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LINCHAMENTO: (IN)JUSTIÇA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Luana Carolina Pereira Rhenius Giovanella

Resumo

Os linchamentos, ocorridos no Brasil tiveram um aumento expressivo nas últimas décadas


conforme estudos realizados por especialistas na área. Este trabalho visa analisar e demonstrar
que, como as instituições que administram a justiça no Brasil parecem ter perdido o controle,
deixando a população à mercê da criminalidade, criando assim, justificativas “sensatas” para
que as multidões realizem episódios de justiça com suas próprias mãos. Identifica-se ao
decorrer do trabalho exposto, a crise da legitimidade das instituições, a sensação geral de
impunidade por parte de quem comete algum crime, e análises acerca de casos concretos, que
demonstrem talvez uma leve mudança no cenário nacional. O modelo do acontecimento é
padronizado, quase ritualístico, sendo geralmente algum suspeito de praticar algum tipo de
crime, a vítima da chamada “justiça popular”. Porém, pode ocorrer casos em que boatos
surgem, e a vítima, pega de surpresa, pode ser morta sem nem mesmo falar ou fazer qualquer
coisa, para que mereça uma pena de morte deflagrada pela população. O tema é de extrema
importância para se compreender como o Estado tem falhado em transmitir segurança e
justiça à população.

Palavras-chave: Linchamentos. Justiça Social. Violência. Segurança Pública.

Abstract

The lynchings that took place in Brazil had an expressive increase in the last decades,
according to studies carried out by specialists in the area. This work aims to analyze and
demonstrate how the institutions that administer justice in Brazil seem to have lost control,
leaving the population at the mercy of criminality, thus creating "sensible" justifications for
the crowds to carry out episodes of justice with their own hands . The crisis in the legitimacy
of institutions, the general feeling of impunity on the part of those who commit a crime, and
analyzes of specific cases, which perhaps demonstrate a slight change in the national scenario,
are identified during the work exposed. The model of the event is standardized, almost
ritualistic, being usually someone suspected of committing some type of crime, the victim of
the so-called “popular justice”. However, there may be cases where rumors arise, and the
victim, taken by surprise, can be killed without even speaking or doing anything, to deserve a
death penalty triggered by the population. The theme is extremely important to understand
how the State has failed to transmit security and justice to the population.
Keywords: Lynchings. Social justice. Violence. Public security.

1.Introdução

O tema proposto neste trabalho torna-se peculiar, por não poder ser considerado
um tema estritamente jurídico. Tratando de uma análise sociológica acerca da crescente onda
de violência, sensação de impunidade, falhas no modelo de segurança pública que culminam
com o problema do linchamento, podendo assim ultrapassar a análise jurídica formal.
O objetivo geral deste estudo é entender como o linchamento vem se apresentando
no decorrer da história até o “modus operandi” social em que ele é aplicado contra indivíduos
“criminosos” (antes mesmos de serem suspeitos), além de compreender o porquê do gradativo
crescimento no número de casos de linchamento no Brasil.
Os objetivos específicos deste tratam de demonstrar as falhas em nosso sistema de
segurança púbica, apresentando os problemas relativos à falta de políticas públicas aumentar a
segurança ao cidadão; problemas na aplicabilidade da justiça, desde a falta de situações
típicas no Código Penal que poderiam cercear ou talvez prevenir o acontecimento dos
linchamentos, até o simples fato de que a sensação de impunidade no Brasil nunca pareceu tão
próxima do cidadão comum, mesmo demonstrando que tal afirmação torna-se uma falácia ao
final deste trabalho. Demonstrar também o real acontecimento de casos de linchamentos e
quais seus respectivos reflexos penais até o presente momento.
No início o trabalho visa demonstrar a evolução das punições aplicadas ao infrator nas
sociedades antigas, medievais e modernas, e o surgimento do cárcere como uma pena
humanizada.
Na tentativa de compreender o porquê do linchamento ocorrer, abrange-se o
estudo do Estado de Natureza a partir da visão de três dos maiores teóricos e estudiosos a
respeito do tema. Sendo eles: Locke, Hobbes e Rousseau. A compreensão do Estado de
Natureza humano faz-se necessário visando entender os motivos pelos quais o homem, na
atual sociedade, sente-se poderoso o suficiente para decidir quem vive e quem morre sem
respeitar o pacto contratual realizado em favor do Soberano, tendo em vista que ao conviver
em sociedade, não se deve atravessar as leis que todos estão submetidos.
A evolução dos linchamentos no Brasil como uma crise social demonstra a
sensação de impunidade corrobora para o aumento da crise dos linchamentos no Brasil.
Com relação à motivação simples e pura do linchamento, trata-se do tema, justiça,
como a próprio problema se apresenta, sendo considerada uma “justiça social”. Nesse ponto,
demonstra a definição, e atribuição da justiça no atual modelo social em que vivemos.
Os linchamentos ocorrem por que a sensação de impunidade além de
“demonstrar” a aplicação da lei, traz a tona o pensamento dos linchadores de que a justiça não
os alcançará, ou caso alcance, irá toma-los de forma mais branda, tendo em vista o breve
estudo a respeito do Código Penal. Como no Brasil a lei é desrespeitada por muitos, inclusive
pelos tribunais, este se torna um pensamento que muitas vezes está certo, ninguém será
punido pelo linchamento cometido, porém, existem exceções recentes que demonstram que os
casos, começam a ser investigados, e pessoas começam a ser punidas.
Os casos concretos apresentados visam demonstrar que este tema, é real,
difundido na mídia e no meio social, porém pouco discutido, tornou-se mais um problema
social a ser debatido no Brasil, e que as instituições de segurança pública tem falhado
miseravelmente em evitar tais situações.

