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Chris Freeman, The ‘National System of Inovation’ in historical perspective, Cambridge Journal of Economics,
1995
I. Resenha analítica
(National System of Innovation – NSI) e sua importância elementar para a avaliação das políticas de
desenvolvimento e de inovação. O autor demonstra como a inovação econômica numa dada sociedade deve ser
abordada de maneira sistêmica e histórica permitindo identificar elementos relevantes relativos à sua origem, bem
como avaliar seus resultados concretos. Desta maneira o NSI, segundo Chris Freeman, é essencial para realizar uma
análise econômica – ao contrário do defendido por vários autores, os quais enfatizam a ‘globalização’ como meio
Freeman enfatiza a importância do sistema educacional e das relações que estabelecidas pelas firmas industriais com
b) Metodologia utilizada
A metodologia de Freeman é, sobretudo, histórica. O autor analisou empiricamente a evolução das concepções de
desenvolvimento e origens da inovação através da extensa bibliografia que utilizou para embasar seu argumento.
A primeira parte do artigo refere-se à obra de Fridriech List, “National System of Political Economy” (1841), afim de
ilustrar a lucidez do austríaco sobre aquilo que posteriormente Freeman nomearia NSI. Freeman faz uso, no primeiro
momento, de um estudo comparativo-histórico entre Alemanha e Inglaterra para explicitar o desejo alemão de atingir
Na segunda parte do artigo, ainda utilizando-se de uma abordagem histórica e empírica, expõe uma tabela que
apresenta as estimativas de gastos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), entre 1934 e 1983, nos Estados Unidos da
América (EUA), Europa, Japão e União Soviética para comprovar o papel específico da P&D nas firmas. O autor
reconhece o problema metodológico de uma comparação exclusivamente baseada nos gastos de P&D e admite a
Em seguida, ao comparar mais especificamente as diferenças entre os Sistemas Nacionais de Inovação, Freeman faz
A primeira ilustra os contrastes entre os NSIs do Japão e da União Soviética em 1970. Tal tabela compara os
gastos em P&D derivados do PNB (dos quais isola os gastos militares), a proporção de P&D e sua integração na
firma, a abertura internacional, entre outros.
A segunda releva as divergências dos NSIs da América Latina e Leste Asiático nos anos 80 de acordo com
critérios de natureza qualitativa, tais como : nível da sistema educacional, estratégias de gestão tecnológica
(importação, transferência, etc.), relação ciência/tecnologia, papel do investimento estrangeiro e infraestrutura de
telecomunicações.
A terceira compara dois sistemas específicos: o brasileiro e o sul coreano. Nesta tabela compara-se os níveis
educacionais, a proporção de engenheiros na população, a proporção de investimento em P&D oriunda do PNB,
a robotização da indústria e indicadores de caráter quantitativo como o número de patentes registradas,
equipamentos de telecomunicações, entre outros.
Por fim, o autor aborda a problemática da globalização e o papel das firmas multinacionais ( Multi-National
Corporation – MNC) e transnacionais (Trans-National Corporation – TNC), confrontando sua tese com aquelas
concebe a inovação como o resultado de uma acumulação de conhecimento marcada por um contexto institucional e
geopolítico específico: a luta alemã pelo desenvolvimento tardio em concorrência à supremacia inglesa. A História é
apresentada como um tipo de capital intelectual que deve ser habilmente usado para fins evolucionistas e de
outras palavras, do capital humano e físico. Assim, a emergência da Alemanha como novo poder mundial seria
resultador da soma de diferentes fatores, não são somente de natureza econômica mas também política, social e
cultural.
Freeman analisa a relação entre importação de tecnologia estrangeira e desenvolvimento técnico local, defendendo
que não basta aquirir uma tecnologia mas que seria igualmente fundamental aprimorá-la. Para tanto, são necessárias
centro de atração da mão-de-obra estrangeira (inclusive inglesa) em busca de formação, tornando as firmas nacionais
detentoras de um “tacit knowledge”. Portanto, o papel do Estado neste caso têm importância primordial no
Freeman conclui que o estabelecimento do sistema industrial Alemão, em meados do século XIX, permitiu a
superioridade produtiva do país que se perpetua atualmente na Europa. Para corroborar sua afirmação, o autor destaca
o caso inglês, país que considera desprovido de uma política efetiva que suporte a indústria a longo prazo, impedindo
o “catch-up” com a Alemanha. A comparação que estabelece com os EUA difere devido aos papéis desempenhados,
segundo o autor, pelo meio ambiante (recursos naturais, energia, etc), História (imigração) e diferenças estruturais
relativas ao financiamento da economia (estatal, no caso da Alemanha, e estrangeiro, no caso dos EUA).
