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I – Considerações iniciais
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In: SOUSA, Luis Carlos Marques. Gestão educacional democrática: itinerários de um paradigma em
construção (formato e-book). Curitiba: Bagai, 2021.
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Curioso observar que somente cinquenta e seis anos depois, na atual Constituição
Federal, é que o indicativo dos Pioneiros foi legislativamente acatado, ou seja, a descentralização
coordenada envolvendo os entes federados (União, Estados e Municípios) numa ação conjunta e
articulada da promoção e manutenção da educação pública para que, efetivamente, todos os
brasileiros tenham acesso a uma escola pública de qualidade.
Com o transcorrer do tempo, um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros destacou-
se dos demais pelas várias funções que exerceu no âmbito da administração pública educacional, bem
como pelos seus escritos a respeito da administração educacional e escolar. Trata-se do renomado
baiano Anísio Spindola Teixeira (1900-1971) que, entre outros aspectos, notabilizou-se como um
persistente crítico da centralização que regia a educação nacional, que, na sua visão, constituía a raiz
de muitos males de que padecia essa mesma educação.
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Convém considerar que a proposta anisiana de municipalização do ensino primário se constituía em algo
ousado para aquele momento, uma vez que o ordenamento jurídico-político do Brasil de então não conferia ao
município o status de ente federado como, contemporaneamente, é determinado pela atual Constituição
Federal.
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Consideradas as devidas proporções e os diferenciados contextos, esse tipo de escola, na atualidade,
corresponderia aos estabelecimentos de ensino que oferecem os chamados anos iniciais do Ensino
Fundamental (1º aos 5º anos).
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Dando a entender que em algum momento anterior a escola brasileira havia sido
detentora de autonomia quanto a pessoal e material, e que isso havia se perdido, Anísio Teixeira não
somente analisava que tal perda teria sido o início da desintegração da escola, como também apontava
para os resultados desse processo, ou seja, “nada restará senão o automatismo de diretores e mestres,
a executar o que não planejaram, nem estudaram como se estivessem no mais mecânico dos serviços”
(TEIXEIRA, 1976, p. 127).
Em relação ao posicionamento sobre a autonomia escolar, destacamos que para Anísio
Teixeira esse princípio educacional não significava independência ou mesmo que o poder público
abandonasse a escola à própria sorte. Inclusive, ele considerava como necessário o acompanhamento
do poder público através dos órgãos administrativos específicos exercendo ações de controle e de
supervisão. Entretanto, no exercício dessas funções administrativas Anísio Teixeira chamava a
atenção para que o Ministério da Educação e as secretarias estaduais de educação tivessem
organização especial “dado à natureza peculiaríssima dos seus serviços de educação e cultura”
(TEIXEIRA, 1976, p. 127, p. 129).
Anísio Teixeira também defendia que
nessa organização especial, o âmbito de controle legal deve ser mínimo, devendo
ficar tudo o que disser respeitos aos aspectos internos dos processos educativos e
culturais sujeitos ao controle de órgãos exclusivamente profissionais, específicos,
mediante instituições permanente e facilmente modificáveis, à luz da melhor
consciência profissional existente (TEIXEIRA, 1976, p. 129).
Apesar de a primeira lei nacional de educação – a LDB 4.024/61- ser vista como uma
“lei de meia-vitória” (TEIXEIRA, 1976, p. 228) ou, no dizer de Carlos Lacerda, que teria sido a lei à
qual se pôde chegar naquele momento, muito provavelmente os embates travados em torno da
centralização x descentralização contribuíram positivamente para que o texto da LDB 4.024/61, em
seus artigos 11, 12 e 104, apresentasse orientações na perspectiva da descentralização do ensino nos
termos da não existir um currículo fixo estabelecido para todo o território nacional. Assim, cada nível
e ramo do ensino poderia construir seu próprio currículo e, neste âmbito, os estabelecimentos de
ensino poderiam oferecer outras disciplinas diferentes das que constavam no currículo mínimo
estabelecido pelo Conselho Federal de Educação.
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Aqui estamos no governo Tancredo Neves (eleito em novembro de 1982, porém governando por menos de
dois anos em virtude da sua candidatura à presidência da República),
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II.3 – A contribuição do movimento dos educadores para a gestação de um novo modelo para a
administração da educação e da escola públicas
Por variadas razões, a programação da realização bienal das conferências não pôde ser
realizada no ano de 1990, de modo que a VI Conferência só pode ser realizada no ano seguinte, no
período de 3 a 6 de julho, no campus da Universidade de São Paulo (USP), tendo como tema “Política
nacional de educação”.
