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A criminologia da libertação de Lola

Aniyar de Castro e as contribuições de


Ricœur e Dussel

Mauro Guilherme Messias dos Santos


Mestre em Direito pela Universidade Federal do Pará, pela qual, igualmente, graduou-se.
Especialista em Direito Processual Penal pela Uniderp. Professor visitante de Direito
Penal e de Direito Processual Penal nas especializações da Unifamaz e da Unama.
Professor de Direito Penal e de Direito Processual Penal na plataforma digital Qconcursos.
Associado à Associação Internacional de Criminologia de Língua Portuguesa. Promotor
de Justiça do Ministério Público do Estado do Pará, com atuação exclusiva na área
criminal. E-mail: mauromessias@mppa.mp.br.

Resumo: A teoria crítica do controle social elaborada por Castro tem como função principal desmascarar
a ideologia presente nos sistemas de dominação latino-americanos, sobretudo no Direito Penal.
Todavia, pode a teoria crítica ter a pretensão de combater a ideologia presente no discurso jurídico-
penal, sem a própria teoria vir a conter uma carga ideológica? O objetivo geral da pesquisa é debater
um alinhamento entre a teoria de Castro, a hermenêutica das ideologias de Ricœur e a filosofia da
libertação de Dussel. Por sua vez, os objetivos específicos são investigar se a teoria de Castro possui
carga ideológica, a partir das advertências de Ricœur, assim como cotejar as bases filosóficas da
teoria crítica de Castro e o pensamento de Dussel, perquirindo se a teoria crítica possui uma filosofia
genuinamente libertadora. A pesquisa se justifica pelos resultados insatisfatórios apresentados por
teorias criminológicas alegadamente assépticas, e, para a realização de seus objetivos, emprega o
método dedutivo, por meio da revisão bibliográfica das obras dos autores citados, a fim de realizar uma
releitura da criminologia da libertação de Castro. As hipóteses do trabalho são a presença de conteúdo
ideológico na teoria de Castro e de colonialismo na base filosófica da teoria crítica.
Palavras-chave: Teoria crítica. Ideologia. Hermenêutica. Criminologia da libertação. Colonialismo.

Sumário: 1 A teoria crítica do controle social – 2 A hermenêutica da crítica das ideologias – 3 A


necessidade filosófica, e não apenas política, de se escolher um lado – 4 Considerações
finais – Referências

1 A teoria crítica do controle social


Uma das estruturas que tem acompanhado a Modernidade desde o seu
nascimento, e, desde lá, produzido exclusão, dominação e violência, é a estrutura
oficial do controle social, ou seja, o sistema penal monopolizado pelo Estado (LEAL,
2017, p. 46). Contudo, na América Latina – que não constituiu a Modernidade, por
ser “inferior”, nas palavras de Hegel (DUSSEL, 1992, p. 15-17) –, o controle social
assumiu uma roupagem própria.

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Elaborada por Lola Aniyar de Castro (2005, p. 65), a teoria crítica do controle
social visa à quebra da ideologia que construiu uma falsa consciência do crime
e do criminoso, desvelando, sobretudo na realidade latino-americana, as formas
ocultas de dominação. Castro (2005, p. 49) aplica o termo ideologia não em sua
concepção de projeto político, mas na sua acepção de falsa consciência, ocultadora
da realidade.
A teoria consiste na crítica à ideologia do controle social, tendo como função
principal desmascarar todo tipo de legitimação ideológica presente nos sistemas
de dominação, sobretudo na dogmática penal. Afinal, sempre se soube que o
discurso jurídico-penal latino-americano é falso (ZAFFARONI, 2001, p. 14), serve de
instrumento para aprofundar as diferenças sociais e justifica a intervenção punitiva
oficial em auxílio a privilégios minoritários (CASTRO, 2005, p. 33).
A criminologia de Castro (2005, p. 58) deita raízes no materialismo histórico
de Marx, responsável por fazer uma interpretação materialista do desenvolvimento
histórico da humanidade, entendendo-o como o resultado do enfrentamento de
interesses contrários. Marx busca desvelar o caráter ideológico que apresenta a
engrenagem capitalista como invocação dos ideais burgueses, para mostrar que
essa sistemática somente funciona sob pressupostos de violência e dominação.
Especialmente na América Latina, Castro analisa em detalhes o controle
social exercido pela centralidade em desfavor da periferia do poder. As relações
de produção baseadas na exploração do homem e geradoras de analfabetismo,
mortalidade infantil e grandes massas de marginalizados, são, entre outros, os
meios úteis com que se mantém a submissão, se fortalece o poder de uma classe
e através do qual o capital transnacional obtém elevados lucros (CASTRO, 2005,
p. 33).
Os representantes da criminologia crítica partem de um enfoque materialista
e estão convencidos de que só uma análise dos mecanismos e das funções reais
do sistema penal, no capitalismo contemporâneo, pode permitir uma política
criminal das classes atualmente subordinadas (BARATTA, 2004, p. 209). Com uma
criminologia entendida e praticada dessa maneira, a teoria crítica do controle social
almeja proceder à denúncia da estrutura do controle social atual na América Latina,
desnudando o seu caráter legitimador e apresentando às classes subalternas um
discurso transparente que estimule a consciência de classe e uma compreensão
das verdadeiras condutas dissonantes (CASTRO, 2005, p. 64).
Baratta (2004, p. 210), o criminólogo europeu mais influente na criminologia
latino-americana de vanguarda (CASTRO, 2005, p. 38), isto é, entre os anos 70-80
do século XX, denunciou que mais de 80% (oitenta por cento) dos delitos perseguidos

