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Resumo: A teoria crítica do controle social elaborada por Castro tem como função principal desmascarar
a ideologia presente nos sistemas de dominação latino-americanos, sobretudo no Direito Penal.
Todavia, pode a teoria crítica ter a pretensão de combater a ideologia presente no discurso jurídico-
penal, sem a própria teoria vir a conter uma carga ideológica? O objetivo geral da pesquisa é debater
um alinhamento entre a teoria de Castro, a hermenêutica das ideologias de Ricœur e a filosofia da
libertação de Dussel. Por sua vez, os objetivos específicos são investigar se a teoria de Castro possui
carga ideológica, a partir das advertências de Ricœur, assim como cotejar as bases filosóficas da
teoria crítica de Castro e o pensamento de Dussel, perquirindo se a teoria crítica possui uma filosofia
genuinamente libertadora. A pesquisa se justifica pelos resultados insatisfatórios apresentados por
teorias criminológicas alegadamente assépticas, e, para a realização de seus objetivos, emprega o
método dedutivo, por meio da revisão bibliográfica das obras dos autores citados, a fim de realizar uma
releitura da criminologia da libertação de Castro. As hipóteses do trabalho são a presença de conteúdo
ideológico na teoria de Castro e de colonialismo na base filosófica da teoria crítica.
Palavras-chave: Teoria crítica. Ideologia. Hermenêutica. Criminologia da libertação. Colonialismo.
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Elaborada por Lola Aniyar de Castro (2005, p. 65), a teoria crítica do controle
social visa à quebra da ideologia que construiu uma falsa consciência do crime
e do criminoso, desvelando, sobretudo na realidade latino-americana, as formas
ocultas de dominação. Castro (2005, p. 49) aplica o termo ideologia não em sua
concepção de projeto político, mas na sua acepção de falsa consciência, ocultadora
da realidade.
A teoria consiste na crítica à ideologia do controle social, tendo como função
principal desmascarar todo tipo de legitimação ideológica presente nos sistemas
de dominação, sobretudo na dogmática penal. Afinal, sempre se soube que o
discurso jurídico-penal latino-americano é falso (ZAFFARONI, 2001, p. 14), serve de
instrumento para aprofundar as diferenças sociais e justifica a intervenção punitiva
oficial em auxílio a privilégios minoritários (CASTRO, 2005, p. 33).
A criminologia de Castro (2005, p. 58) deita raízes no materialismo histórico
de Marx, responsável por fazer uma interpretação materialista do desenvolvimento
histórico da humanidade, entendendo-o como o resultado do enfrentamento de
interesses contrários. Marx busca desvelar o caráter ideológico que apresenta a
engrenagem capitalista como invocação dos ideais burgueses, para mostrar que
essa sistemática somente funciona sob pressupostos de violência e dominação.
Especialmente na América Latina, Castro analisa em detalhes o controle
social exercido pela centralidade em desfavor da periferia do poder. As relações
de produção baseadas na exploração do homem e geradoras de analfabetismo,
mortalidade infantil e grandes massas de marginalizados, são, entre outros, os
meios úteis com que se mantém a submissão, se fortalece o poder de uma classe
e através do qual o capital transnacional obtém elevados lucros (CASTRO, 2005,
p. 33).
Os representantes da criminologia crítica partem de um enfoque materialista
e estão convencidos de que só uma análise dos mecanismos e das funções reais
do sistema penal, no capitalismo contemporâneo, pode permitir uma política
criminal das classes atualmente subordinadas (BARATTA, 2004, p. 209). Com uma
criminologia entendida e praticada dessa maneira, a teoria crítica do controle social
almeja proceder à denúncia da estrutura do controle social atual na América Latina,
desnudando o seu caráter legitimador e apresentando às classes subalternas um
discurso transparente que estimule a consciência de classe e uma compreensão
das verdadeiras condutas dissonantes (CASTRO, 2005, p. 64).
