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Anais P&D Design 2000. FEEVALE, Novo Hamburgo, RS. 29 out. a 01 nov. 2000.

Licheski, L. Design e computação gráfica: a prática pedagógica na produção de projetos.

Design e computação gráfica: a prática pedagógica na produção de projetos

Laís Licheski
Mestre em Educação: Pedagogia Universitária – Pontifícia Universidade Católica-Pr

Palavras-chave: ensino de design, programação visual, computação gráfica


Este artigo procura fazer reflexões sobre a influência do uso da computação gráfica no ensino de programação visual,
através da observação das modificações na prática pedagógica das disciplinas de projeto. Baseia-se em depoimentos de
docentes analisados à luz de diversos autores, criando um quadro do ensino de design diante das transformações
tecnológicas e demonstrando a necessidade de projetos pedagógicos que norteiem o ensino para a superação da
reprodução.

Keywords: design teaching, visual programming, computer graphics


This paper intends to do some reflections about the influence of the usage of computer graphics in teaching visual
programming using for that observations of the changes in pedagogic practices of the project discipline. They are
based in teachers testimony and analyzed throughout the work of many authors, creating a design teaching time based
on technological transformation e showing the need of pedagogical project to guide the teaching to overcame the
reproduction.

Introdução novidade, apenas recursos de programas


Nas últimas duas décadas, a disseminação de exaustivamente utilizados.
computadores pessoais e a proliferação de softwares
gráficos geraram transformações no campo da Entretanto, os efeitos da informatização vão além da
programação visual, principalmente no que se refere aparência. Destaca-se a interatividade proporcionada
à materialização da criação do designer. As várias pelo ambiente computacional, capaz de materializar
etapas manuais e os serviços de terceiros, que tão rapidamente o pensamento humano que pode
consumiam tempo e custos e necessitavam muita modificar a postura do designer diante de seu
habilidade, paciência, conhecimento e domínio de processo de trabalho e dos valores agregados a ele.
diversas técnicas, foram rapidamente substituídos
por hardware e software. Essas modificações e seus reflexos no ensino são
melhor compreendidas quando se resgatam as
Entre os programadores visuais, a inicial euforia origens do design, procurando defini-lo e situá-lo
com a facilitação e rapidez do trabalho logo foi historicamente, e se revelam alguns fatores
substituída por uma constatação: o mundo dos condicionantes ou limitantes de sua prática. Com
elementos e processos do design passara a ter seu suas origens no modernismo, o design refletiu até
acesso possível a quaisquer pessoas capazes de recentemente valores que se apoiavam no
manipular os programas gráficos, causando a racionalismo, na simplicidade, na objetividade, na
proliferação de pretensos designers. Também, os ordenação.
recursos dos programas fartamente utilizados não
tardaram a criar uma certa homogeneidade de É principalmente por meio do ensino que os valores
resultados, mesmo entre programadores visuais. racionalistas do design modernista se mantêm
reproduzidos. As experiências de duas escolas
Nas escolas de design a euforia e a apreensão alemãs - Bauhaus e HfG-Ulm - influenciaram a
também foram sentidas. Os alunos começaram a implantação e o direcionamento de escolas de
ingressar nos cursos com cada vez mais desenho industrial em diversos países, inclusive o
conhecimentos de computação, algo que grande Brasil, dentro desta ótica. A formação de currículos,
parte dos professores não tinha. Os resultados dos centrados nas disciplinas de execução de projetos,
trabalhos dos alunos, horizontalizados pelo ótimo também refletem os valores funcionalistas e o
acabamento proporcionado pelos computadores e racionalistas do design moderno.
periféricos, passaram a refletir a mesma realidade
constatada pelos profissionais: pouca ou nenhuma Entretanto, os questionamentos a esses valores
transformam o design, tecendo novos vínculos,
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parâmetros e limites. E é nesta realidade em utilizando-se métodos para desenvolvimento de


transformação que a informática irrompe, as projetos. Como destaca VILLAS-BOAS (1997) é
modificações por ela trazidas à prática da através da metodologia projetual que o profissional
programação visual identificando-se com o período de design pode ter controle sobre as variáveis
de disseminação dos valores pós-modernos. envolvidas no projeto.

