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INTRODUÇÃO

No âmbito da unidade curricular problemáticas sociais contemporâneas, foi-nos proposto a


realização de um trabalho acerca do estudo “Faces da Pobreza em Portugal” (2021), feito
pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. Estudo esse que procura dar um rosto à
pobreza em Portugal, que normalmente é encarada apenas como números estatísticos.

Ao decorrer do trabalho iremos referir os perfis de pobres em Portugal, suas características


em comum, bem como suas especificidades. Permitindo aumentar a “lente” sobre as
questões inerentes à pobreza, contribuindo para uma compreensão holística, e romper os
estigmas relativos a este fenômeno tão complexo.

CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO

O estudo “Faces da Pobreza em Portugal”, realizado pela Fundação Francisco Manuel dos
Santos, busca identificar os perfis de pobreza existentes em Portugal, desde logo essa
tarefa assume-se complexa, dado a amplitude e diversidade deste fenômeno. Podemos
considerá-lo acima de tudo, como um estudo inovador, e que tal como Carlos Farinha
Rodrigues diz, “procura dar um rosto às pessoas que aparecem nas estatísticas”. Também
percecionamos a valorização da ótica quantitativa, tanto como a qualitativa, podemos ver
seu diferencial na busca pelas pessoas as quais seriam entrevistadas, que não foi através
do meio mais comum: recorrer às instituições de apoio social, essa forma de procura pode
ser usual e eficaz, mas nem por isso consegue abranger a extensão dos diversos perfis de
pobreza em Portugal. Deste modo, foram utilizados dados do Instituto Nacional de
Estatística (INE), como forma de analisar estatisticamente e definir perfis, conjuntamente
com base nos dados do Inquérito às condições de vida e rendimento (IGOR) para identificar
os perfis de pobreza nos indivíduos adultos, e apesar da infância não ser diretamente
estudada, ela foi retratada com base na referência de infância dos inquiridos e dos seus
filhos. Para que a diversidade fosse garantida, o estudo foi realizado em diversas
localidades, desde cidades grandes, até pequenas aldeias, no litoral e no interior, em
Portugal continental e nas ilhas. Realizado ao todo 87 entrevistas, podemos perceber a
diversidade das situações de pobreza, que se situam abaixo do limiar de pobreza, alertando
que esse estudo não representa estatisticamente a população em pobreza, mas sim
pessoas, que não devem ser encaradas apenas como meros números.
CONTEXTUALIZAÇÃO

Quando analisamos a pobreza em Portugal, percebemos que todos os anos ela atinge um
grande número de pessoas, os dados analisados são de 2003 a 2018, entre essas datas
um quinto da população portuguesa, encontrou-se em situação de pobreza. O que podemos
esperar dos próximos anos, é que a pandemia tenha impactos nesses números.

Ao analisarmos a pobreza de 2003 a 2018, temos que ter em conta três subperíodos, sendo
estes de 2003 a 2009, onde verificou-se uma diminuição gradual, porém não contínua da
taxa de pobreza, entre 2009 e 2014 vemos o impacto sociais da crise econômica, que
anulou a generalidade dos ganhos do ano anterior, entre 2014 e 2018 observa-se a
diminuição da taxa de pobreza, no entanto, apenas em 2017 voltamos a ter os valores
anteriores a crise.

Entre 2003 e 2018 podemos verificar como evoluiu a taxa de pobreza, maioritariamente em
dois grupos, o primeiro é entre as crianças e jovens, que é persistentemente mais elevada
do que a taxa global de pobreza, o segundo grupo é o dos idosos, que passou de um valor
bastante acima da taxa global, para um valor abaixo desta, somente entre os anos de 2014
e 2018, que vemos uma aproximação da taxa dos idosos e a taxa global.

Com base nos dados da ICOR identificamos quatro tipos de perfis de pobreza em Portugal,
sendo esses os desempregados, precários, reformados e os trabalhadores, que vão ser
caracterizados ao longo do texto.

Quando analisamos a pobreza, um dos fatores relevantes é a empregabilidade, este


demonstrou-se ser bastante diverso nos diversos perfis analisados durante o estudo.
Podemos verificar que a maior taxa de pobreza é encontrada no grupo dos desempregados,
em 2018 quase metade da população em desemprego se encontrava se situava na taxa de
pobreza, o segundo grupo mais afetado são as pessoas inativas (pessoas com mais de 18
anos que não são reformadas), o terceiro grupo mais afetado são os reformados, e por
último os empregados, constasse que 11% das pessoas em situação de pobreza são
empregados, isso levanta-nos questões relevantes, já que o senso comum, aponta muita
das vezes, que basta ter um emprego, que não teremos pessoas em situação de pobreza,
algo que tal como as estatísticas provam, é um mito. É importante ressaltar, que esses 11%
representam as pessoas abaixo do limiar de pobreza, quando abrangemos toda a
população maior de 18 anos, a porcentagem sobe para 32% de empregados que se
encontram pobres.

Outro fator relevante no estudo da pobreza é a influência que o agregado familiar possui
nas situações de pobreza, onde vemos que nos agregados com mais crianças é onde a
pobreza mais existe, as famílias monoparentais também são muito afetadas e por último
temos as famílias com dois adultos e três ou mais crianças. Em 2018 um terço desses tipos
de agregados, encontravam-se em situação de pobreza. De acordo com os dados, relativos
a 2017, os agregados cujo a principal fonte de rendimento correspondia a “outras
transferências sociais” corriam mais risco de se encontrarem em pobreza.