Baratta (2004, p. 210), o criminólogo europeu mais influente na criminologia
latino-americana de vanguarda (CASTRO, 2005, p. 38), isto é, entre os anos 70-80
do século XX, denunciou que mais de 80% (oitenta por cento) dos delitos perseguidos
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nos países de capitalismo avançado são delitos contra a propriedade. Para ele, é
natural que as classes desfavorecidas desse sistema de distribuição de riqueza
estejam mais particularmente expostas a esse processo de criminalização fundado
no dinheiro. A dogmática jurídico-penal é incapaz de visualizar tais desigualdades.
Muito em razão disso, Baratta (2006, p. 169) já falava de um direito desigual. A
crítica mostra que o Direito Penal não é menos desigual que qualquer outro ramo
do Direito burguês: em verdade, é o direito desigual por excelência (BARATTA,
2006, p. 169). A esse respeito, eis um atual dado estatístico brasileiro, em recente
levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2017, p. 14):
Imagem 1
Percentual de presos provisórios por tipo de crime praticado
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Segundo Leal (2017, p. 46), o controle protagonizado pelo sistema penal assume
formas nitidamente políticas, por ser resultado das necessidades do modo de
produção da vida social moderna e burguesa.
Tamanha a força do capital transnacional e a sua proteção estatal no Brasil,
especialmente via processos de criminalização primária (legislativa), se uma pessoa
meramente vender a outrem um automóvel alienado fiduciariamente em garantia,1
ainda que a este comunique a existência de alienação fiduciária, ficará, em tese,
sujeita à pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa, caso não obtenha a
anuência do banco garantidor do bem móvel. Trata-se do crime instituído pelo
artigo 55 da Lei Federal nº 10.931/2004 (BRASIL, 2004), que incluiu o artigo
66-B, §2º, na Lei Federal nº 4.728/1965 (BRASIL, 1965).2 Hoje, com o advento
da mencionada Lei Federal nº 10.931/2004, tal negócio jurídico conta com uma
proteção estatal tamanha que uma pessoa pode ser presa em flagrante delito por
vender a terceiro, sem o conhecimento da instituição financeira garantidora, um
veículo alienado fiduciariamente.3
Portanto, os processos de criminalização são o norte da teoria crítica do
controle social. Todavia, como afirma Lola Aniyar de Castro (2005, p. 64), não se
deve ficar na simples denúncia – embora, para Novoa Monreal (1985, p. 31), ao
sair da denúncia para propor soluções práticas, a criminologia possa ficar sem
um chão epistemológico. Castro (1986, p. 39) responde a Novoa Monreal no
artigo El jardín de al lado, afirmando, categoricamente, que todo conhecimento
é prático e deve regressar ao mundo da práxis, de modo que a ciência não pode
estar desvinculada da luta social. Para Castro (2005, p. 66), a teoria do controle
social deve, inclusive na prática, isto é, num nível político, desmascarar todo tipo
1
A alienação fiduciária surge em 1965 como um instrumento de garantia destinado a permitir a difusão do
crédito direto ao consumidor, podendo figurar como credor apenas as instituições financeiras registradas
perante o Banco Central do Brasil. A aplicação mais comum do negócio jurídico acima ocorre na venda e
compra de veículos, mercado interessante e lucrativo a um sem-número de grupos econômicos.
2
Eis a redação do dispositivo legal em comento: Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no
âmbito do mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários,
deverá conter, além dos requisitos definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil,
a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver, e as demais comissões e
encargos. [...] §2º O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara fiduciaria-
mente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, §2º, I, do Código Penal.
3
Por força do artigo 33, §2º, do Código Penal brasileiro (BRASIL, 1940), eventual condenação criminal
pode levar essa pessoa a cumprir a sua reprimenda nas casas penais brasileiras. Pior: a sua liberdade
será constrangida antes do seu patrimônio, pois, no Brasil, a atual maioria dos ministros do Supremo
Tribunal Federal entende, desde 2016, após o julgamento do habeas corpus (HC) nº 126.292/SP (BRASIL,
2016b), que a pena privativa de liberdade pode ser executada antecipadamente, logo após condenação
ratificada em segunda instância, mesmo que sujeita a recurso – ao contrário da pena de multa (e também
da pena de prestação pecuniária), que depende do trânsito em julgado. A seletividade penal fundada no
dinheiro, no grande capital, no poder político (sobretudo pela criminalização primária), não poderia ser
mais evidente.