Muito provavelmente, em decorrência da complexidade da temática adotada essa nova
conferência, entre outros aspectos, caracterizou-se por estabelecer uma ampla parceria com
intelectuais e profissionais de outras áreas (economistas, cientistas sociais e filósofos, entre outros).
Assim, esta VI Conferência buscou responder às múltiplas interpelações que estavam contidas no
processo de contribuição para a elaboração de uma política educacional capaz de encarar os desafios
impostos pela profunda crise em que, naquele momento específico, a educação brasileira estava
mergulhada. Neste sentido, os educadores denunciaram:
O nosso já frágil sistema público de ensino tem sido alvo de políticas que em vez de
responderem aos seus problemas, enfraqueceram-no ainda mais e contribuem para a
sua desintegração (...). Políticas traçadas em nome da sociedade, mas que ameaçam
o ensino público porque pensam a esfera pública a partir de interesses privados.
Políticas elaboradas em nome de um novo modelo econômico, supostamente capaz
de tirar o Brasil da crise estrutural que o afeta e de incluí-lo no atual reordenamento
político-econômico internacional, mas que põem em risco a sobrevivência daquelas
instituições de cuja existência e vigor muito dependem na construção de uma
sociedade democrática, porque pensam desenvolvimento sem justiça social
(MENSAGEM..., 1992, p. 17).
construção do conhecimento desde as primeiras séries da escola básica até as cátedras da pós-
graduação.
II.4 – A mobilização das entidades representativas dos educadores para a inclusão de pautas educacionais
democráticas no momento constituinte de 1987/88
c) a gestão democrática como um princípio pelo qual o ensino público deve ser regido
(art. 206, VI);
d) a extensão da gratuidade ao ensino médio (art. 208, II);
e) o atendimento educacional especializado para os portadores de necessidades
especiais (art. 208, III) e
f) a caracterização da universidade como instituição autônoma (art. 207).
É evidente que a incorporação da gestão democrática da educação no texto da
Constituição Federal (posteriormente incorporada pela LDBEN 9394/96), por si só não é uma
garantia para a sua efetivação. Existe a necessidade de ser, consequentemente, implementada.
Todavia, na medida em que o ordenamento jurídico representou um avanço das forças ativas e das
ideias progressistas existentes na sociedade civil, reconhecemos nisso uma contribuição positiva na
perspectiva da garantia e da efetivação dos direitos sociais.
As pautas da gestão, bem como de outras correlatas à educação e à escola, se
inserem, pois, no quadro dessas contradições. Em todo caso não podemos deixar de considerar que o
acolhimento de tais temas nos dispositivos legais (Constituição, LDBEN e outros) também sinalizam
que nos embates travados em torno deles houve ganhos para os educadores e setores sociais
progressistas que conseguiram que parte dos seus anseios fossem registrados. Visto por outro ângulo,
a “conquista possível” poderá e deverá ser aproveitada para servir de estímulo e encorajamento para
a continuidade das outras lutas que possibilitem a ampliação das conquistas já obtidas. Tendo em
vista a realidade educacional brasileira, é obvio que há muito, ainda, a ser feito para que possamos
considerá-la como já sendo efetivamente democrática, o que não só não desmerece os passos e as
conquistas já realizados, mas, ao contrário, sinalizam novas possibilidades a serem atingidas.
Paralelamente à movimentação em torno da Constituinte, os educadores começaram a
se envolver numa outra importantíssima frente de luta: a elaboração da nova Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, cujo debate iniciou-se no ano de 1987, encabeçado pela Associação Nacional
dos Profissionais de Administração Educacional (ANPAE), por ocasião da sua X Reunião Anual,
realizada na cidade de Salvador, no período de 11 a 15 de maio de 1987. Já naquele evento foi
contemplada a questão da gestão democrática do ensino público, sendo então elaboradas várias
propostas para integrar o corpo da futura LDBEN. No que tange à gestão democrática do ensino
público, os participantes do encontro da ANPAE enfatizaram a necessidade de serem instituídos
mecanismos que possibilitassem a participação dos segmentos que compõem a comunidade escolar,
tanto na condução dessa mesma comunidade como no processo de formulação e execução da política
educacional, e que somente nessa concepção poderia ocorrer a democratização da educação e da
escola.