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nos países de capitalismo avançado são delitos contra a propriedade. Para ele, é
natural que as classes desfavorecidas desse sistema de distribuição de riqueza
estejam mais particularmente expostas a esse processo de criminalização fundado
no dinheiro. A dogmática jurídico-penal é incapaz de visualizar tais desigualdades.
Muito em razão disso, Baratta (2006, p. 169) já falava de um direito desigual. A
crítica mostra que o Direito Penal não é menos desigual que qualquer outro ramo
do Direito burguês: em verdade, é o direito desigual por excelência (BARATTA,
2006, p. 169). A esse respeito, eis um atual dado estatístico brasileiro, em recente
levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2017, p. 14):

Imagem 1
Percentual de presos provisórios por tipo de crime praticado

A partir dos dados citados – os quais, é importante frisar, levam em consideração


apenas a taxonomia do Código Penal brasileiro (BRASIL, 1940) e da legislação
esparsa, ou seja, não abordam especificamente a realidade socioeconômica
envolvendo cada caso –, é correto concluir que, dentre os processos judiciais de
criminalização em andamento no país, aproximadamente 70% (setenta por cento)
são regidos por um enfoque eminentemente materialista (roubo, latrocínio, furto,
receptação, extorsão, estelionato e tráfico de drogas), encarcerando-se sobretudo
as classes economicamente subalternas.
Não é novidade alguma afirmar que o Direito Penal, especialmente no Brasil
ou na América Latina, serve de instrumento para justificar o controle social em
auxílio ou proteção não só a detentores de capital, mas, também, de poder político.

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Segundo Leal (2017, p. 46), o controle protagonizado pelo sistema penal assume
formas nitidamente políticas, por ser resultado das necessidades do modo de
produção da vida social moderna e burguesa.
Tamanha a força do capital transnacional e a sua proteção estatal no Brasil,
especialmente via processos de criminalização primária (legislativa), se uma pessoa
meramente vender a outrem um automóvel alienado fiduciariamente em garantia,1
ainda que a este comunique a existência de alienação fiduciária, ficará, em tese,
sujeita à pena de reclusão, de um a cinco anos, e multa, caso não obtenha a
anuência do banco garantidor do bem móvel. Trata-se do crime instituído pelo
artigo 55 da Lei Federal nº 10.931/2004 (BRASIL, 2004), que incluiu o artigo
66-B, §2º, na Lei Federal nº 4.728/1965 (BRASIL, 1965).2 Hoje, com o advento
da mencionada Lei Federal nº 10.931/2004, tal negócio jurídico conta com uma
proteção estatal tamanha que uma pessoa pode ser presa em flagrante delito por
vender a terceiro, sem o conhecimento da instituição financeira garantidora, um
veículo alienado fiduciariamente.3
Portanto, os processos de criminalização são o norte da teoria crítica do
controle social. Todavia, como afirma Lola Aniyar de Castro (2005, p. 64), não se
deve ficar na simples denúncia – embora, para Novoa Monreal (1985, p. 31), ao
sair da denúncia para propor soluções práticas, a criminologia possa ficar sem
um chão epistemológico. Castro (1986, p. 39) responde a Novoa Monreal no
artigo El jardín de al lado, afirmando, categoricamente, que todo conhecimento
é prático e deve regressar ao mundo da práxis, de modo que a ciência não pode
estar desvinculada da luta social. Para Castro (2005, p. 66), a teoria do controle
social deve, inclusive na prática, isto é, num nível político, desmascarar todo tipo

1
A alienação fiduciária surge em 1965 como um instrumento de garantia destinado a permitir a difusão do
crédito direto ao consumidor, podendo figurar como credor apenas as instituições financeiras registradas
perante o Banco Central do Brasil. A aplicação mais comum do negócio jurídico acima ocorre na venda e
compra de veículos, mercado interessante e lucrativo a um sem-número de grupos econômicos.
2
Eis a redação do dispositivo legal em comento: Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no
âmbito do mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários,
deverá conter, além dos requisitos definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil,
a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver, e as demais comissões e
encargos. [...] §2º O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara fiduciaria-
mente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, §2º, I, do Código Penal.
3
Por força do artigo 33, §2º, do Código Penal brasileiro (BRASIL, 1940), eventual condenação criminal
pode levar essa pessoa a cumprir a sua reprimenda nas casas penais brasileiras. Pior: a sua liberdade
será constrangida antes do seu patrimônio, pois, no Brasil, a atual maioria dos ministros do Supremo
Tribunal Federal entende, desde 2016, após o julgamento do habeas corpus (HC) nº 126.292/SP (BRASIL,
2016b), que a pena privativa de liberdade pode ser executada antecipadamente, logo após condenação
ratificada em segunda instância, mesmo que sujeita a recurso – ao contrário da pena de multa (e também
da pena de prestação pecuniária), que depende do trânsito em julgado. A seletividade penal fundada no
dinheiro, no grande capital, no poder político (sobretudo pela criminalização primária), não poderia ser
mais evidente.

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de legitimação ideológica presente na dogmática penal e conscientizar a classe


subalterna da opressão que pesa contra si. Daí a proposta de Lola Aniyar ser
conhecida também como “criminologia da libertação”.
Contudo, pode a teoria crítica de Castro ter a pretensão de combater a
legitimação ideológica de dominação presente no discurso jurídico-penal, sem a
própria teoria vir a conter também uma carga ideológica?

