Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Abstract
The lynchings that took place in Brazil had an expressive increase in the last decades,
according to studies carried out by specialists in the area. This work aims to analyze and
demonstrate how the institutions that administer justice in Brazil seem to have lost control,
leaving the population at the mercy of criminality, thus creating "sensible" justifications for
the crowds to carry out episodes of justice with their own hands . The crisis in the legitimacy
of institutions, the general feeling of impunity on the part of those who commit a crime, and
analyzes of specific cases, which perhaps demonstrate a slight change in the national scenario,
are identified during the work exposed. The model of the event is standardized, almost
ritualistic, being usually someone suspected of committing some type of crime, the victim of
the so-called “popular justice”. However, there may be cases where rumors arise, and the
victim, taken by surprise, can be killed without even speaking or doing anything, to deserve a
death penalty triggered by the population. The theme is extremely important to understand
how the State has failed to transmit security and justice to the population.
Keywords: Lynchings. Social justice. Violence. Public security.
1.Introdução
O tema proposto neste trabalho torna-se peculiar, por não poder ser considerado
um tema estritamente jurídico. Tratando de uma análise sociológica acerca da crescente onda
de violência, sensação de impunidade, falhas no modelo de segurança pública que culminam
com o problema do linchamento, podendo assim ultrapassar a análise jurídica formal.
O objetivo geral deste estudo é entender como o linchamento vem se apresentando
no decorrer da história até o “modus operandi” social em que ele é aplicado contra indivíduos
“criminosos” (antes mesmos de serem suspeitos), além de compreender o porquê do gradativo
crescimento no número de casos de linchamento no Brasil.
Os objetivos específicos deste tratam de demonstrar as falhas em nosso sistema de
segurança púbica, apresentando os problemas relativos à falta de políticas públicas aumentar a
segurança ao cidadão; problemas na aplicabilidade da justiça, desde a falta de situações
típicas no Código Penal que poderiam cercear ou talvez prevenir o acontecimento dos
linchamentos, até o simples fato de que a sensação de impunidade no Brasil nunca pareceu tão
próxima do cidadão comum, mesmo demonstrando que tal afirmação torna-se uma falácia ao
final deste trabalho. Demonstrar também o real acontecimento de casos de linchamentos e
quais seus respectivos reflexos penais até o presente momento.
No início o trabalho visa demonstrar a evolução das punições aplicadas ao infrator nas
sociedades antigas, medievais e modernas, e o surgimento do cárcere como uma pena
humanizada.
Na tentativa de compreender o porquê do linchamento ocorrer, abrange-se o
estudo do Estado de Natureza a partir da visão de três dos maiores teóricos e estudiosos a
respeito do tema. Sendo eles: Locke, Hobbes e Rousseau. A compreensão do Estado de
Natureza humano faz-se necessário visando entender os motivos pelos quais o homem, na
atual sociedade, sente-se poderoso o suficiente para decidir quem vive e quem morre sem
respeitar o pacto contratual realizado em favor do Soberano, tendo em vista que ao conviver
em sociedade, não se deve atravessar as leis que todos estão submetidos.
A evolução dos linchamentos no Brasil como uma crise social demonstra a
sensação de impunidade corrobora para o aumento da crise dos linchamentos no Brasil.
Com relação à motivação simples e pura do linchamento, trata-se do tema, justiça,
como a próprio problema se apresenta, sendo considerada uma “justiça social”. Nesse ponto,
demonstra a definição, e atribuição da justiça no atual modelo social em que vivemos.
Os linchamentos ocorrem por que a sensação de impunidade além de
“demonstrar” a aplicação da lei, traz a tona o pensamento dos linchadores de que a justiça não
os alcançará, ou caso alcance, irá toma-los de forma mais branda, tendo em vista o breve
estudo a respeito do Código Penal. Como no Brasil a lei é desrespeitada por muitos, inclusive
pelos tribunais, este se torna um pensamento que muitas vezes está certo, ninguém será
punido pelo linchamento cometido, porém, existem exceções recentes que demonstram que os
casos, começam a ser investigados, e pessoas começam a ser punidas.