2.O Estado

Com relação ao aumento do índice de linchamentos na sociedade atual, se faz


necessário a analise do contexto histórico e origem desta prática. Presente desde os
primórdios humanos, o que se questiona é como esta prática de cunho brutal ainda encontra-se
presente nos dias de hoje.
Na Alta Idade Média, diante de uma sociedade muito arcaica, existia muito pouco
senso de justiça, fazendo as pessoas suplicarem por punições aos infratores. Esta prerrogativa,
fica evidente na leitura de “Vigiar e Punir” de Michel Foucault, que designa que as punições
públicas ocorridas na baixa e já alta Idade Média como “Suplícios” (FOUCAULT, 2012).
Nos dicionários da língua portuguesa, vê-se a seguinte definição de suplício em
Michaelis, (WEB, 2021):

(lat supliciu) 1 preces ou rogativa pública que se faziam antes da execução de um


criminoso. 2 severa punição corporal ordenada por sentença de justiça; tortura. 3
pena de morte; execução capital. 4 tudo que produz dor intensa, violenta ou
duradoura no corpo.
Ainda sobre os suplícios, encontra-se a seguinte definição de Foucault:

Pena corporal, dolorosa, mais ou menos atroz [dizia Jaucourt]; e acrescentava: “é um


fenômeno inexplicável a extensão da imaginação dos homens para a barbárie e a
crueldade”. (ENCYCLOPEDIÉ apud, FOUCAULT, 2012 p. 35).

Fica claro em nosso dicionário que o povo exigia punições corporais ou até
mesmo da perda de vida em razão dos delitos que a sociedade fazia. Para Foucault a questão
é a crueldade ou não do suplício. O que ele mostra é que o suplício integra um sistema ou
regime jurídico-político, isso é, uma forma de pena própria da soberania medieval.
Foucault afirma que “O Suplício de exposição do condenado foi mantido na França até
1831[...]; [...] é finalmente abolida em abril de 1848” (FOUCAULT, 2012 p. 14).
Diante tal citação, é demonstrado que mesmo após a Revolução Francesa, os
condenados (ou acusados de algum crime) eram ainda publicamente expostos, sofrendo
dolorosas penas conforme o delito cometido.
A partir desta análise, pode-se notar também o ponto de vista de Beccaria, (WEB,
2016, p. 100) aduzindo que “O assassínio, que nos parece como um crime horrível, nós o
vemos cometer friamente e sem remorso”.
As execuções públicas, mesmo que perpetradas pelo Estado, sob a égide da
Justiça, na visão de Beccaria, (BECCARIA, 2016, p. 98) “Não é absurdo que as leis, que são a
expressão da vontade geral, que detestam e punem o homicídio, ordenem um morticínio
público, para desviar os cidadãos do assassínio?”, logo, como pode o Estado matar alguém,
por que este alguém matou outrem? Ou seja, por mais que o Estado tenha sobre si o “direito à
punição”, como pode o Estado punir com o mesmo “crime” que cometeu o infrator?
Cesare Beccaria, em seu livro “Dos Delitos e das Penas” trata a questão muito
bem no capítulo II, realizando uma espécie de análise de Thomas Hobbes aplicando a lei
natural de sobrevivência humana, e remetendo a leitura do início de seu texto à guerra de
todos contra todos, já aplicada por Hobbes em 1651, Beccaria (BECCARIA, 2016, p. 28,) diz:

A moral política não pode proporcionar à sociedade nenhuma vantagem durável, se


não for fundada sobre sentimentos indeléveis do coração do homem. Toda a lei que
não for estabelecida sobre essa base encontrará sempre uma resistência à qual será
constrangida a ceder.