2 A hermenêutica da crítica das ideologias


O trabalho de P. Ricœur concentra-se no estudo da hermenêutica, isto é, da
extração e da interpretação do sentido, especialmente, a detecção da ilusão. O
filósofo francês propõe uma crítica hermenêutica dos discursos ideológicos, sempre
presentes em todo conhecimento, por mais científico que ele seja (RICœUR, 1990,
p. 9).
É verdadeiro dizer que, de há muito, o positivismo científico logrou êxito em
afastar, do saber físico, químico e matemático, a cosmovisão ou ideologias reinantes.
Assim não ocorreu, entretanto, com as teorias sociais, que, por não possuírem o
estatuto da positividade, dotado de um critério explicativo associado à capacidade
de prova da falsificação, sempre estiveram longe de um isento poder de denúncia
ideológica (RICœUR, 1990, p. 78-80). Castro acena no mesmo sentido, ao defender
que inexiste tal neutralidade (1986, p. 39).
O filósofo francês P. Ricœur elabora uma crítica à ideológica pretensão das
ciências humanas de atingir a matematicidade, sempre ocultando ou dissimulando
o exercício da dominação ou da violência. Segundo o autor, todo saber sobre nossa
posição na sociedade, numa classe social, numa tradição cultural, numa história,
é precedido por uma relação de pertença sobre a qual jamais poderemos refletir
inteiramente. Antes de qualquer distância crítica, pertencemos a uma história,
a uma classe, a uma nação, a uma cultura, a uma ou mais tradições (RICœUR,
1990, p. 92). Portanto, para uma criminologia que assume um nível político, que
se autointitula libertadora, parece ser imprescindível tomar uma posição, escolher
um lado – e Castro o faz, inclusive.
O filósofo argentino E. Dussel, ex-aluno de P. Ricœur, absorve do projeto
hermenêutico deste um embasamento ético e político, sobretudo a partir da obra
“A simbólica do mal”, em que o ex-professor de Dussel adentra num pensamento
filosófico tanto reflexivo quanto fenomenológico, isto é, numa filosofia “concreta”,
mais atenta aos desejos e às liberdades dos seres humanos em geral. Ainda não
seria o suficiente para Dussel, mas marcou um importante contato entre o professor

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e o aluno acerca da tarefa filosófica de um “educador político”.4 Castro também


assume um embasamento político, uma práxis no bojo de sua teoria criminológica.
Para a autora, a criminologia crítica assume um compromisso e apenas o faz de
maneira militante (CASTRO, 1986, p. 39). Aqui, no tocante à tarefa de educadores
políticos, Dussel e Castro possuem grande afinidade.
Contudo, ao contrário da base filosófica da criminologia de Castro, que reside
na teoria crítica da Escola de Frankfurt e no seu método histórico dialético (CASTRO,
2005, p. 66), a filosofia de Dussel, que adota o chamado método “analético”, defende
a posição do dominado, do oprimido, numa proposta de libertação latino-americana
mediante um compromisso de transformação social na própria região (LEAL, 2017,
p. 59). Daí se falar na “filosofia da libertação” de E. Dussel, que, frise-se, difere
sobremaneira do embasamento filosófico da teoria de Lola Aniyar de Castro.
Antes de abordar a diferença citada, cumpre aprofundar o conceito de ideologia
abordado neste trabalho.

2.1 Função geral da ideologia


Uma visada crítica das ideologias é fundamental para uma compreensão do que
seja uma concepção hegemônica e universalista de direitos humanos, responsável
por legitimar práticas absolutamente opressivas e que, desde a sua aparição histórica
no Iluminismo do século XVIII, na Revolução Francesa e na Revolução Americana,
foi usada em grande medida como discurso e arma política em contextos muito
distintos e com objetivos contraditórios (SANTOS; CHAUI, 2013, p. 47).
Apesar de corajosas, as raras pessoas que questionam as práticas e justifi-
cativas do sistema social histórico são tidas como bastante temerárias, e o grupo
hegemônico, etnocêntrico, universalista, com certeza se voltará contra elas e com
frequência as punirá como aberrações que não se podem tolerar (WALLERSTEIN,
2007, p. 73). No discurso ocidental e dominante dos direitos humanos, há cada vez
menos espaço para localismos e atitudes decoloniais,5 cujos atores logo passam
a ser reputados como verdadeiros inimigos, inclusive dos direitos humanos.

4
Dussel reconhece em Ricœur uma filosofia de embasamento ético e político, mas nela aponta uma incom-
pletude: sua inaplicabilidade para o enfrentamento assimétrico entre várias culturas, uma dominante e
outras dominadas, a exemplo da destruição do mundo ameríndio pela conquista em nome do cristianismo
(DUSSEL, 1993, p. 140).
5
A preferência pelo termo “decolonial”, e não “descolonial” – suprimindo, portanto, o “s” –, busca marcar
uma distinção com o significado clássico de “descolonizar”. Quer salientar que, ao invés de meramente
desfazer o “colonial” ou revertê-lo, a visada consiste em superar o momento colonial, a face oculta da
Modernidade, numa atitude pós-colonial, portanto. Tal marca distintiva, contudo, não é unânime no meio
acadêmico-científico, daí a necessidade do presente esclarecimento terminológico, que, de modo algum,

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A ideologia opera atrás de nós, mais do que a possuímos como um tema diante
de nossos olhos, e é a partir dela que pensamos, mais do que podemos pensar
sobre ela (RICœUR, 1990, p. 70). O que a hermenêutica trata de trazer à luz não é
inicialmente o sentido do texto, mas o esclarecimento crítico de um entendimento
que o precede, justamente porque não existe tabula rasa do entendimento, ou seja,
há algo que lhe é anterior (GRONDIN, 2012, p. 48-50).
Gadamer critica fortemente o positivismo científico imposto às ciências humanas,
a suposta capacidade destas de descobrir a verdade operando uma fantasiosa e
fictícia exclusão dos pré-juízos do entendimento, em nome de uma concepção
de objetividade, herdada das ciências exatas no contexto histórico da Ilustração
(GRONDIN, 2012, p. 48-50). O filósofo alemão enxerga nos pré-juízos sobretudo
condições de entendimento. Não na forma de uma abertura ao subjetivismo ou ao
preconceito. Em verdade, para o autor, a interpretação deve a todo instante realizar
um exame crítico de seus pré-juízos, por meio do chamado “processo de revisão
constante”, precavendo-se contra o arbitrário dos preconceitos, distinguindo-se,
assim, os pré-juízos legítimos, aqueles que tornam possível o entendimento, daqueles
que não são legítimos e que cabe à crítica superar (GRONDIN, 2012, p. 48-50).
A ideologia, contudo, não permite essa clareza e amplitude de visada. Ela é
responsável por operar um estreitamento do campo com referência às possibilidades
de interpretação (RICœUR, 1990, p. 71), o que o filósofo francês chama de “cegueira
ideológica”, isto é, um enclausuramento do campo interpretativo. É por isso que,
segundo Ricœur, a ideologia se exprime preferencialmente por slogans, de forma
semelhante, inclusive, à estratégia dos meios de comunicação para atrair leitores
e telespectadores a consumirem as manipuladas notícias da criminalidade, o
chamado “jornalismo verdade” (GOMES, 2014, p. 85).