Os casos concretos apresentados visam demonstrar que este tema, é real,
difundido na mídia e no meio social, porém pouco discutido, tornou-se mais um problema
social a ser debatido no Brasil, e que as instituições de segurança pública tem falhado
miseravelmente em evitar tais situações.
2.O Estado
Fica claro em nosso dicionário que o povo exigia punições corporais ou até
mesmo da perda de vida em razão dos delitos que a sociedade fazia. Para Foucault a questão
é a crueldade ou não do suplício. O que ele mostra é que o suplício integra um sistema ou
regime jurídico-político, isso é, uma forma de pena própria da soberania medieval.
Foucault afirma que “O Suplício de exposição do condenado foi mantido na França até
1831[...]; [...] é finalmente abolida em abril de 1848” (FOUCAULT, 2012 p. 14).
Diante tal citação, é demonstrado que mesmo após a Revolução Francesa, os
condenados (ou acusados de algum crime) eram ainda publicamente expostos, sofrendo
dolorosas penas conforme o delito cometido.
A partir desta análise, pode-se notar também o ponto de vista de Beccaria, (WEB,
2016, p. 100) aduzindo que “O assassínio, que nos parece como um crime horrível, nós o
vemos cometer friamente e sem remorso”.
As execuções públicas, mesmo que perpetradas pelo Estado, sob a égide da
Justiça, na visão de Beccaria, (BECCARIA, 2016, p. 98) “Não é absurdo que as leis, que são a
expressão da vontade geral, que detestam e punem o homicídio, ordenem um morticínio
público, para desviar os cidadãos do assassínio?”, logo, como pode o Estado matar alguém,
por que este alguém matou outrem? Ou seja, por mais que o Estado tenha sobre si o “direito à
punição”, como pode o Estado punir com o mesmo “crime” que cometeu o infrator?
Cesare Beccaria, em seu livro “Dos Delitos e das Penas” trata a questão muito
bem no capítulo II, realizando uma espécie de análise de Thomas Hobbes aplicando a lei
natural de sobrevivência humana, e remetendo a leitura do início de seu texto à guerra de
todos contra todos, já aplicada por Hobbes em 1651, Beccaria (BECCARIA, 2016, p. 28,) diz:
[...] pode assumir enquanto tal três formas: poder físico e constritivo, que tem a sua
expressão concreta mais visível no poder militar: poder psicológico à base de
ameaças de punição ou de promessas de recompensas, em que consiste
principalmente o domínio econômico: poder mental, que se exerce através da
persuasão e da dissuasão e tem a sua forma elementar, presente em todas as
sociedades, na educação.
O próprio Hobbes afirma que para a segurança dos súditos, que é o fim supremo do
Estado, e, portanto da instituição do poder político, é necessário que alguém, não
importa se pessoa física ou assembleia, “tenha legitimamente no Estado o sumo
poder”. [1642, trad. It, p. 165] (BOBBIO, 2005, p. 88).
3.Linchamentos
A própria comunidade adere a ideia de que linchar resolve e nas palavras de José
de Souza Martins:
A questão central é esta: por que a população lincha? A partir do conhecimento que
se tem de diferentes modalidades de linchamento em diferentes lugares do país, a
hipótese mais provável é a de que a população lincha para punir, mas sobretudo
para indicar seu desacordo com alternativas de mudança social que violam
concepções, valores e normas de conduta tradicionais, relativas a uma certa
concepção do humano. (MARTINS, 2015, p. 27).
E nesse ponto, que é citado, é fácil compreender por que a sociedade brasileira
tem se tornado cada vez mais violenta “A violência é um assunto que ocupa parte
considerável do conteúdo veiculado na mídia neste início do século XXI, embora quase
sempre de uma perspectiva superficial e reducionista” (BARBOSA, WEB, 2016).
Sobre o tema, o professor Adel El Tasse acrescenta:
Pode-se concluir com isso, que nunca se prendeu tanto no Brasil. Nunca se
colocou tanta gente atrás das grades como nos últimos 20 anos. E mesmo com tantos dados
estatísticos demonstrando essas afirmações, a sensação de impunidade parece só aumentar
com o passar dos anos. De que os crimes no Brasil podem ser cometidos por qualquer pessoa
sem que a lei os alcance.
