (na relação entre professor e aluno), nas instituições
religiosas (com a autoridade do padre, do pastor ou de outros líderes em relação aos
seus éis), nas relações de gênero (entre homens e mulheres), etc. (ARAÚJO, 2013).

Podemos identi car relações de poder e exercício da política em todas as esferas de


nossa vida. O poder está difuso, heterogêneo, na tensão existente nas relações sociais.
Poder é uma prática social, no sentido de que é algo que se exerce e se efetua, e há
sempre múltiplas resistências dentro da própria rede de poder. Para Foucault, é
possível veri car esses poderes mínimos em qualquer situação concreta.
SAIBA MAIS

Zygmunt Bauman (1925-2017) escreve:

“Esta ideia [de cidadão como membro de um corpo político e titular do


decidir, com outros membros, sobre direitos e deveres, prerrogativas e
obrigações] foi lançada na fundação de uma democracia moderna e da
visão de república - res publica - como um corpo político cujos membros
deliberam coletivamente sobre como moldar as condições de sua
coabitação, cooperação e solidariedade.

Tal modelo de democracia moderna nunca foi completamente


implementado. [...] Enquanto poderes constituídos promovem o governo
de poucos, a democracia é uma constante alegação em nome de
todos[...]

(BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e


histórias vividas. Rio de Janeiro: Zahar, 2008, p.74).

REFLITA

Para pensar: Quais práticas de nossa sociedade levam a identi car o


caráter político a rmativo da democracia? Em que aspectos a realidade
atual do país se distancia dessa ideia inicial?
Livro

Filme
Web
Conclusão

Chegamos ao nal de nosso estudo da disciplina de Sociologia Geral. Espero que


tenha sido muito proveitoso para que você tenha conhecido um pouco mais da
sociedade em que vivemos.

Fizemos um breve percurso histórico sobre o surgimento da Sociologia,


apresentando os principais pontos das teorias de seus clássicos fundadores, cando
claro que trata-se de uma ciência em franco desenvolvimento.

A cultura também foi um importante conteúdo, que nos ajudou a perceber a


necessidade de valorizarmos a nossa e as culturas dos outros grupos e povos. Só
assim aproveitaremos de toda a sua riqueza e diversidade.

Também discutimos sobre a política e poder, relações inseparáveis da vida em


sociedade. Destacamos a importância da democracia para a constituição de um
estado que, de fato, possa cumprir seu papel de garantir a vida e a vida com direitos
para todos.

Que esses pontos estudados e tantos outros que, por questões óbvias de espaço e
tempo tiveram que car de fora desse estudo, possam ser buscados oportunamente
para a continuidade do estudo da Sociologia. Isso porque não podemos nos
esquecer que sempre há muito ainda para aprender.

Grande abraço a todos. Um muito obrigado.

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