No ponto de vista filosófico, sobre a legitimidade da pena, não trata de fazer


entender o porquê de sua aplicação e qual o fundamento para aplicação. O que Beccaria faz é
uma teoria dos fins da pena, isso é, uma teoria do dever ser da pena útil/legítima, como já
cita Bitencourt (2014 p. 132) dizendo que “É bom esclarecer, desde já, que o conceito de pena
não se confunde com a teorização acerca da finalidade da pena e da função que esta
desempenha na sociedade”. Relembrando cada período histórico (na medida das
possibilidades) correlacionando ao máximo, argumentos e fatos na evolução do direito do Jus
Puniendi às Teorias sobre a pena. Sánchez (apud BITENCOURT, 2014, p. 132) ainda diz
“Em realidade, a pergunta sobre o que é a pena antecede tanto a indagação sobre para quê a
pena como a análise descritiva da função que esta desempenha numa sociedade concreta”.
Cabe ressaltar, que indo ao encontro com o que se tem dito, segundo Puig (apud
BITENCOURT, 2014. p. 132) “Segundo seu „conceito‟ a pena é um „mal‟ que se impõe „por
causa da prática de um delito‟: conceitualmente a pena é um „castigo‟”.
Frente a tudo que já foi explanado, é possível identificar como os linchamentos já
ocorriam em épocas passadas, de formas diferentes, e posteriormente as vinganças, tema
brevemente abordado a seguir, eram ainda evitados pelo Estado, tornando o acusado um
espetáculo a ser visto pela população, que não precisaria usar de seus meios para realizar
“justiça”, mas sim, apoiar o Estado a realizá-la.
Como o objeto estudado necessariamente deve ser as punições aplicadas pela
sociedade dentro de um Estado organizado, tal qual se conhece hoje, é preciso averiguar
rapidamente essa figura que mantém o ordenamento jurídico, sendo ele criado pelo poder
legislativo, analisado pelo Poder Judiciário e executado pelo poder executivo.
A questão é mais problemática do que parece, pois, quando da definição de
Estado, vários – grandes - autores realizaram análises a fim de entender como, quando e o
porquê do surgimento do Estado. Sendo um deles Bobbio, tendo entre outros, os autores
contratualistas, que demonstram a criação do Estado como a única forma de comuns ou
desiguais conviverem em uma sociedade de forma a manter a integridade de seus bens, seja
ela física ou patrimonial, deixando de lado o estado de natureza, abdicando de direitos, vindo
a se tornar parte de uma sociedade.
O termo Estado torna-se comum segundo Bobbio:

É fora de discussão que a palavra “Estado” se impôs através da difusão e pelo


prestígio do Príncipe de Maquiavel. A obra começa, como se sabe, com estas
palavras: “Todos os estados, todos os domínios que imperaram e imperam sobre os
homens, foram e são ou repúblicas ou principados” [1515, ed. 1977, p. 5]. Isto não
quer dizer que a palavra tenha sido introduzida por Maquiavel. (BOBBIO, 2005, p.
65).
A questão do Estado para Bobbio em seu livro “Estado Governo Sociedade”, é
bem etimológica em certo trecho de definição do termo, do que o estudo do Estado em si,
onde Bobbio explica do surgimento, questiona este surgimento, usos e desusos do termo,
argumentos a favor e contra dentre outros. Apesar disso, Bobbio faz em um de seus
subcapítulos a seguinte pergunta: Quando nasceu o Estado? O autor define da seguinte forma:

[...] o Estado entendido como ordenamento político de uma comunidade, nasce da


dissolução da comunidade primitiva fundada sore os laços de parentesco e da
formação de comunidades mais amplas derivadas da união de vários grupos
familiares por razões de sobrevivência interna (o sustento) e externa (a defesa).
(BOBBIO, 2005, p. 73)

Esse questionamento de Bobbio leva em consideração discussões que dialogam


com a seguinte temática: o Estado sempre existiu ou ele é uma criação da era moderna?
Bobbio afirma que esse debate se tornou comum entre antropólogos e sociólogos, na
discussão acerca do surgimento do Estado. Contudo o autor diz que, “Mesmo este debate é em
grande parte nominalista, na medida em que está condicionado pela multiplicidade de sentidos
do termo „Estado‟. (BOBBIO, 2005, p. 75).
Junto com a formação do “Estado”, ou com sua representação por organizações
sociais mais bem elaboradas (Bobbio fala de organizações políticas), é imperioso não ressaltar
o debate do poder, que é exercido por um grupo de pessoas que “governam” o Estado, de
forma a exercer a vontade do Estado, mesmo que, às vezes, sejam suas próprias vontades.
O poder segundo Bertrand Russell (1958 apud 2005, p. 77) citado por Bobbio
consiste na “produção dos efeitos desejados”, e conforme ele:

[...] pode assumir enquanto tal três formas: poder físico e constritivo, que tem a sua
expressão concreta mais visível no poder militar: poder psicológico à base de
ameaças de punição ou de promessas de recompensas, em que consiste
principalmente o domínio econômico: poder mental, que se exerce através da
persuasão e da dissuasão e tem a sua forma elementar, presente em todas as
sociedades, na educação.

Bobbio realiza uma síntese de várias definições de poder, e de qual é a real


finalidade de seu uso, abrangendo a compreensão de outros autores que realizam a mesma
análise.
A apreciação do Poder para definir o que é o Estado, torna-se importante, devido à
função que lhe é dada, de organizador do ambiente social, onde o Estado mantém sob seus
domínios, sua autoridade, exercida através do poder estatal, especificamente nesse caso o
poder de punição ou o poder de força física, que apenas a ele é atribuído na era moderna. Para
Bobbio (2005) o exercício do poder através da força física, se exprime no poder político, que
segundo ele alega, uma teoria realista do poder político como uma forma de poder distinto de
qualquer outra, constitui-se através da elaboração, conforme juristas medievais, do conceito
de soberania.
Em todo o caso, o uso da força física através do poder político entra em choque no
início da era moderna com o nascimento do Estado, como ele é conhecido, pois “O uso da
força física é a condição necessária para a definição do poder político, mas não a condição
suficiente”. (BOBBIO, 2005 p. 80). O uso do poder entra em conflito, poder político contra o
poder da igreja, e nesse caso o único que detém a exclusividade de uso da força a partir é o
Estado, que o exerce sobre determinado território. (BOBBIO, 2005).
A legitimação do poder, que define o Estado como único capaz de utilizá-lo na
medida de força em qualquer forma, demonstra que no Estado moderno o único real
“proprietário” do poder é o Estado, e nesse caso, Bobbio cita Hobbes:

O próprio Hobbes afirma que para a segurança dos súditos, que é o fim supremo do
Estado, e, portanto da instituição do poder político, é necessário que alguém, não
importa se pessoa física ou assembleia, “tenha legitimamente no Estado o sumo
poder”. [1642, trad. It, p. 165] (BOBBIO, 2005, p. 88).

Demonstrado o Estado e o poder, sendo de todas as formas a principal para o


estudo, o poder político e sua legitimidade, existem muitas outras razões teóricas para a
explicação do poder do Estado e sua legitimidade, legitimando também o direito de punir, ou,
jus puniendi.

3.Linchamentos

O primeiro linchamento registrado no Brasil ocorreu em 1585, em Salvador,


quando um indígena convertido ao cristianismo afirmou que era o Papa. O homem foi
linchado, porque muitos fiéis se ofenderam com a situação. O linchamento da forma como se
conhece atualmente não se iniciou nesses moldes. O termo “linchamento” já teve várias
definições, mas como regra geral, e já citada anteriormente, tornou-se a maneira de realizar
referência a uma forma de justiça sumária, executada por particulares de modo direto, sem a
mediação ou consenso do Estado (NATAL, 2012).
A relação do linchamento com a justiça tem se tornado uma realidade mais viva
com o passar dos anos, apesar de nem sempre ter sido dessa maneira. Ariadne Natal em sua
pesquisa associou grande parte das situações ocorridas que se caracterizavam como
linchamentos, devido a vários fatores. Seu estudo se baseou em um grande prazo de pesquisa
e avaliação, numa zona delimitada (Região Metropolitana de São Paulo), que culminou
encontrar como principal motivo, a falta de presença do Estado, que exercia poder sobre as
grandes metrópoles no início e meio da década de 80 (tendo em vista que o país ainda se
encontrava em uma ditadura militar), porém não era capaz de alcançar as periferias (NATAL,
2012).
Segundo ela:

Os atores populares, habitantes de favelas, cortiços, periferias foram considerados


personagens novos, expressavam interesses de comunidades com pouco espaço e até
então alijados do exercício de cidadania, mas que ao tornar públicas suas
necessidades e reivindicar políticas adequadas (sobretudo relacionadas às questões
habitacionais) e trouxeram consigo a esperança de que a democracia poderia
produzir justiça social de fato (FELTRAN, 2007 apud NATAL, 2012, p. 27). (grifo
nosso).

Identificado isso, e definido o período que marcou a abertura política no país, a


Constituição de 1988 foi um marco na melhora dos direitos civis, liberdades econômicas e
políticas, também transformando a vida de camadas sociais menos favorecidas. Porém,
segundo Ariadne Natal (2012) como consequência, a sociedade brasileira tornou-se
extremamente complexa, no que tange as relações entre as classes sociais, a luta pelo
reconhecimento de direitos e de identidades o que resultou no aumento de reivindicações para
maior participação popular na seara política e resolver definitivamente antigos problemas
sociais (ADORNO, 2002).
No Brasil, a segurança pública faz parte, assim como outros setores, de áreas que
carecem de investimento estatal. Nesse caso específico, a segurança pública tem
responsabilidade direta, cita Ariadne Natal:

As mudanças repentinas e significativas com relação às características e volume de


criminalidade não foram acompanhadas por avanços equivalentes nos sistemas de
segurança pública e justiça criminal, de maneira que impor a lei e a ordem e manter
o monopólio estatal da violência se tornaram tarefas mais complicadas,
principalmente em meio a uma crise econômica que minguou também estes
problemas e, ao invés de aumentar a eficiência e o profissionalismo das forças
públicas e tribunais, apelaram para soluções que tiveram pouco impacto ou até
mesmo agravaram a violência urbana ( NATAL, 2012, p. 33).
Dentro da atual lógica de segurança pública aplicada (que vem sendo mantida
desde os tempos da ditadura militar) o delinquente, é visto como inimigo, e assim ele deve ser
abatido; as práticas de segurança pública utilizadas no Brasil agravaram os problemas de
segurança no país e criaram novos, como esquadrões da morte, execuções sumárias, milícias
formadas por policiais e outros agentes de segurança do Estado, sem contar nas torturas e nos
linchamentos praticados pela população, que ocorreram e continuam ocorrendo sem que o
Estado interfira (NATAL, 2002).
As grandes falhas no atual modelo de segurança pública aplicada no Brasil, que
acabou gerando mais violência contra a população, porém de nada resolveu. Os números da
violência no país estão dentre os que tiveram um grande aumento na década de 80 e 90, não
param de aumentar, com leves exceções em algumas regiões do país.
Outro ponto no Brasil que tem demonstrado grande relevância para o aumento no
número de casos de linchamentos noticiados pela mídia, é o próprio apelo midiático, que
mostra a violência crescente no Brasil com a visão de um show em programas na televisão
aberta, geralmente em horário nobre, e que gera uma sensação de impunidade, como diz:

MENDES (2003) destacou a importância da mídia, e, especialmente a televisão, na


influência de tal instrumento na conduta antissocial que pode ter o indivíduo. Depois
de ressaltar a irrupção, na sociedade, das modernas técnicas de difusão,
profundamente modificadores da autonomia humana, o autor afirma, com inteira
razão, que a mídia vêm ocupando o universo mental do indivíduo, e, sem dúvida
alguma, orientam o sentido de sua conduta. (BARBOSA, 2016).

A própria comunidade adere a ideia de que linchar resolve e nas palavras de José
de Souza Martins:

A questão central é esta: por que a população lincha? A partir do conhecimento que
se tem de diferentes modalidades de linchamento em diferentes lugares do país, a
hipótese mais provável é a de que a população lincha para punir, mas sobretudo
para indicar seu desacordo com alternativas de mudança social que violam
concepções, valores e normas de conduta tradicionais, relativas a uma certa
concepção do humano. (MARTINS, 2015, p. 27).

A sensação de impunidade que é repassada pela mídia, se torna crescente a cada


ano, tendo em vista o crescimento do alcance que ela toma nas regiões do país.
Os meios de comunicação estão muito avançados, isso é um fato. Todas as
notícias e acontecimentos correm o país e o mundo de forma extremamente veloz e isso torna
a mídia muito influente em tudo que propaga.
Barbosa cita que:

A televisão representa o mais extraordinário meio de comunicação de um século


marcado exatamente pela excelência técnica e importância crescente da imprensa em
todas as suas modalidades. A força da televisão reside menos em suas características
de movimento, som e imagem, que na facilidade com que se coloca no interior dos
lares, onde frequentemente ocupa o centro das atenções. (BARBOSA, WEB, 2016).

E nesse ponto, que é citado, é fácil compreender por que a sociedade brasileira
tem se tornado cada vez mais violenta “A violência é um assunto que ocupa parte
considerável do conteúdo veiculado na mídia neste início do século XXI, embora quase
sempre de uma perspectiva superficial e reducionista” (BARBOSA, WEB, 2016).
Sobre o tema, o professor Adel El Tasse acrescenta:

O pânico gerado na sociedade latino-americana atual decorre do chamado discurso


político do crime, em que as condutas catalogadas pela lei penal como delituosas são
exploradas de forma sensacionalista pelos veículos de comunicação de massa, assim
como por determinados setores da sociedade, como parte da classe política, do
ministério público e da polícia, em especial interessados na apresentação do crime
de maneira monstruosa. (TASSE, 2009, p. 12,).

O autor acima referenciado trata do assunto pela ótica de um “agigantamento” dos


poderes conferidos ao Estado (que detém o direito da punição efetiva) na hora de efetivar a
punição do delito cometido, nesse sentido, se o Estado tem a liberdade de ultrapassar seus
limites legais, por que a sociedade também não tentaria tomar para ela o poder da efetiva
punição no caso de possíveis falhas estatais? É visível que a sociedade não tem aceitado de
forma alguma o modo como o Estado tem lidado com a violência, o problema é que, de fato,
não se pode concordar, afinal de contas a violência tratada com violência, gera mais violência.
O grande problema aqui analisado é: o Estado realmente tem fracassado no exercício de punir,
ou isso é uma ação midiática típica da sociedade brasileira?
A violência apresentada pela mídia e os poucos “atos punitivos” que se advém a
partir da apresentação dessas violências, geram dois fatores chaves: a compreensão no que se
pode chamar de “legitimação do aumento de poder estatal” para realizar punições, e como a
população (ou parte dela, ou parte da sociedade) ao mesmo tempo se apresenta tomando para
si esses poderes, nesse sentido.
Esta análise deve ser realizada de forma cuidadosa, pois, ao mesmo tempo em que
isso se pode tornar uma falácia de um lado, por outro lado, ela pode ser considerada
verdadeira. Quais os crimes impunes no Brasil? O Brasil não condena ninguém? Dados
estatísticos retirados de diversas fontes oficiais tratam da situação carcerária no Brasil como
uma das mais crescentes e mais alarmantes no mundo, como se pode verificar através da
notícia veiculada no site do CNJ por Manuel Montenegro:

A nova população carcerária do Brasil é de 711.463 presos. Os números


apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a representantes dos
Tribunais de Justiças brasileiros [...], levam em conta as 147.937 pessoas em prisão
domiciliar. Para realizar o levantamento inédito, o CNJ consultou os juízes
responsáveis pelo monitoramento carcerário dos 26 estados e do Distrito Federal. De
acordo com dados anteriores do CNJ que não contabilizavam prisões domiciliares,
[...] a população carcerária era de 563.526. [...]. Com as novas estatísticas, o Brasil
passa a ter a terceira maior população carcerária do mundo, segundo dados do ICPS,
sigla em inglês para Centro Internacional de Estudos Prisionais, do King‟s College,
de Londres. As prisões domiciliares fizeram o Brasil ultrapassar a Rússia com
676.400 presos. (MONTENEGRO, WEB, 2016).