Quanto ao indivíduo de referência, ou seja, aquele que mais contribuem para o rendimento
do agregado familiar, as características associadas aos indivíduos mais atingidos, são os
trabalhadores agrícolas, da pesca e floresta. E com números mais reduzidos temos os
desempregados, inativos ou trabalhadores não qualificados.

Aquilo que podemos tirar de conclusão sobre a pobreza em Portugal, é que ao mesmo
tempo que é UNA, por incluir indivíduos que se encontram na mesma condição
socioeconômica, ela também é diversa dado a singularidade de contextos e realidades. Ou
seja, estamos perante um grupo classificados como pobres, constituem uma categoria
social específica, meramente estatístico, devido a sua diversidade e falta de pcoesão, já
que não existem regras de entrada ou funcionamento, muito menos sentimento de pertença
neste grupo de pessoas classificadas como pobres, na realidade vemos que elas “não
constituem uma classe para si”. (Palos et al., 2021)

TRABALHO, IDENTIDADE E DOENÇAS

Quando falamos da identidade dessas pessoas, verificamos como o trabalho e o emprego


que elas possuem, é um fator muito relevante, aquilo que observamos é que muitos tem
dificuldade em atribuir nome a profissão da qual fazem parte, normalmente vemos isso
naqueles que praticam atividades no meio rural, em alguns casos a desqualificação das
atividades executadas é tão grande que não consideram-se trabalhadores.

Outro aspeto relevante é o papel que a doença tem na formação da identidade, alguns
consideram-se mais doentes do que trabalhadores, e que a doença assume um papel
central principalmente na vida do perfil dos reformados e dos desempregados. Vemos que
nos outros perfis a doença não assume um papel central, mas quando surge no perfil dos
trabalhadores, é utilizada como forma de valorizar a “garra” e os esforços que fazem pelo
trabalho.

Ao falar em doença temos que compreender que esta limita exercer atividades laborais, e
que ao diminuir o exercício laboral, temos a diminuição dos rendimentos, afetando todo o
agregado familiar que depende desses rendimentos. Quando a doença atinge o principal
provedor da casa, ou quando a doença obriga algum outro membro do agregado a assumir
o papel de cuidador, afeta ainda mais o rendimento familiar.

Analisando os perfis, vemos que a maioria deles muito cedo estabeleceram relação com o
mercado de trabalho, no entanto nem sempre isso significou gosto por aquilo que
executavam, na verdade, quando questionados, percebemos que a maioria deles possui o
sentimento de desgosto pela sua trajetória de empregos, isso deve-se a fatores como a
penosidade, os baixos salários e as relações com os colegas de trabalho. Alguns
posicionam-se numa linha intermediária, na medida em que gostam do trabalho, mas devido
a conformidade com o mesmo, ou seja, trabalhasse porque é isto que deve ser feito.
Entrevistando os mais novos, vemos que o trabalho é orientado pelo dever e necessidade,
não pelo gosto e realização pessoal. Poucos casos realmente expressam gosto e realização
pelo trabalho que realizavam.

Por último, na entrevista, não foi levantada nenhuma questão acerca da imigração, no
entanto as questões inerentes a esta foi bastante abordada pelos inquiridos, enumeramos
as três questões abordadas por eles: alguns já emigraram durante sua trajetória de vida,
outros possuem familiares emigrados e alguns tem o sonho de emigrar, notamos que a
emigração é percecionada por estes como uma forma de fugir à pobreza, no entanto a
realidade que vemos é outra.

RELAÇÃO COM OS SISTEMAS DE PROTEÇÃO

A relação dos inquiridos com os sistemas de proteção na maioria dos casos é negativa,
alguma minoria faz elogios sobre o mesmo, no entanto é de ressaltar que nem todos lidam
com esses serviços de apoio. Quanto às críticas, normalmente apontam a insuficiência dos
apoios, o escrutínio para acederem aos mesmos, que muita das vezes invade a
privacidade, dignidade e autonomia dos mesmos, dado essa invasão de privacidade, muitos
recusaram os apoios pela vergonha e pela exposição exacerbada, e outros que apesar de
acederem aos apoios, o fazem com muita vergonha.

Outra forma de apoio desligada do estado é o que aqui denominamos de


"família-providencia", esse termo surge em oposição ao "estado-providência", é sobretudo
uma forma de apoio intrafamiliar, complementando os apoios estatais, situação que é
bastante comum em todos os perfis analisados, tanto no papel de recetor, quanto no de
provedor.

Ter estes apoios sociais representa apenas valores orientados para a sobrevivência diária,
em nenhum momento são apoios que permitam que essas pessoas saiam dessa situação
de pobreza, mas sim que elas consigam ter o mínimo todos os dias, ou na maior parte dos
dias. Muitas das vezes, nem todos acedem a esses apoios dado a inelegibilidade a eles,
notamos isso no grupo dos desempregados, que muitas das vezes trabalhavam
informalmente, e por isso não tinham acesso a apoios destinados a desempregados. Outro
apoio social que alguns deles não acedem é o Rendimento Social de Inserção (RSI), que
por não estarem abaixo do limiar definido, não lhes é atribuído.

Quando os inquiridos são questionados sobre se consideram ou não que são pobres,
muitos deles dizem que não, comparando-se com pessoas em situações mais alarmantes
que a deles, relativizando ou comparando com seu passado. Relativizar as situações
funcionam muitas vezes como um mecanismo para que existam menos impactos a nível
emocional, associados à posição social em que se encontram. No entanto, todos
consideram que seus rendimentos não são adequados às suas necessidades, e que muita
das vezes pequenas quantias como 20 ou 30 euros pode ajudar bastante nos rendimentos
que possuem.

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