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Dussel reconhece em Ricœur uma filosofia de embasamento ético e político, mas nela aponta uma incom-
pletude: sua inaplicabilidade para o enfrentamento assimétrico entre várias culturas, uma dominante e
outras dominadas, a exemplo da destruição do mundo ameríndio pela conquista em nome do cristianismo
(DUSSEL, 1993, p. 140).
5
A preferência pelo termo “decolonial”, e não “descolonial” – suprimindo, portanto, o “s” –, busca marcar
uma distinção com o significado clássico de “descolonizar”. Quer salientar que, ao invés de meramente
desfazer o “colonial” ou revertê-lo, a visada consiste em superar o momento colonial, a face oculta da
Modernidade, numa atitude pós-colonial, portanto. Tal marca distintiva, contudo, não é unânime no meio
acadêmico-científico, daí a necessidade do presente esclarecimento terminológico, que, de modo algum,
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A ideologia opera atrás de nós, mais do que a possuímos como um tema diante
de nossos olhos, e é a partir dela que pensamos, mais do que podemos pensar
sobre ela (RICœUR, 1990, p. 70). O que a hermenêutica trata de trazer à luz não é
inicialmente o sentido do texto, mas o esclarecimento crítico de um entendimento
que o precede, justamente porque não existe tabula rasa do entendimento, ou seja,
há algo que lhe é anterior (GRONDIN, 2012, p. 48-50).
Gadamer critica fortemente o positivismo científico imposto às ciências humanas,
a suposta capacidade destas de descobrir a verdade operando uma fantasiosa e
fictícia exclusão dos pré-juízos do entendimento, em nome de uma concepção
de objetividade, herdada das ciências exatas no contexto histórico da Ilustração
(GRONDIN, 2012, p. 48-50). O filósofo alemão enxerga nos pré-juízos sobretudo
condições de entendimento. Não na forma de uma abertura ao subjetivismo ou ao
preconceito. Em verdade, para o autor, a interpretação deve a todo instante realizar
um exame crítico de seus pré-juízos, por meio do chamado “processo de revisão
constante”, precavendo-se contra o arbitrário dos preconceitos, distinguindo-se,
assim, os pré-juízos legítimos, aqueles que tornam possível o entendimento, daqueles
que não são legítimos e que cabe à crítica superar (GRONDIN, 2012, p. 48-50).
A ideologia, contudo, não permite essa clareza e amplitude de visada. Ela é
responsável por operar um estreitamento do campo com referência às possibilidades
de interpretação (RICœUR, 1990, p. 71), o que o filósofo francês chama de “cegueira
ideológica”, isto é, um enclausuramento do campo interpretativo. É por isso que,
segundo Ricœur, a ideologia se exprime preferencialmente por slogans, de forma
semelhante, inclusive, à estratégia dos meios de comunicação para atrair leitores
e telespectadores a consumirem as manipuladas notícias da criminalidade, o
chamado “jornalismo verdade” (GOMES, 2014, p. 85).
tenta sobrepujar ou estigmatizar a expressão “descolonial”, mas, apenas, explicitar o porquê da preferên-
cia pela gramática “decolonial”.
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Jakobs refundou o conceito de inimigo, aportando sobretudo nos filósofos Platão, Hobbes, Rousseau e
Fichte. Para o jusfilósofo de Bonn, só seria pessoa quem oferecesse uma “garantia cognitiva suficiente
de um comportamento”, ou seja, o indivíduo capaz de transparecer um modo de vida seguro, ideal, sem
riscos para a sociedade. De forma oposta, seria inimigo o indivíduo que, por meio de seu comporta-
mento, sua ocupação profissional ou, principalmente, mediante sua vinculação a determinados grupos,
descumprisse o seu papel no contrato social, abandonasse definitivamente o Direito, causando medo e
insegurança.