Que respostas o ensino de programação visual tem Os termos para definir as etapas principais podem
dado às modificações expostas e impostas pela variar, mas a estrutura principal se mantém: é
informatização? preciso identificar, analisar e conceituar o problema
para então conceber e testar soluções e,
O design está envolvido na revolução contínua do posteriormente, especificar e executar a solução
ato de desenhar, o que, no momento, está escolhida. “O processo projetual é - ou deveria ser -
representado pelo uso de microcomputadores e um processo de pensamento disciplinado, que se
programas de computação gráfica. A universidade caracteriza pela grande agilidade de passar de um
deve preparar indivíduos capazes de enfrentar o problema parcial a outro problema parcial, avaliando
mundo futuro segundo as técnicas mais avançadas: o as implicações de um sobre o outro”. (BONSIEPE,
ensino baseado apenas no passado não é apropriado 1984, p.10).
para um operador visual que deve atuar num futuro
próximo. O problema está em como envolver o FONSECA (1997) observa que a composição das
aluno em sua própria formação. etapas projetuais está em crise. O que antes era uma
indiscutível seqüência hoje já não acontece da
Ensino de Projeto de Programação Visual mesma forma. A informatização do processo não é o
A programação visual está envolvida na revolução único fator de mudança, mas é bastante responsável
contínua dos meios de visualização e produção de por ela já que torna possível a coexistência das fases
mensagens visuais, sejam eles o desenho, os meios do projeto todas na mesma tela e a simultaneidade
gráficos, tipográficos, fotográficos, de resolução, mesclando as etapas de planejamento e
computadorizados. Uma técnica pode ser utilizada execução.
para camuflar deficiências na formação do
profissional, mas as deficiências persistem. As escolas também se adaptam, mas fisicamente,
instalando laboratórios de informática. As alterações
O pensar de um designer, por seu próprio perfil que se percebem no ensino de design têm sido
profissional, deve ser diferente do pensar técnico e decorrentes da prática, de adaptações que se
operativo. Não basta às escolas de design ensinar a tornaram necessárias aos docentes ao se
desenhar e projetar. É preciso que o aluno saiba confrontarem com as influências da disseminação de
fazer associações, resolver questões conceituais, computadores entre profissionais de design,
teóricas. prestadores de serviço - principalmente da área
gráfica - e acadêmicos.
Com o uso de computadores os designers passaram
a ser produtores ao mesmo tempo que projetam. O Prática pedagógica: a metodologia projetual
software se encarrega da arte-final, da separação de A criatividade, na concepção freudiana, origina-se
cores, do fotolito ... mas a compreensão do processo de um conflito dentro do inconsciente e, mais cedo
não é descartável. Teoria e prática têm uma relação ou mais tarde, este produz uma solução para o
de necessidade mútua: a teoria não pode ser apenas conflito. Se a solução reforça uma atividade
um discurso; a prática, um exercício de pretendida pela parte consciente da personalidade,
experimentação. A teoria precisa da prática para ser teremos como resultado um comportamento criador:
real, e a prática da teoria para se fundamentar. A os instintos insatisfeitos são as forças
intermediação se faz pela habilidade de saber pensar impulsionadoras da fantasia. Assim, a pessoa
e aprender a aprender. criativa deve ser inicialmente perturbada por um
problema, e as soluções criativas resultarão da
O projeto como eixo da formação do ensino de liberação de energias necessárias à eliminação da
design foi tradicionalmente implantado nos cursos angústia (DUAILIBI; SIMONSEN JR., 1971).
de desenho industrial - assumindo denominações
diversas -, desempenhando um papel central nas Se na maioria das vezes o problema gerador da
grades curriculares. Seu ensino tem se caracterizado angústia é imposto pelas circunstâncias, ele também
pela execução de propostas que são realizadas pode ser cultivado consciente e artificialmente com a
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finalidade de estimulador da criatividade, o que é Ao trabalhar diretamente no computador, o aluno