Toda a discussão que se realizou até este momento traz, à tona o que
provavelmente é o ponto principal da questão acerca dos linchamentos. A justiça.
Uma busca simples realizada em qualquer dicionário pela palavra “justiça”
encontra várias definições, desde as mais simples até as mais complexas, como por exemplo,
a definição encontrada no Vocabulário Jurídico Conciso de De Plácido e Silva, que segue:
Para Aristóteles, justiça significa dar às pessoas o que elas merecem, dando a cada
um o que lhe é devido. Mas o que uma pessoa merece? Quais são as justificativas
relevantes para o mérito? Isso depende do que está sendo distribuído. A justiça
envolve dois fatores: “as coisas e as pessoas a quem elas são destinadas”. E
geralmente dizemos que “pessoas iguais devem receber coisas também iguais”.
Esse é um dos pensamentos mais famosos acerca da concepção da palavra Justiça,
e este, traz reflexos desde os tempos em que Aristóteles refletiu e posicionou-se sobre o tema,
até os dias atuais.
Não é necessário dizer que o linchamento, como ato de justiça é justamente o
contrário de “ordem”, pois ele ocorre de maneira descontrolada e, obviamente desorganizada.
De todo o apresentado até o momento, é evidente que o significado de justiça não
se assemelha em nada, do que é chamado por “justiça social”, no que se apresenta a toda a
sociedade como um linchamento.
4.Código Penal
Linchar é crime isso é fato, porém não existe tipo penal especifico para o ato de
linchar, já definido anteriormente neste trabalho. Para ser bem claro, o atual Código Penal
atenua crimes cometidos em “concurso de agentes” como previsto no Art. 65, que ainda inclui
outro atenuante que pode ainda ser aplicado ao caso, segue:
A doutrina clássica em geral, sustenta ser necessário cogitar, tanto para o relevante
valor social quanto para o relevante valor moral, a consciência ético-social em geral
ou o senso comum. (BUSATO, 2016)
O linchamento é uma pena informal aplicada pelos populares, sendo assim
desproporcional em relação ao crime praticado pelo linchado. Tendo em vista que o objetivo
é a morte da vítima do crime praticado por aquele que foi linchado, em um caso de
furto/roubo com ou sem a aplicação da violência, a proporcionalidade não existe, muitas
vezes, aplicando-se linchamentos as pessoas que não participaram de nenhuma ação que possa
vir a ser entendida como um crime típico em certa época (como por exemplo, uma mãe
linchada por bater em seu filho que havia a desrespeitado). Para José de Souza Martins (2015,
p. 54) “O linchamento não é uma violência original: é uma segunda violência. Está
fundamentalmente baseado num julgamento moral”.
De acordo com o exposto sobre a alínea “a”, e com o explicitado até aqui,
aplicando analogamente ao caso do linchamento, a população que o comete entende que é
possível repreender penalmente o (suposto) criminoso sem que o Estado interfira na ocasião,
já que ela entende que o Estado não irá agir para responsabilizar o possível infrator, ela age.
A alínea “e” do art. 65 do Código Penal no que se refere ao crime de multidão é o
ponto do código que trata sobre algo relativamente próximo do que pode ser considerado
quando ocorre um linchamento: mais de um agente, crime é cometido por todos ou várias
pessoas que influenciam outra quantidade grande de pessoas a cometerem o justiçamento,
Jose de Souza Martins (2015, p. 105) diz que:
6.Referências Bibliográficas
http://g1.globo.com/politica/dias-de-intolerancia/platb/
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 20. ed. São Paulo:
Saraiva 2014.
BOBBIO, Norberto, 1909. Estado, governo, sociedade; por uma teoria geral da política. 12.
ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.
BRASIL. Decreto Lei Nº 2.848, de 7 de Dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão; tradução Raquel Ramalhete, 40.
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
MARTINS, José de Souza. Linchamentos: Justiça Popular no Brasil. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2015.
SANDEL, Michael J. JUSTIÇA – O que é fazer a coisa certa? 17. ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2015.