Freeman constata como a adoção de novas formas organizacionais permitiu a internalização da P&D no seio da
O autor aborda a problemática da internalização da P&D (in-house Research and Development) através da introdução
do conceito de inovação institucional, sublinhando o papel das instituições não apenas como uma força de inércia
mas também como motor da inovação econômica que permite o desenvolvimento das capacitações inovacionais. A
inovação institucional instaurou-se na indústria química alemã, sendo posteriormente normatizada, profissionalizada
e institucionalizada em outras grandes firmas industriais graças à intensificação das relações entre o Estado,
laboratórios de pesquisa privados e Universidades. No entanto, o NSI permanecia abordado de maneira contida nos
anos 1970, época em que se enfatizava o sistema formal da P&D e educação técnica e negligenciava-se o retorno
inovação radical da incremental. O crescimento e a mudança técnica passam a depender mais de uma difusão lenta,
pelo processo de aprimoramento tecnológico -inovação incremental- e menos de um processo súbito e sem
Na comparação de Freeman entre os NSIs dos anos 70-80, a P&D perde destaque na análise da inovação. A
dos produtos gera a necessidade de interação entre o mercado e as firmas e entre as próprias firmas (subcontratadas,
fornecedores etc.). A “inter-linkage”, ou interligação das firmas, enfatiza o aspecto não linear mas sistêmico do
processo de inovação, determinante para a taxa de difusão e ganhos em produtividade. No caso da inovação radical, a
Uma primeira comparação do autor entre o Japão e a União Soviética nos anos 80 enfatiza a importância da “ inter-
linkage”. No Japão, o setor da tecnologia eletrônica beneficiava-se da integração do Estado com o tecido industrial e
as Universidades, enquanto na União Soviética ocorreu a separação das atividades de pesquisa por organização
(design, gestão das importação de tecnologias, etc) e seus respectivos setores. No contexto soviético, a politica
industrial era direcionada, principalmente, aos setores militares e espaciais. Embora ambos os países
disponibilizassem sistemas educacionais de ponta e possuíssem objetivos e perspectivas econômicas bem definidos, a
A mesma conclusão aplica-se, em termos contrários, à comparação entre a América Latina e o Leste Asiático. Ambos
dispunham de péssimas condições infraestruturais e baixos níveis educacionais, no entanto um pesado investimento
no sistema educacional e infraestrutura de P&D fez com que a Coréia do Sul, segundo Freeman, desfrutasse grande
A escolha de Freeman pela explicação das diferenças entre países baseada na configuração dos respectivos NSIs
confronta-se com outra abordagem, de tradição mais ortodoxa na ciência econômica, conhecida como teoria
neoclássica. O paradigma neoclássico tende a enfatizar o papel da globalização, na qual os atores principais no
processo de inovação e de desenvolvimento seriam as MNCs e TNCs, em particular nos países em desenvolvimento.
Freeman confronta a análise de Ohmae (1990) e Porter (1990) para demonstrar como a ‘globalização’ não atinge uma
convergência geral, sequer obedece à um processo de normatização dentro de uma “inter-linked economy” mundial.
Como relembra Freeman através de Porter, a História, a cultura, os valores, a estrutura sócio-econômica e as
instituições de uma dada sociedade são fatores que, em escala nacional, contribuem no processo de inovação. Apesar
da ascensão do papel das mídias, da ampliação do acesso à educação e da crescente importância das organizações
internacionais, a ‘globalização’ caracteriza-se mais como uma ‘triadisação’ entre Europa, EUA, Japão e os países
exportadores de petróleo. No caso da P&D, Freeman chama a atenção para o fato do NSI do país de origem das
firmas multinacionais desempenhar papel determinante nos gastos de P&D destas firmas no exterior. Assim, o
controle e a propriedade permanecem no país de origem e somente uma pequena proporção da P&D é investida no
Através do trabalho de Lundvall (1993), Freeman coloca a racionalidade limitada e a incerteza no seio do debate para
chamar a atenção em relação à “path dependance”, posta pelo autor como fonte de variedade no desenvolvimento das
várias economias mundiais. A estandardização torna-se então limitada e termina por confrontar a importância das
instituições locais, a cultura de proximidade pessoal, as relações com os clientes, assim como a experiência e
As TNCs e MNCs têm posições centrais quanto à transferência de competência e equipamentos, mas também fazem-
se necessárias reformas institucionais para reforçar a capacitação tecnológica e a ligação entre as organizações e o
processo de inovação. Ocorre um processo de destruição criativa no caso das inovações radicais, por quê se faz
necessária uma restruturação organizacional e institucional. Estas reformas radicais têm consequências sociais e
presença das instituições, parece resumir o pensamento do autor acerca da apreensão do processo de inovação.