Pode-se concluir com isso, que nunca se prendeu tanto no Brasil. Nunca se
colocou tanta gente atrás das grades como nos últimos 20 anos. E mesmo com tantos dados
estatísticos demonstrando essas afirmações, a sensação de impunidade parece só aumentar
com o passar dos anos. De que os crimes no Brasil podem ser cometidos por qualquer pessoa
sem que a lei os alcance.
Toda a discussão que se realizou até este momento traz, à tona o que
provavelmente é o ponto principal da questão acerca dos linchamentos. A justiça.
Uma busca simples realizada em qualquer dicionário pela palavra “justiça”
encontra várias definições, desde as mais simples até as mais complexas, como por exemplo,
a definição encontrada no Vocabulário Jurídico Conciso de De Plácido e Silva, que segue:

JUSTIÇA. Derivado de justitia, de justus, quer o vocábulo exprimir na linguagem


jurídica, o que se faz conforme o Direito ou segundo as regras prescritas em lei.
É, assim, a prática do justo ou a razão de ser do próprio Direito, pois que por ela se
reconhecem a legitimidade dos direitos e se restabelece o império da própria lei.
(SILVA, p. 377, 2012).

Ou seja, de acordo com o supracitado, pode-se entender que a definição de


Aristóteles acerca de Justiça é muito comum, entendimento este repassado por Michael J.
Sandel em seu livro “Justiça, o que é fazer a coisa certa”. Sandel (2015, p. 234) ainda diz que:

Para Aristóteles, justiça significa dar às pessoas o que elas merecem, dando a cada
um o que lhe é devido. Mas o que uma pessoa merece? Quais são as justificativas
relevantes para o mérito? Isso depende do que está sendo distribuído. A justiça
envolve dois fatores: “as coisas e as pessoas a quem elas são destinadas”. E
geralmente dizemos que “pessoas iguais devem receber coisas também iguais”.
Esse é um dos pensamentos mais famosos acerca da concepção da palavra Justiça,
e este, traz reflexos desde os tempos em que Aristóteles refletiu e posicionou-se sobre o tema,
até os dias atuais.
Não é necessário dizer que o linchamento, como ato de justiça é justamente o
contrário de “ordem”, pois ele ocorre de maneira descontrolada e, obviamente desorganizada.
De todo o apresentado até o momento, é evidente que o significado de justiça não
se assemelha em nada, do que é chamado por “justiça social”, no que se apresenta a toda a
sociedade como um linchamento.

4.Código Penal

Linchar é crime isso é fato, porém não existe tipo penal especifico para o ato de
linchar, já definido anteriormente neste trabalho. Para ser bem claro, o atual Código Penal
atenua crimes cometidos em “concurso de agentes” como previsto no Art. 65, que ainda inclui
outro atenuante que pode ainda ser aplicado ao caso, segue:

Art. 65 – São circunstâncias que sempre atenuam a pena:


[...]
III – Ter o Agente
a) Cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral
[...]
e) Cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.
(CÓDIGO PENAL/1940, WEB, 2016)

É possível identificar que de todos os casos analisados pelo professor José de


Souza Martins em seu livro sobre o tema na soma total. 97% dos casos de linchamentos
compreende o tipo descrito na alínea “a” do artigo 65. (MARTINS, 2015). O grande problema
se encontra no objeto que trata esta alínea, já que “relevante valor social ou moral” são
conceitos relativos, dada as devidas proporções à época em que o fato é cometido. Algo que
há 30 anos era socialmente aceito, hoje pode não ser, e vice-versa, sendo assim:

A moral é, na base, heterônoma e prática, recebida por aprendizado e coerção,


mecanismos que dão ensejo à sua formação autônoma. Como estes mecanismos e
experiências que geram a formação da moral autônoma são os mais díspares
possíveis, não é razoável esperar pela constituição de uma “moral uniforme”.

A doutrina clássica em geral, sustenta ser necessário cogitar, tanto para o relevante
valor social quanto para o relevante valor moral, a consciência ético-social em geral
ou o senso comum. (BUSATO, 2016)
O linchamento é uma pena informal aplicada pelos populares, sendo assim
desproporcional em relação ao crime praticado pelo linchado. Tendo em vista que o objetivo
é a morte da vítima do crime praticado por aquele que foi linchado, em um caso de
furto/roubo com ou sem a aplicação da violência, a proporcionalidade não existe, muitas
vezes, aplicando-se linchamentos as pessoas que não participaram de nenhuma ação que possa
vir a ser entendida como um crime típico em certa época (como por exemplo, uma mãe
linchada por bater em seu filho que havia a desrespeitado). Para José de Souza Martins (2015,
p. 54) “O linchamento não é uma violência original: é uma segunda violência. Está
fundamentalmente baseado num julgamento moral”.
De acordo com o exposto sobre a alínea “a”, e com o explicitado até aqui,
aplicando analogamente ao caso do linchamento, a população que o comete entende que é
possível repreender penalmente o (suposto) criminoso sem que o Estado interfira na ocasião,
já que ela entende que o Estado não irá agir para responsabilizar o possível infrator, ela age.
A alínea “e” do art. 65 do Código Penal no que se refere ao crime de multidão é o
ponto do código que trata sobre algo relativamente próximo do que pode ser considerado
quando ocorre um linchamento: mais de um agente, crime é cometido por todos ou várias
pessoas que influenciam outra quantidade grande de pessoas a cometerem o justiçamento,
Jose de Souza Martins (2015, p. 105) diz que:

Não raro, os participantes de linchamentos têm uma difusa concepção de que o


crime de multidão é lícito e dizem isso. Provavelmente, referem-se ao fato de que o
Código Penal considera atenuante a participação em crime coletivo. Conciliam,
assim, a justiça formal do Código com a justiça da vingança, com o justiçamento.
Até mesmo vítimas de tentativas de linchamento, quando ouvidas a respeito,
justificam a legitimidade da violência de que foram vítimas. Portanto, estamos em
face de uma cultura da justiça popular, um código complexo de ações de restauração
da ordem de onde ela é violada.

A pena, individualizada no caso de um possível processo penal (que pouco ocorre


com devidas exceções que serão apresentadas), é sempre a do respectivo resultado do ato,
sendo de menor gravidade a maior gravidade na seguinte ordem: lesão corporal, leve, grave,
gravíssima, seguida de morte, homicídio culposo, homicídio doloso. Todos estes tipos se
enquadram na individualização da pena no caso de ser aplicada, a questão maior é que, como
foi supracitado pelo professor Martins, eles acontecem (e vem aumentando ano a ano), pois
existe a compreensão de que a justiça não funciona, nem para os agressores e muito menos
para o agredido, visto que “Em todos os casos, é evidente, e não raro é explicitamente dito,
que a justiça pelas próprias mãos é praticada por descrença na justiça institucional”
(MARTINS, 2015, p. 105).
Outra caracterização (pouco) aplicada nos casos de linchamentos é referente ao
descrito no Art. 345 do CP/1940 (BRASIL, 2021), que segue: “Art. 345 – Fazer justiça com
as próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite”.
Ou seja, o artigo 345 do CP traz consigo o entendimento de que cabe ao Estado, e
apenas a ele a administração da Justiça, sendo vedado ao particular realizar qualquer ato que
deva ser apreciado pelo Poder Judiciário, existindo, porém, um salvo conduto, que é quando a
lei lhe permite agir, como por exemplo, na legítima defesa. Quando é dito que é pouco
aplicado, realmente o é, pois o linchamento em grande maioria dos casos não demonstra
“pretensão legítima” de quem o comete, pois, a vítima está sendo na realidade, defendida por
uma “multidão” que em grande maioria das vezes são de desconhecidos, poucas às vezes de
conhecidos, mas que não tem ligação direta com o fato do crime, transformando estes em
autores dos outros crimes previstos anteriormente.
Neste momento do trabalho, e utilizando-se da grande mídia ou até mesmo das
mídias menores (jornais interioranos ou regionais) será apresentado e analisado casos com
pouca repercussão. Mas sempre tentando retratar fontes confiáveis de informação, sendo elas
regionais ou nacionais, para demonstrar a quantidade de casos ocorridos. Também serão
apresentados casos que tiveram repercussão geral, não restando dúvidas quanto a sua real
ocorrência, podendo, no entanto diferir na narração dos fatos de acordo com cada periódico
apresentado (se o linchamento foi noticiado em dois ou mais periódicos, por exemplo).
A apresentação de casos visa demonstrar que o problema estudado é real, fatídico
e não uma mera invenção mitológica da mídia brasileira, pois, dados oficiais sobre a questão
não existem (assim como vários outros dados relacionados à segurança pública).
O professor de história André Luiz Ribeiro, 27, é um dos relatos recentes sobre
uma onda de violência baseada na intolerância que persiste no Brasil em 2014.
Confundido com um ladrão em São Paulo, ele foi espancado e só conseguiu escapar depois de
dar aula sobre Revolução Francesa a um dos bombeiros que o resgataram.
Da postagem no Facebook da foto de um adolescente negro acorrentado a um poste no
Rio de Janeiro até a morte da dona de casa Fabiane Maria de Jesus no Guarujá (SP). São
aprisionamentos, espancamentos coletivos e cenas bárbaras que já fizeram vítimas em quase
todos os estados do país, contando apenas os noticiados, não há estatística criminal sobre
linchamentos no Brasil.
5.Considerações Finais

O trabalho em tela visou demonstrar a ocorrência dos linchamentos no Brasil.