bastante utilizado no processo ensino-aprendizagem tende a atuar somente com a casualidade. Dado o
e uma realidade constante nos projetos dos cursos de tema a ser desenvolvido já começa a desenhar, sem
design. ao menos pensar em questões básicas de
problematização: para que estou projetando? para
Em educação a criatividade é fundamental para o quem? como será utilizado este objeto? são
desenvolvimento cognitivo, uma vez que “permitiria perguntas que talvez sejam feitas mais tarde, quando
representações e organizações de experiências mais for necessário explicar porque uma determinada
ricas, processos de reorganizações subjetivas mais solução foi escolhida. A análise das variáveis
autênticas e favoreceria atitudes básicas de envolvidas, que no processo projetual antecede a
exploração do meio e de auto direção.” (NOVAES, criação e direciona os passos que serão dados, é
1986, p. 161). No caso específico do ensino de desprezada diante da possibilidade de execução
projeto, criatividade é essencial, e é por sua presença rápida de muitas soluções que, em sua maioria, se
que se costuma fazer a distinção entre os bons revelam inadequadas.
profissionais e os meros desenhistas ou usuários de
tecnologia. Esta forma de trabalho sempre existiu. Em sala com
freqüência é preciso instar o aluno a não iniciar a
Mas o que caracteriza sobretudo o designer é o ato geração de alternativas sem fazer uma pesquisa
de projetar. Sua atuação não descarta a utilização de inicial que revele a complexidade do problema. A
uma metodologia, seja ela pessoal ou acadêmica. agilização da etapa de geração de alternativas trazida
pelos programas gráficos enfatizou a necessidade de
O design gráfico, enquanto atividade profissional conscientizar o aluno da importância de utilizar um
e parâmetro conceitual para análise de objetos procedimento metodológico referencial que lhe
comunicacionais, requer uma metodologia proporcione diretrizes básicas. Há que se considerar
específica através da qual o profissional tenha que os problemas encontrados no desenvolvimento
controle das variáveis envolvidas no projeto e de projetos de programação visual dificilmente
opção expressa entre alternativas de consecução, podem ser resolvidos intuitivamente, dada a sua
a partir de testagens realizadas por ele ou por complexidade comunicacional e informacional. A
outrem. (VILLAS-BOAS, 1997, p. 15). orientação metodológica serve tanto como parâmetro
para o controle do caminho a ser percorrido até a
Fazer um planejamento interrelacionando assuntos, consecução do objetivo, quanto como auxiliar na
matérias, questões de disciplinas diversas exige uma superação das etapas do projeto.
abordagem metodológica. A metodologia1 é
intrínseca ao processo industrial e, portanto, ao Durante os anos 60 o debate sobre metodologia
design: ela nasce do próprio trabalho e é tão ocupou uma posição de destaque no discursos sobre
científica quanto o seja o problema a ser design. O entusiasmo pelo assunto acabou gerando o
solucionado. que hoje é denominado “metodolatria”, uma crença
exagerada nas possibilidades de seu uso. Atualmente
O resultado que se alcança em um projeto é fruto da procura-se a aplicação de métodos de acordo com as
capacidade técnica e criativa de quem o desenvolve. características do projeto e é sentida uma
Métodos, técnicas, ferramentas são auxiliares no preocupação em posicionar o homem como centro
processo de organização das etapas a serem referencial para a concepção dos objetos.
cumpridas: oferecem um suporte a esse
desenvolvimento. Ao aluno falta compreender a A um eficiente método de trabalho deve aliar-se
necessidade de usar um procedimento lógico que lhe conhecimento tecnológico e cultural, a capacidade
permita chegar ao resultado pretendido e saber como intuitiva e criativa de cada designer e ainda
usá-lo. A questão não é fazer, mas pensar como flexibilidade e capacidade de adaptação diante de
fazer. mudanças.

Reproduzir conhecimentos pode se tornar um hábito


cômodo: a vontade de aprender e de construir
1
conhecimentos precisa ser estimulada. Sem o hábito
“No sentido comum metodologia é a ciência que se do uso do raciocínio reflexivo e analítico em todas
ocupa do estudo de métodos, técnicas ou ferramentas e de
as fases de um projeto, de se aproximar do problema
suas aplicações na definição, organização e solução de
problemas teóricos e práticos”. (BOMFIM, 1995, p. 7). focalizando seu contexto, de enfocar o homem e seu
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ambiente, os estudantes de design podem vir a se Adaptação e atualização do professor


