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A palavra ou termo autismo vem do grego “autos” que significa “voltar-se

para si mesmo” e foi usado inicialmente em 1911, por Euger Bleuler para falar
sobre um dos quatro critérios utilizados como parâmetro para o diagnóstico de
esquizofrenia. Nesse sentido a palavra autismo se referia a pessoas que viviam
voltadas para si, recolhidas em seu mundo privado e que apresentavam
grandes tendências ao isolamento, assim como tinham grandes dificuldades de
comunicação (Paulino, 2015; Stelzer, 2010). Posteriormente, em 1943, Leo
Kanner publicou um artigo nomeado “Autistic disturbances of affective contact”,
aonde após observar onze crianças que apresentavam características de
isolamento social e afetivo, ecolalias, estereotipias e grande fixação pela rotina,
cunhou o termo “autismo infantil precoce”. Neste período o autismo começa a
ser visto enquanto um transtorno específico e não apenas como um sintoma da
esquizofrenia. Um ano após Kanner, Hans Asperger (1944) pública o artigo
“Autistic Psychopathy in childhood” aonde descrevia crianças com inteligência e
linguagem típica, mas que possuíam comprometimentos nas habilidades
sociais (dificuldade para fazer amizades, conversação unilateral, foco intenso,
movimentos descoordenados), trazendo nessa descoberta uma nova maneira
de enxergar o quadro do autismo (Brasil, 2015).
Esses estudos, assim como diversos outros realizados na década de 60,
fizeram com que o autismo ganhasse maior relevância no campo acadêmico.
Dessa época destacam-se as contribuições de Temple Grandin (1965), uma
mulher diagnosticada com a Síndrome de Asperger que inventou a “Máquina
do Abraço” revolucionando as práticas de abate para animais.
Na segunda metade da década de 70, o Grupo para o Avanço da
Psiquiatria (GAP, 1966), classificou o autismo enquanto pertencente as
psicoses da primeira e segunda infância, que levou ao deslocamento do
autismo para a classe de psicose infantil na nona edição da Classificação
Internacional de Doenças (CID-9, OMS, 1975). Quase duas décadas depois, a
partir da contribuição de Ritvo e Ornitz (1976), o autismo foi declarado como
sendo na realidade uma síndrome associada a déficits cognitivos, mudando de
classificação, passando a pertencer a classe de transtornos invasivos do
desenvolvimento (TID) (Júnior e Kuczynski, 2018).
Em 1981 Lorna Wing, psiquiatra inglesa da época, trouxe contribuições
extremamentes significativas para compreensão do autismo, assim como para
o campo do tratamento, defendendo a criação de serviço para pessoas com
TEA e suas famílias. Wing descreveu uma tríade comportamental para o
autismo, aonde apontou três eixos sintomatológicos, sendo eles: transtornos
nas capacidades de reconhecimento social, transtorno nas capacidades de
comunicação social e transtornos nas habilidades de imaginação e
compreensão social (Silva, Gaiato & Reveles, 2012). Os achados de Wing
ajudaram também a instaurar um olhar distinto para o autismo, ampliando os
sinais e sintomas, dando início assim a compreensão do transtorno enquanto
um espectro.
Atualmente o transtorno do espectro autista (TEA) é classificado
segundo Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde (CID-10, 1993) e o Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais (DSM-5, 2014), como um transtorno global do
desenvolvimento caracterizado por consistentes prejuízos na interação social,
dificuldade de comunicação e engajamento em comportamentos restritos e
repetitivos. Recentemente, em março de 2020, o CDC (Centers for Disease
Control and Prevention) lançou um documento atualizando a prevalência do
TEA, onde informa que atualmente 1 a cada 54 crianças de 8 anos possui
autismo. Em relação ao gênero o documento mantém os dados anteriores onde
a prevalência é de 1 para 4, ou seja, a cada 1 menina com TEA, existem 4
meninos. Além disso, o documento do CDC informa que não foram
encontradas diferenças sociais, culturais ou socioeconômicas, demonstrando
assim que o transtorno do espectro autista é um transtorno que afeta crianças
de qualquer raça ou cultura, sendo a diferença apenas em seus graus, que
variam de leve à severo. Vale lembrar que esses dados são referentes a
pesquisas realizadas no Estados Unidos da America (EUA) e que em 2019 foi
sancionada a Lei 13.861 que obriga o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística) a perguntar sobre o autismo no censo populacional, mas o mesmo
só irá ocorrer de 2022 adiante, visto que houve um adiamento devido a
pandemia de Corona Vírus, sendo assim, ainda não há pesquisa equivalente
no Brasil, apenas uma estimativa com base nos dados do CDC e da ONU
(Organização das Nações Unidas).
Os dados atuais demonstram que ao longo dos anos o número de
crianças diagnosticadas com TEA vem crescendo por todo o mundo, inclusive
no Brasil e isso parece decorrer principalmente do maior acesso à informação
sobre o transtorno e a expansão dos critérios diagnósticos advindos da junção
de outros transtornos ao Espectro Autista (Fombonne, 2009; DSM-5, 2013;
Brasil, 2015).
O autismo não possui cura e nem causas conhecidas e definidas,
sabendo-se apenas que a genética, assim como o ambiente possuem grande
contribuições para o diagnóstico. Esse por sua vez é clínico e observacional,
sendo definido pelos sinais e sintomas especificados no CID-10 e DSM-5 (para
maiores informações recorrer aos manuais especificados).
Apesar de não se ter maiores informações sobre as causas do autismo,
atualmente já se sabe que existem diversas intervenções e métodos
educacionais que proporcionam a redução dos sintomas do espectro e ajudam
a promover habilidades sociais, de comunicação e comportamentos