2.2 Função de dominação


O que a ideologia interpreta e justifica, por excelência, é a relação de dominação,
a busca das autoridades por legitimidade (RICœUR, 1990, p. 71-72). Toda pretensão
à legitimidade é correlativa a uma crença, por parte dos indivíduos, nessa legitimidade,
porém, a relação entre a pretensão emitida pela autoridade e a crença que a ela
responde é essencialmente assimétrica, sempre havendo mais na pretensão que
vem da autoridade do que na crença que vai à autoridade (RICœUR, 1990, p. 72).
Sobrevindo uma crise de legitimidade, capaz de ferir o narcisismo penal – isto é,

tenta sobrepujar ou estigmatizar a expressão “descolonial”, mas, apenas, explicitar o porquê da preferên-
cia pela gramática “decolonial”.

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nas palavras de Salo de Carvalho (2008, p. 52), a vaidosa e exagerada convicção


do sistema criminal em sua eficiência e racionalidade –, tal relação se torna ainda
mais assimétrica, levando ruidosa preocupação ao poder punitivo e seus agentes.
Já se desvelou que o poder das agências judiciais é bastante limitado, o que
lesiona o narcisismo penal. Para inflá-lo, abriu-se a porta do fenômeno mais comum
no exercício do poder punitivo: a produção de emergências. Com elas, sustenta-se
que os mais sérios problemas sociais são resolvidos pelo poder punitivo, quando,
em verdade, a ameaça nuclear, a corrupção, a dependência de tóxicos, a destruição
ecológica, etc., ou não foram resolvidas, ou foram solucionadas por outros meios
(ZAFFARONI et al., 2003, p. 68).
Para garantir importância absoluta e dominação, o narcisismo penal não se
contenta com a factível diminuição da marginalização ou com o real combate à
corrupção: ele precisa erradicá-los, torná-los um zero, como se isso fosse sequer
possível ou já tivesse acontecido em algum lugar do mundo. São frases de efeito,
slogans, como o objetivo da República Federativa do Brasil consistente em erradicar
a marginalização (BRASIL, 1988), ou a promessa das Nações Unidas de erradicar a
corrupção (BRASIL, 2006a). O importante, aqui, para o narcisismo penal, é dominar
(função de dominação), apelar ao formalismo e ao dogma do Direito, ainda que
suas promessas sejam impossíveis de serem cumpridas.
Daí a relevância da advertência de Wolkmer (2015, p. 97), para quem a
constituição de uma cultura jurídica antiformalista e antidogmática, fundada nos
valores do poder comunitário e pluralista, está necessariamente vinculada aos
critérios também de uma nova legitimidade, de uma legitimidade desde baixo.

2.3 Função de deformação


Ricœur (1990, p. 73) empresta a ideia de inversão de que Feuerbach falou ao
se referir à cosmovisão não como um exemplo de ideologia, mas a ideologia por
excelência, operando a inversão entre o céu e a terra e fazendo com que as pessoas
andassem de cabeça para baixo. Segundo a metáfora, por meio da ideologia, o
processo de vida real deixa de constituir a base, para ser substituído por aquilo
que se diz, imagina, representa. A ideologia é esse menosprezo que faz tomar a
imagem pelo real, o reflexo pelo original (RICœUR, 1990, p. 73).
Tamanha a profundidade e largueza da função deformadora da ideologia, que
mulheres, crianças e adolescentes, jovens negros, habitantes de assentamentos
urbanos informais, pessoas pobres consumidoras de estupefacientes não enxergam
o processo de criminalização que pesa contra elas próprias, não veem o fenômeno

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da seletividade penal. Há um aceite geral, quase um acordo tácito acerca da


dominação, do discurso, da seletividade. “As coisas são assim porque elas são”,
pensam. Na verdade, as imagens são assim porque as coisas em si mesmas foram
deformadas por um poder, um grupo hegemônico, um interesse colonial.
A hermenêutica filosófica de Ricœur, então, propugna uma inversão da
inversão, uma crítica das produções ideológicas que procedem do real em direção
ao imaginário, do potencial criador de ilusões e fantasmagorias.
A esquizofrenia da sociedade atual a fez egoísta e delirante, uma sociedade
em que se teme não se sabe exatamente o quê, e na qual é preciso eleger um
bode expiatório, alguém que possa ser responsabilizado pelo sentimento de
insegurança coletiva. Surgem, então, inimigos, que são transformados em alvo de
uma política criminal desprovida de qualquer epistemologia, que se faz no dia a dia
sem método e sem vinculação aos valores democráticos de liberdade e igualdade
(GOMES, 2015, p. 279).
Um bom exemplo é o artigo 312 do Código de Processo Penal brasileiro (BRASIL,
1941), utilizado muito frequentemente como forma de antecipação da pena e discurso
do medo e do risco ao estilo jakobsiano. Num perfil eminentemente securitarista,
de tolerância zero e desconfiança sistemática, muitos agentes públicos tendem
a prender cautelarmente pessoas pelo fato de elas não oferecerem a chamada
“garantia cognitiva suficiente de um comportamento” (pressuposto filosófico do
Direito Penal do Inimigo),6 ou seja, tais autoridades identificam inimigos, sujeitos
“ruins”, e aplicam a estes a prisão preventiva com fundamento no impreciso
conceito de ordem pública.
Bauman (2009, p. 15-16) já desacreditou a chamada “garantia cognitiva
suficiente de um comportamento”, ao desvelar que a insegurança nas sociedades
pós-modernas (não solidárias e securitaristas) é caracterizada pelo medo dos
crimes e criminosos, efeito colateral da falsa crença de que seria possível obter
uma segurança completa – o que Todorov (2012, p. 63) denomina de “impulso
messiânico para a perfeição” –, devendo, para afastar-se o medo, sempre existir
um culpado ou, até mesmo, uma mera intenção criminosa.