tornar apenas usuários dos elementos objetivos das A introdução de programas gráficos no cotidiano
metodologias projetuais. Cabe às escolas de design trouxe alterações nos processos envolvidos no
fazer com que os alunos “pratiquem uma forma de trabalho do designer, mas nas escolas com
projetação em que prevaleçam enfoques subjetivos e freqüência foram os alunos que trouxeram a questão
teóricos como elementos diferenciadores de à baila, ao questionarem os métodos tradicionais de
projeto”. (MORAES, 1997, p. 155). realização de projetos e adaptar-se às
potencialidades do novo fazer.
No ensino de projeto é importante que o aluno seja
constantemente solicitado a descobrir, a inventar Um aluno pode, com relativa facilidade, estar
através da experimentação. É comum que o aluno - e mais atualizado do que o professor, lerdo demais
também o profissional - aguarde uma “inspiração em seu bizarro e indiscriminado enciclopedismo
divina” para solucionar um problema criativo, especializado, resultado de uma formação
quando só a intimidade com o assunto em todo seu obsoleta, onde ele não é treinado na
contexto e a disposição em experimentar diversas experimentação seletiva, ou seja, no
soluções é que traz o resultado inspirado. As desenvolvimento de suas capacidades de
soluções não brotam do nada, resultam do exercício selecionar e descartar informações e de tomar
contínuo que desperta a criação. Incrementar a decisões pensamentais, criando ao mesmo tempo
pesquisa e a experimentação é essencial ao ensino de o ensino e a coisa ensinada, junto com a
projeto. participação ativa e criativa dos alunos, que,
para esse efeito, formarão uma equipe de
O aluno é um elemento ativo no processo de ensino trabalho, da qual o professor é apenas o
e seu processo de formação maturação deve ser coordenador. (PIGNATARI, 1977, p. 89)
respeitado: não é possível desconsiderar sua
individualidade e motivações pessoais, ignorar os A aquisição de artefatos tecnológicos não pressupõe
conhecimentos que traz consigo e sua capacidade de conhecimento. Aos professores não basta deter o
assimilação do novo. A expressão pessoal pode estar conhecimento específico da matéria que lecionam,
ligada a um instrumento específico: será a expressão elaborar e preparar esse conhecimento para
- e não o instrumento - que deverá ser estimulada transmiti-lo aos alunos. É preciso estar aberto à
para que o aluno possa encontrar seus próprios inovações e ser capaz de se adaptar, mudar o
caminhos para a resolução de problemas projetuais e enfoque, centrando-o não mais na técnica em si, mas
os melhores recursos para execução, saber avaliar o na concepção do trabalho sob os conceitos.
próprio trabalho, superar a insegurança.
As novas tecnologias banalizaram a boa
Para atingir este objetivo é preciso se considerar que apresentação, e a destreza técnica deixou de ser um
ao ensino livresco, que muitas vezes acompanha o fator diferencial. Havia mesmo uma confusão entre
sistema de ensino, agregam-se conhecimentos pré- essa destreza e criatividade: saber fazer um bom
existentes que incluem percepções, convicções, layout ou arte-final, pautar-se em regras
avaliações pessoais adquiridas pela experiência e compositivas, realizar seu trabalho com
que se transmitem na práxis. O ponto de equilíbrio regularidade, e até previsibilidade, muitas vezes era
entre o saber formal e o pré-existente é a capacidade o bastante para um profissional de programação
de interpretação, que abre espaço para o visual. Como hoje isto está ao alcance de todos, o
estabelecimento de laços e associações e para o fazer profissional se diferencia pelo enfoque criativo e
criativo. inovador, não pela mera operação de possibilidades
previstas. No ensino, o resgate do aprendizado que
Ser imaginativo, criativo e inovador é algo que se os programas dispensam é apontado como um
espera de um designer, seja com lápis e papel, seja caminho para o novo designer.
com mouse e teclado. O que importa é que ele seja
capaz de se expressar com a técnica que melhor lhe O impacto que o uso do computadores trouxe ao
convier e, nessa expressão, diferencie-se pela design exige um professor preparado, dinâmico e
competência, pelo conhecimento e pela criatividade. investigativo, já que as situações que agora se
E isto também é aprendizado. colocam fogem ao controle preestabelecido do
currículo. Entretanto, vale lembrar que para a
docência do desenho industrial são recrutados
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diversos profissionais que não tiveram qualquer encontrá-las é importante para um futuro acesso;
formação pedagógica. portanto, os ambientes de aprendizado que se
baseiam na busca e avaliação de informações são
Isso se dá de tal forma que, muitíssimas vezes, mais adequados à formação do indivíduo que
para que alguém exerça a função de educador, aprende a aprender.
não lhe é exigida nenhuma formação específica.
Existem profissionais de áreas diversificadas que Com a microeletrônica e a informática e as
estão na regência escolar e que não tiveram possibilidades de estocagem e acesso de
nenhuma formação para tal. Possuem uma informações em instantes, revela-se a inadequação
formação específica numa área do conhecimento de escolas que não estimulam para a autonomia da
e, a partir daí, dedicam-se ao ensino. aprendizagem enquanto ainda promovem o acúmulo
(LUCKESI, 1994, p. 96). dessas informações.