adaptativos, sendo que as intervenções baseadas na ciência comportamental
de Skinner (1953) atualmente são as detêm maior investigação cientifica e
comprovação de eficácia (Junior & Kuczynski, 2018; Varella & Amaral, 2018;
Virués-Ortega, 2010; Rogers, 2010; Landa, 2007; Howard Et Al., 2005).
Dentre as terapias baseadas na ciência comportamental de Skinner
(1953), a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) é a ciência com maior
aporte cientifico atualmente e vem sendo adotada e indicada majoritariamente
como meio de atuação entre os profissionais que trabalham com crianças no
espectro autista ao redor do mundo, sobretudo nos EUA e BRASIL, por conta
de sua eficácia comprovada e de seus efeitos significativos no desenvolvimento
das pessoas que possuem esse diagnóstico. Essa convenção ocorre
principalmente pelo fato dessa abordagem ser altamente estruturada e
individualizada, tornando-se assim bem sucedida entre crianças com TEA, que
por conta das características do próprio transtorno possuem maior tendência a
responder com sucesso à diretrizes e rotinas claras e objetivas (Schoen, 2003;
Boyd & Corley, 2001; Campbell, Schopler, Cueva & Hallin, 1996; Silva, Gaiato
& Raveles, 2012; Warren et al., 2011; Smith, 1999; Lovaas, 1987; Dawson et
al., 2010).
Apesar de todos esses avanços ao longo dos anos em relação ao
transtorno, nota-se que ainda hoje há um atraso no descobrimento, no
diagnóstico e na inserção a terapias de crianças com autismo, sendo que os
mesmos ocorrem na maior parte dos casos de forma tardia. Esse atraso
ocasiona muitas das vezes uma progressão alinear e uma diminuição da
potencialidade do tratamento.
A literatura demonstra que os pais dos indivíduos com TEA normalmente
são os primeiros a notarem que algo está diferente no desenvolvimento dos
mesmos, notando diferenças significativas desde a primeira infância devido ao
maior contato e atenção com os filhos nessa faixa etária. Apesar de notarem
discrepâncias no comportamento dos filhos, as dúvidas sobre se pode ou não
haver algo errado com os mesmos começa a aparecer por volta dos 17 meses
de idade da criança e a busca por intervenções e diagnósticos ocorre ainda
mais tardiamente, sendo a média 5 anos de idade no Brasil. Fora isso, após o
diagnóstico existe ainda o tempo para a criança ingressar em intervenções
especificas para tratamento de autismo, que normalmente está vinculada à
média do diagnóstico (Asgharian, 1999; Daley, 2004; Mandel, Listerud, Levy &
Pinto-Martin, 2002; Araújo; Schwartzaman, 2011; Zanon; Backes; Bosa, 2017).
Esse diagnóstico e início em intervenções tardio acaba levando a um
resultado menos significativo, em comparação a uma intervenção precoce, pois
já se sabe que o diagnóstico precoce, assim como a inserção rápida em
intervenções podem determinar o prognóstico nos casos de autismo, podendo
ocasionar uma aquisição mais rápida da linguagem, interação social, redução
de estereotipias e comportamento inflexível, etc., assim como manter os
ganhos obtidos, mantendo-os de forma duradoura, possibilitando assim uma
maior adaptabilidade desses sujeitos nos mais diversos âmbitos sociais
(Howlin, Magiati & Charman, 2009; Reichow, 2011). Este ganho significativo de
habilidades na primeira infância ocorre devido a plasticidade cerebral que é
maior nessa faixa etária em especifico (Araújo; Schwartzaman, 2011).
Inúmeros fatores podem ocasionar a detecção tardia do TEA, alguns
deles são a demora por parte dos pais e profissionais em notar discrepâncias
ou dificuldades no comportamento geral da criança, a variabilidade de
expressões dos sintomas do TEA, a falta de profissionais treinados e
habilitados para reconhecer as mais diversas manifestações do transtorno,
principalmente de forma precoce, visto a sutileza dos sintomas entre 0 a 12
meses , que normalmente envolvem falta de sorriso social, falta de contato
visual, expressão fácil inadequada, atenção suprimida, hipotonia, não possuir
comportamento de ouvinte, etc. e a escassez de serviços e testes
especializados ou padrão ouro (Jendreieck, 2014; Mansur et al., 2017).
Além do diagnóstico tardio, existe ainda a demora do ingresso das
crianças em terapia. Normalmente esse atraso advém do fato da família
precisar de um tempo para lidar com as fases pós diagnostico: impacto, a
recusa, o luto, o enfoque externo e o encerramento. Primeiramente a família
tem que lidar com o impacto da noticia e a realidade de que um membro da
mesma possui um transtorno e que terá que ter auxílios e cuidados distintos,
após esse primeiro impacto, a família tende a passar por um período de
recusa, aonde os membros negam o transtorno da criança, não aceitando e
estabelecendo razões para não necessidade do ingresso ao tratamento, após
perceber que as “razões” são infundadas e que de fato a criança possui uma
necessidade distinta dos demais membros, a família entra na fase de luto, na
qual processa e desfaz as expectativas relacionadas ao filho. Após o luto, a
família passa então a buscar por ajuda e o enfoque passa a ser externo,
levando assim ao encerramento e aceitação do diagnóstico (Pinto et al., 2016).

, tornando a vida familiar confusa e estressante em grande parte dos


casos. Atualmente se tem uma maior divulgação por partes das mídias sobre o
autismo, mas ainda assim, essa informação não chega de forma ampla a
população, o que acaba gerando desconhecimento por parte dos pais e
familiares, que tendem a explicar a situação da criança com termos como
“tímido” ou “retraído” e esperando que os mesmos melhorem com o tempo,
buscando o diagnostico apenas quando a evolução não ocorre e aparecem
falhas na comunicação ou a falta dela.

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