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nunca está fixo no tempo, como as ciências matemáticas concebem. Existe uma
distância temporal entre o intérprete e o texto, um distanciamento histórico repleto
de efeitos da ação da história, uma verdadeira herança de acontecimentos, uma
tradição, viabilizados por um constante diálogo entre o passado e o presente,
capaz de distinguir os pré-juízos legítimos dos ilegítimos. Segundo o autor, todo
mundo conhece essa peculiar impotência de se julgar onde não dispomos de uma
distância temporal que nos forneça critérios seguros (GADAMER, 2012, p. 393).
Por terceiro, a ciência social jamais rompe seus vínculos, e insiste em cair
na ilusão de uma teoria crítica elevada ao nível de saber absoluto. É preciso notar
que esse interesse totalizante das teorias sociais funciona como uma ideologia,
buscando dominação material, manipulação aplicada às pessoas ou apropriação
de heranças culturais.
A quarta e última proposição de Ricœur consiste na meditação de que o
saber teórico-social está sempre em vias de se arrebatar à ideologia. Existe uma
pré-compreensão na qual a pessoa está lançada, e qualquer pretensão crítica será
apenas parcial, sem uma completa isenção do fundo ideológico.
Embora a teoria crítica do controle social proponha, política e epistemologi-
camente, mostrar um caminho criminológico viável para sinalizar à dogmática a
existência de ideologias na aplicação da lei penal, é preciso ressaltar, com apoio
na hermenêutica de Ricœur: a própria teoria crítica de Castro possui uma carga
ideológica, apropriando-se de pressupostos teóricos coloniais e eurocêntricos,
sobretudo, durante os processos de “importação cultural” na base do desenvolvi-
mento da criminologia crítica na América Latina nos anos 80 (SOZZO, 2002, p. 398).
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Imagem 2
Evolução da população de mulheres no sistema penitenciário (Infopen)
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4 Considerações finais
A teoria crítica do controle social de Lola Aniyar de Castro busca, acima de
tudo, analisar criticamente o funcionamento da estrutura de dominação oficial,
a saber, o sistema penal, revelando a carga ideológica presente no discurso
dogmático. Propostas aptas a mostrar à dogmática a existência de ideologias têm
a possibilidade de diminuir, em alguma medida, o recrudescimento da aplicação
da técnica jurídico-penal.
Contudo, a presente pesquisa considera que, na linha do pensamento de
P. Ricœur, as teorias sociais possuem, inarredavelmente, uma carga ideológica,
decorrente da impossibilidade de separar do pensador a totalidade de seus
condicionamentos, da sua pré-compreensão, cuja estrutura precede e comanda.
Assim, a pretensão da teoria crítica de Lola Aniyar em apontar ideologias na
dogmática penal carrega consigo, necessariamente, um conteúdo ideológico, pois
não há pensadores sem amarras, sem pertença, sem efeitos da história – Castro,
por exemplo, integrou movimentos sociais e exerceu cargos político-estatais por
vários anos.
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Lola Aniyar de Castro’s criminology of liberation and the contributions of Ricœur and Dussel
Abstract: The critical theory of social control elaborated by Castro has as main function to unmask
the ideology present in Latin American systems of domination, especially in criminal law. However, can
critical theory have the pretension of combating the ideology present in the criminal-legal discourse,
without the theory itself containing an ideological charge? The general objective of the research is to
discuss an alignment between Castro’s theory, Ricœur’s hermeneutics of ideologies and Dussel’s
philosophy of liberation. On the other hand, the specific objectives are to investigate if the theory of
Castro has ideological load, based on Ricœur’s warnings, as well as to compare the philosophical
bases of Castro’s critical theory and Dussel’s thinking, inquiring whether critical theory possesses a
genuinely liberating philosophy. The research is justified by the unsatisfactory results presented by
allegedly aseptic criminological theories and, in order to achieve its objectives, employs the deductive
method, through a bibliographical review of the authors works cited above, in order to re-read Castro’s
criminology of liberation. The hypotheses of the work are the presence of ideological content in Castro’s
theory and of colonialism on the philosophical basis of critical theory.
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