Esses profissionais, para sua atividade docente, Não basta lembrar das informações, mas relacioná-
unem as experiências como alunos às características las, sintetizá-las, analisá-las, avaliá-las, estimulando
das aulas de professores que os marcaram, às vezes o pensamento crítico, que surge quando o aluno se
procurando modificar o que lhes pareceu esforça para ir além do resultado simples e imediato.
inadequado.
Ao desenvolver habilidades cognitivas além do
Posteriormente a unidade de ensino em que atuam conteúdo do aprendizado, o aluno terá a
pode vir a favorecer o treinamento ou a capacidade permanente de aprender novos
especialização do docente na área didático- conhecimentos e habilidade especializada futura.
pedagógica. Mas a sua formação como profissional A sociedade - utilizando a tecnologia flexível da
pautará muito de sua atuação como docente. informática em larga escala - exigirá cada vez
Portanto, para formar um professor competente, mais esta inteligência criativa, em substituição
comprometido com o ensino e criativo é essencial do saber apenas especializado. (CARDOSO,
que ele, enquanto aluno, seja colocado diante do 1995, p. 61).
conhecimento como algo a ser construído durante
toda a vida. E compreenda que, como educador, Faz-se necessário criar condições para o
precisa conhecer profundamente sua matéria, estar processamento das diversas informações que o aluno
pronto para os desafios lançados pelos estudantes e recebe, para que encontre o sentido, a estrutura, e
continuar construindo seu conhecimento. forme os vínculos necessários à sua própria
aprendizagem.
A postura do professor deve favorecer o aprendizado
do educando: um professor que encare seus alunos Na tradição (ou comodidade?) de se fazer como se
como futuros concorrentes acaba por lhes negar fazia ou na ânsia de alguns professores de deter para
informações e lhes instigar um espírito de si o conhecimento como fonte de poder, o ensino
competição excessiva. massifica, tolhe a iniciativa, deixa de desafiar e
estimular o estudante.
Aberto às inovações, esse professor será realmente
pesquisador e colaborador em pesquisas e projetos; Quando o jovem necessita de algum tipo de
fará do ensino um processo de insatisfação iniciação em um mundo incerto, o que lhe
produtiva; não será contrário à análise e à avaliação fornecemos são os ossos do cemitério da cultura.
de sua atuação, encarando-as como maneiras de Quando necessita fazer alguma coisa concreta,
acompanhar seu crescimento; e contrariando a fama nós lhe damos uma tarefa abstrata, lacunas a
de que, coletivamente, os corpos docentes são serem preenchidas com respostas ‘corretas’,
refratários à mudanças, não será arrastado pela múltiplas escolhas para verificar se pode
corrente de inovações, mas estará na vanguarda, escolher a resposta certa. Quando necessita
abrindo caminhos. encontrar significado, as escolas exigem dele
memorização. (FERGUSON, 1992, p. 269).
Prática pedagógica: novos caminhos
Quando não se encaixa em algum modelo ou não
possui utilidade imediata, grande parte da Como levar o ensino formal à realidade do mundo
informação que recebemos é mero ruído. Saber da do estudante? Talvez o que as escolas possam fazer
existência de determinadas informações e onde seja extrair o conhecimento que está sendo adquirido
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e contemplar outras experiências, reavaliando o na construção de novos conhecimentos,


ensino sob uma ótica onde o aluno seja muito mais incentivando a leitura, o diálogo, a discussão e o
competente pela maneira particular com que debate, favorecendo a integração dos componentes
processa a informação, identifica variáveis e dá uma do grupo e promovendo o estabelecimento de
resposta adequada. comparações, inferências e relações.