6
Jakobs refundou o conceito de inimigo, aportando sobretudo nos filósofos Platão, Hobbes, Rousseau e
Fichte. Para o jusfilósofo de Bonn, só seria pessoa quem oferecesse uma “garantia cognitiva suficiente
de um comportamento”, ou seja, o indivíduo capaz de transparecer um modo de vida seguro, ideal, sem
riscos para a sociedade. De forma oposta, seria inimigo o indivíduo que, por meio de seu comporta-
mento, sua ocupação profissional ou, principalmente, mediante sua vinculação a determinados grupos,
descumprisse o seu papel no contrato social, abandonasse definitivamente o Direito, causando medo e
insegurança.

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MAURO GUILHERME MESSIAS DOS SANTOS

A insegurança social passou a ser uma enorme demanda da opinião pública,


exageradamente inflada pelos meios de comunicação de massa, que enxergam no
medo e na exploração midiática da delinquência um produto altamente vendável
(GOMES, 2014, p. 97). A própria opinião pública é confundida com a opinião
publicada, uma dicotomia já denunciada por Maffesoli (2010, p. 20). Para o
autor, ao contrário da opinião pública, que é versátil e dotada de humanidade e
fragilidade, a opinião publicada é aquela que “continua a repetir exaustivamente
algumas ideias convencionais, lugares-comuns e outras verborragias [...], fácil de
engolir e, portanto, muito conveniente para a midiacracia que se acomoda numa
mediocridade generalizada”.
Bauman, portanto, revelou a maior parte da fama da base filosófica de Jakobs:
a exploração do medo. Medo de usuários de entorpecentes, de profissionais do sexo,
de habitantes de assentamentos urbanos informais, de “subversivos” defensores
de direitos humanos, de indígenas “antropófagos”.
Graças à função de deformação, de que trata este subcapítulo, o sujeito
moderno nem sequer está consciente da irracionalidade em que está imerso, ou
seja, está alienado de sua própria alienação (CASTRO, 2005, p. 60-61), agindo
mimeticamente e incorrendo numa flagrante esquizofrenia.

2.4 As quatro proposições de Ricœur


A partir das funções expostas alhures, Ricœur elabora quatro proposições
que evidenciam a natureza ideológica de toda e qualquer ciência social, apontando
as dificuldades propriamente epistemológicas encontradas pelas ciências sociais
em buscar uma matematicidade ou neutralidade. Tais dificuldades são devidas à
estrutura mesma de um “ser” que não se encontra jamais na posição de separar
de si mesmo a totalidade de seus condicionamentos, da sua pré-compreensão,
cuja estrutura precede e comanda.
Na primeira proposição de Ricœur, todo saber sobre nossa posição na
sociedade, numa classe social, numa tradição cultural, numa história, é precedido
por uma relação de pertença sobre a qual jamais poderemos refletir inteiramente.
Antes de qualquer distância crítica, pertencemos a uma história, a uma classe, a
uma nação, a uma cultura, a uma ou mais tradições. Ao assumir essa pertença
que nos precede, constata-se o primeiro papel da ideologia: a representação que
temos da coisa (RICœUR, 1990, p. 92).
Em segundo lugar, para Ricœur, o distanciamento é a condição de possibilidade
de uma crítica das ideologias. Na esteira do pensamento de Gadamer, o intérprete

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nunca está fixo no tempo, como as ciências matemáticas concebem. Existe uma
distância temporal entre o intérprete e o texto, um distanciamento histórico repleto
de efeitos da ação da história, uma verdadeira herança de acontecimentos, uma
tradição, viabilizados por um constante diálogo entre o passado e o presente,
capaz de distinguir os pré-juízos legítimos dos ilegítimos. Segundo o autor, todo
mundo conhece essa peculiar impotência de se julgar onde não dispomos de uma
distância temporal que nos forneça critérios seguros (GADAMER, 2012, p. 393).
Por terceiro, a ciência social jamais rompe seus vínculos, e insiste em cair
na ilusão de uma teoria crítica elevada ao nível de saber absoluto. É preciso notar
que esse interesse totalizante das teorias sociais funciona como uma ideologia,
buscando dominação material, manipulação aplicada às pessoas ou apropriação
de heranças culturais.
A quarta e última proposição de Ricœur consiste na meditação de que o
saber teórico-social está sempre em vias de se arrebatar à ideologia. Existe uma
pré-compreensão na qual a pessoa está lançada, e qualquer pretensão crítica será
apenas parcial, sem uma completa isenção do fundo ideológico.
Embora a teoria crítica do controle social proponha, política e epistemologi-
camente, mostrar um caminho criminológico viável para sinalizar à dogmática a
existência de ideologias na aplicação da lei penal, é preciso ressaltar, com apoio
na hermenêutica de Ricœur: a própria teoria crítica de Castro possui uma carga
ideológica, apropriando-se de pressupostos teóricos coloniais e eurocêntricos,
sobretudo, durante os processos de “importação cultural” na base do desenvolvi-
mento da criminologia crítica na América Latina nos anos 80 (SOZZO, 2002, p. 398).