Como um problema crescente, resultado do aumento da violência, criminalidade e da falta de
políticas públicas que cumpram com os objetivos da Constituição Federal do Brasil,
analisando o artigo 3º, incisos I, III e IV.
A natureza humana, segundo o exposto, tende a equilibrar o meio social em que
vive, e no meio social atual tem solicitado que as pessoas permaneçam em completo estado de
alerta. É um modo de sobrevivência.
Nas sociedades antigas e medievais esse medo era autoexplicativo, pois o
Soberano (ou quem detinha o poder equivalente ao dado ao Estado nos dias atuais), não tinha,
segundo o compreendido, o dever de promover uma sociedade “igualitária”. Sendo assim, a
ordem e a paz social eram regidas pela lei do mais forte, e pela mitologia ou religião,
transformando o convívio social em uma luta pela sobrevivência diária. Com o avançar da
Idade Média, ficou demonstrado que as mortes em praça pública, fizeram parte da história
humana. Uma comparação, mesmo que anacrônica daquele meio social com o atual mostra
que a relação multidão e irracionalidade têm muito em comum. Tendo em vista que todas as
mortes da praça pública eram acompanhadas de gritos (em apoio ou contra) materiais
arremessados em direção às pessoas que estavam sendo condenadas e mortas. Com o
surgimento da era moderna e o fim das penas de morte (pelo menos em praça pública), foi se
retirando o corpo, como objeto fim da pena, e se incluindo a restrição da liberdade, já que o
problema era a não possibilidade de conviver em meio à sociedade. Matar não
necessariamente precisaria ser a solução. Começava então as penas de cárcere.
As penas de cárcere surgem em um momento histórico impar: revoluções, e
Estados surgindo e monarquias caindo. Também ao fim dos reinados absolutistas e o
afloramento das constituições. Nesse contexto, o contrato social se completa.
Cada cidadão dará sua liberdade em troca de um melhor meio social (pelo menos
era o que se pensava). Todos em favor de um, soberano, o Estado. Que irá criar leis e gerir as
liberdades, permitindo ou restringindo certas condutas.
Neste ponto, a justiça faz parte do Estado. E o Estado deve geri-la de forma a ser
isento, igualitário e, por óbvio, justo para todos.
O Estado brasileiro tem falhado na sua forma de exercer a justiça. Em relação à
segurança pública e aplicação das leis. Literalmente, fazer cumprir o que manda o código. E
isso tem sido notado pela população em geral de maneiras cada vez mais expressivas. Criando
imensos abismos entre o poder público e a sociedade. Os linchamentos ficaram caracterizados
pela violência empreendida e pelo fato de que nada será feito em relação ao ato cometido.
Pois, em suma, é a justiça sendo aplicada de forma “rápida, completa e eficaz”.
As motivações para que os linchamentos ocorram, giram em torno da sensação de
impunidade, e a falta de segurança pública.
Com relação à segurança pública, é extremamente importante ressaltar que não
necessariamente o Estado tem falhado ao “prender” (encarceramento em massa). Mas o
procedimento – investigar – processar – julgar tem apresentado problemas desde que a
República Federativa do Brasil, era na verdade um Império.
Nosso atual modelo de segurança pública, não trabalha em prol da prevenção de
crimes, agindo ostensivamente e efetivamente na demonstração de que o Estado estará lá, no
local do crime mesmo antes que ele aconteça, prevenindo-o. Não apresentando também
políticas públicas que atuem como agentes preventivos. No campo da impunidade, não se
pode dizer o mesmo. O Estado brasileiro vem tentando incansavelmente resolver seus
problemas através de um Poder Judiciário mais efetivo. Contudo, da maneira errada. Passa-se
por cima das garantias individuais em prol de uma “punição” certa, sem certeza do crime,
tendo em vista que grande parte das populações carcerárias se quer foram julgadas. E isso traz
grandes consequências para a credibilidade da justiça, tanto para a população em geral que
veem presos sendo soltos constantemente por falta de vagas, quanto para o próprio preso, que
muitas vezes está lá sem a necessidade de estar. O crescimento da população carcerária no
Brasil, sem o devido investimento na possível recuperação do preso, transforma presídios que
deveriam prestar penas humanizadas, em penas em que o corpo, novamente se transforma em
alvo de ataque.
Por fim, casos apresentados demonstram a real ocorrência dos linchamentos no
Brasil, mesmo carecendo de fontes oficiais de informação e padronização de dados. Os jornais
e periódicos online trazem atualmente a única fonte de informação disponível
abundantemente a respeito do tema, sem esquecer os dados publicados pelo professor José de
Souza Martins e pela Doutora Ariadne Natal.

6.Referências Bibliográficas

http://g1.globo.com/politica/dias-de-intolerancia/platb/
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 20. ed. São Paulo:
Saraiva 2014.

BOBBIO, Norberto, 1909. Estado, governo, sociedade; por uma teoria geral da política. 12.
ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

BRASIL. Decreto Lei Nº 2.848, de 7 de Dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão; tradução Raquel Ramalhete, 40.
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

HOBBES, Thomas. O Leviatã. Disponível em:


http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_thomas_hobbes_leviatan.pdf.

MARTINS, José de Souza. Linchamentos: Justiça Popular no Brasil. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2015.

SANDEL, Michael J. JUSTIÇA – O que é fazer a coisa certa? 17. ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2015.

NATAL, Adriadne. 30 anos de linchamento na Região Metropolitana de São Paulo.


Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de
São Paulo. São Paulo, 2012.

ADORNO, Sergio. Exclusão socioeconômica


e violência urbana.Sociologias, Porto Alegre, ano 4, nº 8, jul/dez 2002, p. 84-135

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