Quando a instrumentalização técnica deixar de O envolvimento dos alunos com a busca de


ocupar grande parte do espaço dos currículos, talvez informação pode ajudá-los a recuperar a curiosidade
então se passe a escrever, discutir, debater, para que natural e o prazer pelos conhecimentos, pela
o aluno tenha uma posição mais crítica da realidade, autodescoberta, levando-os a situar-se diante da
não seja um mero fazedor de coisas mas o intérprete informação a partir de suas próprias possibilidades e
das coisas. Deixar para o futuro? É preciso alcançar recursos, a adquirir consciência da responsabilidade
essa dimensão e, alcançando-a, mudar o panorama por sua própria aprendizagem. A participação do
de ensino. professor no duplo papel de orientador e de parceiro
da aprendizagem é fundamental, já que o hábito
Nas universidades, a necessidade mais evidente é gerado pelas práticas pedagógicas reprodutivas de
mudar a ênfase da instrução, de transmitir esperar soluções prontas tolhe a iniciativa dos
acervos fixos de informação para formar alunos, muitas vezes padronizando e massificando as
estudantes para se empenharem numa contínua soluções por eles geradas.
aquisição de conhecimentos e saber. Em termos
de matéria de estudo, essa mudança implica uma Adquirir o sentido de globalidade de um projeto
ênfase maior no aprendizado de métodos passa também pelo planejamento do tempo e das
fundamentais de indagação intelectual, de atividades a serem realizadas. O estabelecimento de
discurso e domínio da linguagem básica - seja de um cronograma de atividades costuma gerar um
idiomas estrangeiros ou linguagem de certo desconforto nos alunos - e mesmo no
computador, seja de raciocínio quantitativo - que professor, que freqüentemente impõe seu próprio
proporciona acesso a significativas massa de modelo - que vêem ali apenas etapas pouco
conhecimentos. (BOK, 1988, p. 192). significativas (“para quê fazer isto?”) a serem
cumpridas em prazos que sua pouca experiência não
permite avaliar (“quanto tempo será que eu levo para
No ensino de design vê-se no aluno uma grande fazer isto?”). Esse planejamento pode se transformar
dificuldade para vislumbrar o resultado final e em instrumento de auto avaliação e motivação ao
perceber a totalidade de um projeto. É freqüente o estabelecer etapas que, cumpridas, revelam não só o
pedido ao professor para que “mostre um projeto desenvolvimento do projeto, mas também o de seu
pronto”, já que a seqüência de etapas a serem executor. As etapas e o tempo para realizá-las
cumpridas até o alcance do objetivo final não parece podem ser estabelecidos pelo próprio grupo de
fazer sentido. alunos, desde que lhes sejam dadas condições e
informações para tanto.
Aprender fazendo tem sido uma das características
do ensino de projeto de design; mas a reflexão sobre Novamente cabe ao professor auxiliá-los no resgate
o tema antecede a ação. O procedimento comumente dos conhecimentos anteriores e na busca de novas
observado prevê que, dado o tema, inicia-se o informações, para que necessidade de execução de
trabalho pela busca de informações em torno do determinadas as etapas adquira significado e, desta
problema do qual se ocupa o projeto. Nesta fase, que forma, os alunos sejam capazes de estabelecer um
permite ao aluno adquirir novos conhecimentos, vê- método de trabalho próprio.
se a necessidade cada vez maior de reforçar a
consciência de aprender do grupo. A busca de É comum que, após algumas semanas, os alunos
informações - seja através de livros, periódicos, estejam “enjoados” de executar uma mesma
objetos, entrevistas, conferências, visitas a museus, proposta e se sintam desmotivados a continuar. Em
exposições - representa o complemento e a todas as fase do projeto, a integração do grupo, a
ampliação das informações apresentadas pelo ventilação de idéias, a troca de informações, a
professor. O tratamento das informações obtidas comparação de resultados, podem enriquecer e
deve ser um processo não só individual, mas se auxiliar na solução de problemas, colaborando para
estabelecer coletivamente. Para tanto, cabe ao a manutenção da motivação. A necessidade de
professor oferecer condições à participação de todos realimentação do processo projetual com