Freeman também chama a atenção sobre o efeito “lock-in” num padrão de tecnologia, como por exemplo as
consequências da monocultura na ecologia, e enfatiza o quão é necessário a flexilidade do sistema para a emergência
de novas tecnologias e formas institucionais. A dificuldade seria então de caráter político: uma politica pública a
favor da difusão de uma dada tecnologia deve permitir tanto a emergência de nova tecnologia quanto o investimento
sublinha, em especial a partir deste último conceito, a importância da infraestrutura local, especificidade do meio
ambiente social, cultural, natural e relações de confiança. Enfim, o autor relaciona o fenômeno do aumento da
vulnerabilidade das economias nacionais à choques externos , entre outros fatores, às políticas de liberalização e
Considero interessante e pertinente a abordagem histórica e institucional do processo de inovação. Apesar de não
abordá-la diretamente,Freeman questiona a mudança das instituições pelo viés da inovação institucional, bem como
seu lugar e importância na economia e suas implicações na trajetória do desenvolvimento. Pode-se afirmar que o
conceito de trajetória é fundamental por quê abre espaço para a decisão politica e não impõe uma suposta lei
“natural” e econômica. Assim, a internacionalização das economias não é tida como um mal necessário nem como
uma solução milagrosa, mas sobretudo uma consequência política que registra-se numa evolução histórica do
capitalismo.
O artigo de Freeman constitui, sem dúvida, etapa essencial no conhecimento técnico-científico. O autor inglês é, com
efeito, o fundador da noção moderna de “Sistema Nacional de Inovação”, responsável por transformar a visão acerca
da inovação e do desenvolvimento na análise econômica. A integração do papel das instituições e a ideia de inovação
institucional pôs fim a linearidade e abordagem estática da inovação. A “globalização” e o papel das firmas
As implicações brasileiras relativas à questão abordada são ainda difíceis para minha apreensão, dada minha condição
de estrangeiro recém-chegado. No entanto, acredito que esta visão ‘externa’ poderá me fornecer, futuramente, um
olhar diferente e interessante. Acredito que a problemática do desenvolvimento necessita de mais atuais e profundas
reflexões e, em certo sentido, a direção da análise de Freeman têm muito a contribuir. O Brasil é, segundo categorias
tradicionais, um país “em desenvolvimento” que busca um catch–up em relação aos países desenvolvidos. Mas quais
os impasses que este modelo de desenvolvimento podem impor? A discussão acerca da crise ecológica assume, cada
vez mais, caráter universalista questionando os modos de vida, consumo e produção antes tidos como referência
absoluta e inquestionável. A recente e ainda atual crise econômica também expôs os efeitos de uma corrida pela
acumulação do capital sem regulação, conduzindo as economias à um impasse que coloca em xeque suas realidades
materiais.
O papel da inovação neste sistema é central: ao mesmo tempo em que encarna a acumulação do capital também
intermeia o desenvolvimento tecnológico. Assim, como demonstrou Freeman, o direcionamento dado à inovação é
primordial. As mudanças institucionais que acompanham as inovações têm consequências sociais por vezes
O questionamento que se coloca: existiria um tipo de inovação de caráter ‘social’? E quais seriam as aplicações no
Brasil? Seria o capitalismo realmente capaz de apreender a noção de responsabilidade social? Ou seria possível
incluir a inovação em uma forma organizacional exterior ao modo de produção capitalista? Em outro termos,
poderiam as empresas cooperativas ou aquilo que se conhece por “economia social e solidária” encontrar uma
maneira alternativa de desenvolvimento? O caso das cooperativas financeiras serve como bom exemplo para refletir
sob a questão, pois é surpreendente constatar a proporção de grandes cooperativas que foram cúmplices e atuantes no
sistema desregularizado das subprimes, o qual terminou por configurar a atual crise econômica.
(1) Polanyi K., [1944] 1983, La Grande Transformation. Aux origines politiques et économiques de notre
(2) Chang H.-J. et Evans P., 2005, « The role of institutions in economic change », em G. Dymski e S. Da