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III - Uma mudança paradigmática: pensar e tratar a educação e a escola a partir da gestão
considerar os problemas como sistêmicos e que, por serem tais, envolvem uma gama de componentes
interligados entre si.
Refletindo sobre a mudança paradigmática ocorrida na administração da escola,
Martins (1998, p. 58) recorda que há um componente político que deve ser considerado, pois
passar de uma administração autoritária a uma gestão democrática da educação
implica num compromisso sociopolítico, com o enfrentamento concreto e objetivo
das questões da exclusão, da reprovação e do não acesso que reforçam, pela escola,
a marginalização das classes populares.
Opinando sobre a gestão educacional democrática Ferreira (2000, p. 306) diz que esta
é tomada de decisão, é organização, é direção. Relaciona-se com a atividade de
impulsionar uma organização a atingir seus objetivos, cumprir sua função,
desempenhar seu papel. Constitui-se de princípios e práticas decorrentes que
afirmam ou desafirmam os princípios que as geram. Esses princípios, entretanto, não
são intrínsecos à gestão como a concebia a administração clássica, mas são princípios
sociais, visto que a gestão da educação se destina à promoção humana.
IV - Considerações finais
educacional e escolar. Experimentada tal sensação se faz necessário indagar as razões para, estando
no século XXI, ser explicado o porquê de tal distanciamento. Sem pretensões de apresentar todos os
fatores pelos quais, no cenário educacional brasileiro – do Oiapoque ao Chuí – ainda precisamos
avançar em direção à consolidação da gestão democrática da educação e da escola, gostaríamos de
socializar as explicitações a seguir.
Somos, historicamente, uma sociedade construída sobre os alicerces da dominação, da
dependência e do autoritarismo. E para a manutenção e reprodução desse tipo de sociedade – e aqui
estamos falando da sociedade brasileira da qual fazemos parte – a educação escolar em muito
colaborou; inclusive essa contribuição se deu com o fato de ser um processo educativo excludente,
seletivo e autoritário. Obviamente, diante do que ora constatamos em relação à sociedade e à educação
brasileiras não podemos tomar como um dado cultural imutável; ao contrário, em se tratando de uma
construção histórica é possível, sim, o seu desmantelamento para, alicerçada em outras bases, ser
construída uma outra sociedade, uma outra educação. Utopia? Que o seja! Permitimo-nos pensar
nessa direção porque entendemos que a História humana também é movida pelas utopias e a sua
construção é possível desde que sujeitos concretos assumam as utopias revolucionárias e as
visibilizem em práticas sociais coletivamente sonhadas, democraticamente construídas e
igualitariamente assumidas.
Outro aspecto importante a ser considerado diz respeito ao peso, também histórico, do
patrimonialismo que se constituiu no primeiro estilo administrativo aplicado ao setor público. Por
esse fenômeno as elites brasileiras gravitavam em torno do Estado brasileiro arrancando deste os mais
diversos benefícios: “Sinecuras, prebendas, políticas públicas escandalosamente vantajosas, poder
político e social, empréstimos mais que favoráveis, garantia de impunidade na operação de uma
infinidade de mecanismos de corrupção, clientelismo, patronagem e uma lista sem fim de privilégios”
(TORRES, 2004, p. 143).
O patrimonialismo configura-se, ainda, como uma incestuosa relação entre o público
e o privado, ou seja, na utilização da coisa pública como algo privado. Vale ressaltar que em muito a
educação e a escola pública brasileiras foram contaminadas por tal relação. A título de ilustração
lembramos: i) a defesa de que o setor privado de ensino deveria ser subvencionado por verbas
públicas5; ii) a visão da função de diretor escolar como “cargo de confiança” a ser preenchido apenas
por profissionais que estivessem sintonizados com o poder político, o que, de certa forma, implicava
a nomeação de parentes, amigos ou correligionários.
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Notadamente, por ocasião da elaboração das nossas duas leis de diretrizes e bases da educação nacional (a
Lei 4024/61 e a Lei 9.394/96) as reivindicações dos privatistas se apresentaram com bastante fôlego. Por outro
lado, a proteção para o ensino privado tem ocupado ponderável espaço na pauta dos debates travados no
Congresso Nacional.
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Indicadores de Aprendizagem
13 – Comentar os dois principais fatores que, em nosso País, tem contribuído para a
não efetivação da gestão democrática da educação.