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informações também pode servir como motivo para projetar sistemas visuais e a considerar o produto de
a execução de pequenos projetos visuais - como seu trabalho em relação a fatores tecnológicos,
painéis, cartazes, folhetos explicativos - que levem o produtivos, utilitários, mercadológicos,
aluno a se utilizar de conhecimentos e conceitos de comunicacionais e psicológicos, procurando
outras disciplinas - artes gráficas, semiótica, antecipar necessidades e desejos dos usuários e
psicologia, noções de marketing - e estimulem sua visualizar a orientação quanto a novos caminhos a
criatividade. serem percorridos. O trabalho desse profissional
deve se apoiar em pesquisas atualizadas e em
Ao final do projeto, a apresentação dos resultados projeções para o futuro. Para fazer face a este perfil,
acompanhada do relato das dificuldades e da forma deve buscar nas ciências sociais e comportamentais -
de superação das mesmas, dos aspectos positivos e como sociologia, psicologia, filosofia - a base
negativos encontrados, pode promover uma nova teórica para seus projetos.
reflexão do grupo, encaminhando-o para a auto
avaliação de seus procedimentos metodológicos. Por meio de disciplinas de prática projetual os
alunos precisam praticar uma forma de realização de
Preparar os alunos para a aprendizagem contínua, projetos na qual os enfoques teóricos e subjetivos
dando margem ao pensamento independente: os tenham lugar, onde se realize uma apropriação
recursos educativos podem ser aplicados de forma a contextual e conceitual do tema. A prática projetual
atender o indivíduo ao longo de sua vida, ensinando- precisa ser realmente natural ao designer, intrínseca
o a aprender através do questionamento, da crítica, à sua atividade, não mera repetição de passos.
da busca de soluções adequadas. “No futuro [...] os
estudantes precisarão aprender a conviver com a Não existe apenas um caminho para a resolução de
mudança rápida, abrupta e até mesmo ameaçadora. um problema: é preciso incentivar o surgimento de
O aprendizado será correlativo à vida, uma possibilidades de solução. Para tanto, não serão
emocionante aventura intelectual, para a qual os apenas os aspectos objetivos e sistemáticos a serem
estudantes terão de estar explicitamente preparados”. valorizados, mas os críticos, analíticos, téoricos,
(HESBURGH, 1979, p. 154). O fomento da subjetivos, cognitivos, culturais, comportamentais,
capacidade intelectual dos estudantes passa pela psicológicos, estéticos, éticos... Cabe ao professor,
revisão de conteúdos - que devem ser pertinentes e como orientador, possibilitar ao aluno o
de qualidade - e pela aplicação de métodos desenvolvimento da reflexão.
pedagógicos que privilegiem a criatividade docente
e discente. Mas cabe à universidade dar essa possibilidade ao
professor, oferecendo-lhe a oportunidade de refletir
Considerações finais sobre sua prática pedagógica diante do caráter
profissionalizante dos cursos e do perfil de
Dar aula de Design para mim é como trabalhar profissional que se pretende formar.
em Design, ou seja,
é buscar o melhor trabalho possível, O sistema universitário tem se prestado a produzir
é refletir sobre ele, profissionais de acordo com a orientação do
e é transmitir isso para os alunos. mercado, como uma indústria que oferece produtos
(REDIG, 1988, p. 105) para suprir necessidades econômicas. Durante a
graduação, os discentes especializam-se em tarefas
técnicas como forma de garantir o futuro sucesso,
As transformações no fazer e no ser do designer, prisioneiros de uma visão robotizada que acaba por
promovidas principalmente pela tecnologia que confirmá-los como produtos em transformação para
alterou a relação do homem com o mundo, foram o mercado.
trazidas à tona pelos entrevistados no reflexo de suas
práticas pedagógicas. A conclusão é pela valorização Para a universidade tem sido essencial o contato e a
do pensar, do construir, do analisar. A partir disso, interação com o setor produtivo, sem o que corre o
podem ser feitas ainda algumas considerações. risco de oferecer a seus alunos uma formação irreal,
quando não obsoleta, deixando de responder com
Se inicialmente o programador visual era um eficiência aos que procuram seus serviços como
profissional responsável por uma imagem gráfica formadora profissional. Entretanto, há que se
