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PROTECÇÃO DE DIREITOS DE

PERSONALIDADE DO TRABALHADOR NA
EXECUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

INTRODUÇÃO
O trabalho não é só o processo graças ao qual o homem saiu do reino animal,
mas também aquele pelo qual os homens se ligam objectivamente entre si, no seio de
grupos, de sociedade determinada. A actividade produtiva do homem, a sua luta contra a
natureza, efectua-se sempre no quadro de tais relações sociais. O trabalho é a base
dessas relações. O trabalho é, pois, a base sobre a qual assenta a sociedade.

O trabalho é também um direito e um dever fundamental, no-lo diz o art. 76.º da


Constituição da República de Angola, enquadrado nos direitos económicos, sociais e
culturais, ou direitos da segunda geração, cabendo ao Estado assegurar o direito ao
trabalho, através da implementação de políticas de emprego, da promoção da igualdade
de oportunidade na escolha da profissão, formação académica e desenvolvimento
científico.

A Constituição da República de Angola, doravante CRA, estabelece no Capítulo


III do Título II, os “Direitos e Deveres Económicos, Sociais e Culturais”, onde
encontramos o art.º 76.º (Direito ao trabalho), determinando que «1. O trabalho é um
direito e um dever de todos. 2. Todo o trabalhador tem direito à formação profissional,
justa remuneração, descanso, férias, protecção, higiene e segurança no trabalho, nos
termos da lei».

A par do art.º 76.º, os demais direitos, liberdades e garantias enunciados no


Capítulo II assumem um carácter essencialmente colectivo ou organizativo, respeitando
às estruturas de representação colectiva dos trabalhadores (comissões de trabalhadores,
associações sindicais) e ao conflito colectivo de trabalho (direito à greve e proibição do
lock-out) – arts. 50.º e 57.º., da CRA.

A relação jurídico-laboral representa para o trabalhador também uma


compressão dos seus direitos enquanto indivíduo. De um lado, o trabalhador, ao
disponibilizar a sua força de trabalho, se obriga a uma prestação intuitu personae, do
outro lado, o contrato de trabalho se caracteriza fundamentalmente pela existência de
uma subordinação jurídica, que se traduz na situação de sujeição, em que se encontra o
trabalhador, de ver concretizado, por simples vontade do empregador, numa ou noutra
direcção, o dever de prestar em que está incurso. É uma situação, completamente
natural, na medida em que, conforme dita o art. 37.º da Lei Geral do Trabalho,
doravante LGT, compete ao empregador estabelecer os termos em que o trabalho deve
ser prestado, o que faz, nomeadamente, definindo o horário de trabalho a observar pelo
trabalhador e o local onde o trabalho se realiza, controlando o modo de prestação,
emitindo ordens e ditando a disciplina da empresa.

É mister lembrar que, na relação jurídico-laboral, o trabalhador é, na grande


maioria dos casos, o contraente mais fraco, na medida em que o rendimento do trabalho
constitui, também em regra, a sua única fonte de subsistência. Em muitos casos, com o
medo de perder esse meio de sobrevivência, o trabalhador está – mais do que o comum
dos contraentes – psicologicamente condicionado na reivindicação dos seus direitos,
liberdades e garantias.

O reconhecimento da existência desta compressão de direitos, aliado à ideia de


que o trabalhador não perde o direito à individualidade, ou seja, de que não deixa de ser
pessoa, só por estar integrado na empresa, aumentou o enfoque sobre os direitos
fundamentais do trabalhador no âmbito da relação de trabalho.

Nesta senda, no ordenamento jus laboral português, o Código do Trabalho,


aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, dedicou, pela primeira vez, um
conjunto de normas aos direitos de personalidade do trabalhador. Com as alterações
operadas no Código do Trabalho pela Lei n. º 7/2009, de 12 de Fevereiro, tais direitos
passaram a constar essencialmente dos artigos 14.º a 22.º, que estatuem respectivamente
sobre “Liberdade de expressão e de opinião”, “Integridade física e moral”, “Reserva da
intimidade da vida privada”, “Protecção de dados pessoais”, “Dados biométricos”,
“Testes e exames médicos”, “Meios de vigilância a distância”, “Utilização de meios de
vigilância a distância” e “Confidencialidade de mensagens e de acesso a informação”.

Contrariamente, no ordenamento jus laboral angolano, a Lei n.º 2/00, de 11 de


Fevereiro, Lei Geral do Trabalho, posteriormente revogada pela Lei n.º 7/15, de 15 de
Junho, Lei Geral do Trabalho não fazem referência aos direitos de personalidade do
trabalhador, conforme faz o Código do Trabalho português.