3 A necessidade filosófica, e não apenas política, de se


escolher um lado
De fato, a pura denúncia não parece ser o melhor lugar para a criminologia. É
preciso escolher um lado, e a criminologia de Castro o faz – tal como Dussel, em
sua “filosofia da libertação”.
E. Dussel é tido como um filósofo contemporâneo que trabalha uma filosofia
ética e politicamente insatisfeita com a realidade de opressão sobre o povo
latino-americano.
A filosofia de E. Dussel propõe uma tomada de posição, a tarefa de assumir
uma ética e uma política no interior de uma filosofia latino-americana em favor
do dominado. Embora a Modernidade (o império do ego cogito, do eurocentrismo
cartesiano) não tenha incluído em sua gênese a América Latina, que era “inferior”,

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na visão de Hegel (DUSSEL, 1992, p. 15-17), o filósofo argentino afirma o contrário:


o povo latino-americano, conquistado e massacrado, constituiu, sim, a Modernidade.
Em oposição a Hegel, Dussel (1992, p. 21) formula a hipótese de que a América
Latina, desde 1492, é, sim, um momento constitutivo da Modernidade, é a “outra
face”, a alteridade essencial da Modernidade, que não consiste apenas no ego cogito
(“eu penso”), no império da razão moderna, mas, também, e até mesmo antes, no
ego conquiro (“eu conquisto”), no império da violência contra mulheres acusadas
de serem bruxas, do índio como vítima sacrifical do europeu, a “bestialidade” a
ser ou evangelizada ou morta.
Para o filósofo argentino, o “Outro” não chegou a ser reconhecido como o
“Outro” pelo europeu. Esse “Outro” sequer pôde ser ele próprio. Na verdade,
esclarece Dussel, o “ameríndio” foi encoberto como o “Mesmo”, aquilo que os
europeus já eram desde sempre. Em outras palavras, o “Outro”, com a chegada do
europeu, nunca pôde ser ele próprio, logo, não foi descoberto, e sim, encoberto.
As Américas não foram propriamente descobertas, pois não permaneceram
distintas, não apareceram como “Outro”, e sim, transformaram-se no objeto em
que o “Mesmo” se projetou e encobriu. Para Dussel (1992, p. 35), o verdadeiro
significado de descobrir as Américas seria constatar a existência de territórios
continentais habitados por pessoas ao oeste do Atlântico, até então totalmente
desconhecidos pelos europeus, o que exigiria do intérprete o gesto de abrir o seu
horizonte de compreensão do mundo. Em outras palavras, descobrir consiste em
reconhecer o “Outro” como o “Outro”, sem “mesmificá-lo”, ou seja, reconhecer o
índio como o índio, sem “europeizá-lo”.
O discurso colonial como aparato de poder se apoiou, desde o princípio, no
repúdio das diferenças raciais, culturais e históricas, demonstrando toda a sua
agressividade quanto aos diferentes, assumindo uma forma de governabilidade que
passou a se apropriar, a dirigir e a dominar o “Outro”, isto é, o diferente do “Mesmo”
(DERRIDA, 2013, p. 123-125). Um colonialismo que gera passividade perante o
discurso de dominação. Como o escravo que, quando se revolta, fala a língua do
senhor, pois já é um conquistado, ou a mulher, que, quando se liberta, exprime-se
dentro da ideologia machista, pois já é uma dominada (DUSSEL, 1977, p. 7).
Para uma atitude decolonial, não basta falar apenas na luta entre detentores
de capital e negados, no interior da totalidade europeia. A América Latina possui
um longo episódio colonial, mais ocultador do que a negação da massa europeia.
Aqui reside a diferença entre a filosofia de Dussel e o embasamento filosófico da
“criminologia da libertação”. O nível epistemológico da teoria crítica do controle
social de Lola Aniyar de Castro elegeu o método histórico dialético fundado em

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A CRIMINOLOGIA DA LIBERTAçãO DE LOLA ANIyAR DE CASTRO E AS CONTRIBUIçõES DE RICœUR E DUSSEL

Hegel e na Escola de Frankfurt, ao passo que Dussel incorporou um método para


pensar a América Latina sob uma perspectiva libertadora, consistente numa visada
a partir do “Outro”, daquele que está fora da totalidade social, método que o autor
denomina “analético”.
Enquanto o pressuposto filosófico abordado por Lola Aniyar de Castro limita-se
à dialética negativa, isto é, negar o negado dentro de uma totalidade social, rejeitar
a opressão do grande capital sobre as massas europeias, Dussel trabalha um
conceito absolutamente estranho ao método histórico dialético: a “exterioridade”,
um campo além da dialética negativa, esta que é limitada à totalidade social (a
exemplo da totalidade europeia), que não compreende outras realidades, como
a do jovem negro latino-americano absolutamente ocultado, que luta contra uma
histórica segregação racial, mas sequer consegue se fazer enxergar na sociedade,
sequer faz parte da totalidade social. Esse jovem não habita a totalidade social:
ele habita algo mais oculto, a “exterioridade”.
A “exterioridade” representa, pois, a alteridade existente fora da totalidade
social, tendo em vista que o latino-americano sequer fez parte do processo de
construção do conhecimento eurocêntrico, e tampouco sua realidade foi objeto de
análise (LEAL, 2017, p. 57). Daí assumir-se que o pressuposto filosófico eleito
por Castro em sua teoria crítica é eurocêntrico, embora o seu nível político almeje
a libertação latino-americana.
Ainda que a teoria crítica de base materialista histórica proponha estar do lado
dos oprimidos, os oprimidos aos quais ela se coloca do lado não são os mesmos da
filosofia da libertação, não são os latino-americanos, na medida em que ainda não
eram conhecidos, e sobre os quais, portanto, repousava uma absoluta obscuridade
(LEAL, 2017, p. 57).
Portanto, para o filósofo argentino, o “Outro”, aquele que reside na “exterio-
ridade” de determinada totalidade social, não é apenas a pessoa que tenha fome,
integrante do público preferencial da seletividade penal patrimonialista, principal
objeto da repetida e genérica crítica do materialismo histórico copiada na América
Latina, como alertado por Máximo Sozzo (2002, p. 399). É, também, o indígena
massacrado, a mulher objeto sexual nas mãos do colonizador, o negro escravo, o
asiático da guerra do ópio, o judeu nos campos de concentração (DUSSEL, 1993,
p. 141). Têm-se, assim, claras diferenças entre o fundamento filosófico adotado
por Castro e aquele sustentado por Dussel.
A fim de exemplificar a diferença trabalhada anteriormente, veja-se a proble-
mática contemporânea do excessivo encarceramento feminino – que, até onde se
pode ver, não se encontra ligada à crítica econômica marxista nascida no século