específica e que interferia praticamente apenas nos considerar, também, que a formação profissional não
aspectos produtivos, paulatinamente ele passou a deve ser a única meta da universidade. Em um
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mundo em que a substituição do trabalho humano soluções encontradas por esse grupos seja discutida
pela máquina aumenta rapidamente, gerando um amplamente.
grande número de desempregados, o profissional
altamente especializado corre o risco de não se
adaptar. O novo tempo pede profissionais capazes de Bibliografia
se ajustarem às contínuas transformações
(tecnológicas, científicas, filosóficas e sociais), BOK, D.. Ensino superior. Rio de Janeiro: Forense-
flexíveis, com iniciativa, amplo conhecimento e com Universitária, 1988.
disposição para o trabalho em grupo, onde várias
pessoas de diferentes áreas se aliam na busca de BOMFIM, Gustavo Amarante. Metodologia para
soluções. desenvolvimento de projetos. João Pessoa:
Universitária/UFPB, 1995.
É interessante perceber o quanto este perfil
profissional tem em comum com o design, campo de BONSIEPE, Gui (coord.). Metodologia
atuação essencialmente interdisciplinar, já que experimental: desenho industrial. Brasília:
emprega meios de expressão e conhecimentos de CNPq, 1984.
diversas áreas. A interdisciplinaridade 2 poderia ser
uma realidade nos cursos de design por sua BÜRDEK, Bernhard E.. Diseño: história, teoria y
afinidade com a prática projetual, que implica na practica del diseño industrial. Barcelona:
busca de conhecimentos das mais diversas áreas. Gustavo Gili, 1994.
Entretanto, o que se identifica no ensino de desenho
CARDOSO, Clodoaldo M.. A canção da inteireza:
industrial são práticas pluridisciplinares 3, que
uma visão holistica da educação. São Paulo:
acontecem mais por casualidade ou por afinidade
Summus, 1995.
entre professores do que por orientação pedagógica
dos cursos e instituições.
DUAILIBI, R. ; SIMMONSEN, H.. Criatividade: a
formulação de alternativas em marketing. São
A prática projetual não é um fim em si mesma, mas
Paulo: Mcgraw-Hill do Brasil, 1971.
uma atividade-meio para a formação de designer.
Tampouco as demais disciplinas que concorrem para
FAZENDA, Ivani C A.. Interdisciplinaridade, um
esta formação são estanques: os conhecimentos
projeto em parceria. São Paulo: Loyola, 1993.
adquiridos por meio delas igualmente devem
provocar reflexões, análises, estimular a curiosidade ___________________. Integração e
e a busca pelo novo. A interação e integração entre interdisciplinaridade no ensino brasileiro,
disciplinas poderia promover uma visão do efetividade ou ideologia. São Paulo: Loyola,
conhecimento como um todo, em que as partes 1979.
componentes seriam tão significativas quanto a
própria totalidade, participando da formação de um FERGUSON, Marilyn. A conspiração aquariana.
profissional mais preparado para enfrentar desafios e Rio de Janeiro: Record, 1992.
transformações.
FONSECA, Suzana V.. O impacto da
A universidade é o local apropriado para a formação informatização no design gráfico: novas
diversificada que se exige daqui para o futuro. Como tendências no processo dos objetos gráficos a
realizá-la é uma questão que tem sido feita diante de partir da introdução do computador. Rio de
situações distintas e por grupos distintos, sem que a Janeiro, 1996. Dissertação (Mestrado em
necessária explanação das dificuldades e união das Design)- PUC RJ.
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“...interação existente entre duas ou mais disciplinas. HESBURGH, T.. A relevância dos valores no
Essa interação pode ir da simples comunicação de idéias à ensino superior. Brasília: UnB, 1979.
interação mútua dos conceitos diretores da epistemologia,
da terminologia, da metodologia, dos procedimentos, dos LESSA, Washington D.. A informatização do
dados da organização referentes ao ensino e à pesquisa”. elemento gráfico. Design e Interiores, São Paulo,
(FAZENDA, 1979, p.27).
3 n. 33, ano 6, p. 79-80, 1993.
“Encontro de duas ou mais disciplinas, com objetivos
múltiplos, com certa relação entre si, com certa
cooperação, mas sem coordenação dessas relações”. LUCKESI, Cipriano C.. Filosofia da educação. São
(FAZENDA, 1993, p. 31). Paulo: Cortez, 1994.
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