Pese embora os direitos de personalidade dos trabalhadores não encontrem


protecção na LGT, efectivamente, tal tutela resultava, desde logo, da Constituição, por
via do reconhecimento da eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre os
particulares, nos termos dos artigos 26.º e 27.º, da CRA.

Diante desta omissão clamorosa do legislador ordinário angolano, em torno da


consagração dos direitos de personalidade dos trabalhadores na LGT, eclodiu-nos o
desejo de proceder um estudo exploratório e comparativo do ordenamento jurídico-
laboral português e angolano em torno da consagração e protecção dos direitos de
personalidade dos trabalhadores em ambos os ordenamentos jurídicos laborais.

A pertinência desta temática parte da constatação de que os direitos


fundamentais e de personalidade do trabalhador sofrem uma ameaça real por força do
contrato de trabalho e, como tal, merecem especial tutela, embora não se olvide que tais
direitos concorrem com outros igualmente considerados merecedores de protecção,
designadamente aqueles de que é titular a entidade empregadora, na medida em que é a
própria Constituição que consagra, além do mais, o direito à iniciativa económica
privada (art.º 14.º) e o direito à liberdade de iniciativa e de organização empresarial (art.
38.º, n.º 2).

Situações há em que, no âmbito da execução do contrato de trabalho, o


trabalhador vê-se forçado ou obrigado a não exprimir a sua opinião em torno de
assuntos extra laborais, vê a sua integridade física e moral a ser agredida, vê a sua
reserva da intimidade da vida privada invadida, vê os seus dados pessoais e biométricos
a serem usados para fins diversos aos laborais, é exigido a realizar testes e exames
médicos, para averiguar se é portador ou não de determinadas doenças, é vigiado por
meios de vigilância a distância e os seus correios de comunicação, correio electrónico e
social media invadidos pela entidade empregadora, para ter acesso a determinada
informação.

É de suma importância lembrar que os direitos do trabalhador só podem ser


legitimamente limitados se – e na medida em que – o seu exercício impedir ou dificultar
a normal actividade da empresa ou a execução da prestação estipulada. E a limitação
não pode justificar-se senão em obediência aos critérios de proporcionalidade, na
dimensão de necessidade, adequação e proibição do excesso, e de respeito pelo
conteúdo essencial mínimo do direito atingido.

Depois de termos notado a falta de consagração dos direitos de personalidade na


Lei Geral do Trabalho e termos notado a sua consagração no Código do Trabalho
português, decidimos fazer um estudo comparativo entre os ordenamentos jurídicos-
laborais português e angolano, a fim de perceber a forma como os direitos de
personalidade do trabalhador são protegidos em Angola, na falta da sua consagração na
LGT, e onde os operadores jurídicos se baseiam para a tutela dos mesmos, e como os
mesmos são tutelados no ordenamento jurídico-laboral português, uma vez consagrados
no Código do Trabalho.

A falta de consagração dos direitos de personalidade dos trabalhadores na LGT


em Angola não dificulta a sua tutela pelos operadores jurídicos, quando estes são
violados pela entidade empregadora? Como se processa a tutela no ordenamento
jurídico-laboral português onde os direitos de personalidade dos trabalhadores estão
consagrados no Código do Trabalho?

O trabalho teve como objectivo geral comparar o processo de tutela dos direitos de
personalidade dos trabalhadores no ordenamento jurídico-laboral angolano, cuja LGT
não os consagra, com o processo de tutela dos direitos de personalidade dos
trabalhadores no ordenamento jurídico-laboral português, cujo Código do Trabalho os
consagra. E como objectivos específicos localizar os direitos fundamentais dos
trabalhadores consagrados na Constituição da República de Angola e na LGT, bem
como os consagrados na Constituição da República Portuguesa e no Código do
Trabalho; descrever os direitos de personalidade dos trabalhadores consagrados na LGT
de Angola e no Código do Trabalho português; e perceber o processo de protecção dos
direitos de personalidade dos trabalhadores face a tríade dos poderes patronais em
Portugal e em Angola.

O mesmo tem três capítulos. O primeiro debruça-se sobre os direitos


fundamentais dos trabalhadores, o segundo sobre os direitos de personalidade do
trabalhador na ordem juslaboral portuguesa e angolana e o terceiro e último fala sobre a
protecção dos direitos de personalidade dos trabalhadores face os poderes patronais.
perspectiva comparativa entre Portugal e Angola.

Quanto à metodologia, o tipo de investigação é.

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