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MAURO GUILHERME MESSIAS DOS SANTOS

XIX. Ao que parece, a organização social de gênero, absolutamente hierarquizante,


representa um instrumento de dominação social universal mais antigo do que os
elementos de classe.
A mulher latino-americana jovem, encarcerada, negra, mãe, não se encontra
meramente negada pela totalidade social, como ao estilo eurocêntrico do método
histórico dialético (adotado por Castro em sua teoria crítica). Essa mulher parece
se encontrar num âmbito ainda mais obscuro, mais além do método dialético, fora
da totalidade social, isto é, na exterioridade dusseliana.
Segundo o Levantamento de Informações Penitenciárias (INFOPEN, 2014, p.
5), vinculado ao Ministério da Justiça, em geral, as mulheres submetidas ao cárcere
são jovens, têm filhos, são as responsáveis pela provisão do sustento familiar,
possuem baixa escolaridade, são oriundas de extratos sociais desfavorecidos
economicamente e exerciam atividades de trabalho informal em período anterior
ao aprisionamento. Bem ainda, a maioria dessas mulheres ocupa uma posição
coadjuvante no crime, realizando serviços de transporte de drogas e pequeno
comércio; muitas são usuárias, sendo poucas as que exercem atividades de gerência
do tráfico (INFOPEN, 2014, p. 5).
Não obstante a expressiva participação de homens no contingente total de
pessoas privadas de liberdade no país, a população absoluta de mulheres encar-
ceradas no sistema penitenciário cresceu 567% (quinhentos e sessenta e sete por
cento) entre os anos 2000 e 2014, conforme a imagem a seguir (INFOPEN, 2014,
p. 10) – enquanto a população de homens encarcerados subiu 220% (duzentos
e vinte por cento) no mesmo período, seguindo a tendência geral de aumento do
encarceramento no Brasil:

Imagem 2
Evolução da população de mulheres no sistema penitenciário (Infopen)

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A CRIMINOLOGIA DA LIBERTAçãO DE LOLA ANIyAR DE CASTRO E AS CONTRIBUIçõES DE RICœUR E DUSSEL

O quadro apenas suavizou após uma análise criminológica sobre a prisionização


feminina. Em 2016, no julgamento do HC nº 118.533/MS (BRASIL, 2016a), o
Supremo Tribunal Federal decidiu que o chamado tráfico privilegiado de drogas
não possui natureza hedionda. A consequência foi a libertação imediata de 45%
(quarenta e cinco por cento) das mulheres presas à época.
Por ocasião dos votos, a ministra Cármen Lúcia destacou que a Nova Lei
de Tóxicos (BRASIL, 2006b) impulsionou fortemente o crescimento da população
carcerária feminina. No período de 2005 a 2014, a quantidade de pessoas presas
condenadas por tráfico de drogas cresceu 340% (trezentos e quarenta por cento).
Quando se fez o recorte de gênero, percebeu-se que, no mesmo período, o número de
mulheres presas condenadas por tráfico de drogas aumentou em aproximadamente
600% (seiscentos por cento). Além disso, os dados mais recentes apontavam que,
à época, 68% (sessenta e oito por cento) das mulheres encarceradas no Brasil
estavam detidas por delitos de drogas, número proporcionalmente três vezes maior
que o de homens detidos pelos mesmos delitos (IBCCRIM et al., 2016, p. 8).
É de Bordieu (2012, p. 110) a lição de que a igualdade formal entre os
homens e as mulheres tende a ser dissimuladora. Segundo as informações e dados
estatísticos, as mulheres brasileiras, especialmente as jovens, mães e pobres, são
identificadas como receptivas ou prediletas às forças repressivas. Sim, o sujeito
moderno não difere grande coisa de seu antepassado medieval, a não ser no que
se refere à eleição de suas vítimas (HORKHEIMER, 1973, p. 126). O lugar das
bruxas, dos feiticeiros e dos hereges é ocupado agora por mulheres (sobretudo
jovens negras), pessoas pobres que consomem entorpecentes, habitantes de
assentamentos urbanos informais ou profissionais do sexo.
A igualdade formal, prevista, inclusive, na Constituição da República Federativa
do Brasil, ilude a muitos. Segundo o seu art. 5º, caput, “Todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza [...]” (BRASIL, 1988), numa redação
inspirada sobretudo na Declaração Universal dos Direitos do Homem, que foi
antecedida pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Ora, a mulher
fazia parte do “homem” referido nas declarações?
Hunt (2009, p. 17) duvida que Lafayette, aristocrata e militar francês com
ampla atuação na Revolução Francesa e incumbido de rascunhar a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, e T. Jefferson, um senhor de escravos
incumbido de redigir a Declaração da Independência dos Estados Unidos, tenham
chegado a imaginar qualquer igualdade relativamente à mulher – ou ao escravo,
ou ao indígena. Convém referir que o principal autor da Declaração Universal
dos Direitos do Homem, René Cassin, um jurista francês laureado com o Nobel

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MAURO GUILHERME MESSIAS DOS SANTOS

da Paz em 1968 pelas suas contribuições ao referido documento internacional,


deliberadamente retirou do artigo 12 de seu rascunho declaração à proscrição a
“trabalhos forçados”, mantendo apenas a vedação à “escravidão”, numa atitude
marcadamente colonial (CLAVERO, 2014, p. 36).
A igualdade formal referida nas Declarações aplicava-se a todos, inclusive a
mulheres? Para Douzinas (2000, p. 187) não: ela era de valor limitado para os não
propriamente “homens” (ou seja, homens sem propriedade), mais limitado ainda
para mulheres e completamente negado para aqueles definidos como não humanos
(colonizados, escravos e estrangeiros). Em Douzinas, fica claro que, mesmo no nível
formal, há uma ideologia hierarquizante de pessoas, uma estratificação que não
se resume à lei do dinheiro (valor limitado) e que pode atingir mais penosamente
a mulher (valor mais limitado ainda) e, pior, a mulher latino-americana (valor
completamente negado).
O problema contemporâneo do encarceramento massivo de mulheres no
país não está ligado à crítica econômica marxista nascida no século XIX. A mulher
latino-americana jovem, encarcerada, negra, mãe, não se encontra meramente
negada pela totalidade social (como ao estilo eurocêntrico enxergado pelo método
histórico dialético): ela parece se encontrar num âmbito ainda mais esquecido,
isto é, na “exterioridade” dusseliana ou no valor completamente negado de que
fala Douzinas.

4 Considerações finais
A teoria crítica do controle social de Lola Aniyar de Castro busca, acima de
tudo, analisar criticamente o funcionamento da estrutura de dominação oficial,
a saber, o sistema penal, revelando a carga ideológica presente no discurso
dogmático. Propostas aptas a mostrar à dogmática a existência de ideologias têm
a possibilidade de diminuir, em alguma medida, o recrudescimento da aplicação
da técnica jurídico-penal.
Contudo, a presente pesquisa considera que, na linha do pensamento de
P. Ricœur, as teorias sociais possuem, inarredavelmente, uma carga ideológica,
decorrente da impossibilidade de separar do pensador a totalidade de seus
condicionamentos, da sua pré-compreensão, cuja estrutura precede e comanda.
Assim, a pretensão da teoria crítica de Lola Aniyar em apontar ideologias na
dogmática penal carrega consigo, necessariamente, um conteúdo ideológico, pois
não há pensadores sem amarras, sem pertença, sem efeitos da história – Castro,
por exemplo, integrou movimentos sociais e exerceu cargos político-estatais por
vários anos.

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A CRIMINOLOGIA DA LIBERTAçãO DE LOLA ANIyAR DE CASTRO E AS CONTRIBUIçõES DE RICœUR E DUSSEL

Bem ainda, note-se que o nível epistemológico da teoria crítica do controle


social de Lola Aniyar de Castro, fundado sobretudo em Hegel e na Escola de
Frankfurt, possui incongruências respectivamente à realidade latino-americana,
como a brasileira. A crítica do materialismo histórico incorporada por Baratta e
seus sucessores não deve ser “retalhada” e aplicada indiferentemente aos povos
latinos de forma “reestilizada” e descontextualizada. É preciso reinterpretar Marx
aos olhos latino-americanos, e não ao tempo das massas europeias (ZAFFARONI,
1988, p. 74-75).
Nesse passo, a partir da filosofia da libertação de E. Dussel, a pesquisa
conclui que a teoria crítica do Lola Aniyar pode receber as contribuições de um
método decolonial, como o método analético dusseliano, para, sem heranças
culturais eurocêntricas, assumir uma atitude ética e política compromissada com
a região latino-americana e com problemas sociais insuscetíveis de abordagem
pelo materialismo histórico marxista.

Lola Aniyar de Castro’s criminology of liberation and the contributions of Ricœur and Dussel
Abstract: The critical theory of social control elaborated by Castro has as main function to unmask
the ideology present in Latin American systems of domination, especially in criminal law. However, can
critical theory have the pretension of combating the ideology present in the criminal-legal discourse,
without the theory itself containing an ideological charge? The general objective of the research is to
discuss an alignment between Castro’s theory, Ricœur’s hermeneutics of ideologies and Dussel’s
philosophy of liberation. On the other hand, the specific objectives are to investigate if the theory of
Castro has ideological load, based on Ricœur’s warnings, as well as to compare the philosophical
bases of Castro’s critical theory and Dussel’s thinking, inquiring whether critical theory possesses a
genuinely liberating philosophy. The research is justified by the unsatisfactory results presented by
allegedly aseptic criminological theories and, in order to achieve its objectives, employs the deductive
method, through a bibliographical review of the authors works cited above, in order to re-read Castro’s
criminology of liberation. The hypotheses of the work are the presence of ideological content in Castro’s
theory and of colonialism on the philosophical basis of critical theory.

Keywords: Critical theory. Ideology. Hermeneutics. Criminology of liberation. Colonialism.

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descolonización y pluralismo jurídico en América Latina. Florianópolis: UFSC-NEPE, 2015, p. 95-101.

Recebido em: 21.06.2019


Aprovado em: 27.08.2019

Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2018 da Associação


Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):

SANTOS, Mauro Guilherme Messias dos. A criminologia da libertação de Lola


Aniyar de Castro e as contribuições de Ricœur e Dussel. Revista Fórum de
Ciências Criminais – RFCC, Belo Horizonte, ano 6, n. 12, p. 13-32, jul./
dez. 2019.

32 R. Fórum de Ci. Crim. – RFCC | Belo Horizonte, ano 6, n. 12, p. 13-32, jul./dez. 2019

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