Você está na página 1de 2

FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

DEPARTAMENTO DE DIREITO ECONÔMICO, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO

Disciplina: DIREITO TRIBUTÁRIO I


Professores: Luís Eduardo Schoueri e Roberto Quiroga Mosquera
Turma: 4º Ano Diurno/Noturno

Seminário – 1º semestre de 2023

Caso 2A – Conceito de Tributo

A empresa Lojas Canadenses S.A. (“Canadenses”) é uma tradicional


varejista, possuindo lojas de departamento espalhadas pelo Brasil. No exercício
de suas atividades, a empresa costuma adquirir mercadorias de atacadistas ou
indústrias de diferentes regiões do país, revendendo tais mercadorias em seus
estabelecimentos.
Sendo a contribuinte obrigada à apuração do Imposto de Renda da
Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)
pelo regime do Lucro Real, a Canadenses deduz, quando da apuração da base
de cálculo dos referidos tributos1, os dispêndios com a aquisição das
mercadorias que revende, apurando, assim, o seu lucro líquido tributável.
Ocorre que alguns de seus principais fornecedores, cujas mercadorias
fornecidas representavam mais de 60% das despesas deduzidas pela
Canadenses no ano de 2020, foram declarados inidôneos pelo Receita Federal
do Brasil (RFB), que realizou diligências em seus estabelecimentos e notou a
incompatibilidade da estrutura física com o volume de mercadorias
comercializadas.
Desconfiando da possibilidade de a Canadenses ter adquirido “notas frias”
dos fornecedores declarados inidôneos (com o simples intuito de reduzir a base
de cálculo do IRPJ e da CSLL), a RFB notificou a empresa para que
comprovasse a efetiva aquisição das mercadorias, exigindo a apresentação de
comprovantes de pagamento, transporte, movimentações de estoque etc.
A Canadenses, entretanto, não possuía tal documentação. Em razão
disso, amparando-se no disposto no art. 82 da Lei nº 9.430/962, a RFB: (i)

1
A base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pelo regime do Lucro Real é equivalente ao
“lucro líquido do período de apuração ajustado pelas adições, exclusões ou compensações
prescritas ou autorizadas pela legislação tributária” (art. 6º, caput, do Decreto-Lei nº 1.598/77).
2
Art. 82. Além das demais hipóteses de inidoneidade de documentos previstas na legislação,
não produzirá efeitos tributários em favor de terceiros interessados o documento emitido por
pessoa jurídica cuja inscrição no CNPJ tenha sido considerada ou declarada inapta. Parágrafo
único. O disposto neste artigo não se aplica aos casos em que o adquirente de bens, direitos e
mercadorias ou o tomador de serviços comprovarem a efetivação do pagamento do preço
respectivo e o recebimento dos bens, direitos e mercadorias ou utilização dos serviços.
desconsiderou todas as despesas relacionadas a aquisições de bens fornecidos
pelas empresas declaradas inidôneas, ao argumento de que tais valores
estavam amparados em “notas frias”; e (ii) declarou imprestável a contabilidade
da Canadenses relativa ao exercício de 2020, lançando o IRPJ e a CSLL
conforme o regime do Lucro Arbitrado, nos termos do art. 47, II, “b”, da Lei nº
8.981/95, que assim dispõe:
Art. 47. O lucro da pessoa jurídica será arbitrado quando: [...]
II - a escrituração a que estiver obrigado o contribuinte revelar
evidentes indícios de fraude ou contiver vícios, erros ou deficiências
que a tornem imprestável para: [...] b) determinar o lucro real.
Uma vez que a receita bruta da Canadenses era de conhecimento da
RFB, a base de cálculo arbitrada foi apurada conforme regra prevista no art. 16
da Lei nº 9.249/95, segundo o qual “[o] lucro arbitrado das pessoas jurídicas será
determinado mediante a aplicação, sobre a receita bruta”, com base em
presunções de lucro.
No entanto, membros do departamento jurídico Canadenses estão
inconformados com a autuação, já que, acreditando estarem sendo penalizados
pelo ilícito dos fornecedores, notaram que a base de cálculo do Lucro Arbitrado
impõe presunções gravosas de lucro. Afinal, elas consistem na adição de 20%
sobre a presunção praticada por empresas sujeitas ao Lucro Presumido3. Assim,
quando comparada àquela apurada pelo regime do Lucro Presumido, a base de
cálculo do Lucro Arbitrado resulta em uma tributação consideravelmente mais
onerosa.
Foi então que a empresa procurou seus advogados tributaristas, que
sugeriram o ajuizamento de ação anulatória para discutir a validade da regra
prevista no art. 16 da Lei nº 9.249/95, particularmente no que diz respeito ao
adicional de 20% aplicável na apuração da base de cálculo em função da
imprestabilidade da contabilidade.
À luz da matéria “Conceito de Tributo”, elaborem:
(i) como representantes do Contribuinte (grupo 5), os argumentos
cabíveis para justificar a invalidade da regra; e
(ii) como representantes do Fisco (grupo 1), os argumentos cabíveis
para justificar a validade da regra.
Esclareça-se que demais argumentos que transbordem da temática
“Conceito de Tributo” poderão ser suscitados, devendo, porém, os debates em
sala se centrar no tema da aula para a resolução do caso.

3
Ao contrário do regime do Lucro Real, no qual o lucro tributável é apurado a partir do lucro
contábil da empresa (após a realização dos ajustes previstos na legislação), o lucro tributável
apurado pela sistemática do Lucro Presumido é obtido mediante a aplicação de percentuais
(coeficientes de lucro) sobre a receita bruta do contribuinte